Foto: Conaie

A luta de classes continua em todo o mundo

Editorial da 20ª Edição do jornal Tempo de Revolução. Assine agora o jornal impresso e, além de acessar a edição digital, receba em sua casa. Para assinar somente a versão digital, clique aqui.

O ano de 2022 está marcado por uma série de mobilizações que mostram uma situação revolucionária no mundo inteiro.

Sri Lanka

No dia 9 de julho, as mobilizações que tomam conta do Sri Lanka há mais de dois meses atingiram um ponto crítico quando manifestantes tomaram a residência presidencial levando Gotabaya Rajapaksa a fugir pela porta dos fundos e, um dia depois, anunciar sua renúncia.

Gotabaya assumiu a presidência do país em 2019 e integra o clã que governa a vida política cingalesa há décadas. Seu irmão e líder do clã, Mahinda, que já presidiu o Sri Lanka até 2015, chegou a ser nomeado primeiro-ministro por seu irmão, porém, com as mobilizações deste ano se viu obrigado a renunciar em maio, depois que os violentos confrontos entre as forças de segurança e os manifestantes deixaram nove mortos.

O descrédito nas instituições e no governo, a escassez de alimentos, de remédios, cortes de energia elétrica e a falta de combustíveis estão entre as principais causas da ira popular que tomou conta das ruas do país. Além disso, a inflação galopante, que só em junho foi de 55%, faz com que os poucos produtos acessíveis tenham preços exorbitantes. De acordo com a ONU, 75% da população não se alimenta de maneira suficiente.

Soma-se a todos esses problemas a forma desastrosa como o governo tem lidado com a pandemia no país. As estatísticas escondem por conta da subnotificação, mas atualmente milhares vão aos hospitais diariamente e muitos morrem de Covid-19. O acesso ao ensino remoto é negado para mais da metade dos estudantes, pois não há internet disponível para grande maioria.

Há um elemento fundamental neste que é o maior movimento de massas desde a independência da ilha em 1948: os “ingredientes” para a explosão social do Sri Lanka estão presentes em praticamente todo o mundo.

Equador

Esses elementos estão presentes no Equador, por exemplo, que foi palco de uma greve geral de 18 dias, encerrada em 30 de junho, e que apresentava em sua pauta reivindicações como a diminuição do preço dos combustíveis, remédios e suprimentos para hospitais e postos de saúde, entre outros pontos (adquira o Tempo de Revolução e leia a análise completa da greve).

Líbia

No dia 1º de julho, manifestantes tomaram e atearam fogo no Parlamento da Líbia, na cidade de Tobruk, após romper os portões do palácio com uma escavadeira. Na capital, Trípoli, manifestantes se dirigiram ao palácio presidencial e só recuaram após forte repressão policial, entretanto, apenas mudaram o destino do protesto e foram até a sede do primeiro-ministro. No dia seguinte as manifestações tomaram as principais cidades do país e barricadas foram levantadas nas principais estradas próximas à capital.

Entre as palavras de ordem utilizadas pelos manifestantes, estavam “O povo quer a queda do regime”, “Estamos fartos! A nação quer derrubar governos! Queremos eletricidade!”. A desconfiança com os políticos é generalizada, os cortes constantes de eletricidade que o país tem sofrido nos últimos dias e o alto custo de bens essenciais como o pão estão entre os principais motivos da ira popular.

Mianmar

No dia 7, em Mianmar, um protesto com duas mil trabalhadoras da fábrica de roupas A Dream of Kind reivindicava direitos trabalhistas, garantia de licença médica, licença eventual, assistência social e aumento salarial, além de denunciar violações de direitos trabalhistas e várias formas de opressão que ocorrem na fábrica.

Esse movimento demonstra o nível de radicalização do país, pois desde o golpe militar de fevereiro de 2021 o regime instaurado em Mianmar tornou ilegais as organizações de trabalhadores e sindicatos. Alguns ativistas tiveram que fugir quando os movimentos de massa foram brutalmente reprimidos.

Ainda podemos destacar a greve dos ferroviários na Grã-Bretanha e a renúncia de Boris Johnson, a onda de sindicalização e as manifestações pelo direito ao aborto nos Estados Unidos, greves na Espanha, mobilizações na Argentina etc.

Crise, guerra, revolução e contrarrevolução

Março de 2020 marcou o início da pandemia que matou mais de 6,3 milhões e assola o mundo até hoje. Naquele momento afirmamos que apesar de uma paralisia momentânea diante do avanço do coronavírus, explicamos que “grandes revoltas se preparam para o momento seguinte”.

O início da pandemia representou uma mudança brusca da situação política e iniciou uma nova etapa. O avanço da vacinação e a incapacidade da classe dominante de garantir que lockdowns, distanciamento social e até o uso de máscaras fosse uma realidade na maioria dos países logo lançou uma parcela da população contra seus governos. Não demorou muito para que mobilizações voltassem a acontecer (podemos destacar as lutas pelo “Fora Bolsonaro!” no Brasil) e eventos de grande magnitude, como o assassinato de George Floyd pela polícia nos Estados Unidos, desencadearam mobilizações globais antes mesmo do surgimento de vacinas.

A pandemia foi um acidente que acelerou ainda mais os problemas desencadeado pela crise econômica mundial iniciada em 2008. As massas tornaram-se mais miseráveis e, ao mesmo tempo, a humanidade viu a burguesia enriquecer ainda mais, com o surgimento de novos bilionários e até trilionários.

Mas não vivemos mais na mesma etapa de desenvolvimento histórico iniciado com o avanço do coronavírus pelo planeta.

Praticamente todos os governos injetaram dinheiro na economia para enfrentar a crise desde 2008, com nova injeção agora em 2020. O resultado foi um aumento da já elevada dívida pública. A injeção de dinheiro público, em outra palavras, a emissão de moeda, somada a gargalos na produção e transporte de mercadorias, provocou um fenômeno global de alta da inflação. Além destes fatores de instabilidade para a economia global, há ainda o problema das bolhas especulativas, com destaque para a bolha do mercado imobiliário na China. Estamos diante de uma situaçã marcada pela inflação galopante, crise dos combustíveis e de energia, empobrecimento das massas e radicalização ainda maior das ruas. A guerra entre a Rússia e a Ucrânia é uma consequência do desenvolvimento da crise do capitalismo e impactou ainda mais na luta de classes.

E o Brasil?

O que acontece no mundo poderá se desenvolver de maneira semelhante no Brasil. Se ainda não vimos grandes explosões sociais por aqui é porque as direções da classe trabalhadora jogaram todas as espectativas para as eleições. Neste momento de radicalização até astros da música pop se colocam contra Bolsonaro, tamanha é a pressão da sociedade.

Após a traição da luta pelo “Fora Bolsonaro!”, o combate contra esse governo reacionário tende a se expressar nas urnas, mas o desemprego, a fome, a destruição da saúde, da educação e dos serviços públicos, as privatizações ainda serão realidade. Em breve, ou até mesmo antes de outubro, as ruas podem novamente ser o palco dos principais combates por melhores condições de vida. Os prazos são incertos, mas abaixo da superfície se acumula a ira e a frustração de milhões de brasileiros que sentem na pele as consequências da crise, da pandemia, do machismo, do racismo etc.

Cada país carrega suas particularidades devido ao seu próprio desenvolvimento histórico, mas os desdobramentos das eleições na França e na Colômbia, por exemplo, mostram como a esquerda aparece como uma alternativa diante do fracasso dos governos reacionários que se lançaram na tentativa de jogar todos os custos da crise e da pandemia sobre os ombros dos trabalhadores. Também demonstram a falência dos “reformistas” completamente submissos às suas burguesias e ao imperialismo.

O que os marxistas devem compreender desse processo é que segue a luta para ganhar a vanguarda do movimento proletário, principalmente sua camada jovem, que poderá se preparar agora, se forjar nos combates que virão e aprender a ver o mundo com os olhos da classe trabalhadora e a marchar ao seu lado, obro a ombro. Como afirmamos anteriormente:

“Nunca foi tão atual o combate que a Corrente Marxista Internacional (CMI), e sua seção brasileira, a Esquerda Marxista, travam pela construção de uma verdadeira internacional dos trabalhadores que, agindo internacionalmente, e em cada país, pela unidade e independência de classe dos trabalhadores, com base nas verdadeiras tradições revolucionárias do movimento operário mundial e no programa marxista, possa ajudar a conduzir as classes trabalhadoras ao limiar de sua verdadeira história de paz, de progresso e realização de todas as capacidades humanas, saindo do reino da miséria e do sofrimento para o reino da felicidade e da abundância.”

Para construir o partido revolucionário é preciso retomar nossa atividade cotidiana nas escolas, universidades, fábricas, nos bairros, nas praças, nas ruas. As candidaturas da Esquerda Marxista durante este processo eleitoral irão apresentar as análises e a plataforma de combate da organização, batalhar para ganhar o maior número possível de militantes para a luta consciente e organizada pelo socialismo levando como slogan central: Abaixo Bolsonaro! Abaixo o capitalismo! Por um governo dos trabalhadores sem patrões nem generais! Viva o socialismo!

Nesse processo de radicalização pelo qual estamos passando devemos, por meio das reivindicações transitórias, ajudar a elevar a consciência dos trabalhadores e da juventude e mostrar que um mundo novo é possível e necessário.