Eleições 2016: Crise de legitimidade do sistema e um regime que desmorona

Descrédito popular dos políticos e instituições burguesas, queda do PT, contraponto à tese da Onda Conservadora, PSOL nas eleições.

Foto: Personagens políticos da década de 1980 celebram o nascimento da Nova República em vigor até os dias de hoje.

Encerrado o 1º turno das eleições municipais, uma análise é necessária para identificarmos o que o resultado neste terreno distorcido, as eleições burguesas, revelam sobre a atual situação política e sua relação com o combate dos marxistas no terreno da luta de classes.

Em primeiro lugar, como prognosticávamos antes do 1º turno: os votos brancos, nulos e as abstenções somaram altas cifras, expressando “um descrédito popular generalizado nos políticos, nas instituições burguesas e no processo eleitoral” (Ver: Eleições 2016 e a pressão sobre o PSOL).

O resultado deste 1º turno mostra que a soma daqueles que não votaram em nenhum candidato foi maior do que os votos recebidos pelo primeiro colocado em 9 capitais. Em São Paulo, por exemplo, João Doria (PSDB) obteve 3.085.187 votos. Entretanto, brancos, nulos e abstenções somaram 3.096.304 eleitores na capital paulista. No Rio de Janeiro, isso fica ainda mais evidente: os votos em Marcelo Freixo (PSOL) e Marcelo Crivella (PRB) somam 1.395.625 votos. Já brancos, nulos e abstenções somaram 1.866.621 eleitores, o que corresponde a 38,1% dos aptos a votar no município.

A queda do PT

O descrédito generalizado com a participação no processo eleitoral tem íntima ligação com a falência política do PT, que perdeu drasticamente o número de eleitores. Nas eleições de 2012, no 1º turno, os candidatos do PT à prefeitura, em todo o Brasil, receberam 17.273.415 votos. Nestas eleições receberam apenas 6.821.726 votos. Ou seja, uma perda de mais de 10 milhões de eleitores.

Em 2012, o PT ganhou 630 prefeituras. Neste ano, 256 prefeitos do PT foram eleitos no 1º turno, e 7 estão na disputa no 2º turno. O partido perdeu, portanto, quase 60% da quantidade de cidades que governava. Em capitais, o PT só ganhou em Rio Branco, no Acre, e está disputando em Recife o 2º turno.

Onda conservadora?

A responsabilidade pela alta de brancos, nulos e abstenções, e pela queda do PT, abrindo espaço para partidos como o PSDB, não pode ser creditada ao avanço de um conservadorismo entre a população. Os 10 milhões de votos perdidos pelo PT não passaram para a direita, mas se expressaram na recusa de participação eleitoral (brancos, nulos e abstenção). A responsabilidade é do próprio PT, da sua política de colaboração de classes, das alianças com a direita, dos seus governantes que aplicaram descarados estelionatos eleitorais. Como destaque disso figura o governo Dilma, reeleito em 2014 para derrotar Aécio Neves, mas que começou a aplicar o programa do candidato derrotado, assim que a vitória foi anunciada.

O PT serviu bem à burguesia em seus tempos de auge, freando a luta de classes e garantindo a paz social para os lucros de banqueiros, especuladores e patrões. Agora é pisoteado pela classe dominante, perseguido e desmoralizado, pois deixou de ser útil, não consegue mais conter as massas nas ruas, nem as greves nas fábricas. O PT é vítima de suas traições.

Alguns argumentam, para justificar a tal “onda conservadora”, que o PSDB aumentou sua votação e o número de prefeituras ganhas. Isso é verdade e a mídia propaga com gosto esse resultado. Há de fato um crescimento do PSDB, mas em detrimento de outros partidos de direita. É preciso fazer esta comparação: em 2008, o PSDB teve 14.682.079 votos nos seus candidatos a prefeito e em 2016 teve 17.612.608 votos (alta de 2.930.529 votantes); o PMDB, em 2008, teve 18.653.351 votos e em 2016 teve 14.870.849 votos (perdeu 3.782.502 votantes!). Portanto, na comparação entre 2008 e 2016, o PMDB perdeu mais votos que o PSDB ganhou. Isso com um acréscimo de mais de 15 milhões de eleitores entre as duas eleições. Fazendo a comparação entre a soma de votos de PMDB e PSDB, e o número de eleitores aptos a votar, constatamos que em 2008 os dois juntos receberam o voto de 25,88% dos eleitores, em 2012, 22,07%, e em 2016, 22,54%. Ou seja, uma queda significativa, comparando com 2008, e uma pequena elevação, comparando com 2012, na votação nos dois partidos burgueses mais significativos no cenário político nacional.

Não há onda conservadora. O que existe é o rechaço generalizado aos políticos e ao sistema político. O PT passou a ser identificado, não sem razão, por amplas parcelas da população, como um partido igual aos outros, perdendo um número gigantesco de apoiadores.

O fato é que a falência do PT permite que os partidos de direita retomem diretamente o controle das instituições em todos os níveis. Mas, isso não lhes garante poder governar com estabilidade, pelo contrário, passam a governar num maior grau de crise. Estão expostos e sem base social sólida.

Esta é a crise de legitimidade do sistema que faz com que o candidato do PSDB em São Paulo, João Doria, vencesse no 1º turno, mas perdendo para brancos, nulos e abstenções. Ele se apresentou insistentemente como um “não político”, como um “gestor”, que nunca concorreu em nenhuma eleição. Seu aparelho e marketing eleitoral conseguiram iludir muitos eleitores cansados dos políticos tradicionais. Entretanto, o determinante para essa vitória foi a fraqueza de Haddad.

O atual prefeito petista conseguiu subir na reta final, com parte da vanguarda de esquerda aderindo à campanha, diante do risco de um 2º turno entre PSDB e PRB (Russomano), ou PMDB (Marta). Mas esse impulso foi incapaz de reverter a desmoralização do atual prefeito, que aumentou as tarifas do transporte em junho de 2013, que colaborou com a repressão às manifestações, que não atendeu as reivindicações dos professores em greve, que seguiu com a privatização da educação e saúde, e que manteve as alianças com a direita (com Pros, PR e PDT, e com Gabriel Chalita, ex-PSDB, ex-PSB, ex-PMDB e ex-secretário de educação de Alckmin, como vice).

Por isso tudo, pra preparar o futuro sem ficar refém do passado, a Esquerda Marxista apoiou até o fim a candidatura do PSOL, e combateu a falsa ideia de que a candidatura de Erundina seria a responsável por dividir a esquerda.

O PSOL nas eleições

O PSOL apresentou um importante resultado nesse 1º turno, apesar de todas as limitações impostas pela legislação eleitoral, com redução do tempo de TV, com o tempo de campanha mais curto (que dificultou as campanhas com menos estrutura para chegar a mais pessoas) e sendo excluído de debates.

O PSOL sai do 1º turno com duas prefeituras no Rio Grande do Norte (Jaçanã e Janduís) e disputa com chances de vitória o 2º turno no Rio de Janeiro (RJ), com Marcelo Freixo; em Belém (PA), com Edmilson Rodrigues; e em Sorocaba (SP), com Raul Marcelo.

A bancada de vereadores eleitos pelo PSOL subiu de 49, em 2012, para 53, nestas eleições. Mais do que o número geral, o que vale destacar é o crescimento em importantes centros políticos: em São Paulo, o PSOL passou de 1 vereador para 2; no Rio de Janeiro, de 4 para 6, e teve os 2 candidatos mais votados em Niterói; em Belém teve a candidata mais votada; em Florianópolis, subiu de 1 para 3; em Porto Alegre, de 2 para 3, tendo a candidata mais votada; em Belo Horizonte, não tinha vereadores e conseguiu duas vagas, também com a candidata mais votada da cidade; em Recife, o PSOL também conquistou seu primeiro mandato de vereador.

Outro elemento importante diz respeito à nova distribuição da bancada de vereadores entre PT e PSOL nas seis capitais das regiões sul e sudeste:

– Porto Alegre: PT 4 e PSOL 3

– Florianópolis: PT 1 e PSOL 3

– Curitiba: PT 1 e PSOL 0

– São Paulo: PT 9 e PSOL 2

– Rio de Janeiro: PT 2 e PSOL 6

– Belo Horizonte: PT 2 e PSOL 2

– Total: PT 19 e PSOL 16

São Paulo concentra a vantagem do PT nessas capitais. O PSOL elegeu mais vereadores na soma das outras cidades. E na capital paulista, sem a participação do ex-senador Suplicy e o efeito de sua ampla votação (301.446 votos), o PT teria conquistado 7 vereadores e não 9 na coligação vergonhosa com PROS, PR e PDT.

O conjunto do resultado do PSOL nestas eleições, o faz aparecer ainda mais no cenário nacional como uma alternativa, apesar do cerceamento da legislação e do reduzido enraizamento do partido. É a expressão de que amplos setores da população, apesar da desorientação provocada pelas traições e a queda do PT, está em busca de saídas à esquerda.

Para o PSOL se credenciar como essa alternativa precisa ter independência de classe, combater todo o pragmatismo eleitoral, a adaptação ao sistema e basear sua intervenção nas lutas populares, contra o governo Temer, o Congresso Nacional, contra os ataques e pelas reivindicações, apontando que o socialismo é o horizonte.

Os candidatos marxistas

A Esquerda Marxista lançou candidaturas a vereador em coligação com o PSOL. Esses candidatos tiveram diferentes resultados segundo as circunstâncias e são motivo de orgulho para nossa organização. Foram campanhas militantes e de luta, que não receberam dinheiro de empresários, que basearam sua arrecadação financeira entre os apoiadores, e que se apresentaram como candidaturas “contra o sistema”. Nossa plataforma não se adaptou a objetivos eleitoreiros. Mantivemos nossas posições, bandeiras e palavras de ordem. Combatemos a pressão da direção dos aparatos, PT e CUT em especial, com suas manobras para iludir a base em defesa da conciliação de classes e nas tentativas de canalizar a indignação contra o governo Temer para vias institucionais. Explicamos que a saída para a atual situação só pode se dar com a abolição da ordem existente, apontando que nossa luta é pelo Fora Temer e o Congresso Nacional, por uma Assembleia Popular Nacional Constituinte e um governo dos trabalhadores.

Nossa luta central é no terreno da luta de classes, pela construção das ideias socialistas e pelo fortalecimento da organização revolucionária do proletariado. Essas tarefas nossas candidaturas cumpriram com absoluta certeza.

O que continua se aprofundando é a crise econômica e os ataques aos trabalhadores. A instabilidade política dá seus sinais a todo o instante, acompanhada de demonstrações de disposição de luta de jovens e trabalhadores, como ocorre na greve dos bancários que resiste, apesar da intransigência dos banqueiros, do governo e das manobras da direção. O que está em curso é uma profunda crise do regime capitalista com o desmoronamento do regime político da Nova República saído da Constituinte de 1988. Acontecimentos revolucionários estão em gestação em escala global, o Brasil está inserido nesse quadro e se prepara para a explosão.

Prepare-se para esta luta, junte-se à Esquerda Marxista!