Foto: LIA BIANCHIN

O movimento #EleNão, os atos e o que fazer

Este artigo foi originalmente publicado no Foice&Martelo, publicação que analisa a situação política nacional e internacional de um ponto de vista marxista e das tarefas revolucionárias. Conheça o jornal, assine e tenha acesso exclusivo ao conteúdo completo do número vigente e ao acervo de edições. Confira a edição em vigor.

“A verdadeira educação das massas não pode nunca ser separada de uma luta política independente e sobretudo da luta revolucionária das próprias massas. Só a ação educa a classe explorada, só ela lhe dá a medida das suas forças, alarga o seu horizonte, aumenta as suas capacidades, esclarece a sua inteligência e tempera a sua vontade.”
Lênin, Relatório Sobre a Revolução de 1905

No último dia 29 de setembro tomaram conta de centenas de cidades, em todo o Brasil, atos convocados contra o candidato Jair Bolsonaro pelo movimento “Mulheres Unidas contra Bolsonaro”.

A Esquerda Marxista (EM) e o Movimento Mulheres pelo Socialismo (MPS) estiveram presentes nos atos em inúmeras cidades do país, levando sua política através de panfletos com a Plataforma de Luta da Mulher Trabalhadora e de suas candidaturas contra o sistema e pela revolução socialista.

A organização dos atos refletiu o caráter do grupo do Facebook, que tem quase 4 milhões de participantes: uma frente única, pluriclassista, sem direção política estabelecida e em favor do “qualquer um menos ele”. Apesar do objetivo central do ato ter sido derrotar Bolsonaro, as manifestações tiveram um caráter combativo em diversos locais, sendo que em alguns deles foram entoadas palavras de ordem de cunho político, com a presença de bandeiras de partidos e organizações políticas. Outro ponto positivo que deve ser assinalado diz respeito à participação de mulheres e homens. Certamente a grande maioria e a responsabilidade em convocar e dar impulso aos atos coube às mulheres, porém todos ali presentes sentiram-se parte do movimento.

A EM e o MPS apoiam a organização das mulheres em luta. Ressaltamos a participação massiva nos atos da classe operária e da juventude. Mas a falta de impusionamento dos sindicatos operários, a desorganização do proletariado que se mostrou nesses atos, favorece a política reformista de um movimento “com todas as classes”, “por fora das classes”. Isso cria uma ilusão e prepara uma derrota futura que o movimento Mulheres pelo Socialismo critica de forma justa.

É importante também avaliar que esse movimento, como outros que têm se desenvolvido desde 2013, estão sendo organizados por fora das grandes organizações históricas da classe trabalhadora. O descontentamento com elas, acentuado após o estelionato eleitoral cometido pelo governo Dilma nas eleições de 2014, têm papel importante nesse processo. Porém é preciso combater a ideia desenvolvida pela direita, e por alguns reformistas, de que os atos possam, na verdade, ter servido de vitrine para Bolsonaro, fortalecendo sua candidatura ou que sua realização possa vir a atrapalhar o desempenho do candidato petista.

A esquerda, ao abandonar a luta de classes, substituindo-a pelas lutas identitárias de caráter pequeno-burguês, levou as massas – que apesar das questões morais, são guiadas, de fato, pelas questões materiais – a buscar outras saídas consideradas mais “radicais”. A classe trabalhadora sentiu-se traída por anos de governos petistas de conciliação de classe e, diante da podridão desse sistema, é levada a voltar-se em direção àqueles que escancaram – mesmo que de forma falsa – essa podridão. É dessa situação, a traição dos reformistas, particularmente do PT, que nasceu o “fenômeno Bolsonaro”, que fala “contra o sistema” para melhor defendê-lo atacando o movimento operário e os direitos dos trabalhadores.

Sentindo a massa escorrer pelos dedos, a esquerda reformista agarra-se ao monstro que criou. Pintam Bolsonaro de fascista, para tentar reunificar toda a classe trabalhadora e a burguesia “progressista” em prol de Haddad e do retorno do partido ao governo federal para, novamente, buscar uma aliança com o capital e demonstrar que continua com força suficiente para controlar a ira dos trabalhadores contra a barbárie capitalista. Este caminho só reforça a desconfiança dos trabalhadores no PT e prepara uma nova derrota eleitoral, depois de ter sido batido por Bolsonaro (e pela recusa de voto, abstenções, voto em branco e votos nulos) em todos os bairros operários.

Bolsonaro não passa de um demagogo de direita, com o mesmo programa da grande maioria dos seus colegas de casa. Ele irá atacar frontalmente os direitos conquistados pela luta dos trabalhadores – uma Reforma da Previdência, privatizações, emprego sem direitos (“carteira de trabalho verde-amarela”). Dai a justeza e a necessidade do combate a suas propostas, desde já, em termos políticos e nas manifestações de rua.

Apesar de seus limites, esses atos demonstram a energia e a vitalidade de jovens, mulheres e homens que, diante de uma batalha justa, saem às ruas. É preciso construir uma organização que canalize essa força, orientando a luta contra o fim desse sistema e pela construção do socialismo, única saída possível para os trabalhadores.

Derrotar Bolsonaro nas eleições é apenas uma batalha. Cabe a nós, marxistas, utilizar esse terreno deturpado para denunciar o caráter falacioso da democracia burguesa, discutindo pacientemente com a classe trabalhadora e demonstrando, através da teoria e da prática, a necessidade da revolução e da derrubada do capitalismo.