A tática Black Block, a confusão política e a luta de classes

Um artigo do Edilson Silva, Secretário Geral do PSOL, intitulado “Tática Black Bloc: condenar, conviver ou se aliar?” tenta extrair lições positivas do movimento Black Block e das suas táticas. Esse homem perdeu a cabeça.

A mídia e os jornais divulgaram nestes dias um artigo do Edilson Silva, secretário geral do Partido do Socialismo e Liberdade (PSOL), que estava no site do partido desde outubro do ano passado. O artigo intitulado “Tática Black Bloc: condenar, conviver ou se aliar?” tenta extrair lições positivas do movimento Black Block e das suas táticas. Mas, diante do incidente trágico da morte do cinegrafista Santiago Andrade e da tentativa da mídia e do advogado Jonas Tadeu (que representa os dois jovens acusados pela morte do cinegrafista) de envolver o deputado do PSOL Marcelo Freixo com o caso, o PSOL tirou rapidamente o artigo do site. O partido alegou que o artigo defendia posições pessoais do Edilson Silva e não era uma posição oficial. Mas, não adiantou nada o PSOL tentar esconder o artigo, pois ele acabou sendo difundido na internet e por toda mídia.

O senador Randolfe Rodrigues, pré-candidato a presidente pelo PSOL, soltou uma nota rebatendo as acusações feitas pela Rede Globo que grupos do partido estariam apoiando a violência nas ruas. A nota diz o seguinte: “Neste sábado (15) no programa Fatos e Versões, do Canal Globo News, a jornalista Diana Fernandes atribuiu a minha pessoa uma declaração de que existiriam grupos minoritários dentro do partido que, se não estimulam, seriam coniventes com a violência nas ruas.
Esta afirmação é totalmente desprovida de verdade. A minha posição e também do partido é clara: ninguém do partido possui relação de concordância com estes grupos e muito menos estimula ou financia tais práticas. E quando afirmo isso estou me referindo ao conjunto de nosso partido (…). Nosso partido apoia as manifestações por considerar um direito do povo lutar contra os desmandos dos governantes e por demandas mais do que justas. E nossa presença nestas manifestações, seja dos militantes filiados, seja de nossos parlamentares, sempre será de apoio à demanda apresentada e nunca de apoio a atos isolados de pequenos grupos, como os Black Bloc”.

A direção do PSOL soltou uma nota repudiando as tentativas da mídia e da Rede Globo, em particular, de envolver Marcelo Freixo e o partido com a morte do cinegrafista: “Nosso partido apoia de forma irrestrita o direito à livre manifestação e recrimina a postura repressiva do aparato estatal. Mas, ao mesmo tempo, não concorda e nem participa de ações efetuadas por pequenos grupos presentes em alguns atos.
Por essas razões, fica evidente que a reportagem veiculada pelo Fantástico e outros veículos de comunicação foi irresponsável e leviana, transformando informações frágeis numa acusação gravíssima. A reportagem se baseia nas declarações do advogado Jonas Tadeu Nunes, que defendeu o miliciano e ex-deputado estadual Natalino José Guimarães, chefe da maior milícia do Rio de Janeiro. Justamente os milicianos que foram para a cadeia pelo trabalho da CPI presidida pelo deputado Freixo”.

A mídia usou de má fé ao publicar um artigo escrito em outubro do ano passado pelo secretário geral do PSOL, por ocasião do impacto causado pelas manifestações de junho-julho, com o claro objetivo de incriminar o PSOL e Marcelo Freixo, num momento em que o Senado está prestes a votar uma lei antiterrorismo com o apoio do governo Dilma e de sua base aliada.

Repudiamos a onda de criminalização dos movimentos sociais promovida pelo governo e pela justiça a serviço dos interesses da burguesia. Contra a repressão somos solidários com todo movimento social que luta contra o capitalismo independente das divergências político programáticas. Mas, não podemos nos omitir de fazer uma crítica ao documento de Edilson Silva que tenta descaracterizar os métodos de luta da classe trabalhadora em favor da chamada “tática Black Block”, que é a completa negação da luta de classes. 

Mas, exatamente por ter sido escrito no calor das manifestações do ano passado é que o artigo de Edilson Silva é problemático.

Vejamos o que ele diz: “Em tese, as táticas Black Bloc dispõe-se a proteger manifestações da sociedade civil contra ações truculentas das forças do Estado. Dispõe-se a gerar prejuízo material a quem causa prejuízo ao bem público mais precioso – as pessoas – e é fácil perceber um forte conteúdo anticapitalista nos seus alvos. Seu diferencial mais saliente, e porque não dizer sedutor, é a coragem e o desprendimento com que se lançam diante da repressão estatal”.

Nós já analisamos os Black Blocks em nosso artigo nesse site intitulado “Black Block, uma análise marxista”. Mas, quando o Secretário Geral de um partido que se diz socialista sai em defesa deste “forte conteúdo anticapitalista” dos métodos dos Black Blocks, então chegamos à conclusão que Edilson Silva não sabe o que é o capitalismo e muito menos que a única forma de derruba-lo é a luta de classe do proletariado.

A luta contra o capitalismo só é eficaz quando se ganha a maioria do proletariado e das massas oprimidas nesta luta. Não se dialoga com os trabalhadores e sua camada avançada, que cada dia que passa se decepciona com a política de colaboração de classes do PT, por meio de “ações exemplares” contra símbolos do capitalismo. A falta de compreensão do que significa a luta de classe do proletariado dentro da sociedade capitalista leva a buscar atalhos oportunistas, ultraesquerdistas, quando na verdade o necessário é fazer uma política socialista defendendo as reivindicações dos trabalhadores. É uma tarefa difícil pois são muitos os obstáculos, especialmente as ilusões das grandes massas, que mesmo estando insatisfeitas possuem ilusões na sociedade burguesa. É necessário dialogar com essas ilusões para ganhar a confiança dos trabalhadores.  É preciso fazer propaganda política para educar os trabalhadores mais avançados, defender as reivindicações dando sempre uma perspectiva socialista, defender a unidade das organizações dos trabalhadores na luta comum contra o capitalismo e o governo.

Nada disso vamos encontrar na chamada “tática Black Block” que tem o mérito de afastar os trabalhadores e as massas populares quando ocorrem manifestações. Edilson Silva tirou conclusões completamente erradas dos motivos que levaram milhões de manifestantes das ruas no ano passado.

Mas, a confusão política continua por parte do Secretário Geral do PSOL: “Creio que uma questão preliminar é estabelecer que esta tática não é uma novidade em si. A novidade está nas condições objetivas encontradas no presente momento histórico e que permitem que esta tática ganhe uma força inédita. É fácil perceber quais são estas condições nos próprios posts de ativistas que reivindicam a tática Black Bloc.

A primeira é a revolta contra as condições de vida, no transporte, na saúde, na educação, na segurança, em contraste com os gastos absurdos e desnecessários com a Copa, por exemplo. Isto é um escárnio e revolta qualquer um. A segunda condição é uma sensação generalizada de impotência das ações políticas tradicionais na busca pela melhoria da situação, com a sociedade vendo a cooptação fácil de movimentos sociais vendidos, políticos e partidos se acomodando deliciosamente no poder e a situação social se deteriorando. A terceira condição – talvez a que permita o salto de qualidade no sentido de transformar esta indignação em ação -, é a existência de uma plataforma de comunicação (internet) que permite o somatório político das indignações individuais em um processo acelerado de desalienação política e a visualização de formas autônomas e acessíveis de se fazer algo no concreto e – muito importante – coletivamente, mesmo sem estar organizado em qualquer agrupamento estável e tendo seu anonimato preservado”.

Edilson Silva reconhece as razões do descontentamento popular e que conclusões ele tira para transformar a “indignação em ação”?

Um “salto de qualidade” por meio de uma plataforma de comunicação expressa na internet e nas redes sociais.  Brilhante conclusão das manifestações de junho do ano passado. Edilson Silva dá um tiro no próprio pé ao proclamar em alto e bom tom que seu partido não serve para nada. Então, para que que existe o PSOL se as redes sociais, com o “anonimato preservado” já dão conta do recado? O Secretário Geral para ser coerente com a sua entusiasmada defesa da “tática Black Block” deveria propor a dissolução de seu próprio partido.

A internet e as redes sociais são um importante instrumento de comunicação, mas não substituem a organização dos trabalhadores, da juventude e das massas em geral. Sem organização não há democracia e o movimento operário na sua luta pelo socialismo precisa tanto da democracia da mesma forma que o corpo humano precisa do oxigênio. O que faltou nas manifestações do ano passado e que serve como alerta para as manifestações atuais foi organização, falta liderança e perspectivas políticas para a defesa das reivindicações. Sem organização qualquer movimento se volatiza como éter. O que Edilson Silva vê como virtude na “tática Black Block” e na dos grupos anarquistas é o pior pecado, pois não tem política, não tem programa e não tem organização.

Mas, a confusão não para aí. Continuando Edilson Silva diz: “Feita esta preliminar, não nos parece que o conceito da tática Black Bloc seja algo retrógrado ou mesmo indesejável em essência e propósitos originais. É algo progressivo, politicamente moderno, trazido pelas mãos da dialética na história. Se este fenômeno é mesmo a síntese de um processo histórico e do desenvolvimento das forças produtivas, creio estar descartada a hipótese da não convivência com ele”.

Neste ponto, Edilson Silva já não sabe o que está falando, está confundindo tudo e dizendo muita besteira. A “tática Black Block” é o resultado da descrença de uma parte da juventude radicalizada que não acredita na luta de classes e se sente abandonada pelos partidos tradicionais de esquerda que defendem o reformismo e a colaboração com a burguesia.

É uma tática do desespero que vê na luta contra o capitalismo apenas uma indignação moral. Não tem nada a ver com o desenvolvimento das forças produtivas da sociedade e com a dialética da história. Somente a maioria da classe trabalhadora, através de suas organizações e com os métodos próprios de luta da classe trabalhadora pode resolver a principal contradição do capitalismo que reside no fato de que as forças produtivas da sociedade estão em confronto com a propriedade privada dos meios de produção, ou seja, a com a apropriação privada de uma produção que é fundamentalmente social, e abrindo um processo de ruptura revolucionária abolir a ordem existente.

A “tática Black Block” e a dos grupos anarquistas deve ser criticada duramente, pois em nada ajuda o movimento operário e não responde a necessidade de se construir uma alternativa à política de colaboração de classes praticada pelo PT e pelo governo de coalizão com a burguesia. É uma política retrógrada que está afastando os trabalhadores e as massas populares da luta pelo atendimento das reivindicações de transporte, saúde, educação, que não estão sendo atendidas pela burguesia e pelo governo. E assim, facilitando a política de repressão e criminalização dos movimentos de massa.

O texto de Edilson Silva é o resultado da confusão política que norteia o PSOL. Por um lado o partido tem uma plataforma rebaixada na linha do “democrático popular” vislumbrando o socialismo como uma questão de “ética”. Por outro lado, adota táticas ultraesquerdistas e sectárias de divisão do movimento operário. Esta confusão leva à capitulação diante da política dos grupos esquerdistas e aventureiros, como aconteceu agora na segunda manifestação contra a Copa, ocorrida em São Paulo. Edilson Silva depois de dar atestado de óbito para o seu partido, pressionado pela mídia burguesa, se finge de morto.