Cinco anos da estatização da creche comunitária do bairro Adhemar Garcia

Este artigo traz um exemplo vivo de como organizar os trabalhadores por suas questões cotidianas sem adaptar-se às pressões para rebaixar as reivindicações às miseráveis condições de vida ofertadas pelo regime capitalista.

No ano de 1999, a antiga diretoria da Associação de Moradores do Conjunto Habitacional Adhemar Garcia, comprometida partidariamente com o então prefeito de Joinville (SC), Luiz Henrique da Silveira (PMDB) e seu vice, Marco Antônio Tebaldi (PSDB), decidiu que ao invés de lutar por um CEI público no bairro, devia fundar, precariamente, uma creche comunitária. Juntando móveis e utensílios usados e um grupo de mulheres bem intencionadas, fizeram da sede da Associação um espaço para os pais deixarem seus filhos enquanto trabalhavam nas empresas da cidade.

Em maio de 2001, a comunidade elegeu uma nova direção para sua Associação, independente e de luta, oposição a outras duas chapas ligadas ao governo. Essa gestão assumiu e manteve o serviço, que na época atendia 71 crianças. Onze mulheres trabalhavam em regime voluntário, recebendo como ajuda de custo uma cesta básica doada pela concessionária do transporte público na cidade – Gidion, além de R$ 120, fruto da cobrança de mensalidades dos pais.

No início, não tínhamos ainda a consciência de que serviço público é obrigação do poder público. Trabalhamos no sentido de melhorar o serviço prestado e ampliar o atendimento, visto que a lista de espera era maior do que o governo era capaz de atender. Fomos até a empresa Gidion propor um número maior de cestas básicas. Assim, teríamos mais trabalhadoras atendendo. Mas as cestas não viriam sem exigências. Devíamos fiscalizar no bairro as vans clandestinas e, naturalmente, nos manter calados quando do aumento da passagem.

Embora tivéssemos ainda pouco conhecimento, uma coisa tínhamos de sobra: entendimento que a direção da Associação tinha como objetivo maior defender os interesses da comunidade. Por isso, nos posicionamos contra as exigências. Imediatamente, a empresa cortou a ajuda a nossa creche. Recorremos então à Prefeitura.  Depois de uma longa batalha, conseguimos fechar um convênio com a Secretaria de Bem Estar Social para ajudar na compra de alimentos e material de limpeza. Mantivemos esta forma por um tempo, mas o fato de os trabalhadores se manterem em um regime de voluntariado estava nos tirando o sono. Foi quando surgiu na cidade uma proposta de convênios com a educação infantil. Com esta parceria, registramos todas as trabalhadoras.

A partir de 2005, parte da direção começou a militar na Esquerda Marxista. Foi quando começamos a cogitar a possibilidade de entregar a creche para a Prefeitura. Afirmávamos assim que nosso papel não era prestar serviços à comunidade, mas cobrar do Estado esses serviços. Iniciamos as conversas na diretoria, depois com os pais e a comunidade, para convencer que era preciso repassar o serviço a quem realmente tinha o dever de prestá-lo.

Foram quase dois anos para convencer a diretoria. Quando iniciamos a pressão sobre a Prefeitura, alegavam não ter interesse em assumir. Caso assumisse, nos retiraria a sede por total. Fizemos uma batalha ainda no governo Marco Tebaldi (PSDB) e, posteriormente, no governo Carlito Merss (PT). Naquele momento, havia 25 colaboradoras registradas e atendimento a 160 crianças.

Em paralelo ao trabalho de convencimento dos pais, explicando que se a Prefeitura assumisse, a educação das crianças seria gratuita, começamos a construção da nova sede da entidade. Depois de muitas reuniões e manifestações, finalmente, no final de 2011, o governo Carlito cedeu às pressões e apresentou um cronograma de reformas e ampliação do prédio. A Secretaria de Educação assumiu as quase 80 crianças matriculadas para o próximo ano nos CEIs públicos e conveniados do bairro.

Depois de um ano discutindo o projeto de reforma e ampliação, em dezembro de 2012, foi assinada a ordem de serviço. No ano seguinte, ficou pronta a creche comunitária estatizada. Hoje, o CEI Meu Pequeno Mundo, que manteve o nome de quando era creche, atende 240 crianças. Os pais não pagam mais a tão pesada mensalidade.

Através desse relato demonstramos como a classe trabalhadora aprende. A partir da sua própria experiência, erra e acerta. Muitos são os artifícios do capitalismo para cooptar os instrumentos de luta da classe: o assistencialismo, o voluntarismo. A organização marxista é o elemento consciente, organizador, da luta da classe trabalhadora. Desde as suas necessidades mais básicas, como o cuidado dos seus filhos, até a derrubada do sistema que nos oprime e a construção da sociedade socialista. Uma Associação de Moradores marxista entende que  seu papel é organizar os trabalhadores do bairro para o enfrentamento com o Estado, por serviços públicos, gratuitos e para todos.

* Moacir é militante da Esquerda Marxista e dirigente da AMBAG