Governo Bolsonaro e o não combate à pandemia

Artigo publicado no jornal Foice&Martelo Especial nº 21, de 10 de dezembro de 2020. CONFIRA A EDIÇÃO COMPLETA.

Vidas trabalhadoras importam. Mas não para o capitalismo e os governos de defesa deste sistema. Enquanto o Brasil vai se aproximando rapidamente do número oficial de 180 mil mortos por Covid-19, lemos nos jornais que o governo federal pode ter que jogar fora 6,8 milhões de testes perto da validade e que não executou o orçamento aprovado para gastos contra a pandemia. Não bastasse, Bolsonaro ainda não tem um plano para a vacinação da população em 2021. 

Em meio à segunda onda da pandemia (ou repique, já que no Brasil os números não chegaram a baixar significativamente), o ministro da Saúde, Eduardo Pazzuelo, declarou que não considera que seja o momento de endurecer restrições e reforçar a testagem. Bolsonaro e outros integrantes do governo têm se manifestado publicamente contra os riscos e as medidas de isolamento.

Em novembro, de acordo com o Estado de S. Paulo, o Ministério da Saúde só pensava em agir quando houvesse “alta consistente no número de mortes”. Em 8 de dezembro, quanto este texto foi escrito, o país voltou a registrar quase 800 mortes em um único dia, uma variação de +31% em relação há 14 dias. Se essas ainda não são mortes o suficiente, quantas seriam? 

Além disso, a consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados listou pelo menos dez ações de combate à pandemia da gestão Bolsonaro que não avançaram, apesar da abertura imediata de créditos extraordinários por meio de uma série de medidas provisórias. Ou seja, ele não gastou o dinheiro liberado para contratar médicos, reestruturar hospitais, comprar testes de Covid-19 para presídios e fomentar agricultura familiar para doação de alimentos.

Uma MP de maio, por exemplo, destinava dinheiro para a contratação de 5 mil médicos para atuar em áreas mais impactadas pela pandemia. No entanto, até 20 de novembro, apenas 4,6% do recurso tinha sido gasto. 

Para reestruturar os prédios dos hospitais universitários para a abertura de novos leitos, havia a liberação de R$ 70 milhões desde abril, mas apenas R$ 17,1 milhões foram usados. Para os presídios brasileiros, onde se alastram contaminações e mortes de detentos e agentes penitenciários, foram autorizados R$ 17,2 milhões e efetivamente pagos apenas R$ 2,4 mil.

A lista de ações não realizadas continua e Bolsonaro joga a culpa nos estados, que, segundo ele, não solicitaram. É a mesma desculpa utilizada para justificar os 6,86 milhões de testes que perdem a validade entre dezembro deste ano e janeiro de 2021 em um armazém do governo federal em Guarulhos. 

Para se ter ideia do que significa essa perda, o SUS aplicou 5 milhões de testes deste tipo até o momento. Ou seja, podem acabar sendo jogados fora mais exames do que foram realizados até agora. 

A vacina, por sua vez, segue sendo usada como uma disputa política e comercial entre diversos grupos privados capitalistas e os governos que os representam. Esta semana, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que tenta se construir para as eleições de 2022, anunciou o início da vacinação no estado para 25 de janeiro, usando a Coronavac — imunizante fruto da parceria entre o Instituto Butantã e a chinesa Sinovac.

Isso fez com que Bolsonaro corresse declarar que o governo federal ofertará vacina contra a Covid-19 a toda a população de “forma gratuita e não obrigatória”. 

Os demais governadores também pressionam Bolsonaro para que qualquer vacina com comprovação científica seja permitida. Além da pressão do assédio regional dos grupos farmacêuticos, os governadores também se veem em uma situação politicamente complicada, porque é neles que a bomba pode estourar ainda mais rapidamente. 

Mas Pazzuelo declarou que apenas as vacinas certificadas pela Anvisa – sob controle do governo federal – poderão ser dadas aos brasileiros e que a responsabilidade sobre um plano de vacinação nacional é do governo federal. 

Reunião dos governadores para discutir vacinação da Covid-19 /Foto: Aurélio Pereira

Este controle não estaria errado, mas é preciso lembrar que o mesmo Bolsonaro que “vai com calma” na hora de discutir vacina, é o que voltou a declarar neste dia 8 de dezembro que as escolas não deveriam ter sido fechadas durante a pandemia. É o mesmo que defende o trabalho e o funcionamento da economia acima de tudo, que criticou a reduzidíssima quarentena no Brasil e que já demostrou inúmeras vezes seu desprezo à ciência e à vida dos trabalhadores. 

A realidade é que a próxima grande luta da classe trabalhadora do Brasil e do mundo será pelo direito à vacinação e que ela não será plenamente garantida sem grandes embates. Para se ter uma ideia, vacinas como a Pfizer e Sputnik V têm uma eficácia de 90% e esse número significa que é necessário imunizar no mínimo 56% da população para estabilizar a epidemia, e uma porcentagem ainda maior para suprimi-la. Mas vacinar mais da metade da população brasileira (ou do mundo) não é uma tarefa fácil no capitalismo, com sua sanha pelo lucro, seus governos subordinados aos interesses econômicos e as limitações dos Estados nacionais. 

A luta pela preservação da própria humanidade segue dependente da capacidade de organização e de uma revolução pela classe operária. Neste processo, os trabalhadores precisarão forjar novas direções políticas e passar por cima das direções traidoras, que veem a tudo o que acontece totalmente mudas. 

Este é o combate da Esquerda Marxista. Junte-se a nós.