Plataforma política de luta pela emancipação da mulher trabalhadora

A experiência histórica e material como fundamento político do combate à opressão contra as mulheres

Uma plataforma política, com reivindicações transitórias para a luta pela emancipação da mulher trabalhadora, está baseada no Pro­grama de Transição e na premissa de Trotsky de que:

É necessário ajudar as mas­sas, no processo de suas lutas cotidianas a encontrar a ponte entre suas reivindicações atuais e o programa da revolução so­cialista. Esta ponte deve consistir em um sistema de reivindicações transitórias que parta das atuais condições e consciência de largas camadas da classe operária e con­duza, invariavelmente, a uma só e mesma conclusão: a conquista do poder pelo proletariado.” [1]

Desta forma, na presente plata­forma política, apresentamos ques­tões referentes à luta da mulher e reivindicações para melhoria de vida dentro do sistema capitalista, mas que conduzem e estão conec­tadas ao programa maior de cons­trução do partido revolucionário e a tomada do poder pela classe tra­balhadora, rumo a sua real eman­cipação.

Ao discutir a situação atual das mulheres na sociedade, parti­mos da compreensão materialista e histórica de que a exploração e opressão a qual são submetidas é resultado da ordem pautada nas re­lações sociais da sociedade dividi­da em classes. Nesta sociedade, ao longo da história, surge a família, a monogamia, a propriedade privada e, por fim, o Estado.

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A sociedade está organizada por meio do regime de produção capitalista, que se torna o sistema dominante com a queda do modo de produção feudal, o crescimen­to das indústrias e do comércio, a ascensão da burguesia como classe dominante.

A industrialização, primeiro na forma de manufaturas, depois as fábricas impulsionadas por moto­res, levou a ganhos de produção como o mundo nunca tinha visto antes. Os primeiros países capita­listas exportaram mercadorias para o mundo inteiro e, a partir do sécu­lo XIX, começaram a exportar ca­pitais (fábricas e ferrovias, inicial­mente). Isto constituiu o moderno imperialismo, analisado por Lenin (Imperialismo, estágio supremo do capitalismo). No início do século XX o mundo estava dividido entre as principais potências capitalistas e o progresso histórico retardava­-se ou parava. A propriedade pri­vada dos meios de produção e as fronteiras nacionais são as barrei­ras que impedem o mundo de dar passos gigantes em direção a um novo futuro.

A divisão social do trabalho a nível mundial foi um grande pro­gresso histórico, necessário para o enorme desenvolvimento que al­cançou a humanidade desde o ca­pitalismo, resultado do acúmulo de técnicas e formação de um amplo operariado, a classe dos trabalha­dores assalariados. Nesta situação, a monogamia e a família nuclear asseguraram a sobrevivência dos trabalhadores no dia a dia, com a manutenção do lar e a criação dos filhos, futuros proletários, engre­nagem necessária para o sistema. Na sua obra A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Esta­do, Engels explica:

A monogamia foi um grande progresso histórico, mas, ao mes­mo tempo, iniciou, juntamente com a escravidão e as riquezas priva­das, aquele período, que dura até nossos dias, no qual cada progres­so é simultaneamente um retroces­so relativo, e o bem-estar e o de­senvolvimento de uns se verificam às custas da dor e da repressão de outros. É a forma celular da sociedade civilizada, na qual já podemos estudar a natureza das contradições e dos antagonismos que atingem seu pleno desenvolvi­mento nessa sociedade” (1980, p. 70-71?)

Além do posicionamento de cada país no mercado e na pro­dução global, a divisão mundial do trabalho tem como expressão a divisão de gênero do trabalho nas fábricas e empresas, mas, an­tes disso, tem base na divisão do trabalho doméstico, dentro da cé­lula nuclear desse sistema, que é a família, relativa às funções so­ciais destes gêneros na sociedade. A divisão social do trabalho sobre bases capitalistas é completamente opressora e sobrecarrega a mulher, porque a obriga a cumprir jornadas triplas de trabalho, enquanto traba­lhadora, esposa e mãe.

A família, tal como a conhe­cemos hoje, foi o embrião para a constituição da sociedade de clas­ses, desde a escravatura até o ca­pitalismo, e para a consolidação da propriedade privada. Isso porque está completamente submetida às relações de propriedade e na qual tem livre curso as contradições da ordem pautada pela luta de classes antagônicas.

Quando a herança passa a ser central nesta forma de sociedade, baseada na apropriação não mais coletiva, e sim privada de territó­rios e instrumentos de produção, foi estabelecida a filiação masculi­na e o direito hereditário paterno, como forma de garantia do her­deiro com direito de propriedade. O desmoronamento do direito ma­terno é, segundo Engels, a grande derrota histórica do sexo feminino, pois, com ele, a mulher perdeu seu valor social e também foi transfor­mada em propriedade do homem. Engels aponta que a monogamia “aparece sob a forma de escravi­dão de um sexo pelo outro, como a proclamação de um conflito entre os sexos até então desconhecido em toda a pré-história”. [2]

A hierarquia na família torna a mulher escrava doméstica, pre­sa a tarefas mesquinhas e, dessa forma, afastada da vida social e política, como descreve Lenin, “a mulher, não obstante todas as leis libertadoras, continua uma escra­va doméstica, porque é oprimida, sufocada, embrutecida, humilhada pela mesquinha economia domés­tica (…)”. [3]

Conforme desenvolvido, a Co­missão de Mulheres tem como base os estudos desenvolvidos por F. Engels e partimos da compreen­são materialista histórica de que o ser humano se organiza de acor­do com suas condições concretas. Portanto, há um horizonte de liber­tação da humanidade da explora­ção e de todas as opressões, entre elas a opressão sobre a mulher, a ser conquistada pela luta socialista, a qual passa, necessariamente, pela transformação revolucionária do sistema de produção mundial, pela socialização dos grandes meios de produção, pela eliminação das classes – eliminação, portanto, da exploração do trabalho, do acúmu­lo de riquezas e de desigualdades sociais. E isso será conquistado através da organização e luta po­lítica do proletariado, a classe que possui este papel histórico:

A verdadeira emancipação da mulher, o verdadeiro comunismo, só começará onde e quando come­ce a luta das massas (dirigida pelo proletariado, que detém o poder do Estado), contra a pequena econo­mia doméstica, ou melhor, onde comece a transformação em massa dessa economia na grande econo­mia socialista. [4]

O Estado Operário socialista atuará de forma a propiciar a tran­sição ao comunismo: garantirá as premissas para uma sociedade sem classes, e sem a necessidade, portanto, de um Estado, este que originalmente tem como função mediar os conflitos provindos das desigualdades entre classes, a fa­vor dos direitos de uma minoria parasitária detentora dos bens e exploradora do trabalho humano. Conforme Engels, o Estado parte da “necessidade de uma força que se colocasse aparentemente acima da sociedade, com o fim de atenuar o conflito nos limites da ‘ordem”. [5]

A luta para a real emancipação da mulher demanda as mudanças materiais conquistadas por meio do socialismo, sendo que, com elas, toda a ideologia caminhará progressivamente para o mesmo estágio avançado da economia so­cialista. Conforme Trotsky expli­ca, o modo de vida do operário e da operária avança materialmente, mas tem futuramente a perspectiva do florescimento de uma verdadei­ra ideologia socialista: “os êxitos econômicos de cada operário con­duzem automaticamente a uma ele­vação material e cultural da classe operária em seu conjunto”. [6] O socialismo significa a expansão da cultura sem classes, duma cultura humana e humanitária.[7]. En­tão, não haverá mais resquícios da ideologia patriarcal e machista nas fileiras da sociedade.

O surgimento da propriedade privada e da família monogâmica se observou em todos os conti­nentes, e os povos que possuíam organização diferente foram, mais tarde, aniquilados ou obrigados a se adaptar à ordem capitalista imperialista, quase sempre com a destruição ou assimilação de sua cultura, perda de independência política e territorial, destruição da antiga forma de produção e de so­brevivência. Logo, a sociedade de classes, a dominação do privado sobre o público e todas contradi­ções sociais – advindas do choque do modo de produção com as re­lações de trabalho – e a opressão sistêmica da mulher são mundiais (estas contradições podem ser mais agudas ou mais amenas de um país a outro). Entretanto, são invaria­velmente opressoras. Somente com a luta internacional da classe trabalhadora, tendo em suas filei­ras a presença imprescindível, da mulher, é que se pode dar um passo adiante na história da humanidade.

As reivindicações transitórias das mulheres trabalhadoras: o trabalho da mulher

É de fundamental importância que seja ressaltada a situação pas­sada e atual da mulher no campo do trabalho, para que, ao final des­sa discussão, seja possível fazer a ponte necessária entre a situação da mulher trabalhadora com sua traje­tória histórica. Vamos demonstrar que os problemas enfrentados pela maioria das mulheres só podem ter uma solução positiva se estas se li­garem a luta geral da classe traba­lhadora pelo socialismo.

O trabalho produtivo está pre­sente na sociedade antes mesmo do cerceamento da terra, tornando­-a privada. A mulher, como agente produtivo e fecundo da sociedade conhecida e passada, desempenha uma relação intrínseca com as re­voluções culturais e, para onde queremos chegar, nas relações de divisão social do trabalho. Engels vai caracterizar em seu livro ‘A origem da Família, da Proprieda­de Privada e do Estado’ que a pri­meira divisão social do trabalho ocorre entre os gêneros [8] com a finalidade de procriação dos filhos. Com esta tarefa social, a mulher estava incumbida de dar educação, alimentar e desenvolver atividades ligadas aos cuidados da tribo.

É importante ressaltar que o trabalho aqui desenvolvido não se dava de maneira isolada, em que uma mulher trabalhava no lar, mas sim, que várias faziam isso, com caráter coletivo. É somente a partir do surgimento da propriedade pri­vada e a imposição da monogamia à mulher, com o objetivo de garan­tir a hereditariedade paterna, que o trabalho feminino passa a ser pri­vado, acarretando o definhamento das atividades públicas femininas e as confinando na esfera privada do lar. Do lar agora individualmente familiar. O trabalho feminino deixa de ser parte do coletivo geral e passa a ser individual ou familiar na unidade básica do sistema que se iniciava, o sistema da proprieda­de privada.

É a partir da revolução indus­trial, no século XVIII, levando toda a família operária para as filei­ras das fábricas, que a mulher vai se reposicionar no mundo do tra­balho, sendo constrangida, assim como seu marido e filhos, a vender sua força de trabalho todos os dias para o patrão, dono dos meios de produção.

A ocupação das mulheres nas fábricas ocorreu mais recorren­temente, no início da Revolução Industrial, no setor têxtil, tanto no Brasil como no resto do mundo. Segundo parte da pesquisa de Es­meralda Blanco, podemos confir­mar essa participação no Brasil.

A indústria têxtil, assim como a de confecções, encontrou efetivamente no sexo feminino – e igualmente no menor – a mão-de­-obra adequada para sua expansão, absorvendo as mulheres e meninas em grande maioria. Dessa forma, no ano de 1920, por ocasião do re­censeamento levado a efeito pelo Ministério da Agricultura, Indús­tria e Comércio, esse setor não só era o de maior índice de absorção de mão-de-obra, como também aquele no qual a participação do sexo feminino era mais acentuada, ultrapassando os 55% entre o ope­rariado adulto e aproximando-se dos 65% entre o operariado menor. Considerado o total de mão-de­-obra empregada no setor, o sexo feminino contribuía com aproxi­madamente 60% dos operários arrolados pela Diretoria Geral de Estatística. Na indústria de con­fecções – ‘Vestuário e Toucador’ na terminologia do recenseamen­to, a presença feminina também era significativa, correspondendo a aproximadamente 50% entre o operariado adulto, 60 % entre o operariado menor e igualmente 50% com relação ao total da mão­-de-obra absorvida pelo setor. [9]

A grande absorção do sexo fe­minino e de crianças neste setor da indústria tem um motivo, as mu­lheres ocupavam-se de atividades que tinham a ver com uma das ati­vidades domésticas que lhes eram atribuídas no lar e que demanda­vam maior agilidade manual. Mas é enganoso achar que as mulheres apenas estavam inseridas no setor têxtil. Em outro excerto da pesqui­sa de Blanco, temos:

É certo, como diz Margareth Rago, que, enquanto os homens ‘estavam presentes em quase todas as atividades ocupadas pelas mu­lheres, como a costura de sacos ou nas maçaroqueiras, vários traba­lhos eram interditados a elas, prin­cipalmente os cargos de chefia’. No entanto, apesar dessa interdi­ção, se considerar a totalidade do setor secundário, a participação da mão-de-obra feminina pode ser ob­servada já na década de 1870, em setores que não os tradicionalmen­te relacionados ao sexo feminino, como, por exemplo, a indústria de calçados, na qual Joaquim Floria­no de Godói observa em 1875 que, dentro 1.524 trabalhadores, 81 são mulheres. No final do século, mais precisamente no ano de 1894, a Repartição de Estatística e Arqui­vo do Estado de São Paulo apura a presença de mão-de-obra feminina em fábricas de fumo, de velas, de sabão, de bebidas e de fósforos. No caso da Fábrica de Fósforo da Vila Mariana, por exemplo, as mulhe­res representavam, então, mais de 25% da mão-de-obra empregada e os menores – cuja participação não é possível classificar entre o sexo -, mais de 40%. Os salários masculi­nos em cerca de 40%, sendo supe­riores aos salários dos menores em aproximadamente 60%. [10]

Contraditoriamente ao fato das mulheres se consolidarem no mer­cado de trabalho neste período, existiam ainda muitas que conti­nuavam apenas com os cuidados domésticos, mesmo depois da Se­gunda Revolução Industrial. [11]

Mas o que podemos retirar de concreto para a atualidade des­sa introdução sobre a inserção da mão-de-obra feminina no mercado de trabalho?

Primeiramente, as mulheres são mais vulneráveis às instabilidades do mercado, sendo a maior parcela de desempregadas no Brasil, são as primeiras a perderem o empre­go em momentos de crise, devido a direitos ligados ao sexo, como a licença maternidade, e às atribui­ções domésticas que mais facil­mente as afasta do setor produti­vo. Contraditoriamente, segundo a pesquisa do DIEESE feita entre 2011 e 2012, os dados evidenciam o aumento das massas femininas, no que se refere à mão-de-obra, nas sete regiões metropolitanas estudadas, porém ainda continuam sendo a maior parcela de desempregados em todas elas. Abaixo podemos confirmar, pelos dados da tabela emitida pelo boletim do DIEESE (Tabelas 1 e 2).

Tabela 1
Tabela 2

Além do desemprego, que afeta principalmente as massas femininas, temos o fator salarial, que afeta as mulheres desde a sua entrada no mercado de trabalho, como podemos apurar na pesquisa de Esmeralda Branco, citada acima e que mesmo com aumentos significativos, ainda são menores que os salários masculinos (Tabela 3).

Tabela 3

‘‘Como a jornada média de trabalho é diferente para mulheres e homens, com períodos menores para ela e maiores para eles, a análise do rendimento por hora trabalhada elimina as discrepâncias do indicador entre os dois contingentes.’’ [12] (Tabela 4).

‘‘Em termos setoriais, as mulheres auferem menor rendimento médio real por hora em todos os setores de atividade com estatísticas comparáveis nas sete regiões investigadas.’’

Tabela 4

A situação piora quando se trata da mulher negra trabalhadora, que enfrenta dupla discriminação no mercado de trabalho, como aponta a pesquisa do DIEESE ‘A mulher negra no mercado de trabalho: inserção marcada pela dupla discriminação’ publicada em 2005: “Elas são a síntese da dupla discriminação de sexo e cor na sociedade brasileira: mais pobres, em situações de trabalho mais precárias, com menores rendimentos e as mais altas taxas de desemprego” (Tabela 5).

Tabela 5

As mulheres negras são gravemente afetadas pelo desemprego em épocas de crise, mas segundo a mesma pesquisa do DIEESE, em momentos de crescimento econômico não observam melhoras nas oportunidades de emprego. Os homens negros também sofrem com essas discriminações de trabalho e salário em relação aos homens brancos, porém as mulheres negras ainda têm as piores condições dentre homens brancos e não brancos e mulheres brancas. No estudo de rendimento por hora, quando comparados os sexos e sua cor de pele, podemos confirmar essa afirmação (Tabela 6).

Tabela 6

A mulher negra no Brasil tem sua trajetória social marcada pela escravidão. Além dos trabalhos forçados, dos castigos, dos abusos sexuais por parte dos senhores e das humilhações, ainda estavam submetidas à ‘sinhá’ nas casas grandes. Se estas desconfiassem de qualquer desejo de seus maridos em relação à escrava jovem – o que normalmente acontecia – infligiam castigos, em vários casos, até torturavam furando os olhos, cortando os mamilos etc., como apresenta Slenes no livro ‘Na senzala, uma flor’. Este fato nos mostra, mais uma vez, como a questão da mulher também é de classe, pois, podemos ver que, em função da posição social da mulher branca, a esta estava permitido explorar, humilhar e torturar a mulher negra, então escrava.

Hoje não temos a escravidão no Brasil, mas os resquícios deixados por esse período são devastadores para a mulher negra trabalhadora, como já demonstramos acima. Mas é preciso reafirmar que defender tanto cotas de gênero, quanto cotas raciais são medidas que não dialogam com uma saída transitória para a superação da exploração capitalista sobre a mão-de-obra feminina e da classe trabalhadora como um todo. As cotas de gênero, geralmente combinadas com cotas raciais, comuns hoje nos cargos políticos, nos movimentos sociais e estudan­tis, inserem uma quantidade de re­presentantes femininas obrigatória que não necessariamente represen­tarão os interesses das mulheres trabalhadoras ou do conjunto da classe trabalhadora e que busca burlar de forma fantasiosa a explo­ração e opressão estrutural a que estão submetidas as mulheres e os negros no capitalismo, incapazes, portanto, de eliminá-las, uma vez que apenas “reformam”, “passam uma maquiagem” no sistema, sem nenhuma perspectiva de mudança de estrutura.

Por sua vez, as cotas raciais, que foram originalmente impul­sionadas no Brasil pela Fundação Ford, além de utilizarem-se do an­ticientífico conceito de raças hu­mana, não resolvem o problema da inserção dos negros na universida­de ou em uma vaga de emprego, como também podemos demons­trar através das duas últimas tabe­las. As cotas geram a divisão entre a classe trabalhadora e desviam a luta por vagas para todo na univer­sidade pública.

Precisamos de pleno emprego, que acaba com a ameaça de desem­prego, ameaça que, consequente­mente, gera o sucateamento das condições de trabalho e de salários. Precisamos da escala móvel de sa­lários, que ajusta automaticamen­te o recebimento a cada mês, de acordo com a inflação. Precisamos das condições adequadas a uma mulher no ambiente de trabalho. A mulher não pode ser igualada ao homem, pois possui necessidades e características próprias do gênero, que, se negligenciados, resulta em maior opressão trabalhista. Preci­samos de vagas nas universidades, melhores salários e condições de trabalho para todas! E para toda a classe trabalhadora.

Além do desemprego, ponta extrema da situação das mulheres trabalhadoras, e do salário rebaixa­do em relação ao do homem, para a mesma função, as trabalhadoras enfrentam as jornadas duplas e/ ou triplas, com os trabalhos do­mésticos e educação dos filhos. Podemos demonstrar esse cenário, a partir da pesquisa realizada pelo Núcleo de Opinião Pública da Fun­dação Perseu Abramo, de 2001.

A pesquisa foi realizada com 2.502 mulheres a partir dos 15 anos e abrangeu temas diversos; cabe-nos aqui ressaltar o tema em questão. As informações abaixo, relativas à pesquisa mencionada, revelam as dificuldades de ser mu­lher, segundo as entrevistadas:

Como componentes negativos que definem a situação atual da mulher, destacam-se dificuldades e excesso de responsabilidades, atribuídas principalmente à dupla jornada de trabalho, o doméstico e o remunerado, lembrados por 10% (16% entre as que dizem que a vida piorou); as discriminações no mer­cado de trabalho, tanto de funções como de salários (7% do total, 10% entre as que acham que a situação da mulher está pior), o preconcei­to social que reserva às mulheres discriminações e um lugar inferior em relação aos homens (5% e 7%, respectivamente) e maior exposi­ção à violência (2% e 4%). ’’ (…) Mas o mundo privado é também o espaço onde as brasileiras identifi­cam as piores coisas da condição feminina.

Enquanto referências ao mun­do público, como a discriminação social machista (18%), a discri­minação no mercado de trabalho (14%) e outras, foram citadas por um terço das mulheres, 61% deram exemplos referidos às suas princi­pais experiências privadas: o peso das tarefas domésticas (11%), o acúmulo de responsabilidades na criação dos filhos (9%), a violência conjugal (11%), a saúde (14%), o casamento e a relação com o mari­do (16%), enfim, o conjunto com­plexo de tarefas e obrigações que socialmente as mulheres têm em à instituição familiar ou in­separáveis da condição ou expecta­tiva da maternidade. (7)

‘E como é a divisão no trabalho doméstico? Em 96% dos domicí­lios em que residem mulheres, uma mulher é a principal responsável pela execução ou orientação dos afazeres domésticos. Três em cada quatro entrevistadas (75%) infor­maram ser as principais responsá­veis pelo trabalho não-remunerado (em 14% dos domicílios são suas mães) e 18% declararam-se auxi­liares, atingindo 93% de participa­ção nas tarefas domésticas. Entre as 43% brasileiras sem cônjuge, 54% são responsáveis diretas pelos trabalhos domésticos (em 30% dos casos suas mães) e 35% são auxi­liares, somando 89% de participa­ção. Entre as que coabitam com marido ou parceiro, 91% são as principais responsáveis e 6% são auxiliares, subindo a participação para 97%). [13] (Grifos nossos)

Os dados da pesquisa inseridos acima transmitem a situação con­creta e desejos de mulheres que representam a totalidade das brasi­leiras, vemos que a jornada dupla pesa para quase 100% das entre­vistadas, vemos que a maioria das mulheres prefere estar no mercado de trabalho a estar no lar com as tarefas domésticas e filhos.

Essa é uma expressão da cons­tante insatisfação das mulheres trabalhadoras, que estão fartas da opressão e das privações tanto na esfera pública quanto na esfera pri­vada e isso é preponderantemente uma questão para a luta pelo so­cialismo e não para a luta entre gê­neros, baseada na concepção indi­vidualista e pequeno-burguesa de que a mulher é e sempre será opri­mida pelo homem e que por isso deve-se unir com outras mulheres para derrotar o outro sexo.

NÃO somos a favor desse pon­to de vista, que não é o ponto de vista de classe, para as massas femininas que enfrentam todas as mazelas proporcionadas pelo sistema capitalista assim como os homens trabalhadores. Assumimos e demonstramos através desta ex­planação que as mulheres estão em condições inferiores aos homens em relação ao pagamento pelo seu trabalho e as condições do mesmo. Afirmamos que o principal causa­dor dessa divisão social injusta do trabalho e consequente opressão é O CAPITALISMO, e ele é que deve ser derrotado.

SOMOS A FAVOR da união de todos os trabalhadores, indepen­dente de sua identidade de gênero e de cor nas lutas de classe e apon­tamos como saída transitória:

  • Trabalho Igual, Salário Igual!
  • Reajuste mensal dos salários de acordo com a inflação!
  • Pleno emprego para a classe trabalhadora!
  • Contra o sucateamento das condições de trabalho!
  • Pela redução da jornada de trabalho sem redução dos salá­rios para todos!
  • Pela garantia das condições adequadas para mulher no ambiente de trabalho! Pela li­bertação da mulher da dupla jornada, dos afazeres domés­ticos.
  • Contra a Reforma da Previ­dência, aposentadoria por 30 anos de trabalho
  • Lavanderias públicas, restau­rantes públicos, creches públi­cas, etc.
  • Estabilidade no emprego

A violência que nos mata

A divisão social entre homem e mulher desenvolvida na história, a partir do surgimento da socie­dade de classes, acarretou a uma condição de submissão da mu­lher pelo homem, uma vez que se tornou propriedade e empregada do lar individual.

A partir da Re­volução Francesa e subsequentes revoluções, em que se consolidou a sociedade burguesa e alguns di­reitos para as mulheres, o quadro apresentado na classe dominante é de homens e mulheres burgueses desenvolvendo as faculdades intelectuais, apropriando-se do conhecimento historicamente desenvolvido pela humanidade e decidindo politicamente.

Apesar de a mulher burguesa ainda sofrer com discriminação de gênero, próprio da ideologia de classes, e poder estar a reboque do homem, condição que não é estática, devido ao poder aquisitivo e ao status, que lhe conferem possibilidade de maior independência econômica. Já para a classe dos que não possuem propriedade, o acesso ao conhecimento e a possibilidade de atuação política tornam-se mais precários, a mulher proletária, especificamente, ao mesmo tempo em que entra cada vez mais na produção e no mercado de trabalho capitalista, necessita lidar em condições difíceis com a manutenção do lar e da prole. Isto a afasta mais intensamente de uma atuação social e política de forma consciente e constante. Diante deste quadro de dupla exploração e opressão da mulher trabalhadora, e a da ideologia burguesa depreciadora do gênero feminino, ou seja, machista, a violência contra a mulher surge como característica da sociedade de classes. Este é um problema que as sociedades contemporâneas não conseguiram e nem conseguirão resolver nos marcos da ordem vigente; dessa forma, não é incomum a existência de métodos de repressão feminina, principalmente no mais íntimo da sociedade de classes, a família individual monogâmica, onde, segundo Trotsky, preservam e proliferam os piores vícios da moral burguesa. Normalmente são os parceiros quem praticam os métodos repressivos/agressões contra a mulher.

Marcha das Mulheres a Versalhes, um importante evento da Revolução Francesa de 1789

A partir da Revolução Francesa, em que as mulheres, impulsionadas pelos ideais de igualdade, fraternidade e liberdade, passaram a participar ativamente do processo revolucionário, houve conquistas de direitos e a questão da violência contra o gênero passou a ser mais pautada por organismos nacionais e mundiais. Como o dia 25 de novembro, instituído em 1999, durante Assembleia Geral das Nações Unidas como Dia Internacional de Eliminação da Violência Contra as Mulheres. Esse dia rememora a atividade política de três mulheres da República Dominicana que foram assassinadas a mando do ditador Rafael Trujillo, em 1960. [14].

Entretanto, estas iniciativas não rompem com a ordem e têm pouca influência na luta contra a violência. Recentemente, a OMS (Organização Mundial da Saúde) constatou que 35% dos casos das mortes femininas são causadas pelo próprio parceiro. E ainda, a ONU, estima que 5.000 mil mulheres ou meninas são mortas por crimes de honra, a mando da própria família, por ano!

Além disso, existem outros tipos de crimes contra a mulher, como aquele praticado em função do dote (nos locais onde é praticado, como na Índia), onde o sogro mata a noiva por causa de quantias de dinheiro ou bens; aquele praticado por desconhecidos, que nesse caso envolvem estupros, assaltos, discriminação por gênero e assédios. E ainda aqueles onde a mulher é mutilada, mais de 135 milhões de mulheres e meninas são mutiladas em 29 países da África e Oriente Médio e segundo a ONU, em média, 6.000 mulheres sofrem com esse tipo de violência, por dia. [15] Existe uma profunda ilusão de que apenas a judicialização do crime de violência contra a mulher e consolidação de estruturas alicerçadas pelo aparelho policial e jurídico poderão acabar com a agressão contra o gênero.

Nós reivindicamos maiores direitos na sociedade, buscamos o máximo de meios para minar a agressão por que passa a maioria das mulheres no mundo. Entretanto, a luta pautada dentro dos marcos das instituições burguesas, demonstra objetivo de reforma do sistema, conforme se verifica na pesquisa de Julio Jacobo Waiselfisz, em “Mapa da Violência 2015, homicídio de mulher no Brasil”: ‘‘O que é novo, e muito recente, é a preocupação com a superação dessa violência como condição necessária para a construção de nossa humanidade. E mais novo ainda é a judicialização do problema, entendendo a judicialização como a criminalização da violência contra as mulheres, não só pela letra das normas ou leis, mas também, e fundamentalmente, pela consolidação de estruturas específicas, mediante as quais o aparelho policial e/ou jurídico pode ser mobilizado para proteger as vítimas e/ou punir os agressores.

No Brasil, há nove anos, em agosto de 2006, era sancionada a Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, visando incrementar e destacar o rigor das punições para esse tipo de crime. A introdução do texto aprovado constitui uma boa síntese da Lei: Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. Mais recente ainda, faz uns poucos meses, em março de 2015 seria sancionada a Lei 13.104/2015, a Lei do Feminicídio, classificando-o como crime hediondo e com agravantes quando acontece em situações específicas de vulnerabilidade (gravidez, menor de idade, na presença de filhos, etc.). [16] Os dados do Sistema de Informações de Mortalidade apontam que de 1980 até 2013, 106.093 mulheres morreram vítimas de homicídio no Brasil e a partir da elaboração e aprovação da Lei Maria da Penha (nº 11.340/2006), o número de mortes cai em 2,6% ao ano, segundo pesquisa divulgada pelo Mapa de Violência 2015. Embora a Lei Maria da Penha (nº 11.340/2006), tenha sido criada há mais de oito anos, ela não garante o fim da violência doméstica, apenas lida com a agressão já de fato instaurada, sem transformar as causas da violência, que possuem base material na sociedade capitalista A luta que visa apenas direitos, sem a perspectiva revolucionária, não apenas é infrutífera, mas colabora para a criação do falso ima­ginário da democracia burguesa e para a crescente ilusão no papel do Estado burguês como provedor de justiça. Engels explica sobre a luta jurídica nos marcos capitalistas:

Essa argumentação tipicamen­te jurídica é exatamente a mesma de que se valem os republicanos radicais burgueses para atacar e calar o proletário. Supõe-se que o contrato de trabalho seja livre­mente firmado por ambas as par­tes. Mas considera-se livremente firmado desde o momento em que a lei estabelece no papel a igualda­de de ambas as partes. A força que a diferença de situação de classe dá a uma das partes, a pressão que essa força exerce sobre a outra, a situação econômica real de am­bas, tudo isso não interessa à lei. (…) Com relação ao casamento, mesmo a legislação mais avança­da se considera inteiramente sa­tisfeita desde que os interessados declarem formalmente em ata que é de sua livre vontade. A lei e os juristas não se preocupam com o que se passa por trás dos bastido­res jurídicos, em que ocorre a vida real, nem como se tenha chegado a esse consentimento de livre von­tade. (…) A situação não é melhor no tocante à igualdade de direitos, sob o ponto de vista jurídico do ho­mem e da mulher no casamento. A desigualdade legal de ambos, que herdamos de condições sociais an­teriores, não é causa e sim efeito da opressão econômica da mulher. (Grifo nosso.)

A luta contra a violência sobre a mulher é necessária e deve estar na ordem do dia de todo revolu­cionário. Entretanto, a situação tende a permanecer característica inerente à sociedade da proprie­dade privada. Hoje são 4,4 assas­sinatos a cada 100 mil mulheres, número que coloca o Brasil no 7º lugar no ranking de países nesse tipo de crime. 54% conhecem uma mulher que já foi agredida por um parceiro e 56% conhecem um ho­mem que já agrediu uma parceira. A Central de atendimento à mulher atingiu 532.711 registros em 2013, totalizando quase 3,6 milhões de ligações desde que o serviço foi criado em 2005. O estudo aponta que, em relação aos casos de agres­são masculinos, o local onde a mu­lher é mais agredida é no próprio domicilio. A violência é sistêmica e institucionalizada na sociedade capitalista e muitas vezes os agres­sores são legitimados por práticas machistas.

A pessoa quando agredida tem a sua integridade moral, física e/ou psicológica abalada proporcionan­do o desenvolvimento ou evolução de problemas físicos ou mentais. A dor física ou moral de quem sofre com a violência é indescritível e incalculável e infelizmente as ví­timas, em alguns casos, preferem sofrer silenciosamente.

Outro problema é a falta de exteriorização dos casos que aca­bam não sendo solucionados: algu­mas pessoas negam-se a procurar por ajuda de autoridades temendo agressões mais severas acobertan­do, portanto, o agressor que ficará sem a devida punição que lhe cabe. É comum também o convívio entre agressor e agredido após as ações de violência, tornando-se relacio­namentos duráveis. Essa situação em que a vítima permanece de alguma forma presa ao relaciona­mento pode ser resultado da depen­dência material/social da vítima.

Se as relações sociais estão intimamente relacionadas às rela­ções materiais, torna-se necessário a luta pelo pleno emprego e pelo salário igualitário entre homens e mulheres, libertando a mulher da violência doméstica, uma vez que ela tenha condições materiais para desvincular-se de um relaciona­mento abusivo.

É preciso ainda dizer que não se acaba ou diminui com a violên­cia doméstica aumentando o po­liciamento, mas sim com espaços acolhedores, que forneçam o apoio psicológico necessário a vítima que denúncia a prática de violên­cia, que garanta sua proteção e dos filhos e que puna o agressor, como é previsto até mesmo nas leis de defesa da vida das mulheres.

Para a superação da violência doméstica e dos assassinatos de mulheres é necessária uma trans­formação social, na base material da sociedade com a superação do sistema capitalista, que consolidou o machismo como produto ideo­lógico, por uma sociedade onde a mulher seja emancipada, integrada e preservada socialmente, sem vio­lações aos seus direitos, a sua inte­gridade física, moral e psicológica. Por uma sociedade que dê as con­dições materiais para a superação da violência e da discriminação de gênero, uma sociedade socialista.

  • Combater toda violência con­tra a mulher!
  • Pelo desenvolvimento de po­líticas públicas para acolher e preservar a vida de mulheres e seus filhos vítimas de violência!

O direito ao nosso corpo

A luta pelo direito de escolha e decisão sobre o nosso corpo é parte constante da luta das mulhe­res. A luta pelo direito ao aborto, de escolher ou não a maternidade, faz parte desse processo. E hoje as restrições são imensas para as mu­lheres que não desejam ser mães e querem interromper uma gra­videz indesejada. Compreender a questão de classe é imprescindível para a defesa da vida das mulhe­res trabalhadoras, que representam a maioria das mulheres em todo o mundo.

No Brasil, desde que a pessoa tenha dinheiro para pagar, o aborto é possível. Mesmo que de forma ilegal, a mulher rica pode pagar pelo serviço clandestino com o mínimo de segurança de vida. Se a mulher for pobre, porém, para ter direito ao aborto, precisa provar que foi estuprada ou estar à beira da morte, sendo que até mesmo estes direitos estão em risco, fren­te a um legislativo cada vez mais tomado por setores conservadores e fundamentalistas e um governo submisso a esses setores. Como consequência, milhões de adoles­centes e mulheres que engravida­ram e não querem dar continuidade à gestação recorrem ao abortamen­to clandestino, o que mata uma mulher a cada dois dias no país e é a quarta causa de morte materna no Brasil [17].

A Pesquisa Nacio­nal de Aborto (PNA), realizada em 2010 pela Anis – Instituto de Bio­ética, Direitos Humanos e Gêne­ro, mostra que uma em cada sete brasileiras entre 18 e 39 já realizou ao menos um aborto na vida, o que equivale a 5 milhões de mulheres! Ou seja, legalizado ou não, o ín­dice de abortamento é alto e esta questão deve ser de responsabili­dade do Estado.

O Estado burguês, gerido pela e para a classe dominante, contro­lado pelos donos do capital inter­nacional age a favor da manuten­ção da mulher como instrumento econômico, social e sexual, na so­ciedade dividida em classes. Em períodos de crise do sistema, em que os princípios burgueses podem ser questionados pelas massas ex­ploradas, intensifica-se o regresso dos próprios Direitos Humanos, le­vantados pela sociedade burguesa e gradativamente desmantelados, para assegurar a ordem da socieda­de de classes, mesmo que para isso se retomem ideias medievais.

Exemplo claro disto, no Brasil, é o Estatuto do Nascituro, projeto de lei 478/07, formulado em 2005 e em tramitação no Congresso em 2007 e 2013. Este PL prevê o fim dos direitos ao aborto em caso de risco para a vida da mulher, de gra­videz de feto anencéfalo e de es­tupro. Um retrocesso em 70 anos no Código Penal, que garante in­terrupção da gravidez nestes casos. Em se tratando de estupro, o estu­prador teria direito a ser registra­do como pai, em troca da solução pífia do pagamento de pensão ou de indenização por danos morais e materiais. Não queremos palia­tivos que permitam a continuidade de atentados contra as mulheres, regulamentados na legislação. So­mente com o fim da sociedade de classes e de toda sua lógica de do­minação – que subjuga a classe tra­balhadora explorada – é que será possível libertar a mulher de forma plena.

O projeto de lei original pre­tende proibir o uso da pílula do dia seguinte, o que evidencia o caráter religioso da lei, uma vez que se considera que a vida se inicia na concepção, o que não é consenso na comunidade científica. Tam­bém seriam proibidas pesquisas com células tronco embrionárias, um retrocesso a possíveis avanços científicos, capazes de melhorar a condição de vida de todos. Estas medidas colaboram para o aumen­to dos abortos ilegais, danos à vida ou morte da mulher. Na versão de 2007, a tentativa de aborto seria ti­pificada como crime, assim como qualquer “apologia ao aborto”, o que fere o direito de expressão e manifestação de movimentos so­ciais a favor do direito.

Temos ainda o PL 5069/2013, que dificulta o acesso de vítimas de abuso sexual ao aborto legal, exigindo boletim de ocorrência e exame de corpo de delito para po­der ter acesso atendimento médi­co adequado, ainda restringindo o acesso a pílula do dia seguinte.

Existe, por parte dos legislado­res reacionários, a falácia da pro­teção “integral” ao nascituro, con­siderado vida dotada de direitos, que, na verdade, somente é pro­tegido pelo Estado enquanto um feto indesejado no útero da mãe. Estas crianças que, quando nasci­das, se deparam com as constantes tentativas de redução da maiorida­de penal, com a educação pública sucateada, com a criminalização e violência brutal contra jovens po­bres nas periferias, estes que pos­suem condições de vida precária e desamparada pelo mesmo Estado burguês.

Esta “proteção” do nascituro acontece em detrimento dos di­reitos da mulher no desenvolvi­mento pleno de sua vida adulta e das decisões sobre seu corpo e sua vida. Evidencia como a ideologia dominante da sociedade burguesa considera a mulher como instru­mento de procriação e mão de obra doméstica, necessária à manuten­ção da vida da classe trabalhadora explorada. Queremos a proteção integral da mulher e avanço nas políticas com este fim.

O PL versa em linhas carre­gadas de moralismo burguês e religioso, em que a mulher não é considerada uma vida a se preser­var e são dela retirados os direitos sexuais e reprodutivos. Além dis­so, o documento trabalha com a premissa de um Estado com saú­de pública de qualidade, e com o pressuposto de que a adoção e uma indenização possam por si só re­solver uma gestação indesejada, condições precárias para criação de filhos, e os danos causados em face da violência sexual.

O aborto não deve ser tratado como uma questão moral e as re­ligiões em nada devem influenciar nas decisões do Estado, trata-se de uma questão de saúde pública e, como tal, deve ser resolvido e am­parado pelo Estado – e do direito da mulher sobre o seu corpo. A luta deve ser pela descriminalização e pela a legalização aborto.

Descriminalização porque evi­dentemente a lei atual demonstrou ser, não apenas ineficaz, mas clara­mente nociva, uma vez que obriga as mulheres a recorrerem um ca­minho cada vez mais difícil pela justiça para realizar o seu direito, ou a pessoas despreparadas e ines­crupulosas para interromper a gra­videz. E legalização para torná-lo prática garantida a todas as mulhe­res pelo Sistema Único de Saúde, amparado por uma rede de ações estatais, a fim de combater a sua exploração comercial.

Tratar o aborto como uma ques­tão de saúde pública e apresentar uma política efetivamente capaz de viabilizar, dentro do sistema público de saúde, um tratamento completo para as mulheres que se submetem a tal alternativa é uma tarefa que o Estado deve assumir, sem as amarras da moral burguesa que possui nome e classe social: são impostas fundamentalmente às mulheres trabalhadoras à custa de suas vidas. A mulher deve ter di­reito a decidir pela gestação ou não de uma vida, e o Estado, uma vez laico, deve garantir os meios para ampará-la na sua decisão.

  • Não ao Estatuto do Nascituro!
  • Não ao PL 5069/2013!
  • Pela legalização do aborto e laicização das decisões do Es­tado!
  • Por saúde pública, estatal, gra­tuita e para todos!

A maternidade

Quando uma mulher tem as condições de optar por ser mãe, ou mesmo quando a gravidez acontece, ela precisa ser amparada pelo Estado através do acesso à saúde pública. Mas hoje, no momento mais importante da gravidez – o parto – temos variadas situações que desrespeitam a mulher, que lhe roubam o poder de decisão sobre seu corpo e que podem causar sequelas tanto emocionais quanto físicas à mãe e também ao bebê.

Em abril deste ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) constatou que o Brasil é o único país do mundo a realizar mais da metade de seus nascimentos através de cirurgias cesarianas. São 53,7% dos nascimentos realizados por esse procedimento, enquanto que o indicado é até 15%. Sendo que, mesmo esses 15% devem ser realizados em casos específicos. Os nascimentos no setor privado, quando se trata de parto cesárea, superam os 80%, e no setor público chegam a 40%!

O parto cesárea é usado como regra no país, pois os médicos obstétricos ganham por procedimento e não por plantão. Isso significa que quanto mais partos eles fizerem, melhor serão remunerados. É como ganhar por produção numa fábrica, quanto mais rápido for o “procedimento” melhor é para o médico, que então passa a usar vários procedimentos, como aplicação de ocitocina (hormônio que acelera as contrações) para não passar horas no trabalho de parto.

Esta lógica de procedimentos, ao invés de partos propriamente ditos, expressa a forma como o Estado burguês lida com uma questão que é também de saúde pública, submetendo médicos e mulheres gestantes à lógica perversa do capitalismo, do “tempo é dinheiro”.

Além da violência física à mulher gestante, causada pela indução de um parto cesárea, há também as violências obstétricas, os abusos cometidos na hora do parto. Cerca de uma a cada quatro mulheres já sofreram abusos na hora do parto. E esses abusos vão desde não prestar o devido atendimento durante o pré-natal, humilhação verbal, toques desnecessários e um procedimento bastante questionável chamado episiotomia, no qual é feito um corte durante o parto normal para “ajudar o bebê a passar”. Na maioria dos casos, a mulher não é consultada sobre a realização do procedimento, o que reforça essa violência ao seu corpo.

Outro fator importante na luta das mulheres mães é a licença maternidade. Hoje, a licença maternidade no Brasil é de apenas 120 dias. Em outros países, a licença maternidade varia. Nos EUA, por exemplo, as mulheres tem licença maternidade de 12 semanas, mas sem remuneração. Diferente de países como Reino Unido, Croácia, França, Noruega, Suécia. Cuba garante 156 dias de licença maternidade, com 100% do salário.

Nos primeiros seis meses de vida, o bebê depende apenas do leite materno e os 120 dias dados como direito de licença não são suficientes nem para isso! Dos zero aos 18 meses, os bebês são completamente dependentes de terceiros, na maioria dos casos da mãe. A licença maternidade deveria cobrir esse período de necessidade absoluta, no mínimo.

Porém numa sociedade onde um deputado é capaz de declarar que ‘‘a mulher deve ganhar menos, porque engravida’’, como o fez Jair Bolsonaro ao jornal Zero Hora, não podemos supor que esses avanços no campo da maternidade sejam levados a sério pela democracia burguesa, que, de fato, não está interessada nos direitos das mães trabalhadoras.

Apenas com luta podemos arrancar nossos direitos desse sistema, que cada vez mais nos explora e joga seus ônus de crises de superprodução em nossas costas.

Além da luta pela ampliação da licença maternidade, devemos lutar pelo direito à licença paternidade, que no Brasil é de 5 dias. Como é que a educação dos filhos pode ser verdadeiramente dividida, se ainda no século XXI entende-se que apenas as mães devem tirar licenças do trabalho a partir do nascimento de um filho?

Esse é um direito também dos pais trabalhadores, para que possam auxiliar a mulher no período de recuperação pós-parto e que possibilite a eles também o contato e a responsabilidade pelo cuidado do bebê.

Somente ampliando a licença maternidade e conquistando a licença paternidade em tempo igual, remunerada e garantida pelo Estado, é que será possível dar condições materiais aos pais trabalhadores para desfrutarem o nascimento de seus bebês e dividirem as responsabilidades dos primeiros meses de vida.

  • Não à violência obstétrica!
  • Parto humanizado público, gratuito e para todas!
  • Ampliação da licença maternidade até os primeiros 18 meses de vida do bebê!
  • Licença paternidade igual à licença maternidade!

A educação dos filhos

A Constituição Federal em seu artigo 7º garante à mãe trabalhadora o direito de, após o nascimento de seu filho, requerer licença de 120 dias de afastamento do trabalho, sem prejuízo do seu salário. A mãe trabalhadora ainda tem assegurado o direito a berçário ou creche nos locais de trabalho, sempre que a empresa tiver trinta ou mais mulheres trabalhando. (CLT, art. 400). Em contrapartida o artigo 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente e o artigo 208 da Constituição Federal asseguram o atendimento em creche e em pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), em 1996, reforça esse direito e incluiu a primeira infância na área da educação básica e previu o direito à creche, a ser garantida pelos estados e municípios.

Trata-se então do direito da mãe e também da criança, mas é incorrer em erro pensar que somente a mãe trabalhadora fora do lar tem direito a uma vaga para seu filho na creche. Toda mulher, inserida ou não no mercado de trabalho tem direito a creche para os filhos. Esse direito é o que lhe garante a possibilidade de participação na vida pública.

O primeiro passo para a emancipação – e não o último – é a incorporação da mulher no trabalho social produtivo. Para Engels “a emancipação da mulher, sua igualdade de condição com o homem é e continuará impossível enquanto a mulher for excluída do trabalho social produtivo e tiver de limitar-se o trabalho privado doméstico. Para que a emancipação se torne factível, é preciso, antes de tudo, que a mulher possa participar da produção em larga escala social e que o trabalho doméstico não a ocupe além de uma medida insignificante[18].

O número de vagas oferecidas, muito abaixo do necessário, faz com que as prefeituras – a municipalização do ensino fundamental iniciada na década de 90 levou as prefeituras a priorizarem o ensino fundamental em detrimento do ensino infantil e aos estados a abandonar as séries iniciais do ensino fundamental – adotem critérios excludentes como a obrigatoriedade da mãe estar trabalhando, ter a renda per capta familiar menor entre todas da lista de espera. Essa política de responsabilizar apenas o município pela educação infantil faz avançar a privatização da educação, já que o poder público se ausenta cada vez mais do oferecimento de vagas em suas redes diretas, lançando mão da terceirização e de convênios com a iniciativa privada para atender a demanda. Isso quando na verdade o acesso à educação infantil é um direito de todos.

Por que não o auxílio creche? Porque defendemos educação pública, gratuita e para todos em TODOS OS NÍVEIS, e não compactuamos com qualquer forma de privatização do ensino. A opção pela maternidade não deve entrar em conflito com as obrigações sociais e não pode impedir o trabalho produtivo da mulher.

  • Vagas para todas as crianças em creches públicas!
  • Em defesa da educação pública e gratuita para todos!

A comercialização do nosso corpo

Historicamente, a prostituição desenvolveu-se na sociedade tal como a concebemos hoje, juntamente com a formação da família enquanto célula nuclear constituída entre o casamento de um homem e uma mulher, onde a monogamia é exigida à esposa e a infidelidade conjugal é tolerada e naturalizada por parte do marido.

Ainda que exista prostituição do homem, ela é majoritariamente imposta às mulheres e ainda é vista como prática paralela à instituição da Família, oprimindo e explorando a mulher.

Com a atuação do departamento feminino do Partido Bolchevique, em 1920 as mulheres conquistaram o direito ao aborto legal e gratuito nos hospitais do Estado. A prostituição e seu uso eram descritos como um crime contra os vínculos de camaradagem e solidariedade e, além disso, era amplamente divulgada uma campanha contra a moral burguesa e uma relação que a mulher se livrasse do trabalho doméstico e na qual ela participasse de forma igualitária ao homem.

Atualmente, o Ministério do Trabalho reconhece a prostituição na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). A restrição ao reconhecimento da profissão está na idade da prestadora do serviço, sendo obrigatória a maioridade legal. Entretanto, mesmo com essas políticas, a prostituição possui um caráter opressor e explorador, pois o papel da mulher é renegado ao da exploração de seu próprio corpo enquanto serviço/produto. Não se trata da venda de sua força de trabalho, e sim da objetificação de seu próprio corpo com a finalidade de lucrar mediante pagamento.

Portanto, a prostituição corrobora com a degeneração do capitalismo no sentido de tornar tudo uma busca pelo lucro e exploração, inclusive das próprias relações sociais. Não há nada de libertário e transgressor em se prostituir, como inúmeras figuras públicas propagandeiam. Tampouco podemos estar de acordo com o Projeto de Lei N° 4.211, proposto à Câmara dos Deputados em 2012 por Jean Wyllys, que visa regulamentar a prostituição, com objetivo do controle e fiscalização por parte do Estado pelo “serviço” prestado. Ou seja, as casas de prostituições seriam legalizadas e os proprietários virariam empresários do sexo. É a exploração sexual institucionalizada. Com a regulamentação, o argumento desse Projeto de Lei é que permitiria às profissionais do sexo “o acesso à saúde, ao Direito do Trabalho, à segurança pública e, principalmente, à dignidade humana”, enfim, direitos trabalhistas às “profissionais do sexo”. Esse argumento é completamente simplista, reacionário, tendo em vista que nossa luta é por emprego, por saúde, educação, moradia, transporte, lazer o suficiente para todos os trabalhadores e para que as mulheres não caiam na vulnerabilidade social e vejam a prostituição como única opção possível para a sobrevivência. Regulamentar a prostituição como trabalho não significa dignificar as prostitutas, mas sim regulamentar o cafetão, facilitar o crescimento da indústria sexual, dos aliciadores e de todos aqueles que lucram com base nesse tipo de exploração.

Regulamentar a prostituição é institucionalizar a mercantilização do corpo da mulher e esquecer que há uma grande rede de exploração sexual internacional altamente lucrativa. Dados do Relatório Nacional sobre tráfico de pessoas (2005-2011)[19] mostra que grande parte das pessoas traficadas para exploração sexual são mulheres jovens, oriundas das regiões de alta vulnerabilidade social (falta de saneamento básico, transporte, iluminação pública etc.), com baixa escolaridade, que exercem funções de baixa remuneração (ligadas aos serviços como manicure, secretária, cabeleireira, doméstica) e em sua maioria são oriundas principalmente da periferia de grandes centros urbanos do Norte e Nordeste.

Há outra questão importante: grande parte da prostituição que ocorre no Brasil é de crianças e adolescentes. O turismo sexual alimenta-se da extrema miséria e da vulnerabilidade de crianças e jovens, em especial as do sexo feminino. Dados do mapeamento do Departamento de Polícia Federal e a da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência em 2009/2010[20] mostram que existem pelo menos 1820 pontos de risco à exploração sexual de menores e que 67,5 % deles estão em área urbana. Nesses locais também estão associadas ações como furto, além da venda e consumo de drogas. Portanto, trata-se de uma profunda vulnerabilidade social e principalmente econômica, que leva diversas famílias e menores a serem aliciadas para o mercado da prostituição, nas suas mais variadas formas, para sobreviver. O mercado da pornografia também alimenta-se de toda uma cadeia de exploração e tráfico de pessoas.

A prostituição está diretamente ligada com o turismo e tráfico sexual, à exploração sexual de menores, mercantilização do corpo, em especial o feminino. Ser contra a prostituição e a sua regulamentação não é uma questão moralista, trata-se de ter claro que essa exploração é proveniente de um sistema dividido entre opressores e oprimidos, onde tudo é uma oportunidade para lucro e exploração, inclusive a vulnerabilidade social, econômica e financeira de muitos indivíduos, em sua maioria mulheres. Por isso, somos contra qualquer tentativa de legalizar a exploração da prostituição.

  • Contra o Projeto de Lei 4211/12
  • Contra toda forma de mercantilização do corpo da mulher!
  • Por garantia de emprego e condições dignas de vida e de trabalho!

A opressão sobre a sexualidade

Os marxistas defendem direitos iguais para todos. Independente da cor da pele, do gênero, da religião, nacionalidade, ou da orientação sexual. É parte de nossa luta o combate a toda forma de preconceito e opressão.

Consideramos que o Estado deve ser laico, por isso repudiamos as tentativas de criação de leis com base em preceitos religiosos ou para beneficiar grupos religiosos. Repudiamos a política de figuras reacionárias como Malafaia, Feliciano, Bolsonaro, etc., que pregam, entre outros absurdos, o ódio aos homossexuais. Cabe destacar que, segundo dados de 2012 do Relatório sobre violência homofóbica no Brasil[21], da Secretaria de Direitos Humanos, foram registradas pelo poder público 3.084 denúncias de violações motivadas pela homofobia.

A luta contra a homofobia conseguirá alcançar seus objetivos plenamente se estiver conectada e inseparável da luta contra o capitalismo que alimenta não apenas o preconceito por conta da sexualidade, mas também o racismo, o machismo e, principalmente, a exploração cotidiana de bilhões de trabalhadores ao redor do mundo, sugando a força de trabalho para alimentar os lucros de uma minoria parasitária.

Por isso, temos uma posição distinta de parte do chamado movimento LGBT, que se limita à reivindicação da aceitação das diferentes orientações sexuais pela sociedade capitalista, inclusive entrando muitas vezes dentro da lógica de mercado capitalista, como a transformação das chamadas paradas do orgulho LGBT em um grande negócio turístico.

Nossa posição sobre a questão LGBT é de classe e revolucionária. Consideramos que a questão da sexualidade individual é uma questão privada.

Defendemos que todos, sem distinção, devem ter acesso e garantia de permanência na escola. Devemos lutar contra a exclusão daqueles que são alijados do processo educativo. Inúmeros homossexuais são apartados da escola e, sem perspectiva de trabalho, entram no mercado da prostituição e da violência das ruas.

Recentemente acompanhamos a votação dos planos nacional, estaduais e municipais de educação. Diversas votações retiraram dos textos qualquer menção à palavra “gênero”, erroneamente nominada pela bancada conservadora como “ideologia de gênero”, que teria como objetivo incentivar a escolha do gênero e orientação sexual das crianças através da educação escolar. Se como marxistas compreendemos a luta contra o capitalismo como uma luta entre classes, e não entre raças ou gêneros, compreendemos também que a educação deva ser crítica e capaz de instrumentalizar os filhos da classe trabalhadora. Estes deverão tornar-se aptos a compreender o mundo além das aparências, e isso inclui, no nosso entendimento, uma educação que também supere o preconceito. Incluir a discussão de gênero nas escolas é uma forma de conscientizar as futuras gerações sobre o respeito à individualidade e diminuir os traumas decorrentes das diversas construções de identidade de gênero na infância.

A questão da sexualidade está diretamente ligada ao acesso à saúde. O acompanhamento psicológico (em especial na infância), tratamentos hormonais e as cirurgias de transgenitalizacão a qualquer adulto responsável pelos seus atos, devem ser garantidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) como direito básico. A luta pela saúde pública gratuita e para todos sem distinção ou restrição deve garantir o direito das liberdades individuais.

Os direitos reprodutivos dos que desejam realizar mudança de sexo não podem ser vistos como concorrentes dos direitos reprodutivos das mulheres, conforme alegam correntes feministas radicais. A concorrência por direitos que só cabem a uma parte da sociedade é uma característica da sociedade capitalista. Lutamos por uma sociedade onde todos possam ter acesso aos seus direitos, onde a prosperidade e as liberdades individuais não sejam privilégios de alguns. Por isso não nos restringimos a escolher este ou aquele grupo que mereça maior atenção de um Estado burguês. Lutamos por um Estado transitório operário revolucionário e democrático, a favor de todos, contra a sociedade dividida em classes.

Também divergimos de parte do movimento feminista que, seguindo a linha da disputa entre direitos, defendem que as transexuais roubam o “protagonismo” das mulheres nas lutas de gênero. A exemplo das pichações de ódio na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), essas correntes atuam incitando a violência e até mesmo reivindicam a morte das transexuais, um grupo já extremamente marginalizado e alvo de crimes e assassinatos com o consentimento de toda a sociedade burguesa. Nós nos juntamos às fileiras das correntes de denúncia de casos como esses, e somos contra todo o discurso de ódio contra os oprimidos.

A violência contra homossexuais é resultado principalmente do discurso de ódio praticado pela camada mais conservadora da classe dominante. O preconceito alimentado por esses grupos mata homossexuais, transexuais, mulheres e negros todos os dias, e é um retrocesso para a humanidade. Em contrapartida com essa política, é necessário defender o Estado laico.

O casamento civil entre pessoas do mesmo sexo é um direito democrático e que entra em choque com os setores que pregam o preconceito, por isso apoiamos a medida. Compreendemos que na atual forma de sociedade, o casamento civil propicia determinadas garantias como pensão, herança, extensão de direitos e benefícios do cônjuge, etc. Porém, sabemos que a transformação das bases econômicas da sociedade transformará também, por decisão livre e voluntária dos seres humanos a superestrutura jurídica da sociedade, das instituições, e, portanto, também as formas de relacionamento entre os seres humanos vivendo em sociedade, ou seja, a atual forma de relações pessoais e familiares, fruto das atuais relações sociais de produção.

Uma economia planificada, com a abolição da propriedade privada, em direção ao comunismo, propiciará o surgimento de uma nova superestrutura jurídica, social e moral, e de um novo tipo de relacionamento entre os seres humanos, em que as pressões econômicas para a manutenção de um casamento, por exemplo, deixarão de existir e as pessoas manterão suas relações por vontade própria.

O racismo, o machismo e a homofobia vão definhar, deixarão de fazer parte da realidade, pois a classe que se beneficia dessas ideias reacionárias, alimentando a divisão da classe trabalhadora, não estará mais no poder. A humanidade estará livre das amarras capitalistas para evoluir e viver.

Compreendemos que tanto a sexualidade quanto a escolha religiosa são de âmbito pessoal, portanto nem o coletivo e nem o Estado podem intervir, da mesma forma que o individual não deve determinar o coletivo. Entretanto, a efetividade do capitalismo em gerar tais opressões e cerceamentos de liberdade está enraizada na realidade prática, na sociedade que necessita da exploração da maioria enquanto classe, e da manutenção dos estereótipos de gênero como um dos pilares da ordem social ideológica.

Qualquer tentativa de libertação deste sistema ou é fictícia para uma minoria detentora de poder, ou tem curto prazo – considerando que, principalmente em momentos de crise do sistema, presenciamos o retrocesso dos direitos e das pautas progressistas, na emergência de se assegurar a ideologia burguesa retrógrada, sobre a estrutura econômica em turbulência provocada pela luta de classes. Desta forma, somente com a derrubada deste sistema e a edificação do socialismo, as liberdades individuais serão plenas. Como diz Engels, a humanidade “passará do reino da necessidade para o reino da liberdade”.

Mas, para conquistar esse mundo novo, é preciso compreender que o problema é este sistema, que em sua profunda crise faz surgir os sinais de barbárie. O que pode impedir essa caminhada em direção ao desastre, e abrir uma saída, é a luta de classes, a luta da classe trabalhadora. Nossa arma é a organização e a unidade. Cada combate deve ter como finalidade a elevação do nível de consciência e organização da classe trabalhadora na luta contra o apodrecido capitalismo.

  • Contra todo tipo de opressão e discriminação!
  • Em defesa do Estado laico e dos direitos democráticos!
  • Por uma saúde, pública, gratuita e para todos, sem distinção ou restrição!

A seguridade social

Na obra Devolvam a Nossa Previdência, os autores, Luiz Bicalho e Serge Goulart, explicam:

A luta pela previdência está na origem dos esforços da classe operária para constituir-se em ‘classe para si’. É daí que surgem as primeiras organizações de classe. Os primeiros sindicatos nasceram das caixas de apoio mútuo, no qual os trabalhadores contribuíam para ajudar-se durante as crises ou acidentes individuais. Destas nasceram as conquistas da saúde pública e da previdência social baseada na solidariedade entre gerações[22].

Os trabalhadores do Brasil não têm interesses fundamentais diferentes dos trabalhadores do resto do mundo, pois se encontram igualmente sob a exploração capitalista e veem parte do fruto de seu trabalho sendo entregue, na forma de mais-valia – trabalho não pago – ao capitalista, ao patrão, ocorrendo processo igual, em sua essência, por todo o mundo. Da mesma forma, as mulheres trabalhadoras não têm interesses fundamentais diferentes dos homens trabalhadores, pois todos fazem parte da mesma classe, a classe explorada por uma minoria. Consideramos, porém, que existem necessidades e direitos próprios do sexo feminino que devem ser atendidos, enquanto necessidade de toda a classe trabalhadora para aumento da qualidade de vida e da condição de trabalho.

Desta forma, a luta pela previdência social, solidária e universal, é pauta a ser discutida e defendida também pelas mulheres trabalhadoras.

A origem da Seguridade Social encontra-se na classe trabalhadora organizando-se para manter-se e preservar-se, esta “Seguridade Operária inteiramente de responsabilidade do Estado, com a participação determinante dos trabalhadores em sua administração”[23] é também a origem da Previdência e Assistência Médico-Hospitalar Pública e Solidária.

No Brasil, as primeiras caixas de assistência foram organizadas pelos ferroviários e pelos trabalhadores dos correios. O surgimento destas duas organizações de Seguridade, de Proteção Social, foi o ponto de apoio para a multiplicação desta reivindicação e finalmente a reunião do conjunto destas organizações profissionais de socorro da classe numa só Previdência e Assistência nacional. (…) A Lei nº 1.711/52, ainda que a Carta de 1946 não o previsse, estabeleceu, pela primeira vez, diferenciações entre os sexos, atribuindo à mulher o direito à aposentadoria integral, voluntária, aos 30 anos de serviço[24].

A Previdência tem sofrido diferentes ataques. Um exemplo é a Emenda Constitucional 20, de 16 de Dezembro de 1998, quando o governo Fernando Henrique Cardoso substituiu o sistema de ‘tempo de serviço’ pelo ‘tempo de contribuição’, significando que a partir dali não bastava comprovar ter trabalhado, tinha que provar que contribuiu; implementou também o ‘fator previdenciário’ no final de 1999 que aumentou o tempo de contribuição em até 40%! O governo Lula aprofundou esses ataques à classe, atacando a previdência dos servidores, acabando com a paridade. E o governo Dilma, com a aprovação da MP 664, alterou as regras para o benefício de pensão por morte, limitando o recebimento do cônjuge ou companheiro segundo a expectativa de vida, ou seja, quanto mais jovem for o beneficiário, menos tempo receberá a pensão.

Vale lembrar que a aprovação dessa MP faz parte do pacote do ajuste fiscal, e ataca diretamente as viúvas. Faz parte da mesma lógica a aprovação da MP 665 – que aumenta o tempo de trabalho para ter acesso ao seguro desemprego, de 6 para 12 meses. Como justificativa foram utilizados casos de fraude, tanto no recebimento de pensões, como do seguro desemprego.

Mas a realidade é bem outra. Existem somente 30 mil pensões de mulheres jovens (menos de 30 anos). O que o governo Dilma fez foi deixar estas viúvas a sua própria sorte.

Já o aumento do tempo de trabalho para usufruto do seguro desemprego, visa dificultar o acesso a esse direito e, assim, poupar recursos do governo.

Ainda com a aprovação da MP 664, os senadores incluíram a fórmula 85/95, ou seja, para se aposentar passa a ser necessário que a soma de tempo de contribuição com a idade atinja 85 no caso das mulheres e 95 no caso dos homens. Essa alteração segue prejudicando a classe trabalhadora como um todo, assim como o fator previdenciário, pois quem entra no mercado de trabalho mais cedo, em geral filhos de trabalhadores, tem que trabalhar por mais tempo em relação aos que começam mais tarde.

Outra mudança em discussão é a instituição de uma idade mínima para aposentadoria de 65 anos para homens e mulheres. Estabelecer essa idade mínima já seria um grande retrocesso. Além disso, equiparar a idade entre homens e mulheres é abrir um ataque contra uma conquista. A dupla ou tripla jornada de trabalho da mulher leva a que esta esteja sem condições de trabalho antes que os homens. A diferença atual entre aposentadorias de homens e mulheres – 5 anos – é uma conquista que deve ser preservada, ao mesmo tempo em que se combate a própria dupla jornada feminina.

Devemos retomar os princípios fundamentais da luta pela previdência. E isso implica retomar a luta pela previdência universal e solidária, ou seja, a geração atual contribuindo para o conjunto dos aposentados e das aposentadas. Um sistema no qual os trabalhadores e trabalhadoras que não estão no mercado formal, por vários motivos impostos por essa sociedade injusta, tenham acesso a uma aposentadoria digna.

Além disso, somos contra o desvio da arrecadação previdenciária, com a utilização da falácia do rombo na previdência. Os “rombos” alegados pelos governantes estão, na verdade, à disposição para o pagamento da dívida pública, assim como para o financiamento de empreendimentos de empresas públicas e privadas. Clauber Santos Barros, acadêmico de Direito pela Universidade do Estado da Bahia – UNEB, explica:

Os estudiosos do tema (…) afirmam que as contas do governo em torno da existência do déficit da previdência se dá ignorando o processo de desvio de verbas deste instituto para financiar o pagamento de dívidas públicas. O problema em torno deste desvio nos faz efetuar uma análise a partir das décadas de 50 e 60 em que o governo retirou ou desviou da previdência uma grande soma de dinheiro para financiar a construção de Brasília, Transamazônia, Ponte Rio-Niterói, Itaipú e, dentre outras, Usinas Atômicas de Angra dos Reis. Após efetuar a tomada descrita, a União nunca repôs à previdência social o montante retirado (HORVATH JÚNIOR, 2010).

Segundo Salvador (2010) e Júnia (2011) o valor da dívida pública brasileira chega a casa de 1,9 trilhões de reais. Para amenizar a dívida o governo retira do orçamento público cerca de 30% da receita que deveria ser repassada para a seguridade social (SALVADOR, 2010). O processo de desmantelamento das contas que deveria destinar-se à seguridade social começa com a transferência desta arrecadação para a formação do superávit primário e atendimento das condições impostas por organismos internacionais por meio do, inicialmente denominado, Fundo Social de Emergência (FSE)”.

(…) o Estado mostra-se omisso na cobrança de dívidas que foram retiradas da previdência para favorecerem setores públicos e privados. Horvath Júnior (2010), cita, como exemplo, as inúmeras renúncias fiscais realizadas pelo poder público para beneficiar entidades beneficentes de assistência social, empregadores rurais de pessoa física, clubes de futebol profissional, segurados especiais, empregador doméstico e das empresas inscritas no simples. (…) Lopes (2010) (…)  informa que desde 1978 a 2010 o rombo da previdência teria chegado a casa de R$ 50 bilhões de reais, sem contudo tenha o governo informado quando havia deixado de repassar para este instituto[25].

Esta é a situação da utilização da previdência social, surgida e fundamentada na solidariedade entre a classe trabalhadora. O suposto estado deficitário provém da destinação para pagamento da dívida pública e da renúncia do Estado em realizar as cobranças de verbas de empresários, que deveriam ser aplicadas na previdência.

Diante do exposto, reivindicamos a garantia de que todos os trabalhadores e trabalhadoras se aposentem e possam enfim desfrutar de seu tempo de vida, após anos trabalhando para produzir a riqueza da sociedade.

  • Revogação das reformas da previdência de FHC, Lula e Dilma! Contra novas contrarreformas!
  • Previdência pública, solidária e universal!
  • Aposentadoria por tempo de trabalho para homens e mulheres!

A emancipação das mulheres

Milícia republicana no início da Guerra Civil Espanhola, homens e mulheres marcham lado a lado

Na luta pela emancipação das mulheres, pela igualdade de direitos e pela ampliação das conquistas existentes, demonstramos que não é possível dissociar as reivindicações transitórias da luta de classes e assumir uma perspectiva de classe significa lutar pela superação do atual sistema de produção, o sistema capitalista, pilar central e base que sustenta o machismo, a violência, o racismo e todas as diversas divisões na classe trabalhadora.

Entender isso profundamente é entender que a luta das mulheres, a luta contra a homofobia, a luta contra o racismo, não são lutas separadas, cada uma com a sua reivindicação e suas especificidades. Essas se unem com a perspectiva de classe, da classe trabalhadora.

Revolucionária Clara Zetkin

Como sintetizou a revolucionária alemã Clara Zetkin: “De mãos dadas com o homem de sua classe, a mulher proletária luta contra a sociedade capitalista”.

A luta das mulheres é pela ampliação dos direitos das mulheres trabalhadoras! A luta das mulheres é a luta pela superação da sociedade de classes! A luta das mulheres é a luta pelo socialismo!

[1] Documentos de fundação da IV Internacional: Congresso de 1938. São Paulo: Sundermann, 2008.

[2] ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do estado. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979.

[3] LENIN, V. I.A contribuição da mulher na construção do socialismo, 1956, Editorial Vitória. O Socialismo e a Emancipação da Mulher.

[4] Idem.

[5] ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do estado. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979.

[6] TROTSKY, L. Questões do modo de vida. São Paulo: Sundermann, 2009.

[7] Idem.

[8] Engels redefine para o tema de A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado, a citação do livro A Ideologia Alemã, escrito por ele e por Marx. Pg. 85, 3º Edição, Editora Escala.

[9] Dados da pesquisa de Esmeralda Blanco Bolsonaro de Moura em ‘‘Além da indústria têxtil: O trabalho fe­minino em atividades ‘masculinas’’’. Disponível em: <http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:-_ HMgp8FNeoJ:www.anpuh.org/arquivo/download%3FID_ARQUIVO%3D3851+&cd=5&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>

[10] Dados da pesquisa de Esmeralda Blanco Bolsonaro de Moura em ‘‘Além da indústria têxtil: O trabalho fe­minino em atividades ‘’masculinas’’’’ Disponível em: <http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:-_ HMgp8FNeoJ:www.anpuh.org/arquivo/download%3FID_ARQUIVO%3D3851+&cd=5&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>

[11] Antunes, Ricardo. Os Sentidos do Trabalho – Coleção: ‘O Mundo do Trabalho’. Pode ser verificado também em: Harvey, David. Do fordismo a acumulação flexível.

[12] Disponível em: http://www.dieese.org.br/analiseped/2013/2013pedmulhermet.pdf

[13] Disponível em: <http://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/05629-introd.pdf> Pg. 22

[14] Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/MapaViolencia_2015_mulheres.pdf

[15] Disponível em: <http://noticias.terra.com.br/mundo/violencia-contra-mulher/>

[16] Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/MapaViolencia_2015_mulheres.pdf

[17] Organização Mundial da Saúde

[18] Marx, Engels e Lênin. Sobre a Mulher. São Paulo: Global editora, 1980.

[19] Disponível em: < https://www.unodc.org/documents/lpo-brazil//noticias/2013/04/2013-04-08_Publicacao_diagnostico_ETP.pdf >

[20] Disponível em: <http://media.folha.uol.com.br/cotidiano/2010/10/06/mapeamento_de_pontos_de_exploracao_sexual-2009_2010.pdf>

[21] Dados disponíveis em: <http://www.sdh.gov.br/assuntos/lgbt/pdf/relatorio-violencia-homofobica-ano-2012>Acesso em 19/07/15.

[22] Bicalho, Luiz e Goulart, Serge. Devolvam Nossa Previdência.

[23] Idem Pág. 26.

[24] Idem, Pág. 26.

[25] Disponível em: <http://marcelopintodarocha.jusbrasil.com.br/artigos/140552900/o-deficit-da-previdencia-desvio-de-recursos-e-os-impactos-sociais-no-processo-de-gestao-dos-fundos-da-seguridade-social>

Documento publicado em duas partes na revista América Socialista, nas edições de abril e outubro de 2016.