Israel: novo governo, mesma política podre

No dia 13 de junho, o Knesset (parlamento israelense) elegeu um novo governo com uma estreita maioria de 60 contra 59 – encerrando o mandato de 12 anos do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu no poder. Seu governo foi caracterizado por políticas de direita e de opressão brutal aos palestinos, com base na posição pessoal de Netanyahu como homem forte de Israel. O exemplo final disso foi o recente bombardeio sangrento de Gaza. O que o novo governo trará? E por que Netanyahu perdeu o poder?

Netanyahu representa a opressão brutal aos palestinos, a demagogia racista e a política de austeridade. Seu governo foi pontuado por uma série de escândalos de corrupção, que ele conseguiu ignorar até agora. No entanto, o governo que vai substituí-lo não é mais progressista. O que a mudança realmente reflete é o aprofundamento da crise no topo da classe dominante israelense.

O aprofundamento da crise do Estado israelense

A história política de Netanyahu é a de um reacionário astuto e imprudente. Ele já havia demonstrado a capacidade de se aproveitar de todas as oportunidades em circunstâncias desfavoráveis, transformando a situação em seu próprio benefício. Ao longo dos anos, Netanyahu conseguiu ocupar uma posição tão central na política israelense que a crise de seu governo se tornou inextricavelmente entrelaçada com a crise do Estado israelense.

Netanyahu agora emerge derrotado. Como seu amigo e aliado Donald Trump, ele é um péssimo perdedor e já está planejando sua vingança. Como Trump, ele conjurou forças reacionárias que não pode controlar totalmente, mas que reunirá para um retorno futuro. Ele está longe de ser relegado a um papel marginal na política israelense. A própria composição da coalizão que o destituiu é prova da profunda crise do sistema político de Israel. Uma seção importante da classe dominante israelense parece determinada a se desfazer de Netanyahu no problemático cargo de primeiro-ministro. Mas a fragilidade da coalizão em que se baseia esta tentativa é um testemunho da profundidade da crise.

Como seu amigo e aliado Donald Trump, Netanyahu apoiará forças reacionárias fora de seu controle para planejar sua vingança e retorno – Foto: Embaixada dos EUA em Tel Aviv
O problema para a classe dominante israelense é que a estabilidade institucional, com ou sem Netanyahu, é uma quimera. Após os resultados eleitorais inconclusivos de março, Netanyahu não conseguiu reunir o apoio da maioria para um novo governo. Ele prolongou seu mandato precipitando a crise que resultou no bombardeio brutal a Gaza em maio. Ele contava com uma vitória retumbante que fortaleceria sua posição. O tiro saiu pela culatra.

Em uma tentativa desesperada de encontrar uma saída para o impasse, o presidente Rivlin confiou ao “liberal moderado” Yair Lapid, chefe do partido Yesh Atid (Há um Futuro), a formação de um novo governo. A tentativa de Lapid se deteve durante o bombardeio a Gaza, mas ganhou ímpeto após o cessar-fogo, quando ficou claro que as reivindicações de vitória de Netanyahu eram vazias e insubstanciais.

Lapid começou a forjar uma aliança extremamente peculiar. À direita, a coalizão compreende o partido de extrema direita Yamina (Direita) e seu presidente, Naftali Bennet, que foi empossado como primeiro-ministro. Ele representa o movimento nacional-religioso dos colonos. Depois, há o partido Yisrael Beiteinu (Israel é Nosso Lar) de Avigdor Liberman, que também é um partido de direita, pró-colonos e racista. A coalizão também incluiu o nacional-conservador Gideon Sa’ar, um membro de longa data do partido Likud (Consolidação) de Netanyahu, que agora estabeleceu sua própria lista.

No entanto, para alcançar a maioria parlamentar, Lapid precisava do apoio de ainda mais partidos. A chamada “Esquerda Sionista” correu em seu socorro. O social-democrata Avoda (Trabalhista) e o partido liberal de esquerda Meretz (Energia) foram rápidos em oferecer seu apoio. A cereja do bolo é a inclusão do partido árabe-islâmico Ra’am (Lista Árabe Unida). Em cenas surreais, o líder do Ra’am apertou a mão do fanático sionista Naftali Bennett quando um acordo para ingressar no governo foi fechado. Essa aliança absurda e extremamente instável está unida apenas por uma coisa: a oposição a Netanyahu.

A tentativa de Netanyahu de virar a situação a seu favor foi parte da razão para a escalada de violência do Estado israelense em Jerusalém e, posteriormente, em Gaza. Netanyahu calculou que poderia acabar com essa aliança através de uma nova guerra contra os palestinos, o que criaria uma divisão entre a direita e a esquerda sionistas e tornaria impossível para o partido árabe Ra’am se juntar a uma coalizão com os partidos dos colonos de direita. No entanto, depois de duas semanas de bombardeio implacável que deixou mais de 260 palestinos e 12 israelenses mortos e dezenas de milhares de vidas destroçadas, Netanyahu descobriu para sua consternação que não só falhou em evitar uma coalizão contra ele, mas que talvez até a fortaleceu.

Um novo elemento na equação

Como explicamos em um artigo anterior, a mudança mais importante na situação atual é o surgimento de uma luta de massas unificada dos palestinos que vivem dentro na fronteira de 1948 de Israel, em Jerusalém Oriental, na Cisjordânia, em Gaza e na diáspora palestina, que culminou na greve geral palestina de 18 de maio. A resistência em massa dos palestinos contra a opressão do Estado israelense ressoou internacionalmente. A grande e crescente onda de solidariedade internacional reflete uma mudança de atitude em relação às idéias revolucionárias entre os jovens e trabalhadores de todo o mundo. Esse movimento – que a arrogância de Netanyahu ajudou a evocar – é uma ameaça à estabilidade do capitalismo israelense e a todos os regimes árabes reacionários da região. Portanto, é um problema para todo o equilíbrio de forças imperialista no Oriente Médio.

A propósito, esse movimento também está desafiando a autoridade da liderança histórica da luta nacional palestina. Este é certamente o caso do Fatah, que já se desacreditou e atualmente está colaborando com Israel na supressão do movimento palestino na Cisjordânia, com uma onda de prisões de jovens ativistas palestinos. O Hamas registrou um aumento temporário de popularidade entre os palestinos por causa de sua postura desafiadora contra Israel durante a repressão do movimento na mesquita Al Aqsa e o bombardeio israelense a Gaza. No médio prazo, no entanto, a autoridade do Hamas como força dirigente no movimento de libertação nacional palestino se verá minada na medida em que o êxito dos métodos de luta de massas expuser o vazio da visão política do Hamas aos olhos de milhares de jovens palestinos.

Netanyahu e a burguesia israelense

O Estado israelense foi fundado na base ideológica de que todos os judeus, sejam trabalhadores ou capitalistas, têm os mesmos interesses em oposição aos interesses dos árabes, e dos palestinos em particular. Ao afirmar ser o defensor dos judeus contra a “ameaça árabe”, a classe dominante israelense reúne os trabalhadores e jovens israelenses em apoio ao Estado israelense – isto é, por trás da defesa dos interesses fundamentais da classe capitalista.

Claro que essa ideia é uma cortina de fumaça escondendo uma realidade diferente: trabalhadores judeus e capitalistas judeus têm interesses fundamentalmente antagônicos. Israel é um país com altíssima desigualdade social: por um lado, você tem uma classe dominante extremamente reacionária e algumas das empresas mais ricas do mundo e, por outro, você tem uma classe trabalhadora que sofre de baixos salários, altos aluguéis e altos preços dos alimentos. Israel é uma sociedade em que 20% da população vive abaixo da linha da pobreza. De acordo com a própria medida da OCDE, Israel é o mais desigual de seus 38 estados membros. Para disfarçar esses antagonismos de classe, a burguesia israelense precisa do mito da “unidade de interesses” dos judeus.

Para se manter no poder, a classe dominante israelense sempre se baseou no nacionalismo e na xenofobia em relação aos palestinos – Foto: Avital Pinnick, Flickr
Para manter seu sistema no poder, a classe capitalista israelense sempre se apoiou no nacionalismo e na opressão aos palestinos. O projeto sionista de expandir Israel como uma pátria para os judeus está sendo realizado por meio de constantes apropriações de terras às custas da população palestina e travando guerras contra seus vizinhos. Essas políticas foram projetadas para alimentar uma mentalidade de cerco e histeria antiárabe entre os trabalhadores e jovens israelenses. O racismo e as táticas de intimidação têm como objetivo obscurecer as diferenças de classe e reunir os trabalhadores israelenses judeus em apoio ao Estado israelense toda vez que o perigo de uma ameaça existencial a Israel é evocado.

Benjamin Netanyahu aperfeiçoou esse método. Mas, para desgosto da burguesia israelense, Netanyahu confiou cada vez mais nessas políticas não para a promoção dos interesses do capitalismo israelense como um todo, mas apenas para estabilizar sua própria posição de poder, enquanto se protegia do julgamento de inúmeras acusações de corrupção. Sempre que Netanyahu estava em apuros e perdia o apoio público, ele batia o tambor da guerra e aumentava sua demagogia chauvinista.

Vimos os métodos de seu manual implantados no bombardeio e invasão de Gaza em 2014; na sabotagem do acordo nuclear dos EUA com o Irã, incluindo repetidos assassinatos de cientistas nucleares iranianos; na racista Lei do Estado da Nação Judaica, introduzida em 2018; na anunciada (mas nunca implementada) anexação da Cisjordânia na primavera do ano passado e no bombardeio de Gaza nas últimas semanas. Cada uma dessas manobras foi parcialmente projetada de uma forma ou de outra para estimular a histeria nacionalista a fim de sustentar o declínio da popularidade de Netanyahu.

À medida que sua popularidade começou a declinar, ele confiou cada vez mais nos partidos de direita e de extrema direita, em particular os do movimento dos colonos. Isso o manteve temporariamente no poder, mas ao custo de alienar uma parte crescente da população israelense, em particular os trabalhadores, os jovens e as classes médias urbanas. Além disso, um número crescente de israelenses tem sido capaz de ver que a questão da guerra e da paz é decidida com base nas considerações de poder pessoal de Netanyahu e não tem nada a ver com a defesa dos interesses da maioria. Suas políticas corroeram a eficácia de uma tática central que a classe capitalista israelense usa para reforçar seu governo. Esta é uma séria ameaça à estabilidade de longo prazo do capitalismo israelense.

Netanyahu e o imperialismo

As políticas míopes e egocêntricas de Netanyahu não só colocaram em risco a estabilidade interna do capitalismo israelense. Elas também ameaçaram prejudicar seriamente os interesses imperialistas dos EUA em toda a região. Após as derrotas nas guerras do Iraque e Afeganistão e a instabilidade causada pelas revoluções árabes de 2011, o imperialismo dos EUA entrou em crise. Isso se reflete em suas muitas cambalhotas girando entre diferentes potências conflitantes, como Irã, Turquia, Arábia Saudita e Israel.

Sob o presidente Obama, os EUA começaram a mudar a estratégia contando com negociações, tratados, acordos e uma tentativa de mudar alianças para se desligar parcialmente do envolvimento militar direto na região. O acordo nuclear com o Irã fazia parte dessa estratégia, mas teve o efeito de desestabilizar ainda mais as relações com os principais aliados tradicionais dos EUA, especialmente a Arábia Saudita e Israel. Tudo isso se refletiu na guerra síria, que viu a política dos Estados Unidos desabar em contradições insolúveis, permitindo a ascensão de protagonistas importantes, como a Rússia e o Irã, de um lado e outras potências regionais, como a Turquia e a Arábia Saudita, do outro. Cada um está perseguindo seus próprios interesses nos bastidores, ou então está em conflito aberto com o imperialismo dos EUA. Pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial, os EUA foram relegados a um papel secundário na região.

As políticas seguidas por Trump foram uma tentativa de restaurar a aliança com alguns dos ex-aliados dos EUA privados de direitos. Mas terminou em uma confusão ainda pior do ponto de vista dos interesses gerais do imperialismo norte-americano. Isso se refletiu também na posição dos EUA em relação à questão palestina. Qualquer pretensão de neutralidade foi abandonada, com os EUA abertamente apoiando Netanyahu. Foi uma aposta particularmente perigosa, comprometendo ainda mais a estabilidade de todos os regimes árabes da região que deram qualquer tipo de apoio à normalização ou facilitação das relações com Israel.

A nova administração dos Estados Unidos sob Biden está tentando navegar em direção a águas mais familiares e tranquilas, com base no jogo consolidado das negociações multilaterais patrocinadas pelos Estados Unidos, a fim de trazer de volta à garrafa o gênio das forças reacionárias e revolucionárias postas em movimento pela atual crise. Essa tentativa está fadada ao fracasso.

Essa estratégia foi prejudicada pela guerra de Netanyahu contra o Irã (que, em alguns casos, foi muito duvidosa e aventureira até mesmo para o Alto Comando do exército israelense) e pela escalada da repressão aos palestinos, que é um fator extremamente poderoso que compromete a estabilidade dos regimes árabes da região aliados dos EUA.

Desde a fundação do Estado de Israel, os regimes árabes reacionários e déspotas da região têm se apresentado como protetores dos palestinos para desviar a atenção de suas próprias políticas opressoras e imperialistas. Enquanto choram lágrimas de crocodilo pela opressão aos palestinos, eles não estão apenas reprimindo seu próprio povo, mas também ajudando o Estado israelense a reprimir os palestinos. No entanto, a opressão crescente do povo palestino por Israel os está colocando sob cada vez mais pressão.

O silêncio ensurdecedor de muitos líderes árabes durante o bombardeio a Gaza nas últimas semanas desacreditou-os severamente aos olhos de seu povo. A grande maioria desses regimes está debilitada por suas próprias crises profundas, enfrentando um humor potencialmente revolucionário entre seu próprio povo, seja o Egito, a Jordânia, a Arábia Saudita ou os Estados do Golfo.

O espectro das revoluções árabes de 2011 ou dos movimentos revolucionários em 2019 paira sobre os capitalistas e imperialistas da região. O movimento massivo, unificado e poderoso das massas palestinas, provocado por Israel nas últimas semanas, renovou essas memórias tanto entre as massas quanto aos olhos das classes dominantes. Os imperialistas dos EUA sabem do impacto que o movimento pela liberdade palestina produz sobre as massas oprimidas de toda a região. O incitamento de Netanyahu também minou a aliança entre Israel e os Estados árabes aliados dos EUA, que é um pilar importante da política dos EUA na região. De todas as maneiras possíveis, Netanyahu estava se tornando uma carga muito pesada para o imperialismo dos EUA.

Divisões na classe dominante

Consequentemente, desenvolveu-se uma divisão na burguesia israelense, à medida que uma seção crescente dela concluiu que precisava se livrar de Netanyahu para evitar uma desestabilização maior da situação política. Várias tentativas foram feitas para removê-lo. O problema, porém, do ponto de vista da classe capitalista é que não há partido pronto para assumir. Enquanto Netanyahu e seu partido Likud foram enfraquecidos, o restante dos partidos burgueses estão em uma posição ainda mais frágil.

Primeiro, as alegações de corrupção contra Netanyahu foram trazidas ao conhecimento público. Em seguida, o parceiro de coalizão de longa data de Netanyahu, chefe do partido Yisrael Beiteinu, Avigdor Lieberman, foi pressionado pela grande burguesia a se recusar a formar uma coalizão com ele após as eleições gerais de 2019. Nessas eleições, a classe dominante tentou remendar uma coalizão chamada Kahol Lavan (a chamada “aliança central”), liderada por Benny Gantz e Yair Lapid. Mas sua tentativa de remover Netanyahu falhou, após o que Gantz se desacreditou completamente ao entrar em uma coalizão com Netanyahu, o próprio inimigo contra o qual ele estava se opondo. A crise política levou a quatro eleições nos últimos dois anos.

Enquanto as acusações de corrupção se acumulavam contra Netanyahu, seus aliados e protegidos do partido se voltavam cada vez mais contra ele. Gideon Sa’ar é um deles, assim como Naftali Bennett e Ayelet Shaked, do partido de direita Yamina. Todos agora estão armados contra Netanyahu na nova coalizão. A crise econômica desencadeada pela COVID-19 exacerbou ainda mais as tensões sociais e a instabilidade política.

Após as últimas eleições em março, Netanyahu mais uma vez tentou superar o desafio ao seu governo, adotando medidas anti-palestinas opressivas ainda mais agressivas, levando aos confrontos no bairro palestino Sheikh Jarrah e na mesquita Al Aqsa e provocando o conflito mais recente com o Hamas. No entanto, essa manobra não rendeu como antes. Em primeiro lugar, a maioria dos israelenses viu a campanha de bombardeio e as provocações de Netanyahu na mesquita Al Aqsa com enorme desconfiança. Em segundo lugar, ao invés de mostrar um Estado sionista onipotente, o conflito terminou em um impasse devido ao movimento em massa dos palestinos dentro das fronteiras do estado israelense e um movimento de solidariedade pró-palestino que irrompeu em toda a região e em todo o mundo.

Do ponto de vista da maior parte da classe dominante israelense, Netanyahu se tornou um risco. Suas ações estão minando a legitimidade do Estado sionista por completo. É por isso que a classe dominante agora está promovendo todos os esforços para remover Netanyahu por qualquer meio, forçando companheiros improváveis ​​como Naftali Bennett e o partido Ra’am a formarem uma coalizão.

O novo governo: tão ruim quanto o anterior

Do ponto de vista da classe trabalhadora e do povo palestino oprimido, este governo nada oferece. Seu programa pode ser descrito como “a política de Netanyahu sem Netanyahu”. O que preocupava a classe dominante com Netanyahu não era sua corrupção, sua violenta repressão aos palestinos, seu racismo ou os ataques aos padrões de vida da classe trabalhadora. Tudo isso faz necessariamente parte do capitalismo israelense. O que os preocupava era que Netanyahu estava expondo essas táticas e polarizando a sociedade israelense a um grau intolerável, minando assim a legitimidade do Estado e de suas instituições.

O fato de a chamada “Esquerda Sionista” (Avoda e Meretz) ter aderido o governo não pode disfarçar sua agenda de direita. O chamado Partido Trabalhista (Avoda) e o Meretz mostraram suas verdadeiras cores. Os partidos sionistas supostamente de “esquerda” sempre seguem os partidos sionistas de direita. Embora retratados como progressistas, eles estão sempre prontos para apoiar um grupo de partidos de colonos de direita e racistas contra outro. Na verdade, a própria noção de sionismo de “esquerda” é uma contradictio in adjecto. É impossível defender os interesses da classe trabalhadora e compartilhar a ideologia nacionalista sionista da classe dominante israelense.

A coalizão anti-Netanyahu no Knesset está unida apenas por sua oposição a Netanyahu. É uma coalizão extremamente fraca e pode ser destruída no decorrer dos eventos – Imagem: wikimedia commons
Uma olhada no pessoal também deixa claro qual é a posição desse governo: Naftali Bennett (Yamina) será o primeiro-ministro pelos primeiros dois anos, após os quais – e supondo que essa coalizão sobreviva por tanto tempo! – ele será substituído por Yair Lapid (Yesh Atid). Bennet é um racista e um defensor vociferante dos colonos sionistas. Ele é a favor da anexação israelense da Cisjordânia e é conhecido por declarações como: “Eu matei muitos árabes e não vejo nada de errado nisso!”.

O Ministério do Interior irá para a política de extrema direita Ayelet Shaked, do Yamina, que zombou daqueles que a chamaram de fascista em um anúncio eleitoral há alguns anos, em que borrifou em si mesma um perfume com o rótulo “Fascismo”, dizendo: “cheira a democracia para mim!”. O Ministro das Finanças é Avigdor Liebermann, ele próprio um colono sionista que vive na Cisjordânia e foi anteriormente Ministro das Relações Exteriores e Ministro da Defesa de Netanyahu. Benny Gantz permanecerá como Ministro da Defesa, cargo que já ocupava sob Netanyahu durante o recente bombardeio a Gaza. Gantz também foi o comandante militar do bombardeio e invasão de Gaza em 2014, que matou 2.300 palestinos, dois terços dos quais eram civis, de acordo com a ONU.

A necessidade de uma alternativa revolucionária

Esta “aliança anti-Netanyahu” é excepcionalmente fraca e não demorará muito para que estoure uma luta interna amarga. Se um partido revolucionário genuíno existisse em Israel hoje, as divisões na classe dominante e a natureza cada vez mais desacreditada e fragmentada de seus partidos representariam uma oportunidade de separar uma camada de trabalhadores israelenses judeus da classe capitalista israelense e em direção a uma posição de classe.

No entanto, ainda não existe um partido na esquerda israelense com ideias claras e capaz de aproveitar essa oportunidade. Contra a discriminação, a guerra perpétua, a opressão do povo palestino e a corrupção dos partidos estabelecidos, o maior partido da esquerda israelense é o Hadash (Novo), que é uma aliança dominada pelo Partido Comunista de Israel (Ma’Ki). Hadash levanta a demanda por mais “democracia”. Mas o que isso significa? Democracia parlamentar burguesa? A corrupção e a disputa por cargos, por meio das quais a classe dominante decide qual de seus representantes deve “representar e pisotear” as massas, como escreveu Marx? A verdade é que não pode haver um fim para o imperialismo israelense e a opressão dos palestinos sobre uma base capitalista; nem pode haver um fim para a corrupção e a exploração. O que temos em Israel não é qualquer forma de estado de coisas “infeliz” e acidental. Isso é o melhor que o capitalismo pode oferecer. Não pode haver capitalismo israelense sem toda a podridão que ele hoje acarreta. Portanto, o que é necessário não são demandas moralizantes ou abstratas por “democracia” ou “paz”. O que é necessário é uma luta pela derrubada revolucionária do Estado burguês de Israel.

Nas últimas semanas, vimos emergir um heroico movimento de massas da juventude palestina. Mas em vez de organizá-los, indo de bairro em bairro, coordenando o movimento pela derrubada revolucionária do Estado israelense, o Hadash pregava um pacifismo desdentado. Seus slogans são: “Contra a guerra”, “Árabes e judeus se recusam a ser inimigos”, “As crianças em Gaza e de Ber Sheva querem viver”. Mas a quem esses apelos morais são feitos? Ao governo de Netanyahu? Ao alto comando do exército? Aos sionistas liberais?

É correto opor-se à guerra reacionária, mas o pacifismo liberal não pode oferecer nenhuma saída para o ciclo de barbárie que estamos testemunhando. Cada “paz” imperialista é baseada no racismo, na discriminação, na apropriação de terras, nos despejos e na repressão violenta aos protestos do povo palestino. Periodicamente se vê cortada pela guerra imperialista, que prossegue os mesmos objetivos por outros meios. A guerra, por sua vez, é seguida por uma nova “paz” imperialista em um ciclo interminável de opressão. Os interesses de classe por trás desse mecanismo de opressão devem ser expostos sem piedade. O que é necessário é uma luta para superar o nacionalismo reacionário fomentado pelo Estado israelense, promovendo a luta de classes, a solidariedade de classes e o internacionalismo proletário no contexto de uma onda revolucionária que está abalando o capitalismo e o imperialismo em escala mundial.

O que é necessário em Israel-Palestina é uma organização marxista genuinamente revolucionária que possa oferecer uma perspectiva concreta para a derrubada revolucionária do Estado capitalista israelense e o estabelecimento da Federação Socialista do Oriente Médio, dentro da qual tanto os judeus israelenses quanto o povo palestino poderiam viver em paz junto com todos os outros povos da região. Essa organização ainda não foi criada. Conseguir isso é a tarefa urgente dos trabalhadores e jovens mais progressistas e radicais de toda a Palestina histórica.

TRADUÇÃO DE FABIANO LEITE.
PUBLICADO EM MARXIST.COM