Eleições gregas (Parte 1): Se a esquerda estivesse unida poderia ter ganhado

Os resultados das recentes eleições na Grécia – um terremoto político – são uma clara indicação da crescente radicalização da sociedade que tem na base o impasse histórico do capitalismo e o movimento em direção a uma situação abertamente revolucionária.

SYRIZA é o grande ganhador das eleições e emergiu como a voz indiscutível da virada à esquerda entre as massas trabalhadoras. A alta percentagem de votos que recebeu e seu amplo movimento em direção a uma possibilidade concreta de ganhar o poder estão devolvendo confiança à classe trabalhadora e às massas pobres, depois de dois anos de numerosas derrotas, e colocou a classe dominante nas cordas, lançando-a na confusão e no pânico.

Os grandes perdedores, por outro lado, são os conservadores do partido da Nova Democracia e a liderança burguesa do PASOK, que sofreram um colapso sem precedente, enquanto os principais apoios do governo burguês, LAOS e a Aliança Democrática (Dimokratiki Symmachia, de Dora Bakoyanni) também foram esmagados e não conseguiram votos suficientes para entrar no Parlamento. O único partido do campo tradicional da burguesia que obteve um número suficiente de votos foi o partido do Senhor Kammenos, dos “Gregos Independentes” (Anexartiti Hellines), baseado na demagogia anti-austeridade. O “Amanhecer Dourado” (Chrysi Avgi), neonazista, se beneficiou da desintegração dos partidos tradicionais da burguesia e da confusão política entre as atrasadas camadas pequeno-burguesas e, dessa forma, foram capazes de ganhar uma percentagem relativamente alta de votos, um alerta para a esquerda e para o movimento dos trabalhadores.

O Partido Comunista apresentou um quadro de estagnação, fracassando em ganhar apoio adicional de um “mar” de eleitores que estava se movendo para a esquerda. Finalmente, o partido da “Esquerda Democrática” (Dimokratiki Aristera) viu o alto perfil eleitoral – que apresentara três meses antes – subitamente “desinflado”, e foi incapaz de lançar raízes profundas dentro das massas trabalhadoras.

Esses resultados eleitorais não permitem a formação de um governo de coalizão burguesa, uma vez que a Nova Democracia e o PASOK juntos fracassaram em obter a maioria no Parlamento, a despeito do bônus adicional de 50 cadeiras parlamentares que a Nova Democracia obteve devido ao seu primeiro lugar. Isto explica porque novas eleições – que se espera aconteçam em junho – são uma absoluta necessidade para a burguesia, mas também uma oportunidade nova e ainda mais histórica para a esquerda.

“Nova Derrocada”

A liderança da Nova Democracia (ND), que esperava votos suficientes para lhe capacitar a governar sozinha, ganhou somente 18,87% deles, com aproximadamente 1,2 milhões de votos. E foi somente graças à “fraude” legalizada pela lei eleitoral que eles ganharam 108 assentos. O partido perdeu 14,6% de seus 33,47% em 2009, uma queda histórica deste partido tradicional da burguesia, que também perdeu quase um milhão de votos em termos absolutos! Este resultado é um desastre para Nova Democracia e, objetivamente, coloca não somente o problema de sua liderança, mas também a própria sustentabilidade do partido.

Os resultados eleitorais da ND nas grandes cidades caíram para níveis historicamente baixos em comparação aos dados anteriores para os principais partidos burgueses do país. Em Atenas, no primeiro distrito eleitoral, caíram 15,95% (de 31,75% a 17,79%) e no segundo, 14,22% (de 26,62% a 12,4%); em Pireus, no segundo distrito eleitoral caíram 23,06% (de 23,06 a 9,77%) e no primeiro, 16,33% (de 32,97% a 16,44%); já em Tessalônica, no primeiro distrito eleitoral caíram 15,55% (de 30,3% a 14,8%) e no segundo, 17,61% (de 37,62% a 20,01%).

Agora, algumas figuras de destaque dentro da ND – agentes e apologistas da classe dominante – estão abertamente colocando a questão da liderança do partido e lançando um apelo pela reunificação dos fragmentos políticos que anteriormente se tinham afastado do partido (LAOS, Aliança Democrática, Gregos Independentes). Contudo, além do fato de que o tempo até as próximas eleições seja bastante limitado, o retorno da ND aos seus altos resultados anteriores não pode ser alcançado através de uma mera “remontagem” desta fragmentação porque, no período que está se iniciando, a maioria da sociedade grega se move claramente para a esquerda.

Apesar de todas as manobras cômicas do Senhor Samaras, que contribuíram para a decadência e obsolescência da ND, a desastre eleitoral do partido não resultou de uma liderança incompetente, mas, em última instância, reflete a crescente fragilidade política e o impasse da classe dominante, enquanto o capitalismo grego está se movendo a todo vapor para um default (calote) desordenado e para a saída da Zona do Euro.

SYRIZA – Uma oportunidade para tomar o poder e as novas tarefas para conseguir isto
Os resultados do dia seis de maio revelam que SYRIZA está se transformando a cada dia em um forte movimento de massas pelo poder. Seu êxito se deve, acima de tudo, a seu persistente apelo por um governo da Esquerda, o que reacendeu a esperança política das desesperadas massas da classe trabalhadora e dos pobres.

A poderosa dinâmica de SYRIZA se focou em todos os movimentos sociais progressistas que, sem se deterem, e no devido tempo, se estenderam e galvanizaram toda a população do país, na classe trabalhadora e nos grandes centros urbanos. Dentro desta importante camada das massas, SYRIZA é agora o primeiro e indiscutível partido e, se acrescentarmos seus votos aos do Partido Comunista, vemos como uma poderosa esquerda comunista surgiu e também que um governo da Esquerda é a demanda política básica do povo trabalhador.

SYRIZA ganhou em todo o país uma surpreendente votação de 16,78% dos votos, obtendo 12,18% de votos a mais em comparação com 2009 (quando recebeu apenas 4,6%), e cerca de 1,1 milhões de votos no total – 800 mil votos a mais que em 2009 (quando recebeu somente 315.655 votos).

O núcleo duro de apoio a SYRIZA é formado pelo eleitorado das massas trabalhadoras e das grandes cidades, onde as forças aliadas de SYRIZA geralmente ganham o primeiro lugar. No segundo distrito de Atenas, o maior colégio eleitoral do país, SYRIZA ganhou 14,41 pontos percentuais a mais, alcançando 21,81% em comparação aos 7,4% de 2009 e agora se coloca como o primeiro partido. No primeiro distrito eleitoral de Atenas, SYRIZA ganhou 11,11% a mais que em 2009, ganhando um total de 19,09% dos votos ante sua votação anterior de 7,98%. No segundo distrito eleitoral de Pireus, SYRIZA ganhou 18,6% a mais, obtendo um total de 23,85% acima dos 5,65% que ganhou em 2009. No primeiro distrito eleitoral de Tessalônica, SYRIZA cresceu 11,68 pontos percentuais comparados a 2009, obtendo 17,46%, acima dos 5,77%. No segundo distrito eleitoral de Tessalônica, SYRIZA alcançou 10,35% a mais, obtendo um total de 14,42% dos votos, em comparação aos 4,08% de 2009. Na municipalidade de Patras, SYRIZA avançou 20,13 pontos percentuais, obtendo 25,41% dos votos, acima dos 5,28% de 2009.

Alguns exemplos impressionantes são os resultados de SYRIZA nas zonas operárias de Atenas. Em Peristeri, SYRIZA aumentou seus votos em 17,5 pontos percentuais, obtendo 24,0% em comparação aos 6,5% de 2009. Na municipalidade de Nea Ionia, o aumento foi de 17,6%, obtendo 24,62% dos votos, acima dos 7,36% anteriores. Na municipalidade de Perama, ganhou mais 17,8 pontos percentuais, obtendo 22,03%, acima dos 4,23% anteriores. Na municipalidade de Keratsini-Drapetsona, cresceu 18,63 pontos percentuais, obtendo um total de 24,41% dos votos, acima dos 5,78% anteriores.

Tudo isto mostra com clareza que, com este crescimento em massa nos votos, SYRIZA se transformou no partido de massas fundamental da classe trabalhadora. Depois de três décadas de domínio do PASOK, a liderança política dentro da classe trabalhadora retornou ao movimento comunista. Esta é uma grande oportunidade histórica que a direção de SYRIZA não pode permitir que seja desperdiçada. Tem o dever de rejeitar qualquer tipo de cooperação com os partidos burgueses e, baseando-se no grande apoio que recebeu das massas trabalhadoras, deve levantar a causa do socialismo, apelando constantemente ao Partido Comunista para formar uma aliança política para a luta pelo poder.

Por outro lado, é hora de SYRIZA abandonar sua atual e débil estrutura de aliança entre um grande partido tradicional (Synaspismos) e várias organizações pequenas de esquerda e de “indivíduos” para se transformar em um grande partido de massas que organize a classe trabalhadora e a juventude.

Também é tempo de SYRIZA abandonar suas débeis demandas programáticas e começar a desenvolver o programa político que se adeque à situação atual. Os marxistas do Synaspismos acreditam que o que realmente necessita SYRIZA nestes tempos de crise histórica e de decadência do capitalismo é de um programa socialista baseado na ideia de que a principal tarefa de um governo da Esquerda é substituir este sistema apodrecido por uma economia planificada democraticamente, onde as alavancas fundamentais da economia sejam nacionalizadas, enquanto que, ao mesmo tempo, seja derrubado o Estado burocrático e burguês autoritário e corrupto, para substituí-lo pelas instituições do movimento operário, por uma democracia operária genuína (para mais detalhes sobre este ponto, ler nosso recente artigo: SYRIZA: Os “dez pontos” e o governo da Esquerda).

A classe operária e as massas empobrecidas não podem esperar. A crise capitalista está condenando-as à pobreza, enquanto que a crescente reação burguesa – tanto em sua expressão mais moderada, como a de Samaras, Chrysochoidis e Kammenos, quanto a mais extremista, a do neonazista “Amanhecer Dourado” – está afiando as garras. O impulso para frente de SYRIZA é hoje poderoso, mas o caminho ao poder não está isento de obstáculos. Depois da confusão inicial e do pânico, a classe dominante, em estreita colaboração com a “Troika” (União Europeia, FMI e Banco Central Europeu), resistirá em muitas frentes, com represálias políticas e econômicas, e vai tratar de aproveitar todas as possíveis debilidades, retiradas e desilusões por parte da direção de SYRIZA, caso esta tente um caminho “suave”, “pacífico” e “gradual” em relação ao poder e à mudança social.

Com o objetivo de desterrar a “Troika” de uma vez por todas, para abolir suas leis, para recuperar todos os direitos que nos foram tirados e colocar em prática nosso programa, temos que estar preparados para lutar seriamente pelo poder! Há que se organizar as massas em luta, assegurando que tenham os meios necessários para se defender contra a violência e o terror oficial e extraoficial do Estado. Em cada local de trabalho e em cada bairro, é o momento de criar amplos comitês de defesa do Governo da Esquerda, que lhe garantam a execução do programa, uma vez alcançado o poder.

Fonte: Elaboração própria com dados do Ministério do Interior da Grécia.

Traduzido por Fabiano Adalberto

Revisado por Roberta e Edson

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