O programa eleitoral do PODEMOS

PODEMOS apresenta um programa que é, em geral, progressista e avançado. Mas para colocá-lo em prática deve assumir uma política e um programa socialista. Essa é a lição da experiência do Syriza na Grécia.

O PODEMOS apresenta um programa que é, em geral, progressista e avançado. Se colocado em prática, transformaria radicalmente a vida de milhões de famílias trabalhadoras no Estado Espanhol.

Algumas propostas são importantes no sentido de anular leis reacionárias do PP e algumas do PSOE na época de Zapatero:

  • A “Lei da Mordaça” que fere gravemente as liberdades democráticas, artigos do código penal, como os que penalizam os piquetes e criminalizam greves;
  • As reformas trabalhistas do PP e PSOE que permitem as demissões voluntárias (plano), degradam a negociações coletivas, precarizam os empregos e rebaixam os salários,
  • As reformas das pensões do PP e PSOE, recuperando a aposentadoria aos 65 anos e a subida das pensões com a IPC (Índice de Preços de Consumo);
  • A “lei de costas” que privatiza o litoral;
  • A lei de aborto, que impede as mulheres menores de idade a exercerem este direito livremente;
  • A lei educativa LOMCE que retrocede 45 anos o sistema educativo e lesiona competências autonômicas;
  • A reforma do Tribunal Constitucional que propicia a destituir cargos públicos eleitos pela maioria;
  • A “Lei de regime local”, que corta gastos com as prestações sociais das prefeituras; 
  • O artigo 135 da Constituição que privilegia o pagamento da dívida ao invés de utilizá-lo nas áreas sociais.  

O programa econômico

A proposta de reforma fiscal propõe aumentar os impostos aos ricos, eliminar subsídios e isenções fiscais às grandes empresas, além de subir os impostos dos fundos de investimentos evasores de impostos (Sicavs, entre outros). Também propõe subir o imposto sobre a renda (IRPF) a quem ganha mais de 60 mil euros por ano. Desta maneira espera-se conseguir entre 30 e 40 milhões de euros. 

Outra proposta é de reduzir o IVA (Imposto sobre o Valor Agregado) de alimentos e serviços básicos de 4 a 10% e aumento dos produtos de luxo a 25%, cujo consumo cresceu no mesmo período em que a crise se aprofundou.

Também se propõe um “imposto de solidariedade” ao sistema bancário durante 4 anos para recuperar parte dos 60 milhões que o Estado reverteu em capitalizar o sistema financeiro.

A parte mais débil do programa econômico se refere à dívida e ao sistema energético. O objetivo de auditoria da dívida pública seria simplesmente de “lançar luz sobre o processo de crescimento e recomposição interna da dívida”, sem perspectiva alguma de cancelá-la para dar o primeiro passo para desfazer-se dos grilhões mais imediatos da finança estatal.

O programa social

Aqui se propõe restituir o investimento público em pesquisa e desenvolvimento a níveis anteriores aos da crise, restaurar o gasto em saúde, educação cortados desde 2008 e estabelecer uma “renda diferencial” de 600 a 1200 euros para as famílias que vivem abaixo da linha de pobreza, entre outras medidas.

Propõe-se a garantia da atenção à saúde universal e uma “tarifa social” para energia e transporte para as famílias em situação de pobreza.

No que diz respeito à moradia, a proposta é o pagamento para cancelar as dívidas hipotecárias e que ninguém seja despejado de sua moradia. Será pressionado o SAREB e os bancos e imobiliárias com andares vazios a fornecer casas para aluguel social.

Também se propõe a educação pública de 0 a 6 anos e transferir gradualmente os subsídios da escola conveniada (escola particular, mas que recebe verba da Administração Central) para a educação pública.

No quesito trabalhista, se propõe um salário mínimo de 800 euros para 2017 e de 950 euros para 2019, limite de um ano para obter contratos temporários e que os contratos de tempo parcial durem ao menos 50% da jornada trabalhista de um contrato indefinido da mesma empresa.

Democracia e corrupção

A proposta é converter o Senado em uma câmara que atenda aspectos das comunidades autônomas, instaurar o caráter constitucional da plurinacionalidade do Estado Espanhol e o “direito de decidir”.

Eliminação dos privilégios econômicos dos altos cargos políticos e eleitos e proibir as “portas giratórias” durante 10 anos a membros do governo que entram nos Conselhos de Administração de grandes empresas após acabar seus cargos.

Outra proposta é de eleger o órgão máximo de governo dos juízes, o Conselho Geral do Poder Judicial, por sufrágio universal. Ainda que, por suas condições de vida e status social, a maioria dos juízes está em prol e mais próxima dos ricos do que das famílias trabalhadoras, esta medida estabeleceria um elemento de controle popular.

Eliminação dos símbolos franquistas e volta das exumações das valas comuns dos assassinados pelo fascismo e se instalação de direitos democráticos no exército e na guarda civil: direito à sindicalização, liberdade de expressão e filiação a partidos, etc.

Celebramos as propostas destinadas a separar completamente a Igreja do Estado: anulação dos acordos com o Vaticano, eliminação da disciplina religiosa das escolas (escola laica) e dos serviços religiosos nas instituições públicas, recuperação dos bens sem registros apropriados pela Igreja ou o pagamento do IBI (Imposto sobre Bens Imóveis) de seus imóveis.

A política exterior

PODEMOS não ratificará os tratados comerciais TTIP, TiSA e CETA. A pior parte do programa são as referidas bases militares norte-americanas e a OTAN, refletindo uma inaceitável adaptação à pressão do Imperialismo. Nem a revogação do acordo de tomar permanente a base militar de Morón da Fronteira (base militar norte-americana), nem desmantelamento das bases militares no território. O programa limita-se a propor uma “auditoria” e “revisão” dos convênios de defesa feitos com os EUA.

Lamentavelmente, essa é a posição sobre a OTAN: “buscaremos dotar de uma maior autonomia estratégica a Europa e a Espanha dentro da OTAN (…) para enfrentar as relações com nossa vizinhança e as problemáticas globais desde uma perspectiva europeia”. O que é uma perspectiva europeia? Não são as multinacionais do continente que governam Europa? Não é a OTAN o braço armado conjunto do imperialismo europeu e norte-americano? Devemos exigir a saída imediata de Espanha da OTAN. 

Apesar das debilidades e inconsistências do programa, a corrente Lucha de Clases está de acordo com a maioria de suas propostas econômicas, sociais e democráticas. Mas há um problema. Não importa quanta “moderação”, “maturidade”, “responsabilidade” e “sentido de Estado” pretendem aparentar os dirigentes de PODEMOS para sufocar a crítica dos meios de comunicação, a classe dominante jamais se reconciliará com os altos impostos para os ricos, os milhões adicionais destinados às áreas sociais e com a ampliação de direitos democráticos das massas trabalhadoras para que façam valer seus interesses. Isso vai contra suas prioridades em meio ao estancamento econômico e de enormes dívidas públicas. 

Sobre bases capitalistas este programa é irrealizável. Como vimos na Grécia com Syriza, desde o primeiro dia, um governo de PODEMOS enfrentaria a oposição feroz, o boicote econômico descarado das grandes empresas.

Como aplicar o programa do PODEMOS?

Para levar a cabo seu programa, os dirigentes do PODEMOS terão que tomar medidas contra os grandes bancos e monopólios que são os verdadeiros governantes do Estado Espanhol. A primeira medida de um governo PODEMOS deveria ser nacionalizar estas alavancas chaves da economia. Isso ganharia um apoio entusiasta das massas, que veria enfim uma medida concreta que atingiria os meios materiais necessários para levar adiante os pontos do programa anunciado. 

Não propomos nacionalizar pequenas e médias empresas. Nos referimos aos bancos, às 100 grandes empresas que dominam a Bolsa, começando pela IBEX35,os grandes latifundiários. 1400 indivíduos concentram 80,5 % da riqueza do país, segundo um estudo do professor Santos Castroviejo em Uma aproximação da rede social da elite do poder económico na Espanha. Quem são eles comparados aos milhões de trabalhadores e famílias comuns? 1% da população. No entanto, o governo age para seu exclusivo interesse sobre o restante dos demais 99%.

Devemos tirar lições da amarga experiência do governo de Syriza na Grécia. Se aceitar o capitalismo deve aceitar suas leis, o férreo controle da sociedade nas mãos de um punhado de plutocratas. Para não decepcionar as grandes expectativas de mudanças depositadas, PODEMOS deve abrir-se a uma política e a um programa socialista. Não há outra alternativa.

Tradução: Evelyn Gonzalez