O que é o marxismo – Parte 1

Atualmente, depois da Primavera Árabe, o interesse pelo marxismo ganhou novo impulso. Publicamos agora a primeira parte de um texto escrito nos anos 70 por Alan e Rob. Certamente este escritos encontarão grande interesse entre os trabalhadores e jovens que buscam avançar na direção da construção do socialismo e portanto buscam ser militantes plenamente conscientes.

Prólogo

O marxismo, ou socialismo científico, é o nome que se dá ao conjunto de ideias concebidas pela primeira vez por Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895). Em sua totalidade, estas ideias proporcionam uma base teórica completamente elaborada para a luta da classe trabalhadora para alcançar uma forma superior de sociedade humana – o socialismo.

Embora as concepções do marxismo tenham sido posteriormente desenvolvidas e enriquecidas pela experiência histórica da própria classe trabalhadora, suas ideias fundamentais continuam imutáveis, proporcionando uma base firme para o movimento operário na atualidade. Nem antes, nem desde a época de Marx e Engels, se apresentou alguma teoria superior, mais veraz ou científica para explicar o movimento da sociedade e o papel da classe trabalhadora neste movimento. O conhecimento do marxismo, portanto, proporciona ao proletariado a teoria necessária para levar a cabo a grande tarefa histórica de transformar a sociedade em linhas socialistas.

É este fato que explica os constantes e amargos ataques a todos os aspectos do marxismo conduzidos por todo tipo de defensores da ordem social existente – desde os conservadores até os reformistas pequeno-burgueses, desde o sacerdote jesuíta até o professor universitário.

Da própria fúria destes ataques, assim como do fato de que os mesmos são constantes, apesar de que cada um dos especialistas de turno sempre tenha a pretensão de ter “eliminado de uma vez por todas” o marxismo, os membros mais avançados do movimento operário podem deduzir duas coisas:

1-      Em primeiro lugar, que os defensores do capitalismo reconhecem no marxismo o desafio mais perigoso para seu sistema, e com isto também confessam, ao mesmo tempo, a verdade que o marxismo contém, apesar de todas as suas tentativas de “refutá-lo”.

2-      Em segundo lugar, que, longe de desaparecer sob a montanha de abusos, de “exposições” desleixadas e distorções flagrantes, as teorias de Marx e Engels estão ganhando terreno, especialmente entre as camadas ativas do movimento operário, onde um número crescente de trabalhadores, sob o impacto da crise do capitalismo, se esforça por descobrir o autêntico significado das forças que dão forma a suas vidas, com a finalidade de serem capazes de influir e de decidir conscientemente seu próprio destino.

As teorias do marxismo proporcionam ao trabalhador que almeja uma visão crítica a ferramenta necessária para isso – um fio capaz de conduzi-lo através do labirinto confuso dos acontecimentos, dos complexos processos da sociedade, da economia, da luta de classes, da política. Armado com esta espada, o trabalhador pode cortar o nó górdio que o ata ao mais poderoso obstáculo no caminho do progresso para si mesmo e para sua classe – a ignorância.

É para manter este nó firmemente apertado que os representantes a soldo da classe dominante lutam com todas as suas forças para desacreditar o marxismo ante os olhos da classe trabalhadora. É um dever de todo trabalhador sério no movimento operário estudar as teorias de Marx e Engels, como um requisito prévio essencial para a conquista da sociedade pela classe trabalhadora.

No entanto, no caminho da luta dos trabalhadores em direção à teoria e à compreensão, há obstáculos muito mais difíceis de resolver do que os oferecidos pelos rabiscos dos padres e professores. Uma pessoa que se vê obrigada a trabalhar longas horas numa fábrica, que não se beneficiou de uma educação decente e, em consequência, não tem o hábito de ler, encontra uma grande dificuldade na absorção de algumas das ideias mais complexas, sobretudo no início. Contudo, era para os trabalhadores que Marx e Engels escreviam, e não para os estudantes e pessoas de classe média já com iniciação na cultura acadêmica.

“Todo início é difícil”, não importa de que ciência se esteja falando. O marxismo é uma ciência e, portanto, exige muito do principiante. Contudo, todo trabalhador que seja ativo nos sindicatos ou em um partido operário sabe que nada vale a pena se não for alcançado com certo grau de luta e sacrifício. É aos ativistas do movimento operário a quem se dirige o presente folheto.

Ao trabalhador ativista que esteja disposto a perseverar, pode-se prometer uma coisa: uma vez que tenha realizado o esforço inicial para se familiarizar com ideias novas e desconhecidas, a teoria marxista lhe aparecerá como fundamentalmente direta e simples. Por outro lado – e há que se fazer finca-pé nisto – o trabalhador que adquirir mediante esforço paciente uma compreensão do marxismo se converterá, por sua vez, em melhor teórico que a maioria dos estudantes, tão somente porque poderá compreender as ideias não somente no plano abstrato, mas também no concreto, ao aplica-las em sua própria vida e trabalho.

Todas as classes exploradoras tratam de justificar moralmente o seu domínio de classe ao apresenta-lo como a forma mais alta e mais natural do desenvolvimento social, ocultando deliberadamente o sistema de exploração, disfarçando e distorcendo a verdade. A classe capitalista atual, através de seus mercenários profissionais e defensores, desenvolveu minuciosamente toda uma nova filosofia e moral para justificar sua posição dominante na sociedade.

A classe trabalhadora, pelo contrário, não tem nenhum interesse material em distorcer a verdade e assume a tarefa de desvendar as realidades do capitalismo com o fim de preparar conscientemente sua emancipação. Longe de buscar uma posição especial para si mesma, a classe trabalhadora tem por objetivo abolir o capitalismo e com isto as diferenças de classe e os privilégios. Para isso, deve rechaçar o ponto de vista dos capitalistas e buscar para si mesma um novo método, o método marxista de compreensão.

O método marxista oferece uma visão mais completa e rica da sociedade e da vida em geral e rasga o véu do misticismo na compreensão do desenvolvimento humano e social. A filosofia marxista explica que o motor da história não se acha nem nos “grandes homens”, nem no sobrenatural, e sim que deriva do próprio desenvolvimento das forças produtivas (indústria, ciência, técnica etc.) em si mesmo. É a economia, em última instância, que determina as condições de vida, os hábitos e a consciência dos seres humanos.

Cada nova reorganização da sociedade – seja a escravidão, o feudalismo ou o capitalismo – deu lugar a um enorme desenvolvimento das forças produtivas que, por sua vez, deu aos homens e às mulheres um maior poder sobre a natureza. Tão logo um sistema social se mostra incapaz de desenvolver estas forças de produção, a sociedade penetra em uma época de revolução. Contudo, no caso da mudança do capitalismo ao socialismo, o processo não é automático e requer a intervenção consciente e organizada da classe trabalhadora para realizar esta tarefa histórica. Se não fizer isso, em longo prazo, estará aberto o caminho para o advento da reação e, finalmente, para uma guerra mundial.

O capitalismo voltou a entrar em nova crise econômica mundial que resulta em desemprego massivo nas linhas da década de 1930. As pseudoteorias dos economistas capitalistas mostraram-se totalmente incapazes de impedir as recessões, o que impulsionou a classe dominante a se desfazer do keynesianismo (1) e voltar a adotar as medidas antigas de “finanças saudáveis” do monetarismo (2). Em lugar de resolver a situação, este último programa serviu para aprofundar e prolongar a crise.

          (1)  A escola Keynesiana ou Keynesianismo é a teoria econômica consolidada pelo economista inglês John Maynard Keynes em seu livro Teoria geral do emprego, do juro e da moeda (General theory of employment, interest and money) e que consiste numa organização político-econômica, oposta às concepções neoliberais. Está fundamentada na afirmação do Estado como agente indispensável de controle da economia, com objetivo de conduzir a um sistema de pleno emprego. A escola keynesiana se fundamenta no princípio de que o ciclo econômico não é autorregulado como pensam os neoclássicos, uma vez que é determinado pelo “espírito animal” (animal spirit no original em inglês) dos empresários. É por esse motivo, e pela incapacidade do sistema capitalista conseguir empregar todos os que querem trabalhar, que Keynes defende a intervenção do Estado na economia.

          (2)  E uma teoria econômica que defende que é possível manter a estabilidade de uma economia capitalista através de instrumentos monetários, pelo controle do volume de moeda disponível e de outros meios de pagamentos. O monetarismo se apoia na chamada teoria quantitativa da moeda, tirando conclusões a partir desta teoria para a política monetária mais adequada. Ou seja, a inflação, para esta corrente do pensamento econômico, é causada por um excesso de moeda em circulação. Os principais defensores do monetarismo, em épocas recentes, foram os economistas da Escola de Chicago, liderados por George Stigle e Milton Friedman, detentores do Prêmio Nobel da Economia. Suas ideias são associadas à teoria neoclássica da formação de preços e ao liberalismo econômico.

Somente o marxismo foi capaz de expor as contradições do capitalismo que provocam periodicamente recessões e depressões. O capitalismo esgotou por completo seu papel histórico no desenvolvimento da base produtiva da sociedade. Constrangidas pelo Estado nacional e pela propriedade privada, as forças produtivas são sistematicamente destruídas, devido à superprodução massiva de mercadorias e capitais.

Tal e como Marx e Engels explicaram:

Nas crises irrompe uma epidemia social que teria parecido um contrassenso a todas as épocas anteriores – a epidemia da superprodução. A sociedade vê-se de repente transportada de volta a um estado de barbárie momentânea; dir-se-ia que uma praga de fome ou uma grande guerra aniquiladora lhe cortaram todos os meios de subsistência; a indústria, o comércio, parecem aniquilados. E por quê? Porque ela possui demasiada civilização, demasiados meios de vida, demasiada indústria, demasiado comércio. As forças produtivas que estão a sua disposição já não servem para promoção das relações de propriedade burguesas; pelo contrário, tornaram-se demasiado poderosas para estas relações, e são por elas tolhidas; e logo que triunfam deste tolhimento lançam na desordem toda a sociedade burguesa, põem em perigo a existência da propriedade burguesa” (Marx e Engels, O Manifesto Comunista).

O presente folheto reúne pela primeira vez em português os três suplementos do Boletim de Estudos Marxistas de Gales do Sul (publicados pela primeira vez na década de 1970) como uma pequena contribuição à sede crescente de ideias marxistas.

Continua:

Parte II
Parte III