Os atentados em Santa Catarina e o problema da Segurança Pública

As ondas de ‘atentados’ em Santa Catarina que somam 97 casos de protestos com queimas de ônibus, carros e incêndios trazem à tona o debate da segurança pública em todo estado. O governo estadual fingiu-se desentendido e afirmava que os ataques violentos não teriam ligação com os presídios e a situação calamitosa do sistema prisional catarinense.

As ondas de ‘atentados’ em Santa Catarina que somam 97 casos de protestos com queimas de ônibus, carros e incêndios trazem à tona o debate da segurança pública em todo estado. O governo estadual fingiu-se desentendido e afirmava que os ataques violentos não teriam ligação com os presídios e a situação calamitosa do sistema prisional catarinense.

As reproduções em redes sociais e as denúncias promovidas por ‘agentes secretos’ dos presídios escancararam a violência aplicada aos detentos das sedes prisionais superlotadas. Os abusos das autoridades presidiárias revelaram cenas de torturas físicas em demonstração rasa do regime criminal desenvolvido pelo aparato repressivo do estado. A população catarinense, refém deste jogo criminoso, acabou sendo diariamente prejudicada com as reduções dos horários de ônibus, pois os governos municipais prontamente atenderam ao ‘pedido luxuoso’ das empresas que exploram o serviço de transporte público e reclamam prejuízos por conta dos atentados.

Com a política de terror instalada, embora o governo estadual tenha declarado nacionalmente que a situação estaria sobre controle e não haveria necessidade de intervenção federal, as forças nacionais se adiantam e criam medidas ofensivas para frear os ataques em ações de ‘sigilo’ prevendo as transferências dos líderes do dito PGC (Primeiro Grupo Catarinense) para o sistema penitenciário federal. Os Conselhos de Segurança (CONSEG) motivam reuniões nas comunidades para cobrar o fortalecimento das forças repressivas e ‘promover segurança pública’.

Porém, o caos instaurado, embora retrate uma janela muito comprimida da situação atual do sistema prisional do país, revela a face do verdadeiro criminoso, aliás, bem diferente da imagem de ‘delinquente’ historicamente construída pela criminologia positivista que domina o sistema penal brasileiro. Afinal, a massa carcerária da letal política criminal, profundamente seletiva e classista, legitima a sustentação do sistema capitalista. E sob a égide do capitalismo e seus instrumentos de repressão, não há como sustentar qualquer política de segurança pública em favor da população, tampouco promover programas efetivos de prevenção à violência sem considerar o fator classe como alvo determinante.  

A legitimação de políticas criminais mais repressivas serve para consolidar a intencional separação da sociedade em dois grupos bem definidos: os “bons” e os “maus” que devem ser separados dos primeiros em nome da ‘paz social’. Evidentemente, tal separação é sustentada pelo antagonismo de classes próprio do sistema capitalista. A ideologia burguesa promove a ilusão da defesa social legitimando a aplicação do poder punitivo por parte do Estado com a finalidade de “proteger” a sociedade do crime.   Entretanto, o avanço da violência através do crime organizado revela que a tradicional ideologia legitimadora da pena (reeducação) é uma farsa. Não há nada de novo nesta afirmação, porém, ela invoca a necessidade de relacionar os sistemas punitivos concretos às exigências próprias do modo de produção capitalista. Nesta ótica, com o caos estabelecido, avançam as discussões de privatização do sistema penal e do trabalho nos presídios.

Os meios de comunicação, utilizados como instrumentos do sistema, intensificam a ideologia burguesa impregnada, motivam o poderio repressor do estado e invocam medidas de violência extrema como a pena de morte, a redução da idade penal, o toque de recolher, etc. O capitalismo instrumentalizou o sistema penal e necessita dele para conter o exército de trabalhadores obrigados a vender a força de trabalho sob condições cada vez mais precárias, pois na sociedade capitalista, o sistema penitenciário depende, sobretudo, do desenvolvimento do mercado de trabalho. Para isso, o estado burguês enrijece seus mecanismos de repressão, impulsionando a criminalização de forma cada vez mais ostensiva, visando proteger os interesses dos grandes proprietários do capital.

Em análise, na Crítica do programa de Gotha, Marx denunciou o direito burguês como direito desigual, explicitando como essa igualdade formal encobre a desigualdade substancial existente entre proletários, que são obrigados a vender sua força de trabalho para sobreviver a partir da expropriação dos meios de vida por parte dos capitalistas. O caráter ideológico do direito penal além de não ser igual, nem defender os interesses de todos, não pode apresentar soluções aos problemas de grande envergadura como o da segurança pública ou do aumento da criminalidade. Além disso, o direito penal funciona exatamente para o que deve funcionar. É o braço jurídico/estatal que cumpre sua função de forma exemplar, pois criminaliza a massa de reserva impondo controle absoluto e não dando outra opção além da completa dependência do aparelho de poder estatal.

O capitalismo somente pode manter-se aplicando medidas criminosas de repressão e pouco ‘precisa’ fazer para conter a violência do crime organizado e a superlotação nos presídios do país. A luta por segurança pública não se contenta com a ‘reforma’ de presídios e o reforço no poder repressivo estatal, que inflama os incêndios do crime organizado, desarma a população e instrumentaliza o sistema carcerário para proteger e assegurar os interesses dos capitalistas. O combate ao sistema criminoso que é o capitalismo se dá no campo de guerra da luta de classes, onde o extermínio de trabalhadores ocorre a cada gota de sangue extraída para sustentar o lucro da burguesia capitalista. E as armas da grande massa de trabalhadores é a retomada de seus instrumentos de organização, na luta contra toda forma de violência e exploração que sustenta as estruturas podres do sistema capitalista.