Greve Geral na Espanha: acompanhamento massivo e gigantescas manifestações – e depois?

A greve geral na Espanha contra as políticas de austeridade do governo de direita de Mariano Rajoy teve participação massiva e culminou em gigantescas manifestações nas maiores cidades.

A greve geral na Espanha contra as políticas de austeridade do governo de direita de Mariano Rajoy teve participação massiva e culminou em gigantescas manifestações nas maiores cidades.

A participação na greve foi completa nas grandes indústrias, no transporte público, no comércio atacadista, na coleta do lixo, na educação e nos serviços de saúde, e de participação considerável na administração pública e em outros setores. Dezenas de milhares de trabalhadores e de jovens participaram em piquetes que percorreram as ruas das áreas industriais das grandes cidades na noite de 13 de novembro e durante todo o dia 14. As áreas centrais de todas as maiores capitais de províncias foram tomadas por ativistas da classe trabalhadora e, de forma significativa, também pela juventude.

As manifestações, que na maioria das cidades foram realizadas à tarde, novamente foram massivas, em alguns casos, sem precedentes em tamanho. Os sindicatos estimaram uma participação de um milhão de pessoas em Madri e também em Barcelona. Em ambos os casos, os manifestantes cobriam toda a rota de marcha antes do início programado. Outras cidades também se tornaram o cenário de gigantescas manifestações: 70 mil em Mallorca (e outros 10 mil em Mahon; cinco mil em Ibiza e 2.500 em Ciutadella); 150 mil em Sevilha; 150 mil em Málaga e número similar em Granada; 350 mil em Valência; 135 mil em Alacant; 50 mil em Castellón; 200 mil em Zaragoza; 30 mil em Tarragona; 200 mil em Murcia (e adicionais 35 mil em Cartagena), e muito mais.

No País Basco a greve e a participação nas manifestações foi mais baixa porque os dois principais sindicatos nacionalistas (ELA e LAB) não aderiram.

Houve muitas ocorrências de ação brutal da polícia contra os piquetes sindicais e os manifestantes. Em Murcia, Málaga, Granada, Madri e Barcelona, a polícia carregou sobre os manifestantes, e trabalhadores e jovens foram detidos e feridos. Em Tarragona, um jovem de treze anos necessitou de cuidados cirúrgicos após ter sido golpeado na cabeça pela tropa de choque da polícia.

A greve geral de 24 horas de 14 de novembro foi resultado de uma intensificação da pressão que finalmente forçou os líderes sindicais a convocá-la. A greve geral de 29 de março deste ano, contra a reforma trabalhista do governo do PP, também foi massiva e, mesmo assim, fracassou em mudar o curso da política do governo. Nos meses seguintes, a política de austeridade, de cortes e de ataques aos serviços públicos e aos direitos da classe trabalhadora se aprofundou. A chegada da marcha dos mineiros em Madri, em julho, canalizou todo este descontentamento em uma gigantesca manifestação de centenas de milhares. No dia seguinte, o governo anunciou um novo pacote de cortes. Os servidores civis imediatamente tomaram as ruas e bloquearam caminhos em um movimento semi-espontâneo que forçou os líderes sindicais a convocar manifestações de massas em 19 de julho. O governo respondeu a isto apresentando um rígido orçamento para 2013, com novos e mais brutais cortes.

A marcha nacional em Madri convocada pelos sindicatos em 15 de setembro, embora reunindo dezenas de milhares de ativistas e delegados sindicais de todo o país, foi muito menor que os protestos de julho. Para muitos, claramente, mais um dia de manifestações não fazia sentido, particularmente porque não fazia parte de um plano sustentável de lutas.

A mobilização de 25 de setembro para “cercar o Congresso” de deputados, na qual dezenas de milhares, a maioria jovens, participaram, e que tinha o apoio de mais de 70% da população, refletiu o enorme descontentamento social que estava acumulando. Finalmente, os líderes sindicais foram forçados a marcar uma data para a greve geral: em 14 de novembro.

A data foi escolhida para coincidir com a greve geral em Portugal e foi mais tarde apoiada pela Confederação Sindical Europeia, que convocou um dia europeu de luta e solidariedade contra as políticas de austeridade.

Este passo é muito importante. Vimos pela primeira vez greves gerais convocadas em mais de um país simultaneamente. Na Itália e na Grécia, os sindicatos convocaram greves parciais (quatro e três horas, respectivamente), enquanto em outros países se realizaram manifestações de protesto.

Há uma crescente consciência entre as amplas camadas da população, especialmente nos países mais afetados pela crise, de que isto não é algo que afete um país ou outro de forma isolada, mas que é uma crise geral do capitalismo europeu. Milhões de pessoas acompanharam o desenvolvimento da crise na Grécia e perceberam que as políticas de austeridade, além de serem nocivas à classe trabalhadora e destrutiva dos serviços públicos, sequer teve o efeito de promover alguma recuperação na economia. A contração da economia na Grécia alcançou 23% nos passados cinco anos e não mostra sinais de se deter. Austeridade leva à contração do consumo privado, paralisa a economia, diminui as receitas fiscais e aumenta os déficits já altos, o que leva depois a mais cortes em uma espiral descendente que parece não ter fim.

O FMI projeta para este ano uma contração da economia da União Europeia (UE) de 0,4%. Os países mais afetados são os do sul da Europa. A Espanha contrairá 1,5%; a Itália, 2,3%; Portugal, 3%; Chipre, 1,3%; e a Grécia, 5,2%. A Alemanha e a França permanecem virtualmente estagnadas, com crescimento do PIB de 0,9% e 0,1%, respectivamente. A taxa de desemprego alcançou 11,4% na EU, com recordes de 25,1% na Espanha; 24,4%, na Grécia e 16% em Portugal. Nestes três países, o desemprego juvenil está acima de 50%.

Tudo isto está provocando o maior impacto na consciência de milhões de trabalhadores e jovens. Há um crescente questionamento dos governos e partidos que aplicam políticas de austeridade (sejam eles socialdemocratas ou de direita) e um crescimento em graus variados em diferentes países dos partidos que são mais consistentes em sua oposição a estas políticas, à esquerda da socialdemocracia. Assim, a Coalizão da Esquerda Radical (SYRIZA), que se originou de um setor do movimento comunista na Grécia, foi em exatamente dois anos de 4,5% a 30% dos votos, e agora é o primeiro partido da classe trabalhadora e do país.

Além do crescimento das alternativas de esquerda, há uma difundida fermentação e questionamento do sistema capitalista e de todas as suas instituições (partidos políticos, bancos, os ricos, o parlamento, a justiça etc.).

A greve geral na Espanha foi precedida pelo suicídio de Egaña Amaia, uma mulher de 53 anos de idade, da classe trabalhadora, na cidade de Barakaldo, em Bilbao. Ela se lançou da janela de seu apartamento no quarto andar do prédio, no dia que estava para ser despejada pelo não pagamento da hipoteca. Desde o início da crise na Espanha já houve mais de 350 mil retomadas de posse (510 ao dia), em que os bancos tomam as moradias de famílias que não podem pagar suas hipotecas (muitas entraram através do engodo e com condições injustas e abusivas, na altura da bolha da habitação). Ao mesmo tempo, estes mesmos bancos recebem bilhões de euros de dinheiro público na forma de resgates e pacotes, e acumulam bens de centenas de milhares de novas casas vazias que incorporadores imobiliários em bancarrota nunca poderiam vender. Este é um exemplo da anarquia do sistema capitalista que condena milhões à inatividade enquanto existem necessidades sociais prementes a atender.

As manifestações que concluíram a greve geral deu à classe trabalhadora espanhola um sentimento de força, um sentimento de excitação que estava refletido na palavra de ordem “Sim, nós podemos”. Mas nos próximos dias o governo promete continuar com a mesma política. A questão é: e depois? Os marxistas de Lucha de Clases (Luta de Classes), dentro da Esquerda Unida (IU, em suas siglas em espanhol), defendem a necessidade de continuidade desta luta através de um plano contínuo e crescente de mobilização que vise à derrubada do governo do PP.

Também é necessário construir uma força política que possa proporcionar uma resposta à questão central: qual é a alternativa às políticas de austeridade? No quadro do capitalismo não há nenhuma alternativa. Estas políticas são ditadas pela crise do sistema. Devemos reconhecer este fato e levantar claramente que a única solução é nacionalizar as grandes empresas e monopólios e colocá-las sob o controle operário, de modo a se poder estabelecer uma planificação democrática da economia para o benefício da maioria da população. Nas discussões que conduzirão à Assembleia Federal da Esquerda Unida, em dezembro, os marxistas de Lucha de Clases defenderão este ponto de vista.