O assassinato de Marielle, a milícia no Rio de Janeiro e a ação policial

Editorial do jornal Foice&Martelo 115 [Confira a versão digital aqui], de 26 de abril de 2018.

Raul Jungmann afirmou que a principal linha de investigação da morte da vereadora Marielle envolve milícias. A rede globo passou a dar em destaque os crimes e atividades das milícias, bandos paramilitares formados na maioria por PMs e ex-PMs. Elas dominam favelas e bairros operários, controlando a venda de gás, TV a cabo, cobrando taxas de comerciantes, do transporte, organizando assaltos a caminhões e fazendo segurança no transporte de drogas.

Mortes que não eram solucionadas tiveram os autores descobertos e eram todos membros da milícia. A máquina entrou em funcionamento e a Polícia Civil cumpriu a sua parte, organizando a prisão de 159 em uma festa em Campo Grande. E então a coisa começou a fazer água.

Mais de 100 trabalhadores presos em festa no Rio

Julgman (Ministro da Segurança): “Precisam explicar o que estavam fazendo lá”

Era uma vez uma festa com as bandas Swing & Simpatia e Pique Novo com ingresso a R$ 10,00. O show foi anunciado por cartazes no bairro de Campo Grande, um bairro de maioria de trabalhadores e operários do Rio de Janeiro. A polícia invadiu a festa, sob pretexto que era um evento patrocinado por uma das milícias que atuam no subúrbio da cidade. O objetivo seria prender o chefe da tal milícia, Wellington da Silva Braga, o Ecko. O resultado da ação policial  foi de quatro pessoas mortas, 159 presos (todos homens) e sete menores apreendidos. Só foram presos os homens, todas as mulheres foram liberadas na hora.

Segundo a polícia, os presos eram membros da milícia. A juíza do caso, Amanda Ribeiro Alvez, fez a audiência de custódia por videoconferência e em grupos de 20 pessoas cada. Todos foram indiciados e tiveram prisão preventiva decretada pela juíza. Vão responder por constituição de milícia privada e porte de armas.

O relatório da polícia fala em 13 fuzis e 19 pistolas apreendidas: teríamos mais de 100 milicianos que não carregavam armas. O único detido a ser solto, o artista de circo Pablo Dias Bessa, declarou que não viu fuzis, que os seguranças não estavam armados e que todos eram revistados na entrada para ver se não portavam armas.

A polícia, confrontada com os depoimentos de familiares questionando as prisões, resolveu explicar o que precisa ser feito, em um tweet no seu perfil oficial que foi logo apagado: “Cabe aos acusados provarem a inocência na Justiça”.

A justiça e a classe operária

Este é apenas um dos aspectos da repressão. Os mortos do dia a dia na Rocinha, os tiroteios entre polícia, traficantes e milícias no Rio de Janeiro compõem outro dos aspectos e este muito mais mortal. Diariamente morrem trabalhadores vítimas das “balas perdidas”. E na maioria das vezes os que disparam estas “balas perdidas” são os policiais.

A pena de morte está em plena vigência nos morros e bairros operários do Rio, com um único problema: em vez de “bandido bom, bandido morto” o que temos é “PM bom é PM que mata”, principalmente negros, favelados e trabalhadores.

Uma reportagem do Conjur (site Consultor Jurídico) mostra como é a realidade nas favelas: “Muitos dos clientes de Joel Luiz Costa e Francisco Melo de Queiroz são acusados de tráfico de drogas. Mas a forma como os suspeitos — e os advogados — são tratados pela polícia e pelo Judiciário varia “conforme o CEP”, dizem. Ou seja: depende de onde o acusado mora. Em grande parte dos casos, é isso que determina se a pessoa vai ser enquadrada como usuária ou traficante.

Eu moro no Pavãozinho, cara. É questão de 50 metros do Pavãozinho para Ipanema. Em Ipanema, eles [policiais] sentem medo de falar com a pessoa.

A presunção de inocência nunca existiu do lado de cá do túnel [Rebouças, que liga as zonas norte e sul do Rio]”, avalia Joel Costa.

Qual a saída para os operários e trabalhadores?

Esta é uma situação concreta na qual a saída é dura e difícil. Em muitos países, como no México ou Honduras, essa também é a situação do dia a dia. A prisão dos Marxistas no Paquistão tem, em sua origem, o protesto contra a repressão militar a toda uma etnia com mais de 12 milhões de pessoas. Mais de 60 países encontram-se em guerra e o drama de refugiados é notícia fácil em todos jornais. Nas Filipinas o presidente orgulha-se de ter “matado bandidos” e os policiais ganham um extra “por bandido morto” sem que ninguém investigue se isso foi ou não verdade.

A classe operária e os trabalhadores são os que mais sofrem. Para acabar com isso é necessário varrer o capitalismo e todo o seu show de horrores. As 60 mil mortes anuais no Brasil não terão solução com este Estado e com esta polícia. Por isso participamos da campanha por uma investigação independente da Execução de Marielle.

Um combate duro, que começa com a preparação política de explicar que este não é nosso Estado, esta não é nossa justiça e passa por mostrar a necessidade de constituir em cada bairro, em cada fábrica, em cada escola, comitês de auto-defesa. Comitês que podem começar fazendo a denúncia do que vem acontecendo, dos ataques perpetrados por policiais e pelos bandos criminosos. Este é o começo. Será duro e difícil, e os marxistas estão dispostos a auxiliar neste combate.

Última Hora – O juiz juiz Eduardo Marques Hablitschek, da 2ª Vara Criminal determinou a soltura de 137 presos. Entretanto, manteve a validade da operação, da prisão até agora (duas semanas) e o inquérito contra todos os presos!