Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

O coronavírus e a crise

Editorial do jornal Foice&Martelo 151, de 04 de março de 2020. Confira outros editoriais aqui. Você também pode conhecer nosso jornal quinzenal e assinar por este link.

O Banco Mundial e o FMI preveem que a epidemia, não declarada pela OMS como tal, do coronavírus leva a uma queda da expectativa de crescimento mundial. As análises mais pessimistas dizem que o mundo entrará em recessão mundial por causa da epidemia. Afinal, o que tem de verdade nessas afirmações?

É verdade, as medidas tomadas pela ditadura chinesa no começo da crise levaram ao fechamento de fábricas e à paralisação da produção em setores inteiros da China. O nível de poluição reduziu-se de forma tão drástica em consequência destas medidas que foi possível medi-lo pelas fotos de satélites. Mas, qualquer um que tenha dois neurônios sabe que essa paralisação é temporária e que a retomada poderá ser feita em nível mais acelerado que antes. A paralisação em outros países mostra isso – nas fábricas da Samsung, na Coréia do Sul, a direção suspendeu os operários suspeitos de contaminação, fechou a fábrica por dois dias para descontaminação e retomou imediatamente a produção.

O problema que está afetando a economia é muito maior que o coronavírus e os economistas do FMI sabem disso. E sabem também que as soluções capitalistas para tal crise não são tão simples. Por isso, usam a desculpa do vírus para um problema econômico e político. Tentam tapar o tamanho do desastre que ocorre e do ainda maior desastre que se prepara na economia mundial para o próximo período.

As previsões de redução do crescimento são alarmantes e a forma de lidar dos governos leva ao pânico e a especulação corre solta, por isso a queda nas bolsas, as perdas chegaram a R$ 5 trilhões e registraram a pior semana desde a crise de 2008. O FED (Banco Central dos EUA) cortou sua taxa de juros e existem pressões que ele reduza esta taxa para zero! A pandemia agrava as frágeis previsões de antes, onde se tinha expectativa de crescimento de apenas 2,5% no PIB mundial e agora tais previsões são reduzidas.

O coronavírus é uma tentativa esfarrapada de encontrar um responsável por aquilo que é apenas a expressão da crise orgânica do capitalismo putrefato que continua a viver como um zumbi, destruindo tudo o que toca.

Lenin já explicou há muito tempo que a política é economia concentrada. E isso, hoje, deriva-se em dois caminhos para resolver a crise – através de acordos com os reformistas para retirar direitos de trabalhadores mais lentamente ou através de governos que fazem o choque direto, certos que as atuais direções do movimento operário e da juventude não oporão medidas que levem a revoluções.

Alguns exemplos dessa política:

  • Na França, Macron mantém a sua reforma da previdência mesmo após a maior greve dos ferroviários das últimas décadas. Ele mediu precisamente até onde estavam dispostos a ir os líderes reformistas das centrais sindicais e da “oposição” – nenhum deles se dispôs a chamar uma greve geral que botasse abaixo o seu governo. A oposição, depois de encerrada a greve dos ferroviários, caminhou para uma “guerrilha parlamentar”, apresentando dezenas de milhares de emendas ao seu pacote previdenciário com o único objetivo de atrasar (e não impedir) a reforma. Macron, do alto de sua “postura democrática”, fez por decreto a reforma, sem passar pelo Parlamento (que passa a ter função meramente homologatória, sem poder modificar nada).
  • Nos EUA, frente ao ascenso da candidatura do “socialista” Bernie Sanders, a burocracia partidária uniu-se em torno do nome de Joe Binden (ex-vice de Obama) e passou a usar todo o seu peso de aparato, nas prévias e nas campanhas públicas, contra Bernie. As dezenas de candidatos reduziram-se a cinco, sendo que todos que desistiram apoiam agora a Binden. Os PACs do Partido Democrata (organismo teoricamente não partidários, financiados por grandes empresas) viram os seus canhões contra Bernie, ao invés de procurarem atingir Trump!

Poderíamos dar outros exemplos, mas estes dois bastam. A burguesia, frente à crise e vendo a facilidade com que os reformistas se rendem, parte para uma ofensiva cada vez maior. Conseguirão vencer e reduzir a classe trabalhadora ao que era, em termos de direitos, ao século 19?

A resistência que se mostra nas manifestações e revoluções que percorreram o mundo diz que não será tão fácil quanto pretendem, apesar dos líderes reformistas. O exemplo do Chile e do Líbano são chagas vivas que a burguesia não consegue conter. O germe da revolução começou e as tarefas dos marxistas é construir o partido mundial, que faça das palavras de Marx a realidade: Trabalhadores de todo o mundo, uni-vos.