Começa o Congresso Mundial da CMI com discussão sobre perspectivas mundiais

Relato do primeiro dia do Congresso Mundial da Corrente Marxista Internacional (CMI) que ocorre em Bardonechia, Itália.

Teve início na terça-feira, 26 de julho, em Bardonechia, Itália, o Congresso Mundial da Corrente Marxista Internacional (CMI) com cerca de 290 presentes de diferentes países.

Alan Woods, do Secretariado Internacional, realizou a abertura política do congresso com informe sobre as perspectivas mundiais.

O camarada Alan abordou a convulsiva situação política que vivemos, marcada por mudanças bruscas e explosivas. Apontou a profunda crise do capitalismo como a raiz dessa instabilidade. Recordou a previsão realizada em 2008, ano do estouro da crise, quando dizíamos que a classe dominante, ao buscar o equilíbrio econômico, iria provocar o desequilíbrio político.

Abordou, logo no início, os recentes acontecimentos no Brasil como exemplo da situação instável que vemos em diferentes países.

Sobre a Grã Bretanha, Alan lembrou que este era, até pouco tempo atrás, o país mais estável na Europa e que agora, após a vitória da saída da União Europeia no referendo, o chamado Brexit, transformou-se no país mais instável do continente.

Salientou que sob uma superfície aparentemente estável, grandes acontecimentos podem estar se desenvolvendo. O que Trotsky chamou de “processo molecular da revolução”.

A votação pelo Brexit foi sucedida por um ataque a Jeremy Corbyn, líder do Partido Trabalhista, por sua deposição com a acusação de não ter realizado a campanha pela permanência com suficiente convicção. Corbyn, eleito para dirigir o partido no ano passado com uma campanha contra a ala direita “blairista”, tem agora agrupado uma base massiva em sua defesa. Em dois dias, 185 mil novas filiações ao partido foram realizadas para dar suporte a Corbyn.

A classe dominante está em pânico. O primeiro-ministro David Cameron anunciou a renúncia após sua derrota no referendo. O desenvolvimento dessa situação pode acabar com o dualismo entre o Partido Trabalhista e o Partido Conservador, com possíveis cisões de ambos os lados.

Do outro lado do Atlântico, nos EUA, pesquisas de opinião realizadas no ano passado apontavam que 67% da juventude estaria disposta a votar em um candidato a presidente socialista, e, entre as pessoas com mais de 65 anos, esse índice foi de 34%. Essa é a demonstração de uma mudança fundamental na consciência da população norte-americana.

Isso se expressou de uma maneira distorcida no apoio massivo à campanha de Bernie Sanders, candidato que se apresentava como “socialista” nas primárias do Partido Democrata.

A crise do capitalismo tem significado a crise do reformismo. Antes os reformistas podiam fazer determinadas concessões à classe trabalhadora, mas isto é impossível na época atual. E o reformismo, mesmo o de esquerda, acaba em traição. Alexis Tsipras, do Syriza, é um exemplo claro disso, com a capitulação diante das exigências da Troika e a aplicação de duras medidas de austeridade na Grécia.

Bernie Sanders também jogou fora uma oportunidade única. Vergonhosamente declarou apoio à candidata rival, Hilary Clinton, ao invés de convocar sua base à criação de um partido de trabalhadores nos EUA.

Alan abordou também a situação no Oriente Médio. Comentou o potencial revolucionário visto com a Revolução Árabe, em especial no Egito, e as lutas populares vistas em 2013 na Turquia contra o governo de Erdogan.

Nesse ponto analisou a recente tentativa de golpe na Turquia. Explicou como, muito dificilmente, o governo de Erdogan não teria conhecimento da preparação de um golpe pelo exército e que, provavelmente, deixou ele se desenvolver para sair fortalecido após seu fracasso. Erdogan é, na verdade, um ditador, que tem tentado expandir sua influência para além da Turquia.

Alan Woods concluiu sua introdução explicando a falta de instrumentos à disposição dos capitalistas para saírem da crise, restando um prolongado período de ataques às condições de vida e aos direitos conquistados pela classe trabalhadora.

A Itália pode ser o próximo país a ser atingido em cheio pela crise, a partir da instabilidade de seu sistema bancário.

O que vemos é uma polarização social. Alan enfatizou nossa tarefa de construir as forças do marxismo em cada país, prepararmo-nos para as turbulências que se intensificarão, construindo uma direção revolucionária capaz de ajudar a classe trabalhadora a derrotar o capitalismo e chegar ao poder.

O debate foi enriquecido pela intervenção de diferentes camaradas. John Peterson, dirigente da seção nos EUA, explicou a situação aberta após o apoio de Sanders a Clinton, com 65% dos jovens se posicionando contra essa atitude, abrindo perspectivas positivas para a construção de nossa organização em meio a essa base.

Ubaldo Oropeza, do México, falou sobre a situação de Cuba e como a burocracia do Partido Comunista tem trabalhado para a restauração do capitalismo na ilha. David Rey, da Espanha, comentou as últimas eleições gerais no país e os erros da direção do PODEMOS que levaram a uma perda de votos significativa em relação às eleições de dezembro.

A camarada Yohana, da Indonésia, retomou a história revolucionária do país e as traições do stalinismo. Explicou a repressão do atual governo contra o movimento dos trabalhadores, que atingiu nosso camarada Hakam, que ficou 3 meses preso por liderar lutas sindicais, fato que contou com uma campanha da Internacional por sua libertação.

Alessando Giardiello, da Itália, enfatizou as traições dos reformistas e a necessidade de táticas corretas para dialogar com a base que tem ilusões nessas direções. Apresentou a atual situação na Itália e a falta de um partido de esquerda com influência de massas. Ao mesmo tempo, a base tem procurado por alternativas, mesmo que com confusões políticas, como é o caso do Movimento 5 Estrelas, que ganhou recentemente as eleições para a prefeitura de Roma e Turim e de um candidato com um discurso contra o sistema, que ganhou as eleições em Nápoles.

O camarada Ilias Kirousis, da Grécia, explicou como a classe trabalhadora tem buscado se reorganizar após a capitulação da direção do Syriza e também dos dirigentes sindicais, que não levam um verdadeiro combate contra a austeridade, convocando apenas greves gerais de um ou dois dias, que servem mais para aliviar a pressão sobre os dirigentes do que para encurralar o governo. Desde 2008, 44 greves desse tipo ocorreram na Grécia, que segue fortemente impactada pela crise econômica e pelos ataques do governo.

Jorge Martin, do Secretariado Internacional, explicou que, diferente do que apresentam alguns analistas, o que se passa na América Latina não é um giro à direita, mas a falência do reformismo, ligado ao aprofundamento da crise econômica. Comentou também os desenvolvimentos na Grã Bretanha após o Brexit.

Deivi Peña, da Venezuela, apresentou a difícil situação que passa a revolução bolivariana, com a ida à direita de Maduro, os ataques da burguesia e o caos econômico, com a alta inflação, a falta de alimentos e o impacto da queda do valor do petróleo nos programas sociais. É provável que um governo da direita chegue ao poder no próximo período, o que deve significar sérios ataques à classe trabalhadora e a retirada das conquistas da incompleta revolução venezuelana. O que certamente virá acompanhado de uma resistência dos trabalhadores.

Ben Morken, da África do Sul, interviu sobre a luta dos trabalhadores no continente africano, a situação na Nigéria, no Senegal e na África do Sul, onde o Congresso Nacional Africano (CNA), partido do governo fundado por Nelson Mandela, tem caído no descrédito diante dos trabalhadores com a alta corrupção e com os ataques que tem realizado contra o povo.

Jérôme Métellus, dirigente da seção francesa, explicou a luta contra a Lei do Trabalho no país, que reuniu milhões nas ruas, e o movimento Nuit Debout, que, apesar de suas confusões e heterogeneidade, expressou a disposição de luta da juventude e seu descontentamento com o sistema vigente.

Adam Pall, do Paquistão, falou sobre a situação da luta política no país, que tem de um lado a elite, o exército e o governo, colocando em prática o avanço de privatizações e diferentes ataques, e de outro lado a sofrida vida do povo e as lutas que se desenvolvem, com as greves de diferentes categorias, como a importante greve dos trabalhadores aeroviários da Pakistan International Air Lines. Comentou também a intervenção da seção junto à juventude na Caxemira.

Ricardo Che, do México, descreveu as fraquezas do governo de Peña Nieto e as grandes lutas da juventude no último período, como dos estudantes de Ayotzinapa e do Instituto Politécnico Nacional. Ao mesmo tempo, os movimentos tem enfrentado a dura repressão, com prisões e assassinatos de ativistas. Na luta contra a reforma educacional, os professores de Oaxaca foram duramente reprimidos, com 5 mortos, dezenas de detidos e feridos, o que desencadeou diferentes manifestações de solidariedade, uma delas reunindo mais de 500 mil pessoas.

Realizaram intervenções também os camaradas Hamid Alizadeh sobre a Turquia; Noureddine, do Marrocos; Hans Öfinger, da Alemanha; Erik Demeester, da Bélgica, comentando os impactos das ações do terrorismo no movimento operário e sua utilização pelos governos ao redor do mundo; Adam Booth, da Grã Bretantanha; Alex Grant, do Canadá; Grahan Day, da Nova Zelândia; Roberto Sarti, da seção italiana; Dan Morley, que abordou a situação na China; Joham, sobre nosso trabalho em El Salvador.

Serge Goulart, secretário geral da seção brasileira, apresentou a situação política no Brasil. Explicou o aprofundamento da crise econômica, a falência política do PT após o estelionato eleitoral, nossa posição contra o impeachment, sem cair na defesa do governo Dilma, os combates contra os ataques à classe trabalhadora e a linha levada pela Esquerda Marxista na atual situação, concentrada nas palavras de ordem: Fora Temer e o Congresso Nacional! Assembleia Popular Nacional Constituinte! Por um Governo dos Trabalhadores!

Caio Dezorzi, também da seção brasileira, abordou o desenvolvimento das lutas e da consciência da juventude desde junho de 2013. Explicou que esse novo momento seguiu evoluindo, tendo como uma de  suas expressões as ocupações de escolas em São Paulo, no final de 2015, que desencadeou ocupações também no Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Ceará, Goiás, voltando a São Paulo nesse ano nas ocupações de escolas técnicas.

Após a intervenção final do camarada Alan Woods. O texto de perspectivas mundiais foi colocado em votação, sendo aprovado por unanimidade dos delegados no Congresso.

O Congresso Mundial da CMI segue até o próximo domingo, 31 de julho. O ânimo dos camaradas é elevado. Este é um momento que possiblita uma rica troca de experiências, com discussões e votações de importantes resoluções. Este, certamente, será um congresso para armar nossa Internacional para enfrentar o convulsivo próximo período, seguindo com força renovada na construção das forças do marxismo ao redor do mundo.