Fraude na Americanas: nenhuma demissão! Que os bilionários paguem a conta!

Uma das maiores redes de comércio varejista do Brasil, o grupo Americanas, está em recuperação judicial após a descoberta de um rombo de aproximadamente R$ 43 bilhões. A dívida junto a bancos e outros credores foi se amontoando ao longo de vários anos, mas era mascarada nos registros contábeis da empresa, o que levada os investidores e fornecedores a manter o fluxo de empréstimos e outras operações financeiras e comerciais, como se estivesse tudo bem na companhia!

A Comissão de Valores Mobiliários já informou que vai investigar possíveis irregularidades, mas um grande fundo de investimento, a Verde Asset, publicou uma nota em que classifica o ocorrido: “Temos a maior fraude da história corporativa do Brasil, um buraco de mais de R$ 20 bilhões”. Nós, marxistas, não temos motivos para duvidar dessa afirmação.

Cerca de 20 dias após o rombo se tornar público, a Americanas entrou com um pedido de recuperação judicial – que foi aceito pelo juiz Paulo Assed, da 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro – e, assim, toda cobrança de dívidas está suspensa por 180 dias. Aliás, a lei de recuperação judicial foi criada em 2005 e reformulada em 2020 para proteger as empresas da falência, pois garante prazos e condições para renegociar dívidas com credores, fornecedores e trabalhadores, sem determinar uma ordem de prioridade. Antes dessa lei entrar em vigor, quando uma empresa decretava falência, os trabalhadores tinham prioridade para receber sua parte, através da venda de ativos e leilão de bens, por exemplo.

Depois de quitada a dívida trabalhista, os fornecedores eram os próximos da fila e só depois os demais credores. Na lei de recuperação judicial, o juiz ou um administrador designado por ele passa a acompanhar o processo de recuperação – inclusive na companhia dos mesmos donos que levaram a empresa à bancarrota, pois não há a obrigatoriedade de afastá-los – e, portanto, é o juiz ou seu representante que vai determinar o que pagar, como pagar e quando pagar. Dessa forma, a situação pode se prolongar por vários anos e, mesmo assim, não está garantida a manutenção dos empregos, pelo contrário, sempre acontecem demissões com a desculpa de sanar as finanças da empresa. Também não há certeza alguma quanto ao pagamento de dívidas trabalhistas por parte do administrador da recuperação judicial.

É verdade que seis executivos da Americanas foram afastados de seus cargos e uma empresa de gestão e contabilidade foi contratada para avaliar a situação, mas até agora os bilionários Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcelo Telles, donos da rede varejista, nada sofreram. Enquanto isso, cerca de 100 mil empregos diretos e outros milhares de empregos indiretos estão ameaçados. Após o anúncio do rombo, por exemplo, as visitas ao site da loja caíram 57%!

Há ainda o risco do “caso Americanas” contaminar todo o comércio varejista: o presidente da rede de lojas Marisa, Adalberto Pereira dos Santos, renunciou ao cargo e o conselho da empresa revelou a existência de uma dívida de cerca de R$ 600 milhões – que pretende renegociar com os bancos – e anunciou que fará uma reestruturação.

A desconfiança dos credores também se voltou para a Ambev, gigante do setor de bebidas, pois a empresa pertence aos mesmos donos das Americanas. A Associação Brasileira da Industria da Cerveja (CervBrasil), que representa fabricantes de menor porte, acusa a gigante de realizar “manobras tributárias” da ordem de R$ 30 bilhões, o que é veemente negado pelos executivos da Ambev.

De qualquer forma, as ações dessas empresas estão sofrendo forte oscilação na Bolsa de Valores e o que estamos vendo pode ser somente a ponta do iceberg.

E as centrais sindicais? E o governo Lula?

No dia 31 de janeiro, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, reuniu-se com representantes de centrais sindicais para tratar sobre o problema. Os dirigentes sindicais mostraram-se preocupados em relação aos empregos ameaçados e propuseram, genericamente, que o governo acompanhe o processo de recuperação judicial para estabelecer um diálogo tripartite em busca de uma solução (1).

Já o ministro respondeu: “O intuito de vir fazer uma visita hoje a vocês (sindicatos) é ouvir mesmo. Não tem uma proposta de governo de como enfrentar (a crise). Viemos ouvir estratégias de parte dos trabalhadores. E podemos estar à disposição para dialogar junto com a empresa (2)”.

No dia 3 de fevereiro, a Executiva Nacional da CUT lançou uma nota afirmando que “está tomando todas as medidas judiciais e negociais necessárias para garantir que os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras das Lojas Americanas e também dos seus fornecedores sejam garantidos (3)”.

Nesse mesmo dia, na sede das Americanas no Rio de Janeiro, ocorreu um ato em defesa dos empregos organizado pelas centrais sindicais, com um potente carro de som à frente, mas uns poucos militantes de esquerda e dirigentes sindicais ao redor.

Está claro que as centrais sindicais não sabem o que fazer nem o que propor para, de fato, defender os empregos ameaçados. E o governo Lula foge do problema como o diabo foge da cruz.

O que fazer para defender os empregos?

Até o momento, como não há nenhum sinal de que o governo Lula irá agir para salvar os empregos ameaçados e não há nenhuma garantia judicial para salvaguardar esses postos de trabalho, não resta alternativa para os trabalhadores a não ser se organizar e lutar por seus próprios meios.

As centrais sindicais e os sindicatos de comerciários espalhados pelo Brasil devem lançar uma campanha nacional em defesa dos empregos, com visitas aos trabalhadores de cada loja, galpão e escritório da empresa, com o intuito de construir uma greve geral dos trabalhadores da Americanas, apoiada numa ampla rede de solidariedade na forma de piquetes, abaixo-assinado, moções, manifestações de rua, pressão sobre parlamentares etc.

A luta tem que estar dirigida para que o governo Lula ou o juiz da recuperação judicial decrete imediatamente a estabilidade no emprego! Nenhuma demissão! Os trabalhadores não são responsáveis pela fraude na empresa e, portanto, não devem ser punidos!

Se as centrais colocarem uma campanha desse tipo em movimento, nós marxistas estaremos na linha de frente desse combate e temos certeza de que a classe trabalhadora atenderá ao chamado porque sabe que hoje os trabalhadores da Americanas estão ameaçados pelo desemprego, amanhã pode ser qualquer um de nós.

Mas, para isso, é preciso estabelecer um plano e um calendário de lutas, agitação e propaganda e focar os esforços nessa mobilização, ao invés de confiar apenas nas “medidas judiciais e negociais” em andamento.

Nossas demandas:

À essa campanha de frente única, no entanto, nós marxistas agregamos outras exigências:

A) Comissão de Apuração dos Trabalhadores!

Que seja eleita uma comissão de trabalhadores da Americanas e seus representantes sindicais para apurar de forma independente toda a contabilidade dos últimos anos e, assim, identificar como ocorreu a fraude e quem são os responsáveis.

Os trabalhadores são os maiores interessados em saber como está a situação das empresas de onde provém o sustento de suas famílias. Portanto, deveriam ter direito a acessar e fiscalizar, através de comissões eleitas pelos próprios trabalhadores, todos os registros contábeis, operacionais, comerciais e financeiros disponíveis.

Aliás, já que as dúvidas pairam também sobre a Ambev e a Marisa, é urgente que os operários e trabalhadores dessas empresas tenham também acesso aos registros por meio de uma comissão eleita pelos próprios trabalhadores e seus representantes sindicais.

O caso da Americanas comprova que é ingenuidade pensar que o próprio mercado é capaz de fiscalizar e evitar fraudes desse tipo. A Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, criou recentemente um “Novo Mercado da Bolsa”, apenas para negociar ações de empresas que adotam rígidas regras de governança corporativa e, entre essas empresas, a B3 listava a Americanas!!

E mais: quantas empresas de auditoria analisaram os registros da Americanas e assinaram relatórios garantindo que estava tudo em ordem nos últimos anos?

Trata-se de capitalista encobertando capitalista. É preciso que os próprios trabalhadores tomem conhecimento da situação e analisem de maneira independente os registros das empresas!

B) Confisco dos bilionários para cobrir o rombo da Americanas!

A fraude e a má gestão nos últimos anos levaram a empresa a reconhecer na Justiça que possui uma dívida de mais de R$ 40 bilhões. Isso coloca em risco os empregos e a continuidade das operações da rede varejista. Portanto, para sanar as finanças da companhia e dar continuidade às suas operações, é preciso que aqueles que lucraram com o golpe sejam punidos! Não é possível tirar a Americanas desse buraco vendendo ativos e bens da própria empresa ou demitindo trabalhadores e fechando lojas pelo país, como a recuperação judicial mais cedo ou mais tarde irá fazer. É preciso confiscar renda, bens e patrimônio dos senhores Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcelo Telles!

É um escândalo social e, ao mesmo tempo, uma clara demonstração do significado do capitalismo nos dias de hoje: esses senhores acumularam uma fortuna na casa dos bilhões de reais e vivem uma vida de luxo explorando trabalhadores comuns e fraudando balanços contábeis e financeiros e agora vão sair ilesos enquanto os trabalhadores vão ficar desempregados? Não podemos aceitar!

C) Estatização da Americanas para garantir todos os empregos!

Na nossa opinião, a única saída capaz de garantir todos os empregos e a continuidade das operações da rede varejista de maneira duradoura é a estatização sob controle dos trabalhadores.

Evidentemente, não temos como prever o futuro, mas dificilmente a Americanas conseguirá se reerguer, sem que sejam tomadas as medidas que defendemos para a manutenção dos empregos e para a continuidade das operações. Isso gerará um impasse: quem vai pagar a conta? Nesses casos, a corda sempre tende a estourar do lado dos trabalhadores, com fechamento dos postos de trabalho e milhares de empregos perdidos. Basta ver o que aconteceu com a Livraria Cultura: ao final do processo de recuperação judicial, a conclusão foi decretar a falência da empresa! O resultado agora é de cenas lamentáveis de um amontoado de livros recolhidos pelas editoras e um enorme vazio de empregos e de conhecimento em cada loja fechada.

Não é justo que os donos bilionários da Americanas escapem de suas responsabilidades e deixem um deserto de postos de trabalho para trás. Por isso, exigimos que o governo federal exproprie o grupo Americanas, ou seja, tire a empresa das mãos desses fraudadores e a estatize! Dessa forma, os empregos serão preservados e as operações poderão ser relançadas sob controle dos próprios trabalhadores!

Mas, vamos supor que os empregos sejam mantidos até o final da recuperação judicial. Vamos supor ainda que os responsáveis pela fraude sejam punidos e que os bilionários sejam obrigados a resgatar financeiramente a empresa. Mesmo assim, a estatização se impõe como uma solução, pois a dinâmica de centralização e concentração de capital conduz a um processo de fusões, aquisições e quebra de empresas menores. Isso faz com que haja um aumento do capital constante na composição orgânica do capital, ao mesmo tempo em que reduz a proporção de capital variável. Dito de outra forma, os grandes capitalistas ficam gigantes às custas dos capitalistas menores e a força de trabalho humana se desvaloriza em relação a esse capital acumulado, aumentando a desigualdade social e o fosso entre ricos e pobres.

A estatização é o primeiro passo desmontar esse círculo vicioso, pois transforma a propriedade privada em propriedade pública e, portanto, voltada para atender o interesse coletivo e não para enriquecer ainda mais os capitalistas. Mas, como afirmamos, esse é apenas o primeiro passo, rumo à propriedade social dos meios de produção! Um regime onde os trabalhadores no poder terão sob seu controle todas as principais fábricas, bancos e empresas e, portanto, estaremos em condições de reorganizar toda a economia no interesse da maioria do povo, segundo um plano democraticamente elaborado.

Dessa forma, o trabalho terá outro sentido. Não será mais um mero meio de subsistência, enquanto os bilionários ficam cada vez mais ricos. Os trabalhadores estarão livres da exploração e nosso trabalho estará voltado para buscar resolver os graves problemas sociais que assolam a humanidade.

– Todo apoio à luta em defesa dos empregos na Americanas! Que as centrais sindicais organizem uma campanha nacional, com calendário de lutas e mobilizações!

– Nenhuma demissão! Estabilidade no emprego, já!

– Comissão de Investigação eleita pelos próprios trabalhadores sobre os registros da empresa! Punição aos responsáveis pela fraude!

– Confisco de renda e de bens dos bilionários donos da Americanas para cobrir o rombo e dar continuidade às operações!

– Pela estatização da Americanas sob controle dos trabalhadores!

(1)https://www.ncst.org.br/subpage.php?id=25386_31-01-2023_nota-das-centrais-sindicais-sobre-lojas-americanas

(2)https://extra.globo.com/economia-e-financas/americanas-ministro-luiz-marinho-diz-que-fundamental-preservar-atividade-da-empresa-25652122.html

(3)https://www.cut.org.br/noticias/lojas-americanas-em-defesa-dos-direitos-dos-trabalhadores-e-trabalhadoras-c1b5