20 de Novembro e o legado de Steve Biko

Já se vão 321 anos da derrota do Quilombo dos Palmares e o assassinato de Zumbi. A heroica resistência à exploração e à opressão do sistema colonial é fonte de inspiração da luta contra a escravidão e símbolo das lutas por liberdade e igualdade do povo brasileiro. O dia 20 de novembro deve ser um dia de luta e reflexão de todos os trabalhadores, independentemente da cor da sua pele.

O racismo é uma ideologia criada pelo capitalismo com o objetivo de justificar exploração e opressão inaceitáveis. Após o novo contrato social da grande Revolução Francesa e seus slogans de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, como justificar seres humanos sendo mercadorias e, ao mesmo tempo, dividir o proletariado para que os capitalistas explorem mais a todos? A base fundamental do racismo está nas absurdas e obsoletas teorias de que os seres humanos se dividem em raças.

Estas teorias, já no século 20, formaram a base para a criação de leis segregacionistas e mesmo da perseguição a grupos e nacionalidades minoritárias (às vezes nem tanto minoritárias) em vários países, das quais as mais conhecidas foram as Leis Jim Crow nos EUA e do Apartheid na África do Sul.

Antes de falar dessas, ressalto que no Brasil, apesar de não ter sido aprovada ou outorgada nenhuma lei de segregação racial, após a libertação dos escravos em 1888, os antigos escravos, em sua maioria agricultores, da noite para o dia se tornaram desempregados. Transformaram-se em sua maioria em exército de mão de obra barata do jovem e nascente proletariado urbano brasileiro. Essa herança da escravidão ficou incutida na memória e na realidade de gerações, alimentando o estereótipo da ideologia do racismo e da existência de raças humanas até os dias de hoje.

As Leis Jim Crow¹ foram leis locais e estaduais de segregação racial em estados do sul dos EUA, na região das grandes fazendas de monoculturas (plantation) e que formaram o exército dos Confederados, derrotado na Guerra Civil.

Estas leis dividiam as escolas para brancos e para negros, determinavam bares e locais públicos segregados, bebedouros separados, proibiam casamentos inter-raciais, separavam assentos nos ônibus etc.

Em 1954, a Suprema Corte decidiu pela inconstitucionalidade da segregação escolar, dando início à derrocada das leis segregacionistas e aos espetaculares movimentos pelos direitos civis que mobilizaram milhões nos EUA pelos 15 anos seguintes.

Na África do Sul, as leis do Apartheid² (separação, na língua africânder) foram um conjunto de leis de segregação implantadas a partir de 1948.

Em 1962, a ONU juntamente com diversos países transformam a África do Sul num dos países mais isolados do mundo. Em 1963, Mandela, líder do Congresso Nacional Africano (CNA), que optou pela luta armada contra o regime, é preso e condenado a prisão perpétua.

É nesta luta que surge o gigante Estephen Bantu Biko, militante antiapartheid desde muito jovem que se formou médico e fundou o Movimento Consciência Negra (BCM na sigla em inglês), sendo seu principal dirigente. Em 1970, tornou-se um dos principais líderes do movimento contra o Apartheid, sendo eleito em 1972 presidente honorário da maior organização de frente única dos negros na África do Sul, a Convenção do Povo Negro. Em 1973, Biko foi “banido” pelo regime, o que significou uma série de imposições à sua liberdade.

Apesar dessas imensas restrições, Biko e o BCM desempenharam um papel significativo na organização dos protestos que culminaram com a Revolta de Soweto de 16 de junho de 1976, que despertaram a solidariedade e a inspiração de luta contra o regime em todo o mundo.

Em 18 de agosto de 1977, Biko foi preso em uma barreira policial, interrogado e barbaramente torturado, levando à sua morte em 11 de setembro de 1977.

Além da coragem e do desprendimento, o fundamental legado de Biko foi a compreensão da umbilical ligação entre o Apharteid e o capitalismo, portanto, do racismo e do capitalismo.

Essas duas frases sintetizam os conceitos de Biko: “O racismo não implica apenas a exclusão de uma raça por outra – ele sempre pressupõe que a exclusão se faz para fins de dominação” e “Racismo e capitalismo são faces da mesma moeda”.

A crença, mesmo que subjetiva, na existência de raças humanas continua sendo a base fundamental do racismo e é nosso dever combater cotidianamente essa crença. A luta contra o racismo é uma luta de todos, independentemente da cor da pele, pois o racismo que atinge brutalmente os negros faz parte do arcabouço de ideologias repugnantes do capitalismo para dividir e explorar mais a todos. Temos a certeza e a segurança de que quanto mais igualdade, menos racismo e só uma sociedade igualitária e fraterna poderá varrer de vez essas ideologias e seu moribundo sistema de desigualdades.  

Viva o Dia da Consciência Negra, Viva Zumbi!

Viva Steve Biko!

Lutar por Igualdade, Lutar contra o racismo, Lutar pelo Socialismo!


¹ A expressão “Jim Crow” provavelmente originou-se da canção “Jump Jim Crow”, cantada e dançada pelo ator Thomas D. Rice com maquiagem blackface, caricaturando os negros. A canção foi lançada em 1832 e era usada para satirizar as políticas populistas de Andrew Jackson. Em consequência da fama de Rice, “Jim Crow” tornou-se, em 1838, uma forma pejorativa de se referir aos negros. No fim do século 19, quando as legislaturas sulistas aprovaram leis de segregação racial dirigidas contra os negros, essas leis ficaram conhecidas como Jim Crow laws (“leis Jim Crow”).

² A nova legislação dividia os habitantes em grupos raciais (“negros”, “brancos”, “de cor” e “indianos”), segregando as áreas residenciais, muitas vezes através de remoções forçadas. A partir de finais da década de 1970, os negros foram privados de sua cidadania, tornando-se legalmente cidadãos de uma das dez pátrias tribais autônomas chamadas de bantustões. Nessa altura, o governo já havia segregado a saúde, a educação e outros serviços públicos, fornecendo aos negros serviços inferiores aos dos brancos.