Foto: Isac Nóbrega

Quem é e o que defende o atual ministro da Educação?

Artigo publicado no jornal Foice&Martelo Especial nº 11, de 23 de julho de 2020. CONFIRA A EDIÇÃO COMPLETA.

Após um período de impasse sobre quem seria o novo ministro da Educação, Bolsonaro decide nomear Milton Ribeiro, pastor presbiteriano e membro do conselho deliberativo da mantenedora da Universidade Mackenzie, instituição em que já ocupou o cargo de vice-reitor. Alguns setores, especialmente da burguesia que atua no campo da educação, queriam um ministro menos polêmico e que colocasse em marcha o programa de privatização e destruição da educação pública. Por esse motivo, nomes como o de Renato Feder, que não emplacou, foram cogitados. Bolsonaro perseguiu um perfil que se alinhasse ideologicamente às suas posições, que possuísse uma autoridade acadêmica com vínculo a alguma instituição de ensino e que, ao mesmo tempo, agradasse à burguesia. Foram esses elementos que determinaram a indicação do novo ministro da educação.

A imprensa, logo após a confirmação, divulgou uma série de vídeos de Milton Ribeiro manifestando o que pensa sobre a educação de crianças, as famílias e as universidades. Como veremos abaixo, uma enxurrada de declarações pré-iluministas, preconceituosas e que não guardam relação alguma com a realidade.

Em uma de suas pregações, o atual ministro aborda da seguinte forma a educação das crianças: “Não estou aqui dando uma aula de espancamento infantil, mas a vara da disciplina não pode ser afastada da nossa casa”. “Talvez uma porcentagem de crianças muito pequenas, de criança precoce, superdotada, é que vai entender o seu argumento. Deve haver rigor, desculpe, severidade. E vou dar um passo a mais, talvez algumas mães até fiquem com raiva de mim: devem sentir dor”[1]. Para Milton Ribeiro, a maioria das crianças é incapaz de compreender orientações e argumentos racionais e, para incorporar ensinamentos de forma adequada, devem sentir dor. A violência no lugar da educação. O castigo físico no lugar do diálogo. Esperamos que essa declaração medieval, desprovida de qualquer base científica, não se transforme em política educacional do atual governo e que os livros não sejam substituídos por varinhas de marmelo.

Já sobre as famílias, faz uma declaração que mistura ignorância e preconceito. Vejamos: “Quando eu vejo a massa de orientação daqueles que ensinam nossos filhos nas escolas. Tem escolas que não tem Dia das Mães e Dia dos Pais. Em algumas escolas, se fala até de casamento gay com os meninos, com as crianças. Aqueles que deveriam defender os princípios éticos são os mesmos que atacam a nossa nação”[2]. As escolas que não adotam mais o Dia das Mães e/ou Dia dos Pais o fazem porque reconhecem que o ambiente educacional deve primar pelo acolhimento, carinho e não pela exclusão e ampliação de traumas. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há 5,5 milhões de crianças brasileiras sem o nome do pai na certidão de nascimento[3]. Sem falar nas crianças que são registradas pelo pai, porém não possuem qualquer tipo de vínculo afetivo por serem criadas exclusivamente pela mãe e/ou avós. Além disso, as escolas abordam a temática da diversidade porque partem da compreensão de que todos devem possuir direitos iguais e serem respeitados. Fazer isso é uma forma de diminuir o preconceito e a violência, afinal, o Brasil é um dos países que mais mata pessoas LGBT no mundo. Só não percebe essa barbárie quem está contaminado por uma mentalidade medieval e reacionária.

O pastor e agora ministro também afirma que as universidades estimulam a “prática sexual sem limites[4]. Trata-se de uma postura que busca desprestigiar, estimular preconceitos e afastar preventivamente seus seguidores do conhecimento científico produzido e difundido pelas universidades. A finalidade do recurso retórico utilizado por Milton Ribeiro fica mais clara quando observamos a postura da Mackenzie, instituição da qual o novo ministro faz parte, diante da comunidade científica. A Mackenzie é famosa por difundir, realizar eventos e ensinar o criacionismo em suas escolas e universidades. Na atualidade, o criacionismo é promovido com o nome de “Intelligent design” na tentativa de incorporar uma denominação mais plausível. O mais interessante é que esse tipo de movimento se difunde no Brasil e no mundo especialmente após as descobertas do genoma humano, que refuta por completo a tese criacionista. O atual presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Benedito Guimarães Aguiar Neto, também ligado à Mackenzie, apresentou tal pensamento da seguinte forma: “Queremos colocar um contraponto à Teoria da Evolução e disseminar que a ideia da existência de um design inteligente pode estar presente a partir da educação básica, de uma maneira que podemos, com argumentos científicos, discutir o criacionismo”[5]. O atual ministro da educação e o presidente da Capes buscam difundir uma interpretação mística e medieval sobre a realidade e não podem obter sucesso nessa empreitada sem atacar violentamente as universidades, que são, por excelência, um ambiente de produção e difusão de ciência. Esse é o sentido geral da declaração de Milton Ribeiro sobre as universidades.

O capitalismo em sua etapa senil, diante da incapacidade de continuar desenvolvendo as forças produtivas, começa a retornar à sua infância e promove, mesmo diante de descobertas científicas que abrem as condições para uma sociedade, uma brutal regressão intelectual e cultural. Essa dinâmica fica mais exposta quando se trata das declarações de um ministro que faz parte de um governo que despreza a educação, a ciência e coloca os estudantes e trabalhadores das escolas e universidades como inimigos que devem ser abatidos. Milton Ribeiro é a cara do governo Bolsonaro, manifesta o pensamento do setor mais reacionário da burguesia e buscará colocar em marcha as posições e políticas defendidas por seus antecessores. Somente a ação independente dos trabalhadores e da juventude é capaz de defender a educação, a ciência e colocar Bolsonaro e seus asseclas ministeriais na lata do lixo da história.

[1] https://congressoemfoco.uol.com.br/educacao/congresso-quer-ouvir-novo-ministro-da-educacao-sobre-declaracoes-polemicas/

[2] Idem.

[3] https://www.huffpostbrasil.com/2018/09/18/7-numeros-da-realidade-das-mulheres-que-criam-filhos-sozinhas-no-brasil_a_23531388/

[4] https://congressoemfoco.uol.com.br/educacao/congresso-quer-ouvir-novo-ministro-da-educacao-sobre-declaracoes-polemicas/

[5] https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2020/01/28/novo-presidente-da-capes-gera-polemica-ao-defender-criacionismo.ghtml