Significado do Future-se de Bolsonaro

No dia 17 de julho o Ministro da Educação Abraham Weintraub anunciou uma proposta de profundas mudanças na organização da educação superior do Brasil. O programa Future-se prevê entregar a gestão de institutos e universidades federais nas mãos de organizações sociais responsáveis pela captação de recursos privados, dentre outras tarefas. Por meio do Future-se o atual governo legitima a política de cortes no financiamento público da educação superior, ferindo também a autonomia das instituições, na medida em que obriga os gestores a conviver com uma entidade privada autorizada a fazer tudo o que pretender.

Essa proposta de privatização da educação superior é um salto de qualidade em relação ao processo de privatização em curso nas universidades, onde fundações privadas atuam abertamente, além do conjunto de legislações que têm sido implementadas no sentido de facilitar a participação de empresas privadas em projetos de ensino, pesquisa e extensão. Em muitas universidades laboratórios se tornaram praticamente a extensão de empresas, que utilizam espaço físico e recursos humanos públicos na geração de conhecimento apropriado pelo setor privado, que chega a beneficiar alguns servidores públicos com o pagamento de bolsas ou mesmo de salários.

Com o Future-se as medidas de regulamentação e fiscalização realizadas atualmente pelas reitorias serão enfraquecidas ou mesmo extintas. Essa tem sido uma das razões apontadas por reitorias e conselhos superiores para se opor ao Future-se, criticando o ataque à autonomia, ainda que defendam a forma como se dá atualmente a relação com as empresas. Em nota, a Andifes, entidade que reúne os reitores das universidades, aponta que os “elementos interessantes do programa não são novos e antes reconhecem o que já se pratica virtuosamente no ambiente e no contexto da legislação de nossas universidades”. Choca a nota falar em “elementos interessantes” do Future-se, assim como defender a legislação vigente.

Nas declarações específicas de reitorias essa postura também aparece. O conselho superior da UnB criticou que as fundações de apoio sejam “completamente desconsideradas” pelo Future-se, destacando que elas “vêm aprimorando o apoio às Instituições de Ciência e Tecnologia (ICTs), tendo acumulado experiência e demonstrado
eficiência na prestação desses serviços”. Essas fundações têm a função de burlar a legislação de compras do serviço público e facilitar a injeção de recursos externos. Esses entes privados atuam no apoio a projetos de pesquisa e de outras naturezas, mediando a relação com empresas e sendo responsável por compras, pagamentos de bolsas e outras atividades.

Em sua nota, a UFMG apontou que a instituição “apresenta uma ampla experiência em ações de empreendedorismo, internacionalização e inovação, implementadas pelos órgãos institucionais ou por meio de suas Fundações de Apoio”. A legislação de inovação, sintetizada pelo Marco Legal da Ciência (2014), regulamentou a possibilidade de compartilhar laboratórios, equipamentos, materiais e instalações com empresas. Permitiu também que as universidades e órgãos que produzem ciência possam negociar com o setor privado os direitos de exploração de determinado produto ou tecnologia produzidos com o uso de recursos públicos, em troca de favorecimento econômico. Além disso, professores em regime de dedicação exclusiva podem desenvolver pesquisa, remunerada ou não, em empresas privadas, o que até então era proibido.

Diante do Future-se, as reitorias se posicionam na defesa da atual legislação, que, na prática, regulamenta uma privatização “aceitável e benéfica” das universidades. Essas são formas encontradas pelo capitalismo de se apropriar do conhecimento produzido com recursos públicos nas universidades. No capitalismo em crise, nem mesmo essa mediação é possível, sendo preciso entregar completamente a produção do conhecimento nas mãos da burguesia. Esse é o significado do Future-se. Uma universidade pública, gratuita e para todos, com um desenvolvimento livre da ciência e da educação, será possível somente com o fim do capitalismo.