O movimento iniciado em junho, em Hong Kong, está entrando no seu terceiro mês. Após conquistarem a suspensão do projeto de lei que permitiria a extradição de pessoas para a China continental, a pauta dos manifestantes se ampliou para o pedido de anistia para os ativistas presos, retirar a caracterização dos protestos de motim, investigação sobre a violência policial e a eleição direta para a liderança do Executivo, atualmente escolhida por um comitê de cerca de 1.200 pessoas majoritariamente pró- China.
Desde que as manifestações iniciaram, alguns eventos, como a greve geral de 5 de agosto e a ocupação do aeroporto, deram importantes exemplos da disposição de luta e do avanço da consciência das massas. No dia 18, mais de 1,7 milhão de pessoas (quase ¼ da população) se reuniu em um ato no Victoria Park, que ficou lotado e a manifestação transbordou para as quadras ao redor. O ato era proibido, mas a repressão não conseguiu impedir a realização.
Novas manifestações massivas tomaram as ruas nos dias 23, 24 e 25 de agosto, porém, nos dois últimos dias houve um aumento considerável da repressão. Os caminhões de água recentemente comprados da França foram utilizados pela primeira vez e a polícia atirou na direção dos manifestantes. Cerca de 36 pessoas foram presas, entre elas uma de 12 anos, e mais de 20 ficaram feridas.
Em Pequim, desde o início o governo chinês buscou taxar as ações opositoras como “terroristas”, sugeriu mobilizar tropas do Exército Popular da Libertação para conter os protestos e colocou a polícia antimotim para realizar exercícios em Shenzhen, cidade vizinha a Hong Kong.
Em seu microblog, o jornal estatal People’s Daily, criticou os manifestantes alegando que eles “devem pagar um custo”. Essa é a vontade da burocracia chinesa, mas que se vê diante de um impasse no atual momento. O exército só não se tornou uma opção ainda por um receio de que a revolta iniciada em Hong Kong possa se espalhar para o continente.
Ao mesmo tempo, a mídia burguesa internacional, sempre muito neutra, tenta mostrar a repressão policial como uma reação diante da violência dos manifestantes. A declaração do superintendente de polícia, Leung Kwok, justificando que o uso da arma de fogo foi feito porque “as vidas dos policiais estavam em risco” é apenas um dos inúmeros exemplos dessa distorção.
A verdade é que a situação é explosiva e o governo chinês tem total consciência disso. O que estamos vendo em Hong Kong é mais uma expressão da crise global do capitalismo. A restauração capitalista já aconteceu há um bom tempo na China, porém, se manteve o forte controle do Partido Comunista Chinês (PCC).
A farsa de “um país, dois regimes” só serviu para criar uma ilusão de independência de Hong Kong, quando na verdade a cidade servia apenas como uma porta de entrada de investimentos estrangeiros no país. O governo chinês nunca pensou em oferecer concessões aos trabalhadores de Hong Kong e a reação à declaração do G7, que ressalta a “existência e a importância da declaração sino-britânica de 1984” e pede “para evitar a violência” demonstra a total intransigência do governo em relação às manifestações.
Assim como Macron não está preocupado com os incêndios na floresta amazônica, o G7 não está pensando nos trabalhadores hongkoneses. A preocupação dos demais países imperialistas é com as consequências da escalada da violência. Porém, a única resposta dada pelo porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores, Geng Shuang, foi de que a declaração de 1984 “confirma que a China restabelecerá sua soberania em Hong kong”.
Há ainda outro obstáculo para as massas no atual momento. Os manifestantes, cada vez mais radicalizados, se chocam não só com a repressão, mas com as lideranças liberais que buscam uma saída através da intervenção de países imperialistas e com as direções sindicais reformistas.
A saída para o movimento na atual situação é ampliando o movimento à China continental. Como explicamos em “Hong Kong: “caminho sem volta” – luta de classes ou derrota”, os marxistas “acolhem os apelos por mais greve e a disposição das massas de continuar a luta, mas a luta necessita não somente alcançar um nível mais alto de organização, com a formação de um comitê de greve de representantes eleitos por todos os trabalhadores e jovens de Hong Kong que estão participando da luta, mas também ser ampliada ativamente além de Hong Kong”.
Não há outro meio. A questão vai além da conquista das reivindicações democráticas. França, Sudão, Argélia e agora Hong Kong são poderosos sinais de um mundo em transformação, mas essa mudança só poderá ocorrer com a derrubada completa do capital por meio de um partido e de sua direção.