Fachada do Ministério do Planejamento, em Brasília Crédito: Gleice Mere/ASCOM/Ministério do Planejamento

Tribunais raciais em ação no Brasil

A CBN publicou em seu site no dia 3 de março uma matéria mostrando que candidatos negros para vaga por cotas na Universidade de Brasília deixaram de ser negros para vagas por cotas em concurso para ser servidor público. Como isto aconteceu? Para isto é preciso explicar um pouco o sistema de cotas e o seu objetivo.

O racismo é uma instituição que tem o seu nascimento no século XIX. Mas Estados que se baseiam na diferença racial para definirem direitos diferentes existem poucos. Se o mundo conheceu e lutou para que o regime racista da África do Sul fosse derrotado, é preciso reconhecer que este não é o único regime racista que o mundo conheceu.

Nos séculos XIX e XX, a burguesia inglesa foi mestre em dividir os povos coloniais, usando as divisões raciais como forma de separar povos e garantir a “supremacia” branca, na verdade a supremacia do capital inglês. Para os brancos pobres, estava reservada a obrigação do trabalho, e quando este não era conseguido, seus filhos podiam ser roubados e inclusive escravizados nas colônias (ver o filme Oranges and Sunshine, dirigido por Jim Loach e estrelado por Emily Watson).

Além dos regimes de supremacia branca direta, o capital inglês manteve na Índia toda a divisão em castas. Com a independência, os “novos” governantes, educados pela burguesia inglesa, introduziram o sistema de cotas para “beneficiar” as castas “menos privilegiadas” e permitir a elas um pouco de melhorias. Até hoje a Índia continua com centenas de milhões de pessoas na miséria, mas tem toda uma “elite” que nasceu das castas mais pobres e dirige diversos estados e ocupa cargos no governo federal. Mas a vida da maioria continua igual, na miséria e na fome.

O “êxito” deste sistema levou a Fundação Ford a propor e conseguir que o governo Nixon, um dos governos mais à direita dos EUA, organizasse um sistema de cotas para negros nas universidades e inclusive nas empresas, para tornar todos “mais coloridos”. Esse sistema foi combinado com um período de dura repressão, de assassinatos de líderes negros (Malcon X, Martin Luther King, etc.) e da prisão e morte da maioria dos dirigentes do Partido dos Panteras Negros. Uma vez conhecendo o sucesso no maior país imperialista, ele foi exportado para outros países. Um desses foi o Brasil, onde a Fundação Ford pagou e paga milhares de bolsistas, pesquisas, trabalhos e livros para divulgar a “cultura Africana” e o sistema de cotas.

Para a maioria dos negros, que estão sendo assassinados no seu dia a dia, que são a maioria absoluta dos 60 mil que morrem por balas nos morros, favelas e campos deste país, este sistema pouco importa. Os últimos dados das universidades inclusive mostram que as notas de corte para alunos cotistas e alunos não cotistas hoje estão quase iguais, com milésimos somente de diferença. Se tem algo de positivo que o sistema mostrou foi que negros e brancos compartilham da mesma inteligência e cultura, ainda que o ENEM signifique muito pouco como “teste de inteligência ou de cultura” (como a maioria absoluta dos testes, aliás, não existe teste que meça inteligência).

A Esquerda Marxista combate decididamente o racismo e lamenta profundamente o drama dos dois jovens que perderam o seu emprego numa situação difícil como agora, aonde um emprego público pode significar a diferença entre uma vida digna e a miséria absoluta. Aliás, o cúmulo do burocratismo, o mesmo órgão que aprovou a sua entrada na universidade pelo sistema de cotas também decidiu que eles não poderiam continuar no emprego público por que não eram negros.

O absurdo da situação mostra bem a que veio o sistema de cotas: não resolveu o problema, cria falsas expectativas num pais aonde quase metade (48%) dos trabalhadores começou a trabalhar com menos de 14 anos (!) e criou um sistema de tribunais raciais. Neles os donos do poder, da ciência e da razão decidem quem pertence a uma raça ou outra. Tudo o que a ciência fez para acabar com uma classificação que não tem nenhum amparo na biologia, o sistema de cotas traz de volta.

Os nazistas penhoradamente agradecem a estes tribunais raciais e caso um governo racista chegue ao poder (nossa, o que é mesmo o governo Temer?) ele saberá utilizar isso de uma forma bem diferente. Afinal, a propaganda do PMDB que está sendo feito nas redes sociais (ou faz a reforma da previdência ou acaba com a bolsa família) mostra bem o que teremos para a frente.

Devemos colocar as seguintes bandeiras para discussão para todos os trabalhadores e jovens:

– Vagas para todos nas universidades, nenhum tribunal racial para decidir quem entra ou sai.

– Estabilidade no emprego, estatização sob controle dos trabalhadores de toda empresa que demita.

– Obras públicas que garantam emprego para todos os desempregados – construir e fazer funcionar escolas, hospitais, universidades, estradas – ao invés de pagar a dívida.