Fotos: Júlio César Guimarães/COB

As mulheres e as Olimpíadas

Desde que as Olimpíadas iniciaram em Tóquio, as mulheres têm ocupado um papel de destaque. Até 02 de agosto, o Brasil ganhou 10 medalhas, sendo 5 de mulheres e, destas, 2 conquistadas por Rebeca Andrade, atleta da ginástica artística e a primeira medalhista brasileira na modalidade. Já Mayra Aguiar, 29 anos, garantiu seu terceiro bronze em três Olimpíadas consecutivas, na categoria até 78kg do judô, e Rayssa Leal, 13 anos, no skate street, esporte de estreia nos jogos olímpicos. Além destas, também foi conquistado o bronze na disputa de duplas do tênis feminino com Luisa Stefani e Laura Pigossi, que integraram a equipe brasileira em Tóquio após desistências de outros países, sendo avisadas que iriam para os Jogos Olímpicos três dias antes do início da competição, em 23 de julho.

Rayssa Leal é a mais jovem brasileira a conquistar uma medalha nas Olimpíadas. Ao chegar na sua cidade, Imperatriz – MA, após a competição, a jovem pediu para que as pessoas não comparecessem ao local onde iria realizar uma carreata para não fazer aglomeração e para que todos continuassem a usar máscara. A jovem também destacou que não queria ser recebida pelo prefeito da cidade, Assis Ramos (DEM), pois em seu governo nunca houve nenhum investimento em esporte.

Foto: Breno Barros

A ginasta artística de 22 anos, Rebeca Andrade, que compete pelo Flamengo, tornou-se a primeira ginasta brasileira medalhista em Jogos Olímpicos, ao levar a prata no Individual Geral em Tóquio. Rebeca tem sete irmãos e começou a treinar aos quatro anos no Ginásio Bonifácio Cardoso, em um projeto social de iniciação ao esporte da prefeitura de Guarulhos, em São Paulo, onde ficou conhecida como a “Daianinha de Guarulhos”, uma referência ao ícone da ginástica brasileira Daiane dos Santos. A Prata e o Ouro de Rebeca foram aclamados por todos, mas inicialmente, a sua popularidade se deu devido sua apresentação no Solo, aparelho de sua especialidade, pois Rhony Ferreira, coreógrafo da seleção brasileira, trouxe para a apresentação o funk de 2015 “Baile de Favela” que foi um marco na expansão do funk de São Paulo ao citar os principais fluxos da periferia paulista. Sem entrar na discussão sobre a letra da música, que de fato é muito problemática, o funk, por outro lado, é uma expressão muito viva da força que vem dos bairros proletários do Brasil, explicitando uma contradição que vemos em inúmeras expressões na letra. Não foi diferente na emocionante apresentação da atleta, que se identifica com a canção e conquistou a primeira medalha olímpica de uma mulher brasileira na Ginástica Artística através dessa canção. A mesma transformação desta música foi feita pelos estudantes que ocuparam as escolas secundaristas no final de 2015 e início de 2016, com a paródia “escolas de luta”, mostrando a resistência dos estudantes contra a reorganização escolar.

O Futebol feminino no Brasil

Mas não foram apenas as vitórias brasileiras que marcaram esses últimos dias. Na madrugada da última sexta-feira (30/7), a seleção feminina de futebol entrou em cena nas quartas de finais contra o Canadá. Após a derrota nos pênaltis e eliminação dos jogos, o clima era de tristeza em campo e de cobrança fora dele. Como resposta para as críticas esperadas, Marta, a principal jogadora de futebol feminino da história, pediu que:

 “se for para apontar o dedo e criticar, que façam contra mim, porque estou acostumada. Mas não façam às meninas, a nova geração do futebol feminino”.

Esta fala não pode passar despercebida destes Jogos Olímpicos, nem de qualquer análise sobre a modalidade. Precisamos conhecer a história do futebol feminino no Brasil para entendermos as dificuldades enfrentadas não apenas pela Seleção Brasileira, mas de todas as mulheres que buscam seguir a carreira de jogadora de futebol em um país que, com os homens, têm este como seu principal esporte.

Foto: Sam Robles

O futebol chegou ao Brasil entre 1893 e 1895, mas as mulheres começaram a jogar somente nos anos 1920. Os jogos em si eram divulgados como shows de circos, como se fosse um espetáculo grotesco, chamado de “super comédia” e “maldita moda”. Ao fim dos anos 1930, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas e com o futebol masculino profissionalizado desde 1933, as mulheres estavam buscando mais espaço para jogar.

Para dar fim a essa tentativa, o governo brasileiro realizou o decreto-lei 3.199, art. 54, que proibia mulheres de disputarem esportes que não fossem “adequados a sua natureza”. Em 1965, tal lei foi reforçada pela Ditadura Militar, explicitando a proibição do futebol feminino. Essa lei foi abolida apenas em 1979, mas o esporte só foi regulamentado nos anos 1980 com a liberação para os primeiros torneios de mulheres.

Isso significa que as mulheres foram proibidas de jogar futebol por 38 anos no Brasil e, mesmo quando liberadas, não receberam qualquer financiamento para o esporte, ao contrário do futebol masculino, sempre utilizado pelos governos burgueses como cartão postal do país e manejado politicamente para seus interesses.

Derrotar o capital para a emancipar a mulher

Portanto, essa história não pode ser esquecida, tal como é importante deixarmos claro que, enquanto marxistas, explicamos a impossibilidade de as mulheres alcançarem a sua emancipação através de condutas, códigos, ações ou conquistas individuais. Para nós, superar a opressão e a exploração significa agir conscientemente para transformar a sociedade que vivemos hoje. Significa combater todas as formas de opressão, entendendo que a sociedade capitalista as dissemina o tempo todo, em todas as instituições e relações sociais.

O Estado burguês e os capitalistas comemoram e buscam se vangloriar das vitórias dos atletas quando estes superaram todas as dificuldades impostas. Mas, na realidade, temos que apontar para as verdadeiras questões, como quantas Rayssas e Rebecas teríamos se houvesse um real investimento em serviços públicos, como o esporte deve ser compreendido? E se não houvesse a polícia militar que sobe os morros matando crianças que poderiam ter um futuro como das campeãs olímpicas? Ao contrário disso, perdemos todos os dias os jovens por bala perdida, por falta de alimentação, saúde e educação. Ainda temos aqueles que conseguem driblar as adversidades, se tornando atletas, mas não possuindo qualquer incentivo público para seus trabalhos, tendo que se sujeitar a bolsas ou a qualquer patrocinador privado.

Diante desse cenário, precisamos tratar o esporte como um serviço público, gratuito e para todos. É preciso de todo investimento real e necessário do Estado, e não parcerias público-privadas que vão escolher em qual esporte irão investir a partir daquele que poderá lhe dar mais lucro. Mas sabemos que esta é uma política revolucionária e socialista, pois o Estado burguês não é capaz de garantir isso.

Os países que são potências olímpicas são justamente aqueles que investem mais em esportes. No Brasil, um país de capitalismo dominado pelo imperialismo, isso não é possível, porque, além da ausência de investimento, vemos também os profundos atrasos, como na história do futebol feminino até a prática do skate, que era juridicamente taxada como “vadiagem” até poucas décadas.

No Brasil e no mundo, as opressões e os ataques aos serviços públicos e qualidade de vida são a realidade da classe trabalhadora e da juventude, evidentemente com seus desenvolvimentos desiguais e combinados. As condições do esporte, que são debatidas pela imprensa a cada 4 anos e por todos que apreciam ver as disputas, não poderiam ser diferentes das condições materiais da nossa sociedade, que vive o momento mais decadente de um modo produtivo decrépito, o capitalismo.

Para que tenhamos o efetivo protagonismo, liberdade e igualdade para a prática dos esportes e de todos os interesses culturais, sociais, científicos para todas as pessoas, a humanidade possui apenas uma saída. Essa alternativa é organizar-se para pôr abaixo todo esse sistema que nada mais tem a nos oferecer, senão as migalhas e as vitórias individuais, as quais os jovens sonhadores acabam sendo obrigados a se agarrarem para tentar superar suas barreiras. Apenas em um outro mundo, onde todos os serviços públicos e o trabalho estarão à nossa disposição e a economia planificada atenderá aos interesses dos trabalhadores e das novas gerações, é que alcançaremos a vitória histórica, o ouro do socialismo internacional.