A Crise Orgânica do Capitalismo – Parte 2

A produção capitalista se esforça constantemente por superar estes obstáculos imanentes [ao seu desenvolvimento posterior], mas os supera somente através de meios que colocam novos obstáculos e em maior escala. O verdadeiro obstáculo à produção capitalista é o próprio capital” – Karl Marx

A produção capitalista se esforça constantemente por superar estes obstáculos imanentes [ao seu desenvolvimento posterior], mas os supera somente através de meios que colocam novos obstáculos e em maior escala. O verdadeiro obstáculo à produção capitalista é o próprio capital” – Karl Marx

 

O enigma da produtividade”

Surpreendentemente, a produtividade também ficou para trás nesta suposta recuperação. Os economistas se referem a isto como o “enigma da produtividade”, o que reflete sua total confusão. Na Grã-Bretanha, isso alcançou níveis extremos, onde a produtividade por hora trabalhada caiu de fato durante os últimos cinco anos. Esta é a terceira vez que tal queda ocorreu nos últimos 100 anos; as outras duas ocasiões foram no rescaldo das duas guerras mundiais. A economia mundial enfrenta crise similar.

A crise da produtividade nos EUA, o país mais rico do mundo, provocou um acalorado debate sobre as razões de sua queda. A argumentação se concentra na fraca demanda desta fraca recuperação ou no fato de que os fatores que impulsionam a inovação estão perdendo força ou estão paralisados. O debate foi provocado pelo Professor Robert Gordon da Universidade de Northwestern, que colocou a questão de se saber se as grandes inovações dos séculos XIX e XX, como o transporte eficiente e os instrumentos de economia de mão de obra nacional, eram agora coisa do passado. O progresso técnico dos EUA vem desacelerando claramente desde 1970, um efeito do retardo na inovação.

“O desenvolvimento mais inquietante é o que está acontecendo com a produtividade”, afirma o Financial Times. “Um informe da Conference Board think-tank realizada nesta semana revelou que, pela primeira vez em décadas, houve um declínio na capacidade mundial de converter capital e trabalho em bens e serviços. Se esta desaceleração continuar, as consequências para o nível de vida seriam sombrias: a eficiência e a inovação são os motores mais importantes do crescimento econômico mundial no longo prazo” (FT, 18/1/14).

Paul Krugman, o Prêmio Nobel de Economia, assinalou na década de 1990 que “A produtividade não é tudo, mas no longo prazo é quase tudo”. De fato, toda a economia pode ser reduzida a uma economia de tempo de trabalho. Quanto mais produtiva é uma sociedade, mais rica se tornará. O aumento da produtividade se deve ao avanço tecnológico e aos investimentos no processo de trabalho. O capitalismo produziu uma revolução em termos de produtividade do trabalho, mas agora chegou aos seus limites. O fato de que o capitalismo esteja enfrentando uma crise de produtividade põe em questão toda a justificação da economia de mercado. Em vez de investir continuamente a mais-valia extraída da classe trabalhadora de novo na produção, o capitalismo se transformou cada vez mais em um obstáculo para si mesmo.

Outro artigo que analisou o informe sobre produtividade da Conference Board sublinhou a gravidade da situação: “A história tanto para a produtividade do trabalho – produção por hora trabalhada – quanto para a produtividade total dos fatores é a mesma. Taxas de crescimento decrescentes são o resultado de uma longa história de queda do crescimento da produtividade nas economias avançadas, que já não é mais compensada por grandes aumentos na eficiência das economias emergentes”.

O artigo continua: “Nas economias emergentes, enquanto as tendências da produtividade ainda são significativamente melhores do que nos anos 1970 e 1980, os sinais preocupantes são de que o gasto sustentado em bens de capital não está produzindo as mesmas melhorias na eficiência como há dez anos, o que sugere que o capital não está sendo destinado às melhores áreas possíveis. A Conference Board estima que a produtividade total dos fatores estagnou no ano passado na China e diminuiu na Índia, o que sugere que mesmo as maiores economias emergentes estão lutando para manter os avanços na eficiência que anteriormente eram tão facilmente encontrados”. O artigo conclui: “Se esta desaceleração continuar, as consequências para o nível de vida serão sombrias”.

No que se refere “às melhores áreas possíveis”, o capitalismo sempre investiu seu capital onde quer que ele possa realizar os maiores retornos lucrativos. Os capitalistas não estão nos negócios por nenhuma outra razão. Esta é a lógica do capitalismo.

Esfriando o Sol”

Este fato levou alguns da esquerda a imaginar que a crise do capitalismo pode ser explicada pela tendência à queda da taxa de lucro. Embora esta tendência exista, é somente uma tendência. Alguns períodos experimentam uma queda na taxa de lucro, enquanto outros experimentam uma elevação, dependendo dos fatores compensatórios. Esta tendência age durante um período prolongado de tempo. Concordamos com Rosa Luxemburgo quando ela disse que, se a queda na taxa de lucro fosse responsável pelo desaparecimento do capitalismo, isto “tomaria tanto tempo quanto o esfriamento do Sol”. Durante os últimos 30 anos anteriores à crise de 2008, houve uma elevação da taxa de lucro. Embora seja uma importante tendência dentro do capitalismo, isto não explica a causa da crise capitalista, que é a crise de superprodução.

Embora tenha havido uma recuperação na rentabilidade desde o colapso de 2008-9, o investimento, que é a chave de qualquer crescimento sustentável, está no fundo do poço. Em alguns países, como a Grã-Bretanha, o investimento caiu substancialmente. A razão disto não é a rentabilidade (que subiu) ou as dificuldades de acesso aos fundos (os capitalistas estão sentados em cima de centenas de bilhões), mas a ausência de mercados rentáveis (ou da “demanda”, como os burgueses gostam de dizer). O excesso de capacidade (superprodução) é generalizado, uma sobra do otimismo elevado e dos investimentos massivos feitos no período anterior à crise.

Normalmente, depois de uma recessão, com a destruição da superprodução, a taxa de lucro, que entrou em colapso durante a recessão, aumenta e age como estímulo a novos investimentos. Os meios de produção desgastados são substituídos por maquinaria e equipamentos novos, e isto proporciona as bases para uma expansão da produção. A redução dos salários e a deterioração dos termos e das condições nos locais de trabalho, junto à erradicação dos estoques excedentes, ajudam a restaurar ou restaurar parcialmente a taxa de lucro. Isto prepara um novo ciclo ascendente, mas também planta as sementes para uma nova recessão no futuro. Este é o chamado processo de “destruição criativa”. Contudo, ao fazer os salários baixarem destroem o poder de compra de que depende a realização de lucros.

Normalmente, uma crise eliminaria este excesso de produção, mas não foi este o caso desta vez. Apesar de ser a mais profunda crise desde os anos 1930, a destruição de valores de papel, bem como de instalações e maquinaria, não logrou erradicar por completo o “excesso de capacidade”, que é sinônimo de superprodução de capital e dos limites do mercado. É por isso que se fala de bancos e empresas “zumbis”, mantidas artificialmente flutuando através do crédito barato. Como resultado, o sistema capitalista está resfolegando devido ao excesso de capacidade e à falta de mercados para vender seus produtos. Este fracasso do sistema também é um reflexo do atual crescimento em passo de tartaruga do comércio mundial. A desaceleração das economias emergentes, particularmente a China, é um sintoma desta crise, assim como um fator que serve para exacerbar o problema.

Os que argumentam que a crise foi causada pela queda da taxa de lucro necessitam explicar por que a recuperação da taxa de lucro ao longo do período passado não levou a uma recuperação real no investimento e a um retorno do crescimento sustentado. “Os lucros como proporção do PIB estadunidense subiram de menos de 4% em meados dos anos 1980 a um pico tipo pós-guerra de 11% no ano passado, uma estatística que aquece o coração de um barão ladrão do século XIX”, afirma John Plender. “A participação dos salários caiu consistentemente desde o início dos anos 1970” (FT, 11/1/14). De acordo com o Escritório de Análise Econômica, com sede nos EUA, os lucros nos EUA antes dos impostos atingiram o pico no terceiro trimestre de 2006 de 1,865 bilhões de dólares, um ano antes da crise de crédito. A taxa de lucro diminuiu gradualmente ao longo de 2008, mas no quarto trimestre daquele ano a massa de lucros caiu a 861 bilhões de dólares. Isto coincidiu com a crise e colapso do comércio mundial, como já explicamos. No entanto, no primeiro trimestre de 2009, os lucros antes dos impostos se recuperaram a 1,130 bilhões de dólares, e no quarto trimestre tinha alcançado 1,549 bilhões. No terceiro trimestre de 2010, eles tinham quase alcançado o nível pré-crise chegando a 1, 845 bilhões.

Sendo este o caso, por que o capitalismo ainda se encontra em crise profunda, com um crescimento anêmico, no melhor dos casos, e queda do investimento, o sangue vital de qualquer recuperação? Com lucros recordes, a teoria de que a crise capitalista é causada pela tendência à queda da taxa de lucro revela-se errada. É uma explicação unilateral, mecânica, que contradiz o método dialético de Marx, que vê a crise capitalista não através de uma única causa, mas através de uma concatenação de contradições. Como ele explicou, “A lei funciona, portanto, simplesmente como uma tendência, cujo efeito é decisivo somente sob certas circunstâncias e durante períodos longos” (Marx, O Capital, Livro III, p. 346). Como já explicamos, a essência da crise capitalista é a superprodução simultânea de bens de capital e de consumo para fins de produção capitalista, ou seja, com a finalidade de produzir lucros. Quando não existem mercados, não há vendas e, portanto, nenhum lucro. Por que os capitalistas investiriam sob estas condições de crise orgânica?

Beco sem saída

Os ataques aos níveis de vida e a austeridade em massa serviram para reduzir o consumo e o investimento, sem os quais não pode haver crescimento significativo. No passado, o capitalismo se desenvolveria investindo o excedente extraído do trabalho não-pago da classe trabalhadora. Desta forma, o capitalismo superaria uma contradição profunda: a de que a classe trabalhadora não pode comprar de volta os produtos que ela cria. Mas os padrões de vida estão sob ataque em todos os sentidos. Salários baixos tornam possível grandes lucros, mas, ao mesmo tempo, tornam a realização de tais lucros impossível porque reduzem a demanda por bens. Além do mais, os governos capitalistas não podem aumentar o gasto público devido à crise das finanças do Estado, e os salários não podem ser aumentados (estes estão sendo cortados em todos os lugares), visto que isto vai comer os lucros. Sem investimento (que vem do trabalho não-pago da classe trabalhadora) e com a queda dos padrões de vida, o sistema está preso em um beco sem saída gigantesco. A produção capitalista depende da acumulação acelerada (investimento). A incapacidade de executar esta função deve provocar inevitáveis e sucessivas crises. A queda da acumulação tem um efeito dominó desastroso na prevenção do ciclo e do processo contínuo de produção, realização (vendas) e investimento. Quando a acumulação cessa, os lucros também cessam.

O capitalismo se vê obrigado a criar seu próprio mercado na forma de investimento em bens de capital, o que, por sua vez, age como um estímulo para o desenvolvimento econômico. Marx dividiu a produção capitalista em dois departamentos baseados em bens de capital e bens de consumo. A complexa interação entre o Departamento 1, a produção dos meios de produção (bens de capital, maquinaria, prédios etc.), e o Departamento 2, a produção de meios de consumo (bens de consumo), serve para expandir a economia. Além da pequena parte do excedente consumida pelos capitalistas, o restante é reinvestido na economia. Toda a justificação histórica do capitalismo tem sido o desenvolvimento das forças produtivas. Se a produção não aumenta, então o mercado continuará a estagnar. Os dois Departamentos da produção são interdependentes. Uma queda em um deve finalmente significar uma queda no outro. O sistema capitalista funciona quando todos os fatores interagem com todos os outros fatores, o que requer um constante aumento da produção, do investimento e o aumento dos mercados em uma espiral de desenvolvimento. Mas atualmente o processo oposto é o que ocorre, com excesso de capacidade e mercados minguantes, que têm consequências inevitáveis de estagnação e depressão.

A lei da “acumulação pela acumulação”, que impulsiona o capitalismo, deixa de funcionar. A crise geral do capitalismo se reflete na incapacidade do capitalismo de desenvolver as forças produtivas como no passado. A curva capitalista de produção, da qual falava Trotsky, encontra-se em trajetória descendente. A época agora se caracteriza por auges curtos ou recuperações anêmicas e profundas recessões e prolongadas depressões.

O que os capitalistas fizerem dará errado. Todas as tentativas para restaurar o equilíbrio econômico simplesmente servirão para desestabilizar o equilíbrio social e político. Estão empantanados entre o diabo e o mar azul profundo. É por isso que entramos no período mais turbulento da história, um período de convulsões – econômicas, políticas e sociais, e também em termos das relações mundiais. Todas essas convulsões se retroalimentam umas às outras em ciclo contínuo.

Austeridade Permanente

Hoje, mais de cinco anos depois da queda devastadora, a perspectiva sob o capitalismo parece sombria, para dizer o mínimo. Temos uma recuperação mais fraca do que em qualquer um dos anos das décadas de 1920 e 1930. Ao mesmo tempo, os níveis de vida estão sendo reduzidos até os ossos e a austeridade está em todos os lugares. O caminho da austeridade “vai ser longo, irregular e tortuoso”, afirma Janan Ganesh. “A recuperação econômica não significa o final da austeridade, ou mesmo o começo do fim. Na melhor das hipóteses, ela marca o fim do começo. Se isto faz nossa crise fiscal soar como um desafio histórico de grandes proporções, é porque deveria” (FT, 15/10/13).

Alguns comentaristas burgueses sérios, como Lawrence Summers, ex-Secretário do Tesouro dos EUA sob Clinton, sacaram algumas conclusões alarmantes. Em um artigo intitulado Por que a estagnação pode chegar a ser a nova normalidade, ele fala de uma “estagnação secular” para o capitalismo. De acordo com o dicionário, a palavra “secular” significa uma duração de tempo indefinidamente longa ou até mesmo um século. Mesmo que a economia acelere este ano, disse ele, “isto não proporciona nenhuma segurança de que seja capaz de um crescimento sustentado com taxas de juro reais normais. A Europa e o Japão preveem crescimento em nível bem abaixo dos EUA. Em todo o mundo industrial, a inflação está abaixo dos níveis-alvo e não mostra nenhum sinal de se elevar – o que sugere um déficit de demanda crônica” (Financial Times, 16/12/13).

Summers fez seu discurso sobre “estagnação secular” na conferência de pesquisa do FMI. Esta nova época de estagnação, abertamente reconhecida pelos comentaristas burgueses, é simplesmente outro termo para uma nova depressão, e um reflexo da crise orgânica do capitalismo. James Richards acredita que já estamos em uma depressão onde o crescimento lento é estrutural. “O sistema vai cambaleando”, disse ele, em umestranho eufemismo. Entre outros estrategistas mais clarividentes do capital, o otimismo anterior foi substituído por grande pessimismo, novamente mais um reflexo da profunda crise do capitalismo. Isto se refletiu em um comentário de Martin Wolf, economista-chefe de Financial Times, que ponderou como um retorno aos anos 1930 era possível. “Eu não sabia. Agora sei”, disse sem rodeios. A gravidade da situação (a nova “normalidade”) finalmente amanheceu sobre os representantes burgueses mais sérios. Foram obrigados a aceitar que estão em uma crise do sistema muito similar à crise dos anos 1930.

Sentimentos semelhantes foram expressos pela chefe do FMI, Christine Lagarde: “A economia global está virando a esquina da Grande Recessão [eles não se permitem usar a palavra depressão], embora o crescimento global permaneça demasiado lento e fraco”, disse a Senhora Lagarde. “A menos que os países se unam para realizar o tipo certo de medidas políticas, poderíamos estar diante de anos de crescimento lento e abaixo dos dois dígitos – muito abaixo do crescimento sólido e sustentável necessário para criar empregos suficientes e melhorar os padrões de vida no futuro” (FT, 3/4/14). Com toda honestidade, não há nenhuma possibilidade de países capitalistas “caminharem juntos” com o “tipo certo de políticas”. É uma ilusão ao extremo, como o mostra o quadro da política europeia.

Mas um novo espectro ronda a Europa – o espectro da deflação e da queda dos preços, que caracterizou a década de 1930. Os economistas burgueses sérios estão extremamente alarmados com a inflação da zona do euro no ano até março caindo a 0,5%. Na Espanha, os preços ao consumidor na verdade caíram uns 0,2% durante o mesmo período. Foi a queda mais aguda nos preços desde 2009. A tendência geral é claramente de baixa, o que sugere um déficit crônico na demanda, que temem que possa terminar em espiral descendente.

A deflação – descrita como um “ogro” [divindade infernal – NDT] por Christina Lagarde – simplesmente aumentará seus problemas ao encorajar as pessoas a adiar gastos e investimentos, bem como ao aumentar o peso da dívida. Como os preços caem, o valor nominal dos empréstimos permanece o mesmo enquanto a renda declina. Os devedores são obrigados a usar mais de sua renda para cobrir seus empréstimos. Isto amortece o consumo, pressionando os preços ainda mais para baixo. O investimento é adiado já que as empresas se aferram às suas reservas de caixa, enquanto cai o custo do seguro do dinheiro. Se eles têm dívidas, a deflação tenderá a aumentar a pressão para as empresas de desalavancagem mais rápida, forçando-as a uma espiral descendente. Como afirmou Luis Garicano, professor de economia em LSE: “Estamos em um território onde os modelos e análises utilizados pelos responsáveis políticos não parecem estar funcionando. E isso é muito preocupante” (FT, 3/4/14).

“Nenhum de nós [na Europa] experimentou alguma vez a deflação”, disse Graham Secker, chefe da estratégia de ações pan-europeia em Morgan Stanley. “Ninguém acreditava que a deflação pudesse ocorrer no Japão até que ocorreu” (FT, 3/3/14).

“Para a zona do euro”, explicou o economista Wofgang Munchau, “a deflação alemã é um pesadelo. Se a periferia quiser se tornar mais competitiva, necessita uma inflação mais baixa do que na Alemanha. Mas se a Alemanha, também, se desinfla, então ou o ajuste competitivo não ocorrerá; ou toda a zona do euro entra na deflação; ou, mais provavelmente, ambas as coisas” (FT, 24/2/14).

Eles estão particularmente assustados porque as taxas de juro estão próximas de zero e ameaçam se tornar negativas. Mas esta estratégia é inútil, forçando os depositantes a guardar dinheiro em seus próprios cofres em vez de pagar por ele em uma conta bancária. Ironicamente, a receita Keynesiana de gasto deficitário, que poderia impulsionar a demanda e a elevação dos preços, é descartada nos estados mais endividados onde a ameaça de deflação mais se agiganta. A única e notável exceção, e que parece estar caminhando para a quebra, é o Japão. Bilhões estão sendo injetados na economia endividada, mas com pequenos resultados exceto possivelmente levantar as taxas de juro, colocando em risco um default do governo.

Crise das forças produtivas

Como era de se esperar, os comentaristas burgueses oferecem todo tipo de razões para explicar a crise, exceto a razão real. Naturalmente, distintos elementos desempenham certamente um papel na crise. Na superfície, a queda foi vista como uma crise financeira. Mas a falta de financiamento foi causada pela crise e não ao contrário. Mas há algo mais fundamental que está operando. As leis do capitalismo não estão mais funcionando como no passado. A acumulação está secando. A globalização (ampliação e intensificação do mercado mundial) está chegando a um impasse e ameaçando reverter. Todos os fatores que contribuíram para os anos de auge se transformaram em seu oposto.

O Marxismo vê no desenvolvimento das forças produtivas a chave do desenvolvimento da sociedade e da história. Enquanto o capitalismo for capaz de desenvolver as forças produtivas, isto pode proporcionar uma estabilidade relativa ao sistema. Esta era a situação no passado, mas não é mais o caso. Hoje, temos o contrário, em que a crise significa instabilidade social em escala mundial. “O mundo entrou na era da insegurança”, explica Philip Stephens no Financial Times (21/2/14).

Mais de cinco anos depois do colapso de Lehman Brothers, o sistema capitalista mundial permanece em um beco sem saída. É um profundo mal-estar do qual não pode escapar. Isso tem consequências sérias. Como Marx explicou há muito, nenhum sistema social deixa o cenário da história antes de se exaurir e de se provar incapaz de desenvolver por mais tempo as forças produtivas. Assim que isto acontece, a sociedade entra em um período de revolução social. Esta é precisamente a situação que existe hoje em escala mundial. Há uma crise das forças produtivas, se rebelando contra as barreiras da propriedade privada e do estado-nação. O capitalismo exauriu sua missão histórica e se tornou em um gigantesco entrave para o desenvolvimento econômico e social e para o avanço humano em geral.

A propriedade privada dos meios de produção, em vez de fazer avançar, se tornou um enorme obstáculo ao progresso social. O modo de produção e a apropriação individual entraram em conflito com as necessidades da produção social. As relações de propriedade existentes, em particular, se tornaram historicamente obsoletas. Em geral, se converteram em um obstáculo para futuros avanços. “De formas de desenvolvimento das forças produtivas”, explicou Marx, “estas relações se converteram em seus grilhões”. As forças produtivas estão em revolta, em todos os aspectos, contra as relações capitalistas de propriedade. O materialismo histórico explica que, “nenhuma ordem social jamais perece antes que todas as forças produtivas para as quais nela haja espaço tenham se desenvolvido; e novas e mais elevadas relações de produção jamais aparecem antes que as condições materiais de sua existência tenham amadurecido no seio da mesma velha sociedade”. Estas condições não somente amadureceram, também estão demasiado maduras e colocaram a revolução mundial na agenda.

O beco sem saída do capitalismo se reflete no fato de que ele não pode utilizar plenamente a capacidade produtiva que trouxe à existência. Nos auges econômicos do passado, o sistema apenas podia utilizar 80% de capacidade produtiva. Em tempos de recessão, o sistema apenas pode utilizar 65% da capacidade instalada. Hoje em dia, este índice se situa no extremo inferior. Isto se pode ver pelos números dos EUA, onde a capacidade de utilização da capacidade instalada caiu para 66,9% em 2009 e subiu para 79% em 2013. Mais uma vez, isso reflete o completo impasse do sistema capitalista.

O próprio Marx resume assim toda a contradição:

“A produção capitalista se esforça constantemente por superar estas barreiras imanentes [ao seu desenvolvimento posterior], mas supera-as somente por meios que estabelecem novas barreiras e em escala mais poderosa. A verdadeira barreira da produção capitalista é o próprio capital” (Marx, O Capital, Livro 3, p. 358).

O sistema capitalista encontra-se em etapa de decadência terminal. O sistema está à beira de um grande choque que produzirá uma nova recessão mundial. Este choque pode ser qualquer coisa. É por esta razão que os comentaristas capitalistas estão alarmados com os acontecimentos na Ucrânia. Se esta situação escalar e a Rússia retaliar contra quaisquer sanções, cortando o abastecimento de energia à Ucrânia e à Europa, então isto poderia causar profundas consequências. A guerra no Oriente Médio de 1973 levou à quadruplicação dos preços do petróleo. Isto, por sua vez, desencadeou a crise mundial de 1974. Hoje em dia, um grande aumento dos preços da energia e o caos decorrente poderiam ter o mesmo efeito.

Mesmo sem isto, há pessimismo e desespero crescentes em todos os lugares. “Outra década de mal-estar econômico no Ocidente – ou, não o queira Deus, outra crise financeira – e é provável que vejamos emergir soluções e políticos mais radicais”, afirma Gideon Rachman no Financial Times (10/12/13).

Esta crise histórica sem solução está pavimentando o caminho para acontecimentos revolucionários e grandes mudanças na consciência em escala mundial. O que está absolutamente claro é que não há nenhuma forma de se sair da crise na base do capitalismo, que está destinado a submergir a humanidade em uma época de revolução e contrarrevolução. Somente podemos avançar através da derrubada revolucionária do sistema, superando o pesadelo da crise capitalista e tudo o que significa. Somente quando erradicarmos as contradições que emanam do capitalismo poderemos utilizar plenamente os recursos do mundo para erradicar a praga da fome, da pobreza e da miséria e criar uma vida digna para os seres humanos. Para a humanidade, isto significaria, de acordo com as palavras de Engels, “um salto do reino da necessidade ao reino da liberdade”.

Tradução Fabiano Adalberto