Conferência da Esquerda Marxista chama “Fora Bolsonaro!”

Após  estudar a história e as lições da Internacional Comunista, os cerca de 100 participantes da Escola de Quadros iniciaram na noite de sábado (20/4) os trabalhos da Conferência Nacional da Esquerda Marxista em Joinville. As ricas e profundas discussões teóricas, sobre aspectos históricos e suas validades para o cenário atual, iluminaram o debate e definição das tarefas práticas da luta revolucionária contemporânea.

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Seguindo as lições do método marxista, o evento foi aberto com um informe sobre as perspectivas mundiais, apresentado pelo representante do Secretariado Internacional da Corrente Marxista Internacional (CMI) Jordi Martorell. Ressaltou-se que vivemos em uma época absolutamente turbulenta e convulsiva, na qual necessita-se atualizar constantemente as análises devido à velocidade dos acontecimentos. A entrada em cena das massas do Sudão e da Argélia são expressões da radicalização observada mundialmente.

Uma crise sem fim

Embora a maioria dos países avançados tenha registrado uma saída da recessão, os dados demonstram se tratar de uma recuperação muito débil. A instabilidade observada mundialmente tem alguns fatores chaves. O primeiro deles está no declínio da produção na China, o que tem importantes impactos na produção e comércio mundial. Outro elemento está no aumento global das dívidas nos últimos 10 anos por parte tanto de estados, empresas e famílias, em um valor hoje três vezes maior que o PIB mundial. A política empreendida pelos EUA neste cenário, sob a liderança de Donald Trump, ameaça ainda mais a velha ordem sob a qual o capitalismo avançou nas últimas décadas. O sistema está abalado também pela crise política europeia que tem seu epicentro no desenrolar do Brexit.

Todos os indícios apontam que o capitalismo se dirige para um novo momento de recessão. Entretanto, como Marx e Engels previram no “Manifesto Comunista”, os capitalistas não têm mais os mesmos meios de suavizar sua crise. Os países dominantes já baixaram enormemente os juros, em alguns lugares já estando em zero. Os estados, por sua vez, já endividaram-se completamente desde a crise de 2008. Com base nessas perspectivas econômicas, é possível entender os marcos sob os quais irão se desenvolver os movimentos políticos do próximo período. Ao invés de uma perspectiva de recuperação, o que observamos é um aprofundamento da crise iniciada há uma década e a aproximação de uma nova recessão mundial.

Terremotos políticos

Demonstrações da crise política em desenvolvimento são os recentes acontecimentos na Síria e na Venezuela. Diferentemente do quadro da Guerra Fria, os EUA enfrentam problemas para fazer prevalecer seus interesses sem grandes dificuldades e uma complexa equação política interna e externa. Enquanto os predecessores de Trump levaram a guerra a vários povos, o atual presidente lidera um país atolado em lama e sangue em vários lugares do mundo e com uma população cansada de aventuras estrangeiras. Essa é a situação depois de 10 anos de crise do capitalismo mundial.

Também como decorrência dessa conjuntura, o cenário político mundial foi transformado. Velhas representações, líderes e instituições inteiras passaram a ser vistas com desprezo e ódio por milhões de pessoas em todos os países. Camadas profundas da sociedade foram despertas para a vida política e passaram a aprender por sua própria experiência em todo o mundo. Desse contexto convulsivo, novas lideranças e representações surgiram. Quanto mais radicais elas se apresentavam, mais apoio recebiam.

Entretanto, o problema para a solução positiva para a crise mundial do capitalismo continua sendo a debilidade do fator subjetivo do movimento de massas. Em outras palavras, faltam partidos políticos capazes de expressar conscientemente os anseios e tarefas históricas das massas trabalhadoras em movimento. Ainda assim, como nenhuma das contradições econômicas e sociais está resolvida, novos e mais amplos setores dos explorados continuarão sendo atraídos ao protagonismo político. Sobre essa base, pode-se passar a um próximo nível, com o desenvolvimento de organizações formadas entre os elementos da camada mais avançada em luta. Essas organizações devem se preparar para, nos momentos de erupção social, estar à altura das tarefas exigidas pela história.

Governo ultraliberal

A partir do quadro mundial descrito por Jordi, o Secretário Geral da Esquerda Marxista, Serge Goulart, apresentou no domingo, dia 21, uma análise sobre a situação política brasileira e introduziu as tarefas que a Conferência Nacional se propôs a encampar para o próximo período. Iniciou-se destacando a crise que perpassa o interior do governo Bolsonaro. Passados mais de 100 dias desde a posse do novo presidente, sua desaprovação atingiu a pior avaliação da história entre presidentes de 1º mandato. Nesse meio tempo, dois ministros já foram trocados. Exigência urgente do mercado financeiro, a contrarreforma da Previdência encontra dificuldade em andar.

Nos bastidores frações burguesas disputam influência em uma luta sem quartel dentro deste governo, que de crise em crise está fazendo avançar a agenda capitalista. Militares, setores do Judiciário e seguidores de Olavo de Carvalho buscam imprimir sua matização ao aparato de Estado sob o comando do ex-capitão do Exército. Todas as frações estão juntas, contudo, na orientação de realizar um governo a serviço do capital financeiro internacional. Têm acordo no propósito de aplicar a contrarreforma da Previdência. Por isso, apesar de todas as confusões em que Bolsonaro e seus funcionários se meteram, as privatizações avançam, com a venda de campos de petróleo e gás e o leilão de 12 aeroportos.

Receita para luta de classes

Onde essa orientação foi aplicada, como na Argentina com Mauricio Macri e na França com Emmanuel Macron, serviu como uma receita para a luta de classes. Em ambos os casos, esses governantes foram eleitos em um contexto de rechaço da população das velhas representações de esquerda, que ao chegarem ao poder trataram de gerenciar o capitalismo. Embora inicialmente identificados como uma alternativa ao sistema, tanto Macri como Macron logo se viram em confronto com a base que os levou ao governo. Essa também é a essência do governo Bolsonaro, eleito na esteira do rechaço das massas ao PT e ao sistema, com um programa ultraliberal a serviço do imperialismo.

O sentido desta análise desenvolvida pela Esquerda Marxista vai ao confronto do arco íris de concepções erradas formuladas entre a esquerda brasileira. Os marxistas observam uma mudança de qualidade na situação política, em que a luta de classes se acirra e explosões sociais estão no horizonte. A base de apoio deste governo está em derretimento desde o dia 1º de janeiro, e mais e mais trabalhadores se dão conta de seu caráter reacionário. Enquanto isso, uma legião de oportunistas, revisionistas e sectários disseminam desânimo entre os trabalhadores e os jovens que querem combater. Ganhos pelo impressionismo em termos de política, apenas conseguem identificar a queda do PT como resultado de uma “Onda Conservadora” e a vitória de Bolsonaro com um fantasma disforme do fascismo.

Volta ao século 19

Vivemos uma época em que a situação mundial está modificando todas as normas até então reconhecidas como lógicas. As fórmulas usadas largamente por toda sorte de lideranças políticas começam a fazer água diante da gravidade da crise econômica e política em curso. No Brasil, o conjunto de ataques organizado pela burguesia em conjunto com seus governos pretende retroceder os direitos sociais a antes de 1889, quando foi criada a Previdência na Alemanha, e ao século 19 em termos de direitos trabalhistas com a “pejotização”. Trata-se, portanto, da maior ofensiva política da burguesia contra o proletariado brasileiro na história.

Enquanto os reformistas e revisionistas de todo tipo se entretêm com goiabeiras, twittis polêmicos e frases estúpidas do presidente, os marxistas explicam pacientemente para os jovens e trabalhadores que Bolsonaro e Paulo Guedes estão em meio à maior guerra de classes das últimas décadas. Para realizar suas pretensões, a burguesia internacional, seus sócios menores nativos e o conluio instalado no Palácio do Planalto precisará quebrar a resistência de uma poderosa classe trabalhadora, que não está derrotada e percebe pela sua própria experiência a necessidade de entrar em cena. Seu protagonismo tem sido bloqueado por sua própria direção, composta por agentes da burguesia dentro do movimento operário, que realizam toda sorte de manobras para impedir a luta proletária e manter sua posição como negociadores da força de trabalho.

Fora Bolsonaro!

O interesse fundamental dos trabalhadores neste momento no Brasil consiste em barrar o projeto ultraliberal patrocinado pelo governo Bolsonaro. Não se trata de impedir um ataque ou outro, mas de derrubar todo o governo reacionário por meio do movimento de massas. Entretanto, organizações políticas e sindicatos recusam-se a empreender esse combate, aterrorizados pelos fantasmas que ergueram sobre suas cabeças ou limitados pela estreiteza de seu pensamento provincial e sindicalista. A tarefa dos marxistas consiste neste contexto, portanto, em esclarecer setores da vanguarda do movimento espontâneo que floresce.

A palavra de ordem que melhor cumpre esse papel é “Fora Bolsonaro!”. Em primeiro lugar, ela esclarece para a juventude e os trabalhadores a unidade entre os problemas que enfrentam em seu dia a dia. Além disso, ordena cada luta econômica e em qualquer nível a se orientar a uma única e poderosa corrente de oposição contra o governo Bolsonaro e todo o conjunto de instituições e personagens políticos em seu entorno. Assim como na luta pelo “Fora Collor!”, essa reivindicação tem a vocação de colocar as massas em movimento. Na medida em que as massas se choquem contra o governo, nada está definido sobre o resultado final desta batalha.

Diante dessa situação mundial e nacional, a Conferência Nacional da Esquerda Marxista definiu seu papel como o de ajudar a vanguarda dos trabalhadores e da juventude a compreender a situação e as tarefas necessárias para vencer o governo, as classes possuidoras e o imperialismo. Para isso, os marxistas farão uma intensa agitação e propaganda em torno da palavra de ordem “Fora Bolsonaro!”, consigna capaz de levar as massas a arrebentar a camisa de força imposta pelas atuais direções e de derrubar todo o regime e suas instituições. Um capítulo importante deste combate é a luta contra a Reforma da Previdência, e para que ela seja vitoriosa, cobramos que as centrais sindicais e os sindicatos mobilizem a base imediatamente para preparar uma greve geral que coloque o governo e o Congresso Nacional na parede.

Senso de urgência

Os marxistas intervirão nas lutas econômicas e políticas dos trabalhadores explicando a necessidade histórica da substituição da ordem capitalista por outra, socialista, capaz de socializar a riqueza apropriada por uma ínfima minoria e de estabelecer uma livre colaboração entre os povos do mundo. Esclarecerão pacientemente que a construção de uma sociedade sem exploração apenas pode ser empreendida pelos homens e mulheres da classe trabalhadora, aqueles que hoje produzem toda a riqueza, embora sejam alienados dela, pois apenas eles têm interesse nessa nova sociedade.

Essas tarefas podem ser realizadas porque são as que a história exige da classe revolucionária e de sua fração mais avançada, os comunistas. Os militantes da Esquerda Marxistas se lançam a elas com senso de urgência, pois vivemos tempos de turbulência e convulsão. A crise geral da humanidade que o capitalismo impõe lança uma nação após a outra no caminho das guerras e revoluções.

Os marxistas não podem prever os rumos dos acontecimentos, mas seu método de análise permite antecipar seus traços gerais e preparar-se para eles. Diante da eleição de Bolsonaro e dos primeiros 100 dias de seu governo, os militantes da Esquerda Marxista encaram com ânimo as perspectivas para a luta de classes. A Escola de Quadros e a Conferência Nacional realizadas foram uma demonstração desse contagiante ânimo revolucionário, baseado na análise marxista e confiança no potencial revolucionário da classe proletária.

Estudar, propagar, organizar

A Esquerda Marxista e seus militantes, no entanto, não querem ser sábios espectadores da guerra de classes em desenvolvimento. Eles preparam ativamente as condições para reverter o rumo do movimento e dos acontecimentos. Para isso, mostram para os trabalhadores e jovens de vanguarda a necessidade da compreensão que compartilham, não apenas para a vitória final, mas também para o êxito de cada luta parcial e local. Por isso recrutam os melhores ativistas para sua organização, porque apenas organizados em um partido revolucionário os trabalhadores podem compreender seus interesses gerais e históricos.

Hoje a Esquerda Marxista não é o partido revolucionário da classe trabalhadora. Esse será construído em meio aos desenvolvimentos da luta de classes. Entretanto, consiste no embrião que traz consigo todo o material genético desse partido necessário. Por meio do estudo, da propaganda e da organização, os marxistas estão agrupando aqueles que querem colocar um fim definitivo ao horror capitalista e abrir caminho para o reino da liberdade para a humanidade. A luta pelo “Fora Bolsonaro!” será uma etapa importante desse combate, para o qual todo revolucionário está convocado.