Congresso da CMI: A luta das mulheres no Paquistão contra a barbárie

Anam Rab, militante marxista do Paquistão, relatou como vivem as mulheres no país e explicou sobre a necessidade da revolução socialista para libertá-las da opressão em que vivem. 

“Como em todo o terceiro mundo, as mulheres, em especial as mulheres trabalhadoras pobres do Paquistão estão sofrendo, às vezes sinto que elas necessitam a revolução socialista mais do que ninguém. É o único caminho para a liberdade!” (Anam Rab)

Uma das noites do Congresso Mundial da CMI foi reservada para a discussão da luta das mulheres no Paquistão. A atividade surgiu a partir das inúmeras perguntas dos camaradas presentes sobre como desenvolvíamos um trabalho com mulheres em um país com tamanhas dificuldades. Anam Rab falou durante cerca de uma hora e meia e respondeu a diversos questionamentos sobre a militância de uma mulher marxista no Paquistão. 

Primeiramente, explicou que as condições econômicas e religiosas no Paquistão têm um peso gigantesco. Do ponto de vista econômico os índices do Paquistão são indiscutíveis. Cerca de 56% da população é analfabeta, diariamente falta água e luz, o índice de desemprego é altíssimo e as condições de trabalho e de vida estão num patamar de séculos atrás. Ao mesmo tempo, a maioria absoluta da população vive sob um regime religioso com uma moral sustentada em ideias de mais de 1500 anos, ou seja, de tradições feudais, as quais são muito bem aproveitadas pelo sistema capitalista.

Durante toda a apresentação Anam reafirmou que a situação da mulher precisa ser entendida a partir deste contexto. Sendo muito importante ao capitalismo que a situação de opresão se mantenha assim. 

Rab expôs que a situação da mulher paquistanesa é muito distinta da mulher europeia. Mas que ao mesmo tempo existem dois tipos de mulheres paquistanesas, as mulheres pobres filhas de trabalhadores e as mulheres ricas, com as quais não é possível traçar nenhum tipo de comparação, pois ainda que o regime religioso seja o mesmo, o fato de a mulher burguesa ter acesso à educação e às condições de vida totalmente diferente, modifica completamente a situação. 

Para Anam, a mulher paquistanesa é uma mulher que não está em um mundo que a permite ter qualquer tipo de felicidade, mesmo no que diz respeito às questões mais elementares. Ela não sabe o que é desenvolver qualquer tipo de afeto com seus esposo, filhos ou mesmo irmãos. 

Anam salientou que no Paquistão o nascimento de um filho homem é uma festa e o nascimento de uma filha mulher é uma tristeza. A mulher é considerada um peso para a família. Portanto, uma menina que cresce nos ambientes tradicionais do Paquistão, vive sob um opressão tão brutal que é quase impossível que ela cresça de forma sadia, seja do ponto de vista físico, seja do ponto de vista psicológico. 

Uma das indagações feitas foi o pedido de que Ana explicasse como ela tinha saído destas tradições milenares e se tornado uma marxista. A camarada explicou que teve a sorte de crescer em uma família de tradição marxista e que foi ganha para a militância revolucionária pela própria família. Mas que apesar de ela ser uma exceção, apesar de todas as condições que são impostas neste país, é possível sim desenvolver um trabalho militante e construir a saída para que a situação da mulher seja transformada. 

Dando continuidade ao informe, explicou que somente 12% das mulheres vão à escola que, de modo geral, as mulheres estão condenadas a viver trancadas em seus lares, sendo preparadas para casar e exercer os trabalhos domésticos. Não existe nenhuma possibilidade de elas escolherem seus futuros. Quando uma mulher se apaixona pelo homem errado, um homem que não foi escolhido pela família, que não é o homem que a família a vendeu, isso é punido de forma severa, muitas vezes com a morte. Anualmente, mais de mil mulheres são assassinadas por questões de honra, ou seja, fugir com um homem, ou o adultério. Por outro lado, quando casam são tratadas como um objeto, responsáveis pelo lar, e como objeto de prazer sexual, ou de prazer com a violência, pois são espancadas sem qualquer motivo. Na questão do adultério isso é muito mais grave, em muitos casos são inventadas essa história para justificar a expulsão da mulher da casa, ou seja, o marido não a quer mais e para expulsá-la inventa a traição para livrar-se. É comum que sejam espancadas ou mesmo queimadas vivas em praça pública, ou na frente de suas próprias casas. As famílias em geral são coniventes com isso, em vários casos os próprios familiares praticam as ações para não sofrerem as consequências sociais da desonra. 

Anam registrou que, hoje, é possível afirmar que existe uma segregação de gênero no Paquistão, além de todos os outros problemas.  

As mulheres paquistanesas casam-se antes dos 18 anos e muitas são “casadas” com 5 ou 6 anos, pois assim as famílias se livram daquela despesa. 

Apesar de tudo isso muitas mulheres conseguem transpor todos esses obstáculos e se rebelam, começam a participar da vida política e de movimentos, especialmente aquelas que conseguem trabalhar. O fato de hoje uma parcela das mulheres paquistanesas terem entrado no mercado do trabalho é uma necessidade de o capitalismo diminuir o custo do trabalho, já que elas ganham entre 30 e 70% menos do que um homem pelo mesmo trabalho. Apesar disso, essa entrada no mercado de trabalho muda a condição da mulher que passa a ter uma vida, a conversar com outras pessoas, a ver um pedacinho do mundo, o que a faz dar saltos substanciais em sua consciência. Hoje os maiores sindicatos de professores e de enfermeiras são compostos por bases de mulheres que nos último ano fizeram greves e manifestações. 

Anam explicou que nossa organização tem feito um trabalho incansável para ganhar mulheres para a militância, que em geral o que as atrai não é a sua condição como mulher, mas sim as condições de extrema pobreza que elas e seus filhos estão submetidos e que depois desse primeiro contato, aí sim é possível abrir um diálogo sobre o papel que ela ocupa na sociedade e a necessidade de transformar esse sistema.       

Mesmo com todo esse horror, Anam, com um sorriso tranquilo, nos disse que há um ditado no Paquistão que “Só a nossa música já é suficiente para matar os fundamentalistas”, num gesto de explicar a necessidade de ter perspectiva com relação à transformação da sociedade. 

Anam concluiu a atividade dizendo que se no resto do mundo a revolução socialista é fundamental, no Paquistão ela é uma questão de sobrevivência imediata.