Imagem: Roberto Parizotti, Fotos Públicas

Desemprego e informalização empurram os trabalhadores para miséria    

No dia 30 de setembro o IBGE divulgou sua última Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio – PNAD. A pesquisa apresenta os dados relacionados à taxa de emprego e renda dos trabalhadores no último trimestre.

Destacamos aqui alguns indicadores da pesquisa1:

  • A atual taxa de desemprego caiu para 13,7% da população economicamente ativa. No trimestre anterior era de 14,7%;
  • O número total de pessoas subocupadas (trabalho de baixa qualidade) é de 7,7 milhões de trabalhadores, recorde da série histórica;
  • Atualmente existem 4,4 milhões de trabalhadores desalentados, ou seja, que desistiram de procurar emprego;
  • O número de pessoas que trabalham por conta própria é de 25,2 milhões, outro recorde da série histórica da PNAD;
  • A taxa de informalidade é de 40,8%, ou 36,3 milhões de trabalhadores;
  • O rendimento real dos trabalhadores caiu 2,9% em relação ao último trimestre, encontrando-se na ordem de R$ 2.508,00;
  • O INPC dos últimos doze meses atingiu o patamar de 10,42%.

Embora a pesquisa demonstre que há certa estabilização na taxa de desemprego, a situação econômica e social da classe trabalhadora se degrada. Trabalho por conta própria, trabalho informal e sub ocupação, significam precarização das condições de trabalho. Basta verificar que a renda média dos trabalhadores caiu enquanto o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), que mede a inflação para os trabalhadores que recebem de um a cinco salários-mínimos foi de 10,42% nos últimos doze meses.

Quanto a renda mensal média dos trabalhadores na ordem de R$ 2.508,00, há que se constatar que este valor representa menos da metade do salário-mínimo do Dieese definido para o último período, fixado em R$ 5.583,90.

No dia 7 de outubro, a matéria publicada na Folha de São Paulo2 enfatizou o problema da taxa de informalidade no mercado de trabalho e a oscilação na renda dos trabalhadores. Segundo Fernando Veloso, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, ouvido pela reportagem, “nos últimos episódios de volatilidade, que têm sido a característica da economia, muitos informais de baixa renda acabaram escorregando para a miséria. São crises temporárias que têm causado cicatrizes permanentes”.

Quatro anos de reforma trabalhista

No contexto da guerra de classes, um dos maiores ataques sofridos pela classe trabalhadora nos últimos anos foi a aprovação da Lei 13.467/2017, que alterou cerca de duzentos dispositivos da CLT. Um dos argumentos do então governo Temer e outros serviçais da burguesia, era que as novas regras do direito do trabalho romperiam amarras no mercado de trabalho e provocariam um “boom” de novos empregos.

Mas o que se constatou, como não poderia ser diferente, foi o oposto. Dados do IBGE demonstram que no último trimestre de 2017 a taxa de desocupação no Brasil que era de 11,8%, quatro anos depois subiu para 13,7%. Fica evidente que o único objetivo da reforma foi a ampliação da exploração da força de trabalho, pois, além de não aumentar o nível de ocupação jogou os trabalhadores na informalidade ou em modalidades de trabalho precarizados pela própria legislação, como é o caso do trabalho intermitente ou em tempo parcial.

Outra consequência da reforma foi a obstrução no acesso à Justiça do Trabalho. De acordo com o Tribunal Superior do Trabalho, de 2017 (ano da reforma) para 2020 houve uma queda de 27,7% no número de ações trabalhistas ajuizadas. A redução não decorre da diminuição de conflitos nas relações de trabalho, mas sim pelas imposições feitas aos trabalhadores pelas novas regras que os obrigam a arcar com o pagamento de honorários advocatícios e periciais quando perdem a causa, mesmo sendo beneficiários da gratuidade da justiça. É possível afirmar que a Justiça do Trabalho se tornou menos acessível que a Justiça Comum.

O fim do trabalho?

Nas últimas décadas pensadores da pós-modernidade apostaram que o processo de automação e informatização levaria ao fim do trabalho. Qualquer pessoa com um mínimo de seriedade intelectual sempre considerou absurda esta hipótese. Até porque o que se constatou foi um fenômeno inverso, a expansão da classe trabalhadora em outras modalidades de trabalho. É o que explica o sociólogo do trabalho Ricardo Antunes em seu livro “O privilégio da servidão”:

Ao contrário da eliminação completa do trabalho pelo maquinário informacional-digital, estamos presenciando o advento e a expansão monumental do novo proletariado da era digital, cujos trabalhos, mais ou menos intermitentes, mais ou menos constantes, ganharam novo impulso com as TICs, que conectam, pelos celulares, as mais distintas modalidades de trabalho. Portanto, em vez do fim do trabalho na era digital, estamos vivenciando o crescimento exponencial do novo proletariado de serviços, uma variante global do que se pode denominar escravidão digital. Em pleno século XXI.3

O problema é que esse novo contingente de trabalhadores opera de forma precarizada, sem direitos ou proteção social. Um trabalhador informal não possui acesso, entre outros direitos, ao seguro-desemprego ou Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, apenas para exemplificar.

A informalização, precarização do trabalho e o desemprego são, como sempre foram, elementos constitutivos do modo de produção capitalista, sem os quais o sistema deixa de funcionar.

Marx, no Capital I, explicava a importância do exército industrial de reserva, ou seja, “uma população trabalhadora adicional relativamente excedente, isto é, excessiva para as necessidades médias de valorização do capital e, portanto, supérflua4. Essa massa de trabalhadores desempregados ou precarizados permanece à disposição do capitalista, seja para suprir necessidades diante de eventuais exigências de mercado, seja para regular os salários diante da oferta de mão de obra e com isso ampliar o capital. De qualquer modo, o aprofundamento das crises cíclicas do capitalismo, cada vez mais severas, descartam qualquer possibilidade, mesmo que parcial, da melhora das condições de vida dos trabalhadores, como ocorreu em determinado momento nos países centrais do capitalismo após a segunda guerra mundial.

O conjunto de inovações produzidas nos últimos três séculos foram apropriadas pelo capital, portanto, produz uma quantidade absurda de riquezas para uma parcela ínfima da humanidade. Por outro lado, verifica-se que nas últimas décadas não houve redução da jornada de trabalho, direitos anteriormente conquistados foram suprimidos, trabalhadores vão para a informalidade, para o trabalho precarizado e para o desemprego, ou seja, acumulação do capital de um lado e ampliação da pobreza e da miséria do outro.

No período da pandemia esse fenômeno se agravou. Se a morte e a miséria assolaram a vida de milhões de trabalhadores ao redor do mundo, houve um crescimento no número de bilionários. Levantamento da revista Forbes apurou que no início de 2021 havia 2.775 bilionários espalhados em 70 países. No Brasil a lista de bilionários passou de 45 no início de 2020, para 65 de super ricos em 2021.5 Além disso a fortuna desta minoria aumentou em 31% durante a pandemia.

Dados como esses não podem levar a classe trabalhadora ao desânimo ou desespero, mas sim unificá-la na luta contra os exploradores, na toada da Internacional, em especial no seguinte trecho:

[…] Abomináveis na grandeza
Os reis da mina e da fornalha
Edificaram a riqueza
Sobre o suor de quem trabalha
Todo o produto de quem sua
A corja rica o recolheu
Querendo que ela o restitua
O povo só quer o que é seu
[…]

1 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. https://www.ibge.gov.br/indicadores#desemprego. Acesso em 05/10/2021.

2 Emprego informal dobra e ‘ioiô’ na renda empobrece brasileiro. Portal Folha de S. Paulo. 07/10/2021. https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/10/emprego-informal-dobra-e-ioio-na-renda-empobrece-brasileiro.shtml

3 ANTUNES, Ricardo. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Boitempo, 2018. p. 37. (p. 37).

4 MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política: Livro I. O processo de produção do capital. São Paulo: Boitempo, 2013. p. 705.

5 Mesmo com pandemia, número de bilionários bate recorde; 65 no Brasil. Veja a lista, Revista Isto É Dinheiro. Ed. n. 124201.10, de 06/04/2021. https://www.istoedinheiro.com.br/mesmo-com-pandemia-numero-de-bilionarios-bate-recorde-65-no-brasil-veja-a-lista/