Imagem: Reprodução Balanço Geral, Divulgação ND

Transporte coletivo de Joinville: história e luta pela Tarifa Zero

Joinville é a maior cidade do estado de Santa Catarina, com cerca de 616 mil habitantes e uma área de 1.127,946 km². Tem como característica ser uma cidade industrial, que cresce todos os dias por meio da metalurgia, montadoras, fábricas de plásticos e tecidos. As principais zonas industriais se encontram no norte e leste da cidade. 

Diferente das grandes cidades que criaram várias zonas comerciais para dar conta das demandas populacionais, Joinville centraliza a maior parte de suas lojas, mercados e estabelecimentos de entretenimento no centro da cidade ou bairros próximos. As principais instituições de Ensino Superior estão em locais de difícil acesso, como na Zona Industrial Norte, na Zona Leste, no centro da cidade e suas redondezas.

Tal configuração da cidade explica o quão crucial é o transporte coletivo para a classe trabalhadora e a juventude de Joinville. Sendo o ônibus o único meio de transporte “público” coletivo na maior cidade do estado, cerca de 110 mil pessoas o utilizam. Entretanto, os dados oficiais mostram que houve uma queda de passageiros entre 2011 e 2019 de 23,6%. Em 2024, o preço da passagem está ainda mais caro do que quando a pesquisa foi feita, chegando a R$ 5,50 antecipado e R$ 5,75 embarcado, restringindo ainda mais a quantidade de usuários.

Outros elementos que ajudam a entender a queda do número de passageiros é a a superlotação dos ônibus; a falta de estrutura de ventilação e ar-condicionado; apenas 268 veículos circulando na cidade; caos no trânsito gerado pela falta de planejamento urbano, principalmente nos horários de pico; além de dados alarmantes como 18,8% das mulheres já terem sofrido algum tipo de abuso no transporte, como aponta pesquisa realizada em 2023.

Em 1969, o complexo de transporte catarinense Transtusa entra em território joinvilense através da família Harger, que detinha 50% da empresa após firmar sociedade com a Transporte e Turismo Santo Antônio Ltda. Em 1971 aconteceu a divisão na empresa e os Harger viram sócios majoritários. Após a divisão da Transtusa, o empresário José Loureiro, até então um dos sócios da Transtusa, fundou a empresa Gidion (1971), atuando como sócio majoritário até 1978, quando passou todas as instalações para a família Bogo, que controla o transporte até os dias atuais. 

A Gidion e a Transtusa operam o serviço de transporte coletivo sem licitação. A prestação de contas do serviço oferecido fica perdida num mar tempestuoso, sendo tratada a portas fechadas entre empresas e prefeitura. Nos últimos 55 anos houve poucas iniciativas relevantes para legalizar o transporte público na cidade, sendo praticamente todas descartadas pela prefeitura, que continua reconhecendo a Transtusa e a Gidion como detentoras da prestação do serviço. 

Para piorar a situação, a prefeitura de Joinville reconheceu em 2012 – pelas mãos do governo petista de Carlito Merss – uma dívida com as empresas por não ter aumentado as tarifas, que, se atualizada para os dias atuais, passa de R$ 230 milhões. A suposta dívida é baseada em aumentos exigidos pelas empresas com a desculpa de inflação. Porém os dados apontam que de 1996 até 2017 a inflação foi de 292%, sendo que a tarifa no mesmo período subiu 567%.

Em 2023, houve novamente a tentativa de abertura de processo de licitação que continua parado até hoje. No último edital, a dívida reconhecida pela prefeitura está dentro do valor a ser pago pelo vencedor da licitação; o novo valor técnico projetado da tarifa subiria para R$ 8,58 caso aprovado na íntegra. 

Mas relembramos que a propaganda liberal em prol da disputa entre burgueses pelo controle do transporte em nada interessa aos trabalhadores e jovens; lutamos por uma empresa pública e estatal de transporte!

O movimento estudantil foi protagonista na luta contra o aumento das tarifas de ônibus na cidade. Organizados através de grêmios estudantis e da União Joinvilense dos Estudantes Secundaristas (Ujes), a juventude foi ponta de lança nas principais mobilizações contra os ataques orquestrados pelas empresas e pela prefeitura. Por meio de manifestações e frentes de lutas, a juventude impulsionou o debate com o conjunto de trabalhadores pela expropriação da Gidion e Transtusa e em defesa da tarifa zero.

Manifestação contra o aumento da tarifa 2015

Destaca-se principalmente o ano de 2003, quando a Ujes, junto aos grêmios estudantis da cidade, mobilizou milhares de jovens até a prefeitura contra o aumento da passagem. Nesse ano, o mandato do vereador e militante da OCI Adilson Mariano foi um importante aliado na luta contra o aumento. Mariano foi, inclusive, preso e condenado por apoiar o movimento estudantil.

Em 2013, a direção da Ujes participou da frente de luta pelo transporte, panfletando nas escolas e ajudando os grêmios a organizar piquetes para as manifestações contra os aumentos de passagem.

Além da Ujes, o Movimento Passe Livre (MPL) também teve um papel nas discussões em Joinville até 2017/18, quando perdeu força. Atuava principalmente no meio universitário, por meio da realização de manifestações quando a prefeitura informava os aumentos de finais de ano da tarifa. Porém, este movimento era influenciado por princípios anarquistas e as táticas de horizontalismo aplicadas nas manifestações, levaram a derrotas e desmobilização das lutas.

O auge e declínio do MPL ocorreu em 2013, quando as discussões nacionais que começaram em São Paulo, contra o aumento da passagem em R$ 0,20 centavos, chegaram em Joinville levando milhares de pessoas às ruas. 

Assim como em São Paulo, as táticas aplicadas pela direção do movimento, que se negava a cumprir seu papel de direção e restringia a luta apenas ao mote do transporte e não pela derrubada do capitalismo, junto à traição dos sindicatos e principais partidos de esquerda não mobilizando suas categorias, abriu espaço para a direita se fortalecer nos atos e atacar aqueles que ergueram suas bandeiras. Nós da OCI nos orgulhamos de termos mantido nossas bandeiras erguidas em meio à pressão exercida pelos traidores e pela direita!

Nos últimos anos a luta pela tarifa zero tem sido organizada por movimentos e partidos quando surge a possibilidade do aumento, mantendo-se a tradição de atos no começo do ano, e quando o movimento estudantil sente de maneira mais direta os ataques impostos pela prefeitura nos cortes de linhas das universidades. Os centros acadêmicos da Univille têm tomado a frente da pauta quando se apresentam cortes e aumentos, realizando atividades de formação, atos e denúncias sobre o descaso com o transporte na cidade. Os estudantes trabalhadores da Univille e da Udesc dependem de um transporte ineficiente, caótico, superlotado e caro, tendo inclusive uma das tarifas mais caras do Brasil. 

Os estudantes que se deslocam da Zona Sul, por exemplo, chegam a passar mais de três horas por dia nos ônibus e terminais. Além de que, dependendo do horário, não há linhas do Terminal Norte até o campus universitário e esses estudantes são obrigados a pegar linhas como o Paraíso e caminhar cerca de 10 minutos, sob sol e chuva, ou esperar mais de meia hora para chegarem às suas universidades. 

Na volta para casa, os ônibus vão extremamente lotados e transportam também os trabalhadores do Shopping Garten, que ficam fora de casa cerca de 10 horas por dia em escala 6×1 de trabalho e que são obrigados a irem para suas casas em pé, amontoados, sentados nas escadas e no piso do ônibus. Demonstrações de como as mafiosas empresas de transporte não estão preocupadas com a vida da classe trabalhadora.

No ano passado, houve uma série de manifestações na Univille, que demonstraram a insatisfação dos estudantes com a precarização do transporte público na cidade. As manifestações ocorreram em um contexto de volta às aulas presenciais no campus pós período da pandemia, onde muitas linhas e horários ainda estavam reduzidos, mesmo os estudantes e trabalhadores sendo obrigados a se deslocarem para seus trabalhos e locais de estudos. 

A Tarifa Zero é um modelo de política pública que tem como finalidade retirar do usuário final o valor da cobrança da passagem. Nesse modelo, o transporte é financiado 100% pelo orçamento do município e a verba para fazer o funcionamento do serviço é variada de acordo com o plano de mobilidade adotado em cada cidade. No Brasil existem cerca de 100 cidades adotando a tarifa zero, tendo proporções médias de 3 mil a 300 mil habitantes. Se pautada radicalmente, essa política entra em choque com o interesse da iniciativa privada que busca a privatização como meio de usufruir dos serviços essenciais para a classe trabalhadora. Trata-se de uma reivindicação transitória necessária para garantir que estudantes e trabalhadores possam chegar aos seus locais de estudo e trabalho, para que possam ter acesso à cultura e ao lazer.

Ressaltamos que nas cidades onde a política da tarifa zero foi aprovada, faz-se necessária uma vigília dos movimentos sociais e partidos revolucionários, pois a iniciativa privada pode a qualquer momento retirar este direito básico conquistado. Somente através de uma mobilização permanente e pautando o avanço para uma empresa pública de transporte será possível garantir a permanência da Tarifa Zero.

A licitação ou a entrada de novas empresas privadas na prestação do serviço de transporte coletivo não resolveria os problemas do serviço atual. Caso apareça uma empresa de transporte interessada em pagar a dívida e ganhar a licitação, ela estabelecerá uma nova dívida com a prefeitura e exigirá também aumentos. Ela também irá sucatear o serviço e diminuir o número de linhas, pois mesmo que o número de passageiros esteja diminuindo, os lucros precisam continuar subindo. 

A ação da burguesia local é a sabotagem e os ataques para precarizar o transporte público e manter a lucratividade na privatização. Na mesma lógica, ela se empenha contra todos os serviços públicos, diretamente, por meio das Organizações Sociais (OSs) ou terceirizações, buscando obter lucros a partir das necessidades básicas das pessoas.

Mas a resposta que os comunistas dão é a luta em defesa de uma solução do ponto de vista dos trabalhadores e da juventude, para que estas camadas tenham acesso aos seus locais de trabalho, de estudo e de lazer. Ou seja, a luta pela Tarifa Zero e por uma empresa pública de transporte. 

Defendemos a expropriação do monopólio da Transtusa e da Gidion sob controle dos trabalhadores!

Se você concorda com essa política e deseja lutar pelo fim da máfia do transporte e pela Tarifa Zero, organize-se com a Organização Comunista Internacionalista!

Referências:

Observatório Urbano de Joinville. Disponível em: https://observatoriourbanojoinville.medium.com/

Diário do transporte. Disponível em: https://diariodotransporte.com.br/2023/07/03/joinville-sc-pesquisa-mostra-que-maioria-usa-o-transporte-publico-porque-e-a-unica-opcao/  

Gazeta de Joinville. Disponível em: https://gazetadejoinville.blogspot.com/2010/02/o-imperio-gidion-e-transtusa-servico.html

NDMais. Disponível em: https://ndmais.com.br/noticias/adilson-mariano-pt-e-considerado-condenado-pela-justica/

Blog da UJES. Disponível em: https://ujesjlle.blogspot.com/

BBC Brasil. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cy65e4qnjjpo

Rede Brasil Atual. Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/cidades/cinco-milhoes-de-pessoas-em-101-cidades-tem-tarifa-zero-decisao-e-mais-politica-que-tecnica/