Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Greve dos metroviários mostra a força da categoria e a vacilação do sindicato

Na noite do dia 22 de março foi decretada a greve que viria a chacoalhar a cidade de São Paulo nos próximos dois dias. A greve aconteceu em meio à guerra imposta pelo governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) ao conjunto da classe trabalhadora, com sua política de privatizações que ameaça todas as empresas públicas.

Apesar da greve girar em torno do pagamento da participação nos resultados dos últimos três anos e novas contratações, as discussões em torno das iminentes privatizações e o impacto que a greve teria nesse sentido ocuparam o primeiro plano durante o movimento. Dessa forma, a disputa foi acirrada, sendo a greve aprovada por 1.076 votos contra 933 e 21 abstenções.

Mas, uma vez aprovada, a categoria mostrou sua força com uma paralisação total que viu o dia 23 amanhecer sob o auspício de uma greve que impactou o conjunto da classe trabalhadora e juventude.

Tarcísio manobra

Na madrugada do dia 22 para o dia 23 o sindicato propôs para a direção da empresa o retorno imediato ao trabalho, desde que não houvesse cobrança de tarifa aos passageiros enquanto durassem as negociações, ou seja, uma “greve de catracas abertas”. Inicialmente o Metrô foi contra, mas diante do impacto da greve, aceitou a abertura das catracas. Esse episódio durou algumas horas até que o próprio governador Tarcísio de Freitas, buscando atender os interesses das empresas que operam algumas linhas privatizadas, conseguiu uma liminar para barrar a catraca livre. Esse fato demonstra que o Metrô, enquanto empresa pública, tem como operar gratuitamente para a população e mostra que quem realmente se beneficia com a cobrança de tarifas são os empresários do transporte. Como exposto em matéria ano passado, as empresas públicas receberam apenas 0,2% do que é arrecadado com tarifas, mostrando que a tarifa serve apenas para o lucro dos empresários e não para o custeio do sistema como dizem.

Assim, fica evidente que Tarcísio não foi contra a greve porque ela “prejudica os passageiros”, afinal, se quisesse ajudar a população, manteria a decisão da empresa de operar com as catracas abertas. Tarcísio é contra a greve dos metroviários porque prejudica as empresas privadas de transporte e o avanço da sua política de privatização para outras linhas.

Por outro lado, avaliamos que a proposta de “greve com catracas abertas” poderia se tornar um tiro no pé da categoria, ao fazer os metroviários voltarem ao trabalho sem nenhum avanço nas negociações. O grande poder dos metroviários – e também dos ferroviários da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e motoristas de ônibus – reside no fato de conseguir paralisar a circulação da principal mercadoria do sistema capitalista: a força de trabalho humana. Uma greve no transporte público, seja sobre trilhos ou sobre rodas, coloca toda a burguesia em polvorosa e, imediatamente, a mídia burguesa enche os meios de comunicação com matérias de passageiros prejudicados para pressionar os grevistas e colocar a população contra a greve.

Porém, os passageiros também são trabalhadores e enfrentam, todos os dias, diversos problemas com o transporte público, como falhas e atrasos, superlotação, preço das tarifas, entre outros. Portanto, é possível conquistar o apoio da população para a greve com um diálogo permanente entre os trabalhadores do transporte e a população que depende do serviço público. Os atos impulsionados pelo Comitê Contra a Privatização da CPTM em frente às estações privatizadas demonstram que é possível conquistar esse apoio entre os passageiros.

Para resumir, somos a favor de abrir as catracas para os passageiros como forma de protesto, para lutar pela gratuidade do transporte e contra a privatização, mas não se pode abdicar de fazer greve até o atendimento das reivindicações.

As direções capitulam

Mais uma vez os metroviários mostraram sua disposição de luta e sua disciplina exemplar, e em nova assembleia decidiram manter a greve em resposta às manobras de Tarcísio, com 1.727 votos contra 344 e 58 abstenções. E assim a categoria entrou em seu segundo dia de greve.

Os passageiros afetados pela greve também são trabalhadores e enfrentam diversos problemas com o transporte público, portanto, é possível conquistar o apoio da população para a greve – Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Porém, a maioria da direção sindical tinha outros planos. Diante de uma proposta irrisória do governo (pagamento de R$ 2 mil), vários diretores do sindicato, liderados pela presidente Camila Lisboa, circularam nos grupos a seguinte mensagem:

“Porque devemos aprovar a proposta do governo, apesar dela ser muito ruim?

A proposta é muito ruim, não atende nossas expectativas, nem está à altura do esforço da categoria nos últimos 2 dias. A indignação é justa porque o governo demonstrou ser desonesto e mentiroso;

Hoje é sexta-feira e seguir a greve no fim de semana pode ser arriscado. Aguardar uma nova proposta no dia de hoje é também um risco já que durante todo esse tempo a disposição de negociação foi zero;

Esse é apenas nosso primeiro embate com o governo, ainda temos campanha salarial daqui a cerca de 1 mês, mostramos nossa força e dobramos a intransigência do governo que não queria negociar nada;

Não estamos em dissídio coletivo, isso faz com que a Justiça do Trabalho não possa julgar o mérito do conflito, diferente das campanhas salariais anteriores que conseguimos resultados favoráveis na justiça;

O governo saiu desgastado na opinião pública pelas mentiras em relação a catraca livre e desinformação para a população. Isso é um acúmulo que podemos conservar para as próximas lutas;

Sairemos da greve com um resultado econômico muito abaixo do que pedimos, mas sem punições e descontos dando fôlego para o próximo embate;

Agora é nos apoiar na moral que ganhamos nesses dias e ir pra campanha salarial unidos e fortalecidos.

Assinaturas: Camila Lisboa, Sergio Carioca, Pasin, Dagnaldo, Bala, Bernardo Carioca, Duarte, Tiago”

Essa carta de capitulação está permeada do início ao fim de erros políticos e uma avaliação da situação muito mais alinhada ao que os dirigentes sindicais gostariam que fosse, do que do mundo real de fato.

Diante de uma mobilização poderosa da categoria, e das primeiras manifestações de fraqueza por parte do governo, pelo que se orientam esses diretores? Pela Justiça e calendário da burguesia! Não apenas reforçam as ilusões na Justiça do Trabalho como ente imparcial na luta de classes e que dá “decisões favoráveis” à categoria, como também, subordinam a força da classe e seus métodos de luta às decisões e calendário do Estado da burguesia, amarrando as mãos dos trabalhadores.

O resultado dessa articulação da direção para acabar com a greve foi o seu encerramento, mas é muito significativo que apesar de toda essa campanha, a proposta de fim da greve impulsionada pela maioria dos dirigentes sindicais, venceu por apenas 21 votos de diferença (1.480 votos sim contra 1.459 votos não e 62 abstenções). Fica evidente que, se o sindicato estivesse disposto a levar a luta adiante, a greve ganharia ainda mais adesão e força e poderia ter arrancado uma proposta muito boa, ao contrário da “proposta muito ruim” que os dirigentes sindicais correram para aprovar.

A luta continua

Nós marxistas temos bem claro que, para combater, a classe trabalhadora necessita de total independência ao mesmo tempo que não deve nutrir nenhuma ilusão e confiança na burguesia, seus representantes e seus aparatos. E também extraímos da história a firme convicção e certeza na força da classe trabalhadora organizada.

Apesar dos delírios expressos por esses dirigentes, que se recusam a olhar a realidade de frente a todo custo, suas vacilações jogaram um balde de água fria não apenas nos metroviários, mas também nas outras categorias que acompanhavam com apreensão o desdobrar da greve dos metroviários. Cabe dizer apenas que os grupos de ferroviários da CPTM foram tomados por mensagens que variavam desde uma surpresa com a capitulação dos dirigentes que desmontaram uma greve poderosa até um repúdio aberto. 

O governo Tarcísio seguirá na sua guerra contra os trabalhadores, o calendário de privatizações avança com o anúncio do edital da linha sete da CPTM. Fica cada vez mais claro para os trabalhadores da base a necessidade de uma frente única.

A categoria dos metroviários é maior que a desmoralização imposta pelas direções. Se os diretores pelegos se apressam em frear e desviar o movimento dos trabalhadores, os marxistas devem ser os primeiros a explicar a vacilação dos dirigentes e a ajudar os trabalhadores a acelerar seu movimento, no rumo certo, para os próximos combates que virão. A categoria dos metroviários irá, sem dúvidas, desempenhar um papel importante nas lutas do próximo período. E nós estaremos ombro a ombro com eles, assim como o restante da classe trabalhadora, ajudando a superar os limites impostos pelas direções e alcançar novas vitórias.

Mãos à obra, camaradas!