Sobre as cotas raciais

As cotas raciais, teoricamente, são medidas que tem como objetivo combater discriminações étnicas, raciais, religiosas, de gênero ou de classe, aumentando a participação dessas “minorias” no processo político, acesso à saúde, educação, bens materiais, redes de proteção social e/ou no reconhecimento popular. Mas, o que são realmente?

 

Para começar a falar sobre a questão das cotas raciais, primeiro é importante entender um pouco mais sobre elas. As cotas raciais são políticas afirmativas; políticas afirmativas ou ações afirmativas são medidas criadas pelo estado que alocam recursos às pessoas pertencentes a grupos sociais discriminados pela exclusão sócia econômicos no passado ou no presente. Teoricamente são medidas que tem como objetivo combater discriminações étnicas, raciais, religiosas, de gênero ou de classe, aumentando a participação dessas “minorias” no processo político, acesso à saúde, educação, bens materiais, redes de proteção social e/ou no reconhecimento popular.

Começou-se a falar de cotas raciais no Brasil no ano 2000, quando universidades e órgãos públicos, decidiram usá-las em vestibulares e concursos, mas só 4 anos depois em 2004 que de fato essa ideia foi posta em prática e a primeira universidade que adotou o sistema de cota raciais foi a (UNB) universidade de Brasília. De lá para cá mais e mais universidades vem adotando esse sistema, mas isso não garante que jovens considerados negros possam entrar na universidade, infelizmente ainda a maioria massiva dos jovens que frequentam a universidade são brancos.

Segundo o IBGE a porcentagem de jovens que ingressam na universidade aumentou de 27% de 51% nos últimos 10 anos, ainda de acordo com o IBGE o número de jovens considerados negros que ingressaram na universidade aumentou de 10,2% para 35,8%.

Mesmo tendo aumentado o número de jovens considerados negros e pardos nas universidades, infelizmente ele não supera o índice alcançado por jovens brancos 10 anos antes que foi de 39,6%. Hoje o número de jovens brancos nas universidades é de 65,7%. O restante de 34,3% de é de jovens considerados pelo IBGE (negros, pardos, indígenas e/ou de outras raças e etnias).

Contando que o Brasil possui uma diversidade antropológica cultural e social muito vasta e que a maior a parte da população é formada por pessoas classificadas pelo IBGE como negras, pardas e indígenas.

É importante ter em mente que as cotas raciais não criam o racismo, mas alimentam o racismo e dividem a classe trabalhadora porque transformam a ideia de raça em uma entidade jurídica, e uma lei de caráter social. Ou seja, cria uma competição entre os trabalhadores. Os trabalhadores que não são contemplados pelas cotas por não atingirem os requisitos, e que seus filhos ou eles próprios não podem se matricular numa universidade por exemplo, obviamente por não haver vagas para todos, se sentem enganados, injustiçados pelos próprios trabalhadores que tiveram uma oportunidade através das cotas, e não pelo sistema e suas contradições.

A lei das cotas raciais, além de acirrar a competição entre os trabalhadores, oficializa o racismo como uma opressão a ser pensada e resolvida de modo completamente separado da luta de classes.

Por isso não queremos cotas, queremos todos os jovens negros na universidade, sem nenhuma exclusão. O estado cria universidades públicas e de qualidade, mas quem as frequenta são os filhos da burguesia, e dentre dessa minoria estão alguns poucos jovens que foram contemplados pelas cotas e puderam ingressar na universidade. Mas como citei acima, ainda é muito pequeno o número de jovens considerados negros que frequentam a universidade em relação ao número de jovens brancos.

O racismo não é uma forma de opressão separada da luta de classes. Ele surgiu como um instrumento de dominação da classe dominante na época da escravidão moderna e foi herdado pela classe capitalista, que continua usando esse instrumento e trata de conservá-lo.

É uma verdade histórica que a noção de raça surgiu apenas depois da escravidão moderna e foi inventada e construída, para justificar a escravidão, com uma ideologia totalmente falsa de superioridade racial. No Brasil na época da escravidão, os europeus e senhores de escravos se consideravam intelectualmente superiores aos escravos vindos da África, e usavam a cor da pele para justificar essa superioridade, e por vez usavam essa superioridade como argumento para que a escravidão não se tornasse tão chocante e até natural. Os negros não eram considerados pessoas, apenas uma força de trabalho, semelhante a máquinas ou animais, não possuíam direto algum.

A ideia de raça não tem significado cultural, e também não tem significado biológico, pois existe uma enorme variação de características físicas entre os seres humanos que tem pele branca, assim como entre os que tem pele negra, variação que não é menor do que entre os que tem cor da pele diferente uns dos outros, de modo que a escolha da cor da pele como uma entidade social é uma ideia totalmente artificial e arbitrária, construída e imposta pela classe dominante ao longo da história, com o único objetivo de consolidar seu domínio e enfraquecer a luta dos oprimidos por sua emancipação social.

O racismo é uma realidade social no Brasil e em outros países, principalmente aqueles que sofreram séculos de regime de escravidão. A origem histórica do racismo contra as pessoas consideradas negras ou contra os não brancos deve ser enfatizada, para demonstrar o papel no racismo nos dias de hoje. O racismo não é apenas uma sequela da sociedade pré-capitalista; mas sim um instrumento para manter a escravidão assalariada de todos os trabalhadores, não importa a cor da pele. O racismo do ponto de vista da burguesia é interessante, pois o regime trabalhista atual é de semiescravidão , as rotinas de trabalho são exaustivas e os direitos são mínimos, os trabalhadores são escravos dentro das fábricas e escravos do sistema, mas ainda é necessário que eles sejam mais oprimidos para que não tenham vontade de lutar pelos seus direitos, e é ai que entra o racismo, os trabalhadores de origem africana os considerados negros e pardos acabam recebendo menos que os trabalhadores brancos, por outro lado esses trabalhadores são “beneficiados” pelas cotas e por outras políticas afirmativas; Desse modo cria uma separação injusta entre os trabalhadores, determinada apenas pela cor da sua pele e por algumas características físicas , e essa separação é percebida pelos trabalhadores e cria divergências entre eles. Assim o capitalismo garante sua manutenção através da segregação e da opressão.

O racismo, mas não só o racismo, mas também a homofobia, o machismo e qualquer tipo de opressão só serão efetivamente superados com a união da classe trabalhadora, união que só pode se dar por meio da luta árdua e concreta contra o sistema capitalista, e com a abolição das classes sociais, na construção e consolidação de uma sociedade socialista. Trata-se de um processo histórico, na qual o indivíduo vai aprender na teoria e na prática, que a sua única essência está na riqueza das suas relações sociais, e que pouco importa a cor da pele.

Como Marx explicou, a propriedade comunal em sua forma comunal espontânea é a relação original entre o indivíduo e suas condições de existência e a propriedade privada é de forma essencial uma relação social exclusiva, na qual alguns indivíduos acabaram negando suas relações originais em favor da exclusão de outros indivíduos. A propriedade privada surgiu do fim da propriedade comunal tribal e é resultado do desenvolvimento das forças produtivas e, portanto, do desenvolvimento de algumas necessidades que iam além dos limites das relações de dependência pessoal; O desenvolvimento da propriedade privada, fazem parte do mesmo processo histórico contraditório que elevou o capitalismo ao seu máximo. A propriedade privada não é uma consequência direta do desenvolvimento das forças produtivas, e sim dos limites estreitos das relações sociais originais, e em razão desses limites e do modo inconsciente e espontâneo que eles foram ultrapassados. No capitalismo com a formação do mercado mundial, esses limites foram ultrapassados, somente para serem reproduzidos da na forma degenerada da propriedade privada capitalista.

Por fim, obviamente o dinheiro e o racismo são coisas diferentes, mas ligadas entre si, assim como o dinheiro é a forma e o resultado das relações comunais degeneradas, em menor escala o racismo é a forma degenerada das velhas rivalidades tribais e étnicas que existiam muito antes da emergência das classes sociais. Na sociedade comunista, nem o dinheiro nem o racismo poderão existir, pois nem um, nem outro permanecerá quando todos os limites, objetivos e subjetivos da propriedade privada forem superados.

Dados de 2011

http://2.bp.blogspot.com/-eul_z5gjvWY/VhLLfv3UYMI/AAAAAAAAcJo/ff-foEq03v8/s400/imagem%2B1.png

Dados 2013

A expansão de matrículas no ensino superior nos últimos dez anos fez com que a porcentagem de brasileiros de 18 a 24 anos matriculados em uma universidade ou faculdade subisse de 32,9%, em 2004, para 55% em 2013, segundo dados divulgados nesta quarta-feira (17) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Mas o recorte racial mostra que esse crescimento foi desigual. Em 2013, 40,7% dos negros de 18 a 24 estavam no ensino superior. Já entre o grupo de brancos da mesma idade, 69,4% estavam matriculados em cursos de graduação no ano passado.

As novas estatísticas do IBGE, levantadas a partir de cruzamento de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio de 2013, mostram que, no ano passado, os jovens que se autodenominam pretos ou pardos não conseguiram superar a taxa de matrícula no ensino superior registrada pelos jovens brancos dez anos antes, em 2004. Em 2013, segundo a Pnad, o Brasil tinha mais jovens de 18 a 24 anos pretos e pardos no ensino médio do que no superior.

Deve-se continuar a luta por uma educação pública, gratuita e para todos, com todos os jovens negros dentro das universidades e que se tenha uma mudança real na sociedade, onde tenhamos “um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”(Rosa Luxemburgo).

*Ariele Efting é militante da Esquerda Marxista e do Movimento Negro Socialista – MNS