O STF no meio do caminho

O STF ficou no meio do caminho e, com isso, desagradou a gregos e troianos. Mas, antes de tudo, desagradou a burguesia. Afinal, o único poder que estava mantendo alguma legitimidade, em meio à desagregação moral e política do Executivo e do Legislativo, cada vez mais mostra seus limites.

A Constituição Federal de 1988 foi um compromisso. Um compromisso entre classes antagônicas, no qual o PT votou contra mas no final assinou. O resultado foram quase 30 anos de luta de classes enquadrados por esse compromisso. Sim, em diversos momentos, como na luta pelo “Fora Collor” que o PT demorou a assumir e agora renega, a CF 88 quase foi rasgada e pisoteada pelas massas. Mas o seu fim foi encontrado com o prolongamento da crise de 2008. A crise econômica, para ser superada, exige que alguém pague. E a burguesia quer fazer a classe trabalhadora pagar, com suor e sangue e principalmente rasgando seus direitos.

A decorrência direta disso é o fim do pacto que a CF 88 garantia, dos anos de “paz social”. Decorrem daí as medidas do segundo governo Dilma, de rasgar suas promessas e atacar diretamente os trabalhadores (a vaca tossiu e os direitos das pensionistas foram reduzidos, o direito ao seguro desemprego foi reduzido etc.) e agora com Temer os ataques foram acelerados – Reforma Trabalhista, Reforma da Previdência.

Fazem parte desta situação a Lava Jato e a tentativa de limpar o sistema político de sua corrupção mais custosa, substituindo o aparato “político” pelos “novos”. A questão é que isso só se faz com traumas e a crise política que hoje assistimos é parte desses traumas. O esgarçamento político que decorre daí, o papel protagonista que assume o STF, a sua conversão em um “poder moderador” que dirime as dúvidas políticas e sobretudo legisla quando o Congresso não consegue fazê-lo, tudo isso também é colocado em dúvida e o caráter mesquinho e de cultura de botequim pé-sujo é exposto ao país inteiro nos embates entre os digníssimos ministros.

É nessa situação de crise que a presidente do STF colocou em julgamento um pedido de habeas corpus preventivo (uma prevenção contra uma prisão arbitrária) de Lula, ao invés de colocar em votação uma questão geral que teria consequências também no caso Lula. A ministra tentava, segundo todos os jornais, constranger os que queriam mudar a jurisprudência sobre prisões atraindo o foco para um caso particular e totalmente político. O problema é que tiros como esse podem sair pela culatra e esse saiu.

A maioria decidiu que Lula deveria ter o habeas corpus julgado contra a posição do relator. E depois concedeu uma isenção contra a prisão enquanto o caso todo não for a julgamento. Em outras palavras, uma meia sola e como toda meia sola bem contestada. E não se sabe se o próximo dia desse julgamento será na data marcada de 4 de abril, porque podem ocorrer viagens de ministros.

Tudo em suspenso. Enquanto isso o aparato repressivo e a própria justiça são colocados em questão com o assassinato de Marielle. Uma campanha internacional é desencadeada – e nós apoiamos – pedindo uma apuração independente.

E para todos aqueles que reclamam que só os ricos têm direitos, lembramos que isso continua sendo a verdade.  Uma boa parcela dos presos do país nunca chegou a ver um juiz, e daqueles que os viram, a maioria dos juízes simplesmente acreditou nos policiais que têm fé publica e não prestou atenção nas testemunhas dos réus. Isso sem contar os que são simplesmente executados nos morros e favelas sem direito a defesa, nem a prisão.

Este pais precisa de uma revolução que sacuda todas estas instituições podres e construa outras. E o povo nas ruas e favelas estaria muito melhor atendido em segurança se construísse comitês de autodefesa que garantissem a sua segurança contra traficantes e policiais.