Trabalhadores e eleições nos EUA: entre o fogo e a frigideira a receita é independência de classe!

No artigo que abaixo segue, Mario Conte faz uma acurada análise da situação da luta de classes nos EUA, onde se destaca o combate pela organziação independente na luta pelo partido dos trabalhadores.

No mês de novembro deste ano ocorrerão eleições presidenciais nos Estados Unidos. A campanha já começou e os meios de comunicação e imprensa têm se ocupado quase que exclusivamente dos candidatos democrata (Barack Obama) e republicano (Mitt Ronney), divulgando suas viagens e apresentando seus discursos como antagônicos, para manter a aparência de democracia na escolha de um melhor (ou menos pior) entre dois iguais, ou como disse John Petterson em http://www.marxist.com/estados-unidos-sem-escolha-trabalhadores.htm,  a escolha entre: “O ‘enforcamento político e econômico’ ou o ‘afogamento político e econômico’,  são mesmo as únicas opções?.”  Não deveriam ser, e em sua perspectiva marxista ele demonstra que não são de fato, mas a diferença reside no fato de tratar-se de uma perspectiva que a mídia tradicional não pode apresentar, uma vez que sua suposta independência ante interesses financeiros e econômicos não passa de uma farsa, que se revela cada vez mais claramente ao conjunto da classe trabalhadora, como por exemplo em escândalos como o de Rupert Murdoch, que hoje controla mais de cem publicações impressas no mundo todo, além de canais de TV. Para quem não se lembra, um tabloide do grupo Murdoch (o inglês “News of the World”) não somente limitou-se a pagar propina à polícia inglesa pela obtenção de informações, como ainda fez uso de escutas telefônicas ilegais em milhares de celulares para obter furos de notícia exclusivos. A mídia burguesa, uma empresa privada sempre em busca do lucro incessante e crescente, não tem qualquer compromisso com a informação ou com a verdade, ou qualquer escrúpulo ao produzir suas notícias. Por isso mesmo seus pretensos noticiários abusam de imagens e temas sensacionalistas e se utilizam invariavelmente de uma abordagem que não se furta a sacrificar a informação para obter respostas emocionais e irrefletidas do seu público. Tudo em nome das vendas e da audiência.

Foi surfando nesse tipo de propaganda travestida de notícia, que Barack Obama ganhou as últimas eleições presidenciais nos EUA. Apresentado como a imagem viva do “bom moço” que resolveria os problemas daquela nação e de todo o resto do mundo, a mídia ajudou-o a tornar-se o anti-Bush, permitindo que ele pudesse ser reinventado á imagem e semelhança de cada eleitor insatisfeito do país, como aquele que faria tudo diferente (não foi por mero acaso que as palavras mais usadas por Obama na sua campanha foram “hope” e “change”, que significam respectivamente “esperança” e “mudança”, além do seu slogan de campanha ser “yes, we can”, que significa ”sim, nós podemos”). Dessa forma, o movimento anti-guerra viu em Obama um anti-guerra, ainda que ele não fosse; os sindicatos viram nele um apoiador dos trabalhadores que estaria ao lado deles, mesmo que ele nunca tenha combatido por seus interesses; ambientalistas viram nele um apoiador de energia renovável e educadores e pais pensaram que ele fosse fortemente a favor da educação pública (desnecessário dizer que ele não é nem uma coisa nem outra também).

Em outras palavras, o povo viu, e continua vendo em Obama, embora cada vez menos, o que eles queriam ver nele. Já que ele nunca explicou claramente com que tipo de esperança ou mudança se comprometia de fato, foi necessário que o tempo revelasse que seu mutatis mutandis não passava de realizar as mudanças necessárias para que tudo permanecesse igual, como dizia o famoso personagem do livro do siciliano Giuseppe Tomasi di Lampedusa, “O Leopardo”. As mudanças, como esperavam (a esperança de novo) todos aqueles que financiaram a sua campanha com milhões de dólares, consistiam simplesmente no rebaixamento das condições de vida da classe trabalhadora americana e na redução dos investimentos públicos nas áreas sociais, como medida para garantir intocados os lucros da burguesia financeira e industrial. Exatamente o que esses últimos esperavam dele, aclamando essas medidas e repetindo em coro “yes, we can”, o “sim, nós podemos” manter nossas obscenas taxas de lucro e “sim, nós podemos” ostentar ainda a mesma riqueza,  apesar do sistema capitalista encontrar-se em colapso no mundo inteiro, espalhando cada vez mais miséria, fome e guerra por ele, como um quinto cavaleiro do apocalipse (as doenças epidêmicas, a peste, são também outro efeito colateral desse bárbaro sistema).

Tal desempenho de Obama criou junto a grande parcela do eleitorado um clima de certa desilusão, uma vez que ele sequer se esforçou em cumprir as promessas. Justiça seja feita, ele mesmo nunca se comprometeu com elas de fato, foram os eleitores ávidos por mudanças reais que projetaram nele suas próprias esperanças. Ele apenas repetia abstratamente “mudança’ e “esperança”, para que cada um preenchesse as lacunas com as imagens que melhor definissem essas palavras. Mas houve algumas promessas, essas feitas, porém nunca cumpridas, o que levou a um recuo na aprovação do governo Obama pelo terceiro ano consecutivo, encontrando-se em 44,4% em janeiro desse ano segundo pesquisa do instituto Gallup. Essa queda provocou uma mudança retórica, necessária para que Obama pudesse concorrer à reeleição esse ano, uma vez que ele não conseguiu apresentar uma única medida eficaz no combate à crise econômica e financeira e nem nunca poderá fazê-lo, pois tanto ele quanto Mitt Roney não passam de legítimos representantes dos interesses dos grandes negócios e da classe dominante e não podem buscar soluções fora dos limites do regime capitalista, limite onde as soluções reais para a crise não serão jamais encontradas.

A colaboração da mídia na construção da sua imagem como o “bom moço” resultou em um prêmio Nobel da paz para Obama já no seu primeiro ano de mandato. Em uma triste ironia Obama aceitou o prêmio, enquanto dava continuidade às duas guerras herdadas de Bush e travadas em outro continente, tornando-se dessa forma, com justiça, merecedor não de um prêmio Nobel da Paz, mas de um Oscar de melhor atuação na farsa que ainda o apresentava como o candidato da classe trabalhadora. Farsa que encenada agora em novo ato, apresenta-o publicamente como o candidato dos eleitores de origem latina, já que neste momento eles são apontados como aqueles que podem decidir as eleições. A farsa se desvela porque na prática seu governo deportou um número recorde de pessoas nos últimos três anos, a uma média de 400 mil ao ano, sendo a maioria dessas pessoas de origem latina.

Esse e tipo de divisão artificial entre os trabalhadores, como se seus interesses linguísticos, culturais e religiosos estivessem acima dos seus interesses de classe (que Obama e seu partido ajudam a alimentar para obviamente melhor explorar segundo seus próprios interesses), fazem parte da suja política das classes dominantes praticada já desde o antigo Império Romano, cujo lema “dividir para conquistar” foi muito bem assimilado pelo novo império. Desse modo o fato de Obama ser negro foi usado largamente como propaganda de que os EUA são um país democrático que apresenta oportunidades iguais para todos em todos os níveis, enquanto práticas racistas continuam sustentando o sistema, no intuito de dividir os trabalhadores em categorias artificiais e historicamente fabricadas apenas para propagar as ideologias dominantes (que são sempre as das classes dominantes) permitindo um domínio mais eficiente da política e economia pelas classes que já se encontram no poder. Foi para sustentar esse domínio que se criou essa falsidade nada científica chamada “raça”, embora quando de sua invenção o termo se reivindicasse das pseudociências de sua época para conferir-lhe um aparente rigor de tese científica e tornar-se um alicerce ideológico sólido para o racismo (esse sim infelizmente muito real, ainda que fundamentado em uma mentira, já que nunca existiu uma única raça que diferisse quaisquer seres humanos em potencialidades ou capacidades, permanecendo estes essencialmente humanos e esta a única categoria realmente biológica na qual se pode classificá-los, motivo pelo qual o racismo deve ser combatido enquanto existir).

Esse alicerce, ainda que falso, foi consolidado pela ideologia, permitindo que as elites justificassem para si mesmas e para toda a sociedade a manutenção do modo de produção baseado no regime da escravidão em uma nação que nascia sob a “luz” das ideologias iluministas europeias, que afirmavam que todos os homens são iguais, constando inclusive isso na letra da constituição do país, quando de sua libertação da Inglaterra. Como essa igualdade entre os seres humanos simplesmente não pode se dar sob o capitalismo, porque este é o regime da propriedade privada dos meios de produção, que deve, necessariamente, negar oportunidades e condições a uma ampla maioria, os fundadores dessa nova nação resolveram essa contradição da igualdade nos direitos não se realizar nos fatos, mantendo a ideologia nefasta do racismo para permitir que seres humanos se tornassem ou permanecessem como propriedade de outros seres humanos, onde estes últimos pudessem extrair e se apropriar de toda a riqueza que os primeiros produzissem enquanto relegados á condição de objeto e posse, retirando, desde os direitos, a igualdade entre os homens pelas condições concretas da reprodução de sua vida diária, para que de fato eles se desenvolvessem em desigualdade de riquezas e acúmulos materiais e oportunidades políticas e classes sociais. Racismo e capitalismo são duas faces de uma mesma moeda, como explicou Stephen Biko, que combateu a política da apartheid conjuntamente ao regime capitalista na África do Sul, e por isso mesmo foi covardemente assassinado pelas forças da repressão daquele país em 12 de setembro de 1977. As elites reconhecem seus inimigos e ameaças e sabiam que Biko demonstrava e explicava que a divisão do regime racista era a forma que o capitalismo encontrou para se desenvolver e explorar a força de trabalho local, no interesse de uma pequena minoria, como sempre ocorre nesse sistema. Quando a cooptação ideológica falha e a verdade começa a se revelar, as elites burguesas não se constrangem em fazer uso da violência contra aqueles que ameaçam a manutenção de seu poder.

Demonstrando na prática que os interesses políticos e econômicos são definidos pela classe e não por qualquer outra questão, Obama foi ao longo desses três anos de governo, no mínimo conivente com as políticas racistas praticadas nos EUA, como a deportação de imigrantes, a manutenção do muro que separa os EUA do México e as investigações ilegais da CIA e do departamento de polícia da cidade de Nova Iorque de atividades de lojistas e estudantes islâmicos na cidade (mais em http://www.marxist.com/usa-labors-reply-to-nypd-surveillance.htm). Essas divisões como religião e cultura, ou o mito artificialmente criado “raça”, não passam de uma cortina de fumaça com a qual se espera dividir a classe trabalhadora e ocultar que as políticas práticas tanto dos democratas quanto dos republicanos tem sido o fechamento de plantas de fábricas, a redução do número de vagas de empregos, a redução dos salários, os cortes nos direitos historicamente conquistados, os cortes nos gastos sociais de saúde e educação pública, a execução dos contratos de hipotecas permitindo que os mesmos bancos que produziram a crise tomem as casas dos trabalhadores que não podem mais pagar suas prestações por conta dela, ao mesmo tempo em que tanto republicanos quanto democratas despejaram centenas de bilhões de dólares (trilhões já!) nos setores financeiro e industrial, sem exigir-lhes uma única contrapartida por essa doação.

O descontentamento e a percepção de que algo precisa ser feito já se manifestou pelo país, ainda que de forma um tanto desorganizada e expressa em programas e reivindicações confusos. O movimento Occupy e seu slogan “Nós somos 99%” traz á ordem do dia a questão de que a sociedade está dividida em classes e que a classe que devora a maior fatia do bolo não ajuda nem a preparar a massa, nem a assá-lo. Esse salto de consciência constitui inegável avanço, que se expressou com uma greve geral em Oakland em dois de novembro do ano passado, que contou com a adesão de 30.000 trabalhadores de diferentes setores. Juan Rojas explicava o que deveria ser feito, em 14 de novembro do mesmo ano:

“Como já explicamos em artigos anteriores, o movimento organizado dos trabalhadores tem capacidade de mobilizar nas ruas milhões de trabalhadores sindicalizados e não sindicalizados. Os acontecimentos em Oakland devem servir para impulsionar um trabalho que seja mais organizado. Também pode servir como um passo importante para que os sindicatos rompam relações com o Partido Democrata, que representa unicamente os interesses do 1%, e ainda devem (os acontecimentos) ser a inspiração para que o proletariado construa seu próprio partido político de massas. O movimento ainda se encontra na sua etapa inicial. Como marxistas, seguiremos participando, fortalecendo e ajudando o desenvolvimento do movimento, ao mesmo tempo em que defendemos a necessidade da transformação socialista da sociedade e a necessidade de criar um partido trabalhador de massas que represente as necessidades e aspirações da classe trabalhadora.” Ver mais em: http://www.marxist.com/estados-unidos-poderosa-manifestacion-30000.htm

Da mesma forma, o ascenso dos servidores públicos e da juventude no estado de Wisconsin não foi devidamente aproveitado pelas lideranças sindicais locais, que vacilaram perdendo a oportunidade de organizar para além do setor público, explicando ao conjunto da classe que o ataque a alguns é apenas o primeiro passo de mais e subsequentes ataques a todos. Além do mais, a precarização dos serviços públicos, com cortes de pessoal e de investimento, são sentidos diretamente pelos trabalhadores do setor privado, que fazem uso desses serviços como salário diferenciado, salário que retorna em forma de serviços após o pagamento dos impostos que incidem sobre uma fração dos lucros dos capitalistas, que os conquistaram através da exploração dos trabalhadores. Explicar que o ataque a alguns é um ataque a todos era o que deveriam ter feito os dirigentes, utilizando isso para chamar e organizar o conjunto da classe no intuito revidar os ataques até colocar nas cordas o governador Scott Walker, liquidando-o politicamente naquele estado e abrindo perspectivas e novas lideranças entre os trabalhadores nesse processo organizativo. Um revide iniciado pela manutenção das vagas de trabalho e direitos abriria a perspectiva de estendê-los a todos os trabalhadores, dos setores público e privado, uma excelente bandeira que uniria todos os trabalhadores em um combate de Frente Única, a melhor forma de obrigar os mais ricos a pagar pela crise que eles próprios produziram. Tal ato reverberaria além dos setores público e privado, chegando até os trabalhadores não sindicalizados e informais, apontando a agulha da bússola na direção da organização e do combate a serem tomados por todos como as ações políticas eficientes.

Mas a vacilação dos dirigentes teve um preço alto. Ao não organizarem o conjunto da classe, enfraqueceram sua própria base até cederem, o que refletiu no resultado das eleições locais, com 35% dos trabalhadores sindicalizados e 20% dos eleitores democratas votando em Walker, que ainda contou com investimentos em sua campanha na ordem de U$$ 30,5 milhões, sendo 2/3 dessa quantia dos apoiadores ricos de seu estado e 1/3 dela dos apoiadores ricos de outros estados. Ao contrário dos trabalhadores mal orientados pelos seus dirigentes sindicais, a burguesia se uniu, pois sabia muito bem que a manutenção de seu projeto seria garantida com Walker se reelegendo governador e assim financiou-o, independente dele governar outro estado. Como o candidato democrata apresentado como “opção” a ele era Barrett, que apresentou uma proposta assumidamente contrária aos direitos dos trabalhadores, as opções regionais foram apenas um espelho em menores dimensões das eleições federais. Tanto democratas quanto republicanos não possuem alternativas para criar os empregos de qualidade ou prover acesso universal e gratuito à saúde e educação, como todos os serviços públicos que os trabalhadores necessitam. Isso só poderá ser feito por um candidato com independência de classe, comprometido com as bases a partir dos sindicatos, já que tanto democratas quanto republicanos encontram-se impotentes em golpear os interesses dos grandes negócios e se voltam, invariavelmente, contra a classe trabalhadora, repassando a ela a conta do banquete para o qual nunca foi convidada, a não ser para servir os pratos e lavar a louça.

O moral dos trabalhadores se elevará a partir de um revide que coloque na ordem do dia a possibilidade de vitória contra os patrões. Mas para isso eles devem contar apenas com as próprias forças, que não são poucas, apenas se encontram hoje desorganizadas, uma vez que seus tímidos dirigentes nunca se prepararam para as tarefas históricas que hoje se lhes apresentam. Que a aparente derrota no Wisconsin represente uma dura lição, desde que coloque as massas em movimento para os próximos passos, com independência de classe. Uma eleição local com um representante dos trabalhadores vitorioso poderia ser um farol a guiar as embarcações de todos os trabalhadores americanos em uma rota revolucionária, que se aproveitaria das correntes que impulsionam hoje o proletariado por todo mundo nas agitadas marés da luta de classes, ao invés de dexá-los a lamentar-se ao sentir o amargo sabor de encalhar na praia pela falta de opções reais entre os dois partidos representantes da burguesia. Evitar que todos esses erros já cometidos se repitam no futuro, traçando uma estratégia clara baseada em linhas de classe que possa mudar a situação favoravelmente aos trabalhadores, é o desafio que todos os trabalhadores tem pela frente junto a suas lideranças como Richard Trumka e os demais dirigentes da AFL-CIO e o “Mudar para Vencer”¹  . Devem essas lideranças, ao invés de buscar desculpas pela falta de opção eleitoral, em um momento que cerca de 50% do eleitorado de Wisconsin declarou ter uma visão negativa dos dois partidos majoritários (democratas e republicanos), aproveitar o impulso do claro entendimento de que nenhum desses dois partidos hoje defende seus interesses e mobilizar os milhões que constituem sua base para formação de um partido de massa dos trabalhadores, com um programa fundamentado na independência de classe.  Esta seria uma medida muito mais eficaz que as políticas conciliatórias, que vem sendo derrotadas uma a uma, em um processo que apenas desmoraliza e desestimula ainda mais os trabalhadores.

Enquanto não tomarem essa direção, não é de se admirar que fique cada vez mais difícil para os líderes do trabalho levar suas bases para votar. Depois de chamar o acordo de livre comércio da Colômbia como “profundamente desapontador e preocupante”, o Presidente da AFL-CIO, Richard Trumka, deixou transparecer a pressão que está sobre ele: “quanto mais estas coisas acontecem, onde os interesses dos trabalhadores são subjugados a outros, mais há um efeito cumulativo, tornando-se mais difícil para nós energizar nossos membros para que se levantem em número necessário (para votar) no outono”.

Apesar do diagnóstico correto, Trumka não tira dos fatos a conclusão lógica que consiste na necessidade de um partido de massas dos trabalhadores, porque estes não querem mais sair para votar em seus inimigos de classe. Enquanto ele chafurdar no lamaçal de argumentos como “olhem os outros candidatos”, que usa para chamar o voto nos candidatos democratas, se encontrará em sérias dificuldades de conseguir mobilizar trabalhadores para votar em um partido cujos interesses são opostos e irreconciliáveis com os seus. A única e óbvia conclusão é que entre os trabalhadores deverão surgir os “outros candidatos”. Como já explicaram Marx e Engels, em março de 1850 na “Mensagem do Comitê Central à Liga dos Comunistas”:

“O proletariado deve aqui cuidar de que por toda a parte, ao lado dos candidatos democrático burgueses, sejam propostos candidatos operários, na medida do possível de entre os membros da Liga e para cuja eleição se devem acionar todos os meios possíveis. Mesmo onde não existe esperança de sucesso, devem os operários apresentar os seus próprios candidatos, para manterem a sua democracia, para manterem a sua autonomia, trazerem a público a sua posição revolucionária e os pontos de vista do partido.”

Ante a crise do capitalismo que abala a economia e o trabalho nos EUA, tornam-se reivindicações transitórias para os trabalhadores, rumo ao socialismo, até mesmo a luta por empregos, saúde e educação universal e gratuita, que por isso mesmo só podem ser levadas às últimas consequências por candidatos responsáveis antes seus eleitores trabalhadores, ou seja, membros da mesma classe. Assim a afirmação de Marx e Engels faz-se atualíssima nesse momento nos EUA.

Como afirmou John Petterson em 18 de maio, retomando Marx e Engels para hoje:

“Por que não lançar milhares de candidatos do trabalho independentes para os cargos em todos os níveis do governo? Longe de ser um mero voto de protesto, estes candidatos e um partido do trabalho realmente poderiam vencer. Afinal, se os trabalhadores são a maioria, por que toleramos ser governados por representantes de outra classe hostil?

A AFL-CIO já apoiou Obama, para o desespero de muitos de seus membros. Mas não é tarde demais. A AFL-CIO criou um novo super PAC, “A Voz dos Trabalhadores”. Ao final de 2011, já tinha levantado $3,7 milhões. Mais milhões certamente seguirão. Estes recursos devem ser colocados para explicar a necessidade de um partido do trabalho baseado nos sindicatos e candidatos do trabalho. Isso inverteria dramaticamente o debate nacional nas eleições de 2012. Devemos trabalhar para levar esta mensagem para nossos sindicatos, companheiros de trabalho, comunidades, amigos, família, o Ocupar, os anti-guerra, o movimento dos direitos dos imigrantes, e outras lutas.”

Como ele mesmo havia explicado ainda em 2008, após a eleição de Obama:

 “Muitos estão eufóricos com a vitória de Obama, e haverá uma certa lua-de-mel… Mas mais cedo ou mais tarde, a euforia vai sair de moda e a fria realidade aparecerá: nada mudou fundamentalmente. Estamos ainda vivendo sob o capitalismo, com tudo o que o engloba: desemprego, execuções hipotecárias, aumento de preços, racismo, milhões de cidadãos e trabalhadores de segunda classe, salários baixos, condições deteriorantes, infraestrutura apodrecida, e assim por diante.

A crise do capitalismo significa cortes, austeridade e instabilidade constante. Não há solução para a maioria dentro dos limites deste sistema. Não podemos esperar que um partido pró-capitalista execute políticas anticapitalistas. Armado com um programa socialista, um partido de massa do trabalho levantaria as bases não apenas para a ‘esperança’, mas para mudança real.”

Aproveitando a declaração da AFL-CIO de que não mais apoiariam automaticamente ao Partido Democrata, no dia 14 de maio, Petterson escreveu uma “Carta a Trumka”, felicitando-o em nome da campanha por um “Partido de Massa dos Trabalhadores” e dirigindo-se a este para que faça uso de sua autoridade e representatividade para convocar a constituição e organização dos trabalhadores em um partido de massas, sob a linha de independência de classe:

“As inspiradoras lutas de dezenas de milhares de trabalhadores em Wisconsin, Michigan, Ohio, Nova Iorque, e em qualquer outro estado dos EUA demonstram que os trabalhadores já tiveram o suficiente e estão dispostos a lutar. Estas ações das massas enviam uma mensagem clara de que os trabalhadores querem o direito de ser representados por um sindicato. Também mostram que os trabalhadores querem empregos para todos e estabilidade no emprego, para não falar em melhores salários, direitos, saúde e condições de trabalho.

No entanto, sem uma liderança política clara, supõe-se que os trabalhadores devem seguir votando pelos democratas, mesmo com esse partido traindo os trabalhadores em uma questão após a outra. Sua declaração pode mudar isso. Sua declaração de independência política é um reconhecimento de que a relação entre o movimento  dos trabalhadores e os democratas nunca passou de uma relação entre um cavalo e seu cavaleiro.”

Nos últimos meses produziram-se alguns novos movimentos, ainda tímidos, nessa direção. Como o partido “Families First” da Carolina do Norte e o “Partido Trabalhador da Carolina do Sul”, formados recentemente, indicando a direção correta a ser tomada, mas ainda muito pequenos e, consequentemente, ainda aquém da tarefa necessária. Tarefa que é a constituição de um Partido dos Trabalhadores de massas, de alcance nacional, com delegações e membros em todos os estados e cidades do país, organizado com independência política para fazer a diferença no interesse dos trabalhadores.

Dessa forma Petterson se dirige a Trumka, explicando que não basta que os democratas não contem como certos os votos ou apoio dos trabalhadores, quando milhões deles voltam seus olhos para os seus sindicatos e dirigentes esperando uma clara indicação de em quem devem votar nas próximas eleições, conscientes que estão de que são a ampla maioria da população e seguem sem representantes ou voz real, quer em Washington, quer em nível regional. De onde se conclui que a única alternativa viável é a de um Partido dos Trabalhadores, baseado nos sindicatos, que dispõe de membros, recursos, vínculos e confiança dos trabalhadores e comunidades, para construir uma alternativa real a democratas e republicanos, que hoje representam indistintamente os interesses do grande capital e dos grandes negócios dos EUA.

Só um partido dos trabalhadores pode se colocar seriamente pela luta por salários dignos e pelo direito de representação sindical para todos, além de lutar pelos direitos de acesso universal e gratuito à saúde e à educação, à moradia digna e com toda infraestrutura necessária, além da necessidade da revogação da lei Taft-Hartley² e de todas as demais leis antissindicais.

Somente um partido dos trabalhadores combateria o atualmente inflado orçamento militar, produzindo os cortes necessários e reorientando esses recursos no interesse social. Da mesma forma, apenas um partido dos trabalhadores poderá organizar todos segundo seu interesse de classe, promovendo a luta contra toda a discriminação e racismo, assim como toda e qualquer forma de preconceito religioso, de gênero ou orientação sexual, promovendo legislações que garantam salário igual para funções iguais e promovendo a legalização e ingresso no mercado de trabalho formal para todos os imigrantes hoje ilegais ou subempregados. Ao organizar todos os trabalhadores, o partido impulsionaria também todos os desempregados, aposentados e a juventude em um verdadeiro movimento de massas pela reorientação das riquezas produzidas para o interesse comum, através do controle democrático dos trabalhadores de todas as indústrias e empresas ao invés de apenas assumirem a posição defensiva para evitar cortes ou concessões de direitos que já tinham como consolidados.

O partido organizaria marchas e movimentos de massa por mais postos de trabalho e contra todos os tipos de cortes ou fechamento de vagas e plantas e poderia apresentar alternativas da estatização sob controle operário de todas as fábricas fechadas pelos seus proprietários burgueses por não apresentarem mais as mesmas altas taxas de lucros, o que leva esses capitalistas a reinvestirem seu capital em outros locais com maior flexibilidade na legislação trabalhista, na intenção de manter suas obscenas margens de lucro intocadas ou mesmo crescentes. O partido pode agrupar milhões de trabalhadores, unindo-os organizadamente para a transformação radical da sociedade e o momento para isso é agora. Do contrário, podem as lideranças, ante o acirramento da luta de classes, permanecer paradas na estação da inação, a olhar o trem da história partir, deixando-as pra trás. Desde já, urge a construção de uma direção revolucionária, que ouse colocar todas essas questões na ordem do dia, explicando pacientemente aos trabalhadores as tarefas imediatas que se lhes colocam, organizando-os com as palavras de ordem corretas. A palavra de ordem correta têm hoje os camaradas da CMI, que se dirigem aos líderes sindicais para que se empenhem “por um partido de massa dos trabalhadores”. Se esses dirigentes permanecerem na estação da inação, serão inexoravelmente ultrapassados pela história e atropelados nos trilhos da ineficiência, pois como disse Leon Trotsky no “Programa de Transição”: “as leis da história são mais fortes que os aparatos burocráticos.”

Certamente, a construção de um partido de massas dos trabalhadores nos E.U.A. será saudada por toda a classe ao redor do mundo e colocará a todos a perspectiva de erguer mais alto suas cabeças para resgatar a dignidade de todos os trabalhadores ao redor do mundo, em um momento que os ataques da burguesia se tornam maiores e mais intensos e violentos, porque têm como objetivo colocar os trabalhadores de joelhos ou até mesmo quebrar as sua pernas, imobilizando-os, através de absurdos planos de austeridade e cortes. Um longo período de acirramento da luta de classes, onde cada batalha colocará a ocupação de nova trincheira para os trabalhadores ou para as sua classe inimiga já se descortinou. Nessa arena, os camaradas da CMI nos E.U.A. já apontaram claramente o que deve ser feito pelas lideranças dos trabalhadores. Estes testarão seus dirigentes a cada novo desafio, mas sua paciência tem limites; a história já demonstrou que a maleabilidade do ser humano não é infinita e com ou sem essas lideranças, os trabalhadores lutarão por seus interesses. Se a luta se der com os trabalhadores armados com um partido de massas dotado de um bom programa, a vitória será mais rápida. A solução dos problemas da crise econômica é mundial, assim como essa crise do capitalismo tem dimensões que ultrapassam as fronteiras dos EUA.

Consolidar vitórias da classe trabalhadora nesse país, através de sua própria organização independente será um empuxo que transformará as atuais vagas revolucionárias dos povos árabes e europeus em um grande tsunami que se espalhará pelas Américas e Ásia até varrer a classe parasitária burguesa definitivamente para seu único lugar de direito, a lata de lixo da história, inscrevendo o fim da pré-história da barbárie capitalista como o primeiro capítulo da história universal para todos os seres humanos, uma história onde todos poderão se colocar diante de tarefas históricas, porque não mais rebaixados pelos grilhões da exploração capitalista às condições sub-humanas de meramente suprir necessidades básicas animais para sua sobrevivência e assim finalmente desenvolver na plenitude todos os potenciais humanos, como nunca em qualquer outro momento da história da humanidade.

(1)  Change for Win: uma nova organização de trabalhadores dotada ainda de um programa confuso, baseado na ideia de que o sonho americano não acabou e a era de ouro pode voltar outra vez mais, sobre eles http://www.changetowin.org/about

(2)  A lei Taft-Hartley foi uma lei de caráter antissindical e antigreve de autoria do senador Robert Taft e do deputado Fred A. Hartley Jr. Foi aprovada em 23 de junho de 1947.