Bósnia – Uma nova etapa na Revolução Europeia

O presente movimento de protesto na Bósnia representa uma nova e mais elevada etapa no processo molecular da revolução europeia. O heroico movimento revolucionário dos trabalhadores e da juventude bósnios é um exemplo brilhante para os futuros movimentos na Europa e em todo o mundo.

Duas coisas são notáveis sobre este movimento. Primeiro de tudo, seu claro caráter de classe. Isto certamente se expressa nas demandas dos manifestantes. Por exemplo, isto é claramente enfatizado, na Declaração dos Trabalhadores e Cidadãos do Cantão de Tuzla em sete de fevereiro:

“Hoje está sendo criado um novo futuro! O governo [local] apresentou sua demissão, o que significa que a primeira demanda dos manifestantes foi satisfeita, e que as condições para a solução dos problemas existentes foram alcançadas. A ira e a raiva acumuladas são as causas deste comportamento agressivo. A atitude das autoridades criou as condições para que cresçam a ira e a raiva.

“Agora, nesta nova situação, desejamos dirigir a ira e a raiva para a construção de um sistema produtivo e útil de governo. Fazemos um apelo a todos os cidadãos para que apoiem a realização dos seguintes objetivos:

“1) Manter a ordem pública e a paz em cooperação com os cidadãos, a polícia e a proteção civil, com o fim de evitar qualquer criminalização, politização e manipulação dos protestos.

“2) Estabelecer um governo técnico, composto por membros especializados, não políticos, e sem compromissos. [Devem ser pessoas] que não tenham ocupado nenhum cargo em nenhum nível de governo e que dirijam o cantão de Tuzla até as eleições de 2014. Este governo deveria estar obrigado a apresentar planos e informes semanais sobre seu trabalho e cumprir seus objetivos proclamados. O trabalho do governo será acompanhado por todos os cidadãos interessados.

“3) Resolver, através de um procedimento acelerado, todas as questões relativas à privatização das seguintes empresas: Dita, Polihem, Poliohem, Gumara e Konjuh. O governo deverá:

Reconhecer a antiguidade e um seguro de saúde aos trabalhadores.

Tramitar o julgamento dos delitos econômicos e de todos os implicados neles.

Confiscar a propriedade obtida ilegalmente.

Anular os acordos de privatização [destas empresas].

Preparar a revisão das privatizações.

Devolver as fábricas aos trabalhadores e colocar tudo sob o controle do governo público a fim de proteger o interesse público, e iniciar a produção nas fábricas onde seja possível.

“4) Igualar os subsídios dos representantes do governo ao pagamento dos trabalhadores do setor público e privado.

“5) Eliminar os pagamentos adicionais aos representantes do governo, adicionados as suas receitas, como resultado de sua participação nas comissões, comitês e outros órgãos, bem como outras formas irracionais e injustificadas de compensação além das que todos os empregados têm direito.

“6) Eliminar os subsídios dos ministros e, eventualmente, de outros empregado do Estado depois do encerramento de seus mandatos.

“Esta declaração é apresentada pelos trabalhadores e cidadãos do cantão de Tuzla para o bem de todos”.

Eis um documento de clara natureza proletária. São as demandas dos trabalhadores, jovens e idosos, que entenderam que não há nenhum futuro para eles sob as presentes condições existentes. Eles entenderam que as privatizações e o “mercado livre” não podem ajudá-los a melhorar a sua sorte. Estão enfrentando o governo com uma alternativa clara: ou este melhora suas condições de vida de forma drástica (o que este governo é inerentemente incapaz de fazer) ou será varrido pelas massas (o que, consequentemente, é a única opção).

Neste movimento, não há espaço para nacionalismo e chauvinismo – os grandes males que atormentaram o povo da Iugoslávia com horrores inimagináveis durante os últimos 30 anos. Os trabalhadores e jovens em luta da Bósnia se tornaram plenamente conscientes do fato de que o nacionalismo e o chauvinismo não são nada além de táticas desagregadoras da burguesia, orientadas para fazê-los lutar uns contra os outros em vez de lutar contra seus opressores. Hoje, as massas não estão lutando em nome do nacionalismo ou por razões religiosas, mas pela satisfação das necessidades materiais, o que é impossível de se conquistar sob o capitalismo.

A segunda característica notável do movimento é o método dos manifestantes. O processo se desenvolveu em ritmo incrivelmente rápido na Bósnia. Os trabalhadores de Tuzla necessitaram somente de três dias para começar a desmantelar seu governo. Naturalmente, o recentemente instalado aparato de estado na Bósnia era muito mais fraco do que as velhas e consolidadas maquinarias de opressão da Europa Ocidental. Mas o principal fator foi a coragem e determinação das massas que estavam simples e completamente indispostas a serem tratadas como animais por mais tempo. O movimento se desenvolveu muito rápido ao pressionar resolutamente para a frente, adquirindo caráter insurrecional, assumindo e incendiando sedes governamentais. Foi esta a chave para seu rápido êxito inicial.

Além disso, o movimento em Tuzla foi ainda mais longe instalando um Plenum com o objetivo de “tomar o assunto em suas próprias mãos”, e substituir o governo local que eles depuseram. Confrontados ao claro exemplo de decrepitude e degeneração do capitalismo, os trabalhadores e jovens da Bósnia estão começando a entender que têm de esmagar o estado capitalista, que é responsável por seus problemas e que têm de substituí-lo com algo melhor – um governo que é diretamente controlado pela povo trabalhador. Este é o desenvolvimento mais importante.

Estes órgãos da luta das massas aparecem todas as vezes que a classe trabalhadora se move para tomar seu destino em suas próprias mãos. Isto aconteceu nas revoluções russas de 1905 e 1917, na Espanha em 1936, na Checoslováquia em 1968 e em muitos outros exemplos. De fato, o que representam, embrionariamente, é o futuro estado dos trabalhadores. A fim de criar as condições para um governo que seja genuinamente receptivo às necessidades de todos os trabalhadores, é absolutamente necessário que o modelo dos conselhos dos trabalhadores se espalhe ao resto do país e se conecte em escala nacional com o objetivo de se prepararem para a tomada do poder.

Os acontecimentos na Bósnia são uma exemplo claro do gigantesco potencial da ação espontânea de massas. Mas isto não nos deve fazer perder de vista os limites da espontaneidade e a necessidade de organização. No momento, os únicos elementos organizados do movimento parecem ser as ONGs liberais. Mesmo que estejamos a lidar com um movimento dos trabalhadores, o movimento dos trabalhadores organizado ainda não tomou parte nos protestos e todos os partidos políticos se distanciaram dos acontecimentos. A única exceção significativa é o apoio dado pelo popular prefeito socialdemocrata de Tuzla, Jasmin Imamovic, ao Plenum local dos Trabalhadores e Cidadãos.

O estado e os capitalistas mafiosos da Bósnia e Herzegovina não podem resistir às massas de forma significativa, mas enquanto o movimento avança, as massas estarão sob tremendas pressões a partir das forças do imperialismo para dar um fim ao movimento. É absolutamente necessário para o movimento estabelecer estruturas claramente democráticas e uma forte liderança. Esta é a essência do método de Lênin de organização, o centralismo democrático. Todas as revoluções fracassadas dos últimos dois séculos se remontam à ausência de uma liderança apropriada.

Para ter êxito, um movimento revolucionário necessita de alguma expressão organizada, necessita de uma voz política unificada e de uma estrutura democrática para estabelecer objetivos claros e para manter os debates. É tarefa urgente para os trabalhadores e a juventude da Bósnia sugerir esta estrutura. Doutra forma, o vácuo da liderança será preenchido pelas ONGs, o que poderia ter consequências desastrosas, como revelado no recente “manifesto” recentemente publicado por duas organizações chamadas “Rebelião” e “Udar”. Este manifesto é uma completa retirada das posições que foram expressadas na Declaração de Tuzla, enquanto apela por mais integração na União Europeia e na OTAN – os dois poderes imperialistas em cujos ombros repousa a principal responsabilidade pela crise que causou a presente rebelião. Contudo, somente dois dias depois, a organização da juventude “Rebelião” se distanciou deste documento, o que revela que há turbulência nestas organizações. 

A Revolução Bósnia é o próximo e decisivo passo da Revolução Europeia. Desde que a crise se iniciou em 2007, a revolução tem saltado para a frente de um país a outro. Somente na Europa, a Espanha, a Grécia, a Turquia, Bulgária e Romênia já foram afetadas por importantes conflitos sociais. A crise está lenta mas inexoravelmente invadindo o próprio coração da Europa, e as massas continuam a reagir a ela com formas de luta cada vez mais agudas. À luz disto, é útil recordar as perspectivas mundiais da CMI de 2014:

“O que vemos é o início da revolução mundial. Os acontecimentos de um país a outro produzem grandes impactos na consciência em outros países. Os modernos métodos de comunicação permitem que os eventos sejam replicados com a velocidade de um raio. (…) Estas explosões ocorreram a partir de questões aparentemente sem relação e de caráter acidental: um projeto de construção de um centro comercial em Istambul e um aumento das tarifas de transporte público em São Paulo. Mas, na realidade, são reflexos do mesmo fenômeno: a necessidade se expressa através do acidente. Este é um reflexo das contradições que foram se acumulando durante décadas sob a superfície. No momento em que o processo alcança um ponto crítico, qualquer pequeno incidente pode lançar as massas em movimento. Os comentaristas capitalistas foram tomados completamente de surpresa pelos acontecimentos na Turquia. Mas, dentro de uma questão de dias, protestos de massas similares varreram o Brasil, o gigante econômico da América Latina, lançando centenas de milhares de pessoas nas ruas. Foram as maiores demonstrações desde há 20 anos. Elas expuseram as contradições que estavam se acumulando na forma de péssimos serviços de saúde pública, de péssimos serviços de educação pública e corrupção desenfreada”.

Na lista de incidentes aparentemente não relacionados que lançam as massas na ação, agora podemos adicionar a privatização de algumas fábricas em Tuzla. A Bósnia é um grande exemplo de como o processo está se aproximando cada vez mais de um enfrentamento colossal, no qual a humanidade finalmente será liberada de todas as formas de exploração e opressão. Temos plena confiança na capacidade da classe trabalhadora de realizar esta tarefa, a maior tarefa na história da humanidade.

Longa vida aos trabalhadores e à juventude da Bósnia e Herzegovina!

Abaixo o capitalismo!

Longa vida à Revolução Socialista!