Foto: Julio Cavalheiro/Secom

Dia da Família na Escola é trabalho não remunerado na Educação de Santa Catarina

Republicamos aqui a posição da Corrente Sindical da OCI sobre o “Dia da Família na Escola”1. Tal ação é importante porque, passado um ano, o Sinte continua ignorando que as gerências fizeram vista grossa a todas as manifestações públicas da Corrente Sindical de pôr fim a esse absurdo. Listamos aqui as ações da Corrente Sindical da OCI, antes da publicação dos argumentos:

  • Em 2023 lançamos esse texto público;
  • Encaminhamos faltas de servidores do dia da família na escola ao sindicato e pedimos providências, ou seja, a retirada da falta ilegal;
  • Levamos em todas as assembleias regionais a discussão;
  • Panfletamos publicamente o material na assembleia estadual.

Sem nenhuma providência efetiva, mais uma vez a categoria se encontra diante da pressão de diretores por trabalhar sem remuneração. Convidamos os servidores que leiam o texto abaixo, discutam com os colegas e pressionem o sindicato por uma medida coletiva e o fim do assédio moral de trabalhar sem ser remunerado, bem como a retirada de todas as faltas do “Dia da Família na Escola” do ano de 2023.

    Todos os anos, a Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina (SED-SC) impõe uma data chamada de “Dia da Família na Escola”, que é realizada, por regra, em um sábado e tenta impor aos trabalhadores de educação o cumprimento de trabalho não remunerado no final de semana.

    Os trabalhadores de educação de Santa Catarina são uma categoria já calejada da arbitrariedade dos governos que se sucedem e que só fazem piorar a situação.

    As chamadas “gestões democráticas” das unidades escolares, em sua maioria, são mais realistas que o rei e ameaçam, com faltas injustificadas e as mais tenebrosas ameaças, o não comparecimento do trabalhador de educação ao chamado “Dia da Família na Escola”.

    Há ou houve também as direções escolares ditas “boazinhas” que dizem que “ok, vem quem quer”, insinuando que o bom professor trabalha de graça, tentando jogar a comunidade contra os professores com discursos de que os que têm algo a apresentar de seu trabalho estarão na escola.

    Um discurso hipócrita e falacioso para não dizer eleitoreiro, pois buscam ganhar a comunidade para “sustentar” a mentira da eleição de diretor, da gestão democrática, da suposta democracia escolar e esconder a precariedade das escolas catarinenses.

    Nem mesmo diante dos últimos acontecimentos de ataques às escolas, que chocam o país e transformam a escola em um ambiente de pressão constante aos trabalhadores de educação, a gerência suavizou o discurso. Apenas deu a “opção” de transferir para maio a data estabelecida em 15 de abril.  

    Dito isso, levantaremos alguns elementos jurídicos e, portanto, de direitos trabalhistas que precisam ser refletidos e defendidos.

    Em nossa categoria existem duas normas vigentes aos professores, os efetivos (estatutários) e os ACTs (regidos por um precaríssimo contrato de trabalho, de acordo com a Lei nº 16.861, de 28 de dezembro de 2015). Contudo, ambas as normas deixam evidente que o regime e os dias de trabalho do professor são preestabelecidos de acordo com o número de aulas que cada um tem. Isso significa que na rede estadual de ensino de Santa Catarina há aulas de segunda a sexta, nos três turnos, pois não se ministra aulas aos sábados. Também significa que a jornada semanal é fixa, individualizada e, como se sabe, existe a mais diversa carga-horária de aula para cada professor.

    Não há na legislação, que trata sobre o regime de trabalho do professor estadual, previsão para o trabalho extraordinário que ultrapasse a sua jornada habitual. Logo, não existe a possibilidade de remuneração pela “hora extra”, seja por meio de pagamento pelo trabalho extraordinário ou pela compensação em outros dias, numa espécie de banco de horas.

    Não havendo tal previsão, não é admissível também o desconto pela ausência no “Dia da Família na Escola”.

    O “Dia da Família na Escola” se torna, por fim, a exigência de um dia de trabalho voluntário. Mas a partir do momento que o professor é obrigado a trabalhar nesse dia, ele deixa de ser voluntário, do ponto de vista da vontade do trabalhador, tornando-se um dia de trabalho sem remuneração. E é inadmissível a existência de obrigação de trabalho sem sua contraprestação pecuniária.

    A seguir, enumeramos algumas regras que regem essa questão, a fim de responder os servidores que se dirigem aos militantes da Corrente Sindical da Esquerda Marxista pedindo orientação, já que o Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de SC (Sinte) simplesmente se omite do debate, deixando a categoria à deriva.

    Segundo o Estatuto do Magistério Catarinense (Lei nº 6844, de 29 de julho de 1986), essa categoria segue as seguintes normas de carga horária:

    “Art. 206 – O registro de frequência é diário e mecânico ou, nos casos indicados em Regulamento, pôr outra forma que vier a ser adotada.

    § 1º – Todo o membro do magistério deve observar rigorosamente o seu horário de trabalho, previamente estabelecido.”

    Aqui já temos a irregularidade do discurso de desconto salarial caso o professor não compareça ao “Dia da Família na Escola”. Já que, como explica muito bem o estatuto, o professor tem uma carga horária semanal individual, fixa e previamente registrada em ponto e, como se sabe, não consiste em sábado. Portanto, àqueles que buscam intimidar o servidor com essa falácia, dizemos que isto é assédio moral.

    Vejamos as normas sobre dia letivo e carga horária:

    As Leis de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) definem que o estudante tem direito aos 200 dias letivos e que inclusive na famigerada Reforma do Ensino Médio isso é mantido. Em Santa Catarina, o calendário está com 204 dias para 2023, porém, dias letivos não têm nada a ver com a carga horária do professor, pois esta é individualizada.

    Observemos, então, como se regulamenta o trabalho remunerado dos trabalhadores de educação.

    No Estatuto do Magistério Catarinense (Lei nº 6844, de 29 de julho de 1986), apenas o Art. 206, já citado anteriormente, trata sobre essa questão. Já na lei dos ACTs (nº 16.861, de 28 de dezembro de 2015), vemos:

    “CAPÍTULO III

    DA JORNADA DE TRABALHO

    Art. 7º – A jornada de trabalho do Professor admitido em caráter temporário será, preferencialmente, de 10 (dez), 20 (vinte), 30 (trinta) e 40 (quarenta) horas semanais, observado o disposto nas Seções I e II deste Capítulo.

    Seção I

    Da Jornada de Trabalho do Professor dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental e da Educação Especial

    Art. 8º – Para o Professor admitido em caráter temporário com efetivo exercício da atividade de docência nos anos iniciais do Ensino Fundamental e na Educação Especial, a jornada de trabalho será de 20 (vinte) ou de 40 (quarenta) horas semanais, correspondendo, respectivamente, a 20 (vinte) e 40 (quarenta) horas-aula.

    Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo não se aplica ao Professor admitido em caráter temporário pela FCEE com efetivo exercício na atividade de docência nas disciplinas de Artes, Educação Física e Informática Educativa, cuja jornada de trabalho fica estabelecida na forma do disposto no § 1º do art. 10 desta Lei. 

    Seção II

    Da Jornada de Trabalho do Professor dos Anos Finais do Ensino Fundamental, do Ensino Médio e da Educação de Jovens e Adultos

    Art. 9º Para fins de atendimento às necessidades específicas da unidade escolar, o Professor admitido em caráter temporário com efetivo exercício da atividade de docência nos anos finais do Ensino Fundamental, no Ensino Médio e na Educação de Jovens e Adultos poderá cumprir jornada de trabalho distinta das que estabelece o art. 7º desta Lei.

    Parágrafo único. Sempre que houver a necessidade de alteração do número de horas-aula ministradas no decorrer do ano letivo, haverá a respectiva alteração da jornada de trabalho.

    Art. 10º – Na composição da jornada semanal de trabalho do Professor admitido em caráter temporário, será observado o limite máximo de 2/3 (dois terços) da respectiva carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos.

    § 1º – Fica estabelecido, na forma do Anexo Único desta Lei, o quantitativo de horas-aula correspondente à respectiva jornada de trabalho do Professor admitido em caráter temporário.

    § 2º – É obrigatório o cumprimento de no mínimo 50% (cinquenta por cento) da jornada de trabalho que não implique atividade de interação com os educandos com trabalho pedagógico na unidade escolar.”

    Como se observa, não há qualquer menção a dias letivos e sim sobre carga horária remunerada. Reafirma-se, portanto, que qualquer tentativa de obrigar o trabalho aos sábados sem remuneração consiste em descumprimento brutal dos direitos trabalhistas da categoria, pois o regime de trabalho de professores está organizado por “número de horas-aula ministradas”. Ainda que seja a miserável hora do relógio, conforme o Governo do Estado estabeleceu em 2015 e impôs a partir de 2022.

    Por outro lado, o trabalhado aos sábados ou fora do horário previamente estabelecido, deve ser considerado como hora extra, remunerada em dobro e a combinar com cada trabalhador. Porém, como já foi explicado, essa previsão não existe aos professores, o que leva a gerência tentar impor o trabalho “voluntário”. Mesmo na iniciativa privada, a hora extra é facultativa, parte de uma solicitação do patrão e do desejo ou não de o trabalhador efetuá-la com remuneração diferenciada inclusive, chegando, em alguns casos, a mais de 200% do valor da hora. Ao contrário, para os professores, em alguns casos, as chefias ameaçam com desconto do dia já trabalhado. Um absurdo completo.

    Salienta-se ainda que a gerência de educação de Joinville endossa tais argumentos quando troca um dia de ponto facultativo2 (dia remunerado) por um sábado, a exemplo do último dia 9 de março. Mostrando que os sábados não são dias de efetivo trabalho, ainda que ditos “letivos”.

    Retomamos ainda uma questão fundamental para nossa categoria. Em tempos de greve do magistério (direito legítimo de todo trabalhador), a recuperação de aula é feita aos sábados, portanto, recuperando em dobro o tempo de serviço da semana e é somente através dessa recuperação aos sábados ou fora do horário previamente estabelecido, contraturnos, que o servidor terá o ressarcimento dos dias de greve, quando a negociação entre sindicato e o Estado se dá. É a partir daí que se autoriza o trabalho aos sábados ou contraturno e só assim que os descontos são ressarcidos e as faltas retiradas da ficha funcional. Portanto, inclusive a história da categoria, não deixa qualquer dúvida de que o sábado não é dia de efetivo trabalho.

    Diante do exposto, chamamos todos os servidores do estado de Santa Catarina a dialogarem em seus locais de trabalho e recusarem essa anomalia de trabalho não remunerado na educação. Além disso, urge que chamemos o Sinte, que tem silenciado em relação a essa demanda e tantas outras, para assumir a responsabilidade como legítimo representante de nossa categoria.

    Portanto, cabe a nós trabalhadores exigirmos ao Sinte que tome providências diante do assédio moral e de qualquer tipo de retaliação ou desconto por conta do não comparecimento ao “Dia da Família na Escola” sem remuneração.   

    1 Artigo originalmente publicado em 14 de abril de 2023.

    2ponto facultativo é aquele onde cada órgão do estado decide se dará ou não o dia de folga aos trabalhadores, portanto, um dia remunerado.