Imagem: Divulgação, Prefeitura de São Paulo

Abaixo a perseguição aos médicos do Hospital Vila Nova Cachoeirinha: pelo direito ao aborto público, gratuito e seguro

No dia 16 de maio, houve um ato na Avenida Paulista em frente ao Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) em defesa do aborto legal. Este ato foi chamado pela Frente pela Legalização do Aborto do Estado de São Paulo devido aos recentes ataques que o direito ao aborto nos casos previstos em lei vem sofrendo recentemente. Manifestantes realizaram a entrega simbólica de uma coroa de flores, que representa a morte, em especial de jovens mulheres que não conseguem acesso ao aborto legal ou são criminalizadas por supostamente estarem matando outra vida.

Além da nota do Conselho Federal de Medicina (CFM), publicada no dia 3 de abril de 2024, que proibia o aborto legal após 22 semanas de gestação, a Prefeitura de São Paulo, sob o comando Ricardo Nunes (MDB), que é apoiado por Bolsonaro para reeleição, cumpre o papel de transformar a cidade em laboratório de experimentação dos ataques mais duros à vida das mulheres trabalhadoras. Apesar dessa nota ter sido recentemente suspensa através de liminar do ministro do STF Alexandre de Moraes, os ataques ao direito ao aborto público e gratuito seguem acontecendo de diferentes formas.

O ato foi precedido pela denúncia do Sindicato dos Médicos (Simesp), que relatava a perseguição realizada a duas médicas que trabalhavam no atendimento ao aborto legal no Hospital Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte de São Paulo, pelo Cremesp e pela Secretaria Municipal de Saúde. Eles tiveram acesso indevido a prontuários de mulheres que passaram pelo procedimento entre os anos de 2021 e 2023, em especial das que foram vítimas de violência sexual e estavam com mais de 22 semanas de gestão.

Este processo teve início em dezembro de 2023, quando a prefeitura suspendeu o atendimento ao aborto legal no Hospital Vila Nova Cachoeirinha. A instituição era referência na cidade e a única que realizava a assistolia fetal– procedimento indicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para a realização de abortos após 22 semanas de gravidez. Nesse período, a diretoria do hospital também foi modificada e colocada nas mãos da ginecologista Marcia Tapigliani, que é bolsonarista, filiada ao PL e militante antiaborto.

Dessa forma, vimos a aplicação da nota publicada pelo CFM sendo testada na prática às custas das condições de vida e da saúde das mulheres que dependem do atendimento público ao aborto. Isso mesmo nos casos já previstos em lei, ou seja, quando a gravidez causa risco à vida da mulher, quando o feto é anencéfalo ou a gestação é resultado de um estupro.

Judicialmente, a Prefeitura de São Paulo conseguiu garantir a suspensão do atendimento neste hospital. As justificativas oficiais foram sobre a necessidade de atender outros procedimentos cirúrgicos eletivos, tal como aqueles causados pela endometriose, e uma suposta necessidade de investigar se os abortos ali realizados estavam de acordo com a lei. Essa suspensão seria apenas temporária, entretanto, segue sem nenhuma previsão de retorno, mesmo após três determinações judiciais, das quais a prefeitura recorreu para manter a suspensão.

Essas pretensas justificativas não passam de enganações, visto que a prefeitura tem dinheiro em caixa para abrir novas unidades de atendimento à saúde, ampliar o atendimento em hospitais já existentes e contratar médicos e enfermeiros para atender todas as pessoas que aguardam procedimentos cirúrgicos.

Além disso, a suposta investigação se baseou em prontuários sigilosos, que continham informações pessoais sensíveis, de abortos realizados no Hospital Vila Nova Cachoeirinha entre os anos de 2021 e 2023. Essas informações só poderiam ser acessadas com autorização judicial ou expressa dos pacientes. No entanto, o que ocorreu foi a quebra do sigilo médico das mulheres que buscaram ter seu direito atendido neste hospital.

O secretário de Saúde de São Paulo, Luiz Carlos Zamarco, confirmou a realização da investigação dos procedimentos de abortos realizados em gestações mais avançadas. Porém, não há nada que impeça o aborto nos casos previstos em lei. De acordo com a doutora em direitos humanos Eloisa Machado de Almeida:

“Autoridades administrativas e políticas não têm nenhum tipo de privilégio de acesso aos prontuários médicos. Se não há ordem judicial e não há autorização do paciente, nenhuma dessas instâncias podem ter acesso a essas informações. Seja na atividade de fiscalização da atividade médica, como os conselhos de medicina, seja na fiscalização do próprio serviço público, como uma Secretaria de Estado.”1

Com isso, ela afirma veementemente que o Cremesp e a Secretaria de Saúde do município estão conduzindo uma investigação irregular, à revelia da lei, de modo a violar os direitos de acesso aos serviços de saúde. Caracteriza-se uma enorme perseguição institucional aos médicos que trabalham com o aborto legal e mais uma ofensiva a esse direito das mulheres.

O resultado imediato desse processo judicial completamente ilegal foi a intimidação de pelo menos três médicos que trabalhavam no Hospital Vila Nova Cachoeirinha até o momento em que este texto foi escrito. Nas próximas semanas, é provável que mais processos administrativos sejam instaurados. Destes profissionais, duas já tiveram o registro profissional suspenso por estarem sendo investigadas por supostas irregularidades ao realizar procedimentos de aborto previstos em lei!

“Alguns desses documentos, inclusive, teriam sido encaminhados pelo próprio Cremesp à Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, hoje comandada pelo bolsonarista Guilherme Derrite, e à Polícia Civil para eventuais apurações, havendo o temor de que sejam abertas investigações criminais contra as vítimas. Em um dos casos, o Cremesp questiona se houve, de fato, a prática de estupro contra uma delas.”2

Esse ataque pode causar a cassação de seus registros profissionais, o que as impediria de exercer a própria profissão. Trata-se claramente de uma tentativa de intimidação aos profissionais da saúde que realizam o aborto legal. É um ataque tanto aos profissionais assediados judicialmente quanto às mulheres que necessitam do atendimento público para o aborto e que estão sendo criminalizadas, mesmo nos casos em que são vítimas de estupro.

No dia de 30 de abril, o Cremesp foi oficiado pela deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL) e pela vereadora Luana Alves (PSOL) a prestar informações sobre esses processos administrativos, com base em 12 perguntas sobre a obtenção dos prontuários e a proteção de suas informações.

“É o entendimento deste conselho a necessidade do cometimento de omissão de socorro nos casos de abortamento legal para que profissionais de saúde não corram o risco de sofrerem interdição cautelar?”, questionam Sâmia e Luana.

Este é um exemplo claro de como a Justiça burguesa é distorcida de todas as maneiras para atacar direta ou indiretamente a classe trabalhadora. Isto é, tanto perseguindo o exercício da profissão dos médicos quanto o acesso aos direitos que estão assegurados na Constituição. Trata-se de um retrato claro da crise do sistema capitalista.

O direito ao aborto é um tema de saúde pública. A sua criminalização é um ataque direto à classe trabalhadora, visto que são as mulheres dessa classe que mais necessitam do atendimento público – em especial, as crianças e as jovens que sofrem abusos dentro do ambiente doméstico, ainda que em gestações mais avançadas. As mulheres da burguesia, por sua vez, têm condições de encontrar e pagar pelo mesmo atendimento em clínicas clandestinas.

Esse ataque não pode ser compreendido apenas pelo conservadorismo do prefeito. Ele é parte integrante do conjunto de ofensivas aos serviços públicos que está sendo empreendido na cidade e no estado de São Paulo. Desde o projeto de privatização completa do Metrô e da CPTM, até a entrega de escolas públicas aos empresários.

Todos os direitos dos trabalhadores foram conquistados pela união e luta da classe operária em favor das suas condições de vida. Entretanto, o capitalismo em sua fase decadente desfere golpes cada vez mais duros a todos esses direitos até então assegurados. Não há nada que esperar desse sistema que explora e oprime a classe trabalhadora. Todas as conquistas estão ameaçadas até a derrubada dele. A única saída é a revolução, a luta unificada de trabalhadores e trabalhadoras pela defesa das suas condições de vida e por plenos direitos.

Se você defende o fim da opressão sobre as mulheres e a emancipação de toda a classe trabalhadora, organize-se com a Organização Comunista Internacionalista (OCI) e com o Movimento Mulheres Pelo Socialismo (MPS). Venha construir conosco a Internacional Comunista Revolucionária.

  • Abaixo a perseguição dos profissionais da medicina!
  • Pela reabertura imediata do serviço de aborto legal do Hospital Vila Nova Cachoeirinha!
  • Pelo direito ao aborto público, gratuito e seguro!
  • Lutar pelo comunismo, por uma sociedade que liberte a mulher de toda violência e opressão!

Referências:

1 https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2024/05/07/medicas-que-faziam-aborto-legal-no-cachoeirinha-sao-suspensas-diz-sindicato-protocolos-mostram-que-prefeitura-teve-acesso-a-prontuarios.ghtm

2 https://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2024/04/conselho-faz-ofensiva-contra-medicos-em-sp-por-aborto-legal-em-vitimas-de-estupro.shtml

Outros links:

<https://www.cartacapital.com.br/politica/apos-suspender-aborto-legal-prefeitura-de-sp-entrega-hospital-de-referencia-a-militante-pro-vida/>

<https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2024-05/manifestantes-em-sp-acusam-cremesp-de-criminalizar-aborto-legal>

<https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2024/05/07/medicas-que-faziam-aborto-legal-no-cachoeirinha-sao-suspensas-diz-sindicato-protocolos-mostram-que-prefeitura-teve-acesso-a-prontuarios.ghtml>

<https://revistaforum.com.br/brasil/2024/4/30/conselho-de-medicina-atropela-lei-persegue-medicos-por-aborto-legal-158089.html>

<https://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2024/04/conselho-faz-ofensiva-contra-medicos-em-sp-por-aborto-legal-em-vitimas-de-estupro.shtml>

<https://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2024/04/cremesp-e-oficiado-e-cobrado-a-explicar-ofensiva-contra-medicos-de-servico-de-aborto-legal-em-sp.shtml>

<https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/05/17/moraes-suspende-norma-do-cfm-que-restringe-aborto-legal.htm>