Feminismo segundo a perspectiva marxista (Parte 3)

Este texto busca compreender os movimentos de resistência da mulher, ao longo de suas lutas históricas, que se expressaram e se expressam de diversas maneiras, sendo o termo feminismo uma designação comum para eles.

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REVOLUÇÃO RUSSA: A MULHER QUE SE EMANCIPAVA 

Paralelamente aos acontecimentos na Europa, descritos anteriormente, as mulheres assumiam papel de vanguarda nos movimentos revolucionários da Rússia Czarista. Em 1910, a comunista alemã Clara Zetkin, junto com Alexandra Kollontai, propôs a criação do Dia Internacional das Mulheres, durante a II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, em Copenhague. O objetivo seria estabelecer anualmente um dia de luta pelo direito ao voto feminino, pela igualdade entre homens e mulheres e pelo socialismo. A ideia foi inspirada pelas lutas empreendidas nos EUA e na Europa pelo direito ao voto, melhores condições de vida e trabalho. Além disso, remete a um acontecimento histórico, sobre o qual há divergências de dados: a manifestação de operárias do setor têxtil de Nova York contra as más condições de trabalho. De acordo com as diferentes versões, este fato teria acontecido em 1857, 1908 ou 1911, um ano após a criação da data. Segundo as versões, a manifestação das operárias foi reprimida com o incêndio do prédio no qual estavam presas, provocando a morte de 146 pessoas, entre elas 125 mulheres.

Em 1917, o 8 de março foi marcado por uma mobilização maciça de mulheres russas por melhores condições de trabalho, contra a escassez de alimentos, por “pão para os trabalhadores!” e contra a entrada da Rússia na Primeira Guerra Mundial. Estas manifestações foram encabeçadas por operárias têxteis. A repressão aplicada pelo czar provocou a insurreição das manifestantes e marcou o início da Revolução de Fevereiro de 1917, que derrubou o regime autocrático.

As mulheres trabalhadoras desempenham papel fundamental no decorrer da revolução, permanecendo como vanguarda durante o desenvolvimento do Estado soviético. Alexandra Kollontai (1872 – 1952) abandona a família de situação privilegiada para aderir ao Partido Operário Social Democrata Russo (POSDR) em 1898. Escreve artigos sobre o conflito entre a aristocracia russa e o povo finlandês, trabalha na imprensa clandestina bolchevique, integra os círculos marxistas russos clandestinos e sofre diversos exílios. Quando passa a atuar entre as mulheres operárias, desenvolve as bases de uma organização capaz de recrutá-las a participar de comícios especificamente dirigidos a elas.

Após a Revolução de Fevereiro de 1917, retornando à Rússia revolucionária, Kollontai se torna a primeira ministra da história, eleita para o Comitê Executivo do Soviete de Petrogrado e, depois, para o nível pan-russo. Neste posto, permaneceu debruçando-se sobre a questão da mulher e batalhando pelos seus direitos e liberdades. Em 1918, organiza o Primeiro Congresso de Mulheres Trabalhadoras da Rússia. Permanece responsável pela organização de mulheres no partido em 1920, período da criação do Genotdel, organismo responsável pela participação das mulheres na vida pública e social, e contra o analfabetismo. A revolucionária lutou também pelo direito ao voto feminino, pelo direito ao divórcio, ao aborto e aos apoios que deveriam ser proporcionados pelo Estado para o favorecimento da maternidade e da criação das crianças. Junto com ela, Vladimir Lenin assumiu papel importante na incessante busca pelo estabelecimento da plena igualdade de direitos do homem e da mulher.

Clara Zetkin (1857 – 1933), revolucionária alemã, contribui para o curso das revoluções russas. Desde o início de suas atividades políticas, fomentou a imprensa operária, como redatora-chefe do jornal A Igualdade, de 1892 a 1917, instrumento de educação e de informação para as trabalhadoras. Isso favoreceu a criação do movimento social-democrata feminino alemão. Em 1915, organiza uma conferência da Internacional Socialista de Mulheres, em Berna, em que as mulheres dos países envolvidos na Primeira Guerra Mundial declaram-se contrárias à guerra, conforme orientação inicial da Internacional Socialista.

Zetkin foi membro do Partido Social-Democrata da Alemanha (PSD) até 1917, e do Partido Social Independente da Alemanha (USPD), pela corrente revolucionária Liga Spartacus, participando da criação deste em 1915 com Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht. Tal corrente originou o Partido Comunista da Alemanha (KPD), durante a Revolução Alemã de 1918-1919, no qual foi eleita deputada até 1933.

O trabalho teórico conjugado ao trabalho prático de Zetkin foi crucial para orientar o movimento operário a favor da inclusão da mulher na indústria e dos seus direitos subjacentes, retomando a defesa realizada por Marx, Engels e Bebel, contra as demandas reacionárias da ala conservadora do movimento. Além disso, Zetkin contribuiu largamente com os estudos e as lutas práticas na questão feminina, quando compreendeu a sociedade moderna como condição necessária para a gênese da “questão da mulher” e a luta pela emancipação feminina. Foi responsável pela distinção, pela primeira vez dentro do movimento de mulheres, entre interesses de mulheres da classe dominante, das classes médias e da classe trabalhadora.

Zetkin influenciou Kollontai sobre a necessidade de um trabalho partidário e sindical entre mulheres, a fim de organizá-las em defesa de seus direitos. Influenciada pelas obras de Engels e Bebel, foi uma figura central que, ao longo de sua vida, desenvolveu novas estratégias para a defesa do direito das mulheres, traçando, neste aspecto, uma nova direção dentro do movimento socialista europeu e do partido social democrata alemão. Contribuiu para a formação de uma estratégia oficial nos partidos operários e na II Internacional, pela liberdade plena da mulher, no âmbito político, econômico e social.

Após a Revolução de 1917, os revolucionários russos viveram na pele as contradições entre as tarefas revolucionárias e o estágio em que se encontravam as forças produtivas: uma Rússia predominantemente agrária e em grande atraso econômico, mergulhada na miséria e na fome, provocados pela participação na Primeira Guerra e pelo governo czarista.

Apesar das dificuldades descritas, já a primeira Constituição da República Soviética, promulgada em julho de 1918, concedeu à mulher direito a votar e a ser eleita para cargos públicos. O Código do Matrimônio, da Família e da Tutela do Estado Soviético, de 1918, o mais avançado no mundo, implementava aos poucos a união livre, o direito ao casamento e ao divórcio desvinculados da Igreja. Também conferia direito à pensão alimentícia para mães solteiras, o que significou um passo em direção à possibilidade material de união de casais sem condicionamento econômico ou social, assim como o rompimento dos privilégios masculinos na detenção de bens no casamento.

O código aprovado em 1927 segue a mesma linha. O terceiro Congresso da Internacional Comunista, em 1921, aprovou teses e resoluções para um programa de trabalho partidário e sindical entre as mulheres, reconhecendo que a libertação da opressão seria possível a partir da revolução socialista e concretização do comunismo. Por isso, era enfatizada a importância das lutas diárias da mulher pela sua liberdade, inseparáveis da luta da classe trabalhadora.

Conforme mencionado, as contradições enfrentadas pelos revolucionários residiam em aprovar a nova legislação e propiciar as condições materiais necessárias para que fosse aplicada. Havia um impasse, por exemplo, com o Código da Terra, aprovado em 1922 pelo Comitê Executivo Central. Apesar de abolir a propriedade privada da terra, de bens naturais e de colocar toda a terra nas mãos do Estado, a URSS era ainda predominantemente agrícola e ainda havia o princípio fundamental da indivisibilidade da terra. Este princípio da indivisibilidade propiciava a formação da família enquanto unidade, que vivia sobre a terra. Logo, a relação material das famílias com a terra ainda dificultava a divisão de propriedades, ou da produção por ela gerada, em caso de divórcio. Por um lado, na cidade havia possibilidade de mudança de moradia e divisão de bens sem afetar a economia, permitidas pelo trabalho assalariado situado especificamente em indústrias. Por outro lado, no campo, a questão do divórcio encontrava dificuldade diante da contradição entre modo de produção rural em latifúndios indivisíveis – sobre os quais moravam as famílias – e a nova legislação que permitia a divisão de bens com igualdade.

Leon Trotsky, um dos principais líderes da Revolução Russa ao lado de Lenin, explicava que a questão da mulher, mesmo após a revolução, não se resolveria automaticamente. Assim como no período da transição soviética, também no capitalismo a questão da mulher não se resolve com pequenas reformas ou campanhas ideológicas imersas na realidade da propriedade privada. A questão depende de amplo trabalho revolucionário:

Estabelecer a igualdade política da mulher e do homem no Estado soviético é um dos problemas mais simples. Estabelecer a igualdade econômica do trabalhador e da trabalhadora, na oficina, no sindicato, é já muito difícil. Mas estabelecer a igualdade efetiva do homem e da mulher na família, eis o que é incomparavelmente mais complicado e exige imensos esforços para revolucionar todo o seu modo de vida. E, no entanto, é evidente que enquanto a igualdade do homem e da mulher não for atingida na família, não se poderá falar seriamente de sua igualdade na produção, nem mesmo da sua igualdade política, pois se a mulher continua escravizada à família, à cozinha, ao sabão e à costura, suas possibilidades de agir na vida social e na vida do Estado continuam reduzidas ao extremo. (TROTSKY, L., Questões do Modo de Vida)

A família burguesa, seja urbana ou rural, produz opressões como a impossibilidade de divórcio ou o divórcio com privilégio ao homem para a detenção de bens. Para efetivar o fim dessas opressões é necessário que o Estado operário construa, junto com a sociedade, as bases materiais para uma vida coletiva e democrática:

Mais uma vez, as condições de aparição de um modo de vida e de uma família de tipo novo não podem separar-se da obra geral de construção socialista. O governo operário deve valorizar-se para que seja possível organizar de modo sério e adequado a educação coletiva das crianças, para que seja possível libertar a família da cozinha e das limpezas. A coletivização da economia familiar e da educação das crianças é impensável sem o enriquecimento de toda a nossa economia [socialista] em conjunto. (ibid.)

Engels já explicava, em A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado: “Quando os meios de produção passarem a ser propriedade comum, a família individual deixará de ser a unidade econômica da sociedade. A economia doméstica converter-se-á em indústria social”. Estes são os passos para libertação definitiva da mulher.

Sobre as dificuldades materiais para a igualdade entre homens e mulheres na URSS, houve a questão da NEP, a Nova Política Econômica, proposta por Lenin em 1921 como medida provisória de recuperação da economia, que admitiu certas aberturas para iniciativa privada no campo e na cidade sob controle do Estado. Ao proporcionar larga proporção na União Soviética, contribuiu para a dificuldade em se incluir a mulher na indústria de forma democrática. Enquanto a nova legislação concedia diversos direitos trabalhistas às mulheres, como fim do trabalho noturno, maior período de licença maternidade, entre outros, a NEP os transformou em barreira para a contratação delas, pois, diante do interesse em aumentar a produtividade a baixo custo, os administradores de fábricas evitam contratá-las e a demitiam-nas sempre que possível. A nova política econômica também propiciou o fechamento de creches e lares para crianças de mães solteiras devido ao realocamento de recursos estatais numa tentativa de melhorar a economia e minar outros graves problemas sociais que assolavam o país por décadas (GOLDMAN, 2014). Também o primeiro Plano Quinquenal, implantado por Stalin entre 1928 e 1932, priorizava a indústria pesada e remunerava melhor os setores mais produtivos, justamente onde havia menos mulheres, ficando estas restritas aos setores alvos de menores investimentos e menor remuneração.

Apesar das contradições, a ala bolchevique do partido defendeu duramente que a legislação soviética deveria seguir os elementos mais progressistas da sociedade, mesmo que minoritários, que era a família urbana, a indústria e a vida na cidade, e não os elementos mais atrasados, como o campesinato que se encontrava enfurecido diante das mudanças no código civil (idem). Havia extensos embates entre juristas de diferentes concepções do que se constituía a legislação soviética revolucionária. Na visão normativa, a legislação soviética deveria estar em consonância com a realidade social imediata e com a situação econômica atrasada. Na visão libertária, deveria ser um dispositivo ativo em favorecimento da aniquilação dos elementos atrasados, ao se fomentar o fortalecimento dos elementos progressistas. Para a visão libertária, pelo período compreendido entre 1918 até a década de 1930, a lei soviética, que em si mesma continha as disposições para se tornar desnecessária, deveria agir como elemento revolucionário, a favor da completa libertação dos resquícios da sociedade czarista e dos elementos da sociedade burguesa.

Outro embate empreendido durante o processo revolucionário foi sobre a inserção da mulher na indústria. Os bolcheviques agiram ativamente, e de forma bastante avançada, na reivindicação pela inserção da mulher, apontada por Marx como inevitável e importante para a classe. Esta inserção era negada por grande parte do movimento operário, pois, gerava, dentro da lógica capitalista, a diminuição geral dos salários, uma vez que a renda familiar seria então composta por vários salários menores que o “salário familiar” pago ao homem da família enquanto era o único trabalhador do lar. Para evitar o empobrecimento geral e para a emancipação efetiva das mulheres, as reivindicações dos marxistas apontadas como dever do Estado eram:

– garantia de salário igual para trabalho igual, e não o “salário familiar”, reivindicado por movimentos proletários chamados “antifeministas”;

– criação socializada das crianças em creches, lares para crianças e instituições de educação, todos estatais;

– construção de refeitórios e lavanderias comunais;

– mecanização do campo e socialização das terras, tornando-as coletivas (acabando com os camponeses ricos, ou a pequena burguesia favorecida no contexto rural patriarcal);

– casamento e divórcio livres de imposições e implicações sócio econômicas e desvinculados da Igreja.

Somente assim a população poderia sobreviver e libertar a mulher das tarefas domésticas, que passariam a ser de responsabilidade do Estado, mas necessariamente um Estado operário socialista revolucionário, em transição para o comunismo.

Os bolcheviques também pautaram no Partido o trabalho sistemático e específico entre as mulheres camponesas e trabalhadoras, para aproximá-las dos debates políticos. Era preciso formá-las politicamente, agrupá-las às fileiras do partido e dos sindicatos em defesa de suas demandas e contra a ideologia retrógrada incrustada no movimento operário e contra, principalmente, o capitalismo.

Na União Soviética, vários impasses impossibilitaram a conclusão de uma ampla construção de creches, lavanderias e refeitórios coletivos. Estes impasses surgiram devido ao processo contrarrevolucionário orquestrado por Stalin, como “solução” para os problemas estruturais e econômicos da Rússia. Um país atrasado, que vinha de uma situação semi-feudal no período czarista, palco de guerras civis, alvo de embargo econômico e de ataques dos países imperialistas necessitava do apoio de revoluções socialistas nos países mais desenvolvidos economicamente. Por exemplo, na Alemanha, de forma a minar pelas bases os ataques da burguesia. A situação se complicou a partir do isolamento da Revolução Russa, com o avanço de uma burocracia no aparelho de Estado e a aplicação da linha contrarrevolucionária stalinista de defesa do socialismo em um só país. Isso resultou em imobilidade da Internacional Comunista quanto ao trabalho revolucionário ativo entre os trabalhadores dos outros países, provocando amargas derrotas, como no caso da Revolução Chinesa de 1925-1927. Isto isolou mais ainda a URSS, mergulhada na burocratização e palco de execuções de opositores ao regime, ou mesmo de aliados não confiáveis.

Diante de uma população majoritariamente agrária e conservadora, e dos limites econômicos impostos pela revolução isolada, a burocratização e política stalinista obteve campo aberto para implementar elementos conservadores na legislação. Já em 1936, o Comitê Executivo Soviético Central emitiu um decreto que declarava o aborto ilegal, um retrocesso diante da legalidade promovida desde a revolução de 1917 – apesar do constante debate em torno da questão do aborto como desvio moral, debate do qual participou fervorosamente Kollontai pelo direito de decisão da mulher sobre o próprio corpo (GOLDMAN, 2014).

Seguindo a moral conservadora, e salpicada pela exaltação pessoal de Stalin e do Partido, a propaganda do Estado realizada em 1936 era pró-natalidade, valorizava a família e oferecia benefícios às mães proporcionais à quantidade de filhos. A historiadora Wendy Goldman explica que os dados levantados por pesquisas demonstram que o aborto não era resultado apenas da pobreza, mas também, contraditoriamente, dos avanços propiciados pela revolução. Ou seja, resultava da maior liberdade da mulher, ávida por desfrutar das oportunidades de educação, emprego e trabalho político. Logo, as melhores condições sociais e a mobilidade social provocaram a queda da taxa de natalidade. Por isso, a política pró-natalista, que contava com a criminalização e punição dos envolvidos com aborto, era alheia às conquistas promovidas e reacionária.

Esta nova onda legislativa utilizou-se dos ressentimentos do senso comum gerados nos primeiros anos da revolução, a partir das contradições quanto ao divórcio facilitado, diante da permanência da moral da sociedade de classes. O divórcio, que deveria propiciar maior liberdade à mulher, resultou em crescimento sem precedentes de mulheres e lares abandonados pelos homens, principalmente no campo, que buscavam nas mulheres apenas empregadas e serviçais enquanto estivessem “saudáveis”. Deitando na esteira do conservadorismo, o partido foi levado a uma onda de retrocesso, ao invés de lutar contra maré pela dissolução da moral feudal e burguesa e pelas garantias estatais da libertação efetiva da mulher. Quando volta a reforçar os valores da família, afirma a relação de dependência que uma sociedade desigual mantém em relação à família, como instituição de sobrevivência da classe. Além disso, o partido abandona a tarefa revolucionária de criar as condições sociais para que a família não mais precise existir e não mais aprisione a mulher como empregada doméstica do Estado para manutenção do status quo. Conforme Goldman, a Constituição de 1936, ao isentar o Estado das responsabilidades domésticas, legitimava definitivamente a jornada dupla da mulher.

A nova política e orientação conservadora stalinista acabou com muitos dos direitos conquistados, por exemplo, o direito ao aborto, ao divórcio e o reconhecimento jurídico e social de homossexuais. Para que o partido contivesse o fervor revolucionário internacional, em nome de uma suposta necessidade de defender a revolução Russa, utilizou-se também da moral reacionária, reafirmando o valor da família e do patriarcado. Conforme Goldman (2014), houve um claro giro nas concepções jurídicas. Em 1918 tinha-se uma concepção do crime, por exemplo, baseada nas causas sociais e passíveis de reabilitação, e as discussões no partido eram calorosamente abertas e honestas. Já no Partido de Stalin de 1936, colocava-se ênfase na culpabilidade pessoal e no castigo, e o que reinava nas discussões do partido era uma cautela temerosa, com argumentação prejudicada.

Apesar das contradições presentes na Revolução Russa e no Estado Soviético, conquistaram-se direitos para as mulheres mais avançados do que os conquistados nas revoluções democrático burguesas em países capitalistas.

O Estado operário soviético revolucionário, apesar das debilidades, avançou na coletivização do trabalho doméstico e na gradual libertação da mulher. Foi capaz de elevar economicamente a Rússia, país afundado em profunda miséria e fome, que passou pela guerra civil, sofreu inúmeros ataques imperialistas e sofreu a burocratização stalinista após as primeiras décadas depois da revolução. Conquistou direito ao aborto e ao divórcio, o fim do analfabetismo, pleno emprego, e foi capaz de colocar a economia da URSS em pé de disputas econômicas e tecnológicas com a maior potência capitalista. Embora a disputa entre potências não seja o objetivo da revolução e, sim, a revolução socialista nos demais países capitalistas, até a tornar a revolução internacional.

Os revolucionários, na edificação do socialismo, acabavam por fazer o Estado soviético ultrapassar as conquistas da revolução democrático-burguesa dos países capitalistas ocidentais. Na verdade, tais conquistas foram apenas consequências da obra maior do trabalho proletário e revolucionário em transição para o socialismo. Os avanços nos direitos das mulheres estavam diretamente atrelados às reconfigurações das relações sociais de trabalho, resultado das forças produtivas então livres da propriedade privada dos grandes meios de produção e da exploração capitalista.

Apesar da derrocada do Estado soviético, a revolução foi vitoriosa em tirar o país do estado semicolonial e transformá-lo em potência mundial, em disputa com o império capitalista. Mesmo com a burocratização subsequente e a gradual abertura para o mercado e a ideologia capitalista, ainda restaram conquistas geradas pela economia planificada. Por exemplo, como o fim do analfabetismo, pleno emprego, direitos trabalhistas, como salário igual para trabalho igual, direito ao divórcio livre e ao aborto, este último reconquistado após a morte de Stalin. As condições de vida para as mulheres na Rússia, mesmo após as ondas contrarrevolucionárias que assolaram a URSS, chegaram a se equiparar ou até mesmo a superar democracias burguesas. Foi no regime socialista que se chegou a um maior nível de libertação da mulher e inclusão social efetiva. Somente com a revolução socialista internacional e aniquilação completa do capitalismo será possível a conquista permanente da igualdade para as mulheres em todos os âmbitos.

Tanto a contenção de Stalin do movimento revolucionário internacional, quanto a crise do capitalismo, em meados da década de 70, resultaram em retrocesso de direitos femininos conquistados em todo o mundo. Ou seja, os direitos conquistados na ordem burguesa não são definitivos e estão condicionados à situação socioeconômica da sociedade de classes.

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