Casa de trabalhador é demolida no Juquiá

Um relato sobre o sofrimento dos moradores do bairro Juquiá, em Joinville, diante do ataque do estado ao seu direito de moradia.

“Pisa ligeiro, pisa ligeiro, quem não pode com a formiga não atiça o formigueiro.”

Canto dos movimentos por moradia no Brasil

Oitocentas famílias. Esse é o tamanho do formigueiro que a Prefeitura de Joinville (SC) insiste em atiçar. A consciência de classe dos trabalhadores que moram no Juquiá, ocupação no bairro Ulysses Guimarães, cresce aos saltos, assim como cresce a própria ocupação.

O histórico de ataques e resistência é longo. Mas o Estado não cansa de atacar a comunidade.  No último dia 30, máquinas a serviço da subprefeitura sudeste, da Secretaria de Meio Ambiente e da Habitação (ironicamente), derrubaram duas casas. Em uma delas, moram um casal e um recém nascido. A família não estava em casa. A máquina, sem piedade, esmagou toda a estrutura da casa feita de madeira e Eternit, destruindo tudo. Quando o casal chegou e tentou barrar, foi ameaçado pelos policiais que davam cobertura à operação.

Quando o Estado vai ao Juquiá, é para despejar

O único equipamento público do bairro é a Escola Municipal Amador Aguiar que leva o nome do burguês fundador do banco Bradesco, porque o banco ajudou a construir a escola. O posto de saúde está em obra há três anos. A rede de esgoto está pronta no loteamento, mas ainda não está ligada à estação de tratamento.

Já as tentativas de despejos e demolição de casas isoladas são constantes e vieram de todos os últimos governos da cidade. Marco Tebaldi (PSDB), em 2005. Carlito (PT), em 2009. No atual governo do PMDB, do empresário Udo Döhler, é o segundo momento de ataque. Em 2013, os moradores ocuparam um ônibus e o gabinete do prefeito.

Até 2005, a ocupação fazia parte do território do bairro Adhemar Garcia, cuja Associação de Moradores (AMBAG) é dirigida pela Esquerda Marxista e havia travado muitos combates ao lado da comunidade. Moacir Nazário, presidente da AMBAG, chegou a ser detido pelo Grupo Tático da Polícia Militar durante um enfrentamento, tornando-se uma referência para a luta deles. Sabendo disso, o então prefeito do PSDB, com a ajuda do vereador Ademir Machado, racharam o bairro, criando o Ulysses Guimarães.

Para cada ataque, muita resistência

No dia 30, quando pela manhã efetuaram o desmanche das duas casas, na parte da tarde, 300 moradores se organizaram e em passeata fecharam um dos principais cruzamentos do bairro. Durante três horas queimaram pneus, trancando várias ruas na região.

A polícia e os bombeiros tentaram impedir a ação, mas nada continha a comunidade, muito revoltada. Conforme proposto ao final do ato, 80 moradores se reuniram no loteamento à noite para preparar uma manifestação no dia seguinte em frente à Prefeitura. O pastor, que dirige um centro de recuperação na comunidade, além de oferecer a igreja para reunião, colocou à disposição uma van. Alguns se dividiram entre os carros dos vizinhos. Como já tinham aprendido com o histórico de enfrentamentos, na manhã do dia seguinte, organizaram o trancamento de um ônibus do transporte coletivo, fazendo o motorista levar o restante dos moradores até a Prefeitura.

O prefeito e seus secretários receberam uma comissão de 20 lideranças dos 100 presentes no ato, entre eles o vereador Adilson Mariano e a advogada do Centro de Direitos Humanos, Cynthia Pinto da Luz, militantes da Esquerda Marxista. Mais uma vez, o prefeito assumiu compromisso de não mais atacar a comunidade e pediu um prazo para que a Secretaria de Habitação cadastre os moradores e apresente um plano de regularização.

Apesar do breve alívio, os moradores não cruzarão os braços. Já está marcada uma nova reunião para dia 5 de julho, em que a comunidade criará um grupo de luta permanente, para cobrar do prefeito os compromissos assumidos. O aguerrido povo que mora no Juquiá já aprendeu: cada conquista foi arrancada do poder público com muita luta, muito pneu queimado, muita organização e resistência.

Das 800 famílias, metade já teve suas moradias regularizadas. Em 2005, conquistou-se uma rede de energia de alta tensão até a praça. Nesta rede foram colocados vários medidores coletivos, além da instalação de rede de água e hidrômetros em cada casa. Um ano depois, os moradores forçaram a instalação de energia em todas as ruas, que receberam iluminação pública. Em 2009, durante o governo petista, a resistência, além de impedir o despejo e a remoção de casas construídas após a regularização, conquistou asfalto nas vias em que passam transporte coletivo.

Construir o Movimento por Moradia, derrubar o capitalismo

O que aconteceu na última quinta-feira é o retrato da barbárie, fruto desse sistema podre que combatemos. É o que falávamos no início de junho, no aniversário do Movimento por Moradia (http://goo.gl/NVFTI3): enquanto vivermos num modo de produção em que casas não são construídas para morar, mas para gerar lucro para uma ínfima parcela da população, veremos cenas como essa (https://goo.gl/xnKsWI). O resultado de meses de trabalho de uma família destruído em segundos por uma máquina a serviço dos grades proprietários de terra e construtores. É preciso transformar nossa revolta espontânea em organização, no Movimento por Moradia, unificando todos os trabalhadores na luta por moradia digna e regularizada para todos.