13 de Maio: o que temos pra comemorar?

Há 129 anos era promulgada a Lei Áurea, que decretou o fim da escravidão no Brasil.

Embora muitos de nós tenhamos aprendido na escola que este foi um “favor” da Princesa Isabel, ou ainda uma decisão do mercado estrangeiro, essa não é a verdade. Para nós, marxistas, nenhuma destas versões condiz com a realidade, pois ignoram um aspecto muito importante desse cenário: a luta pela liberdade. A verdade é que o fim da escravidão, no Brasil e em outros países, foi resultado direito da luta de classes: a disputa dos interesses das classes dominantes em explorar, e das classes dominadas em serem livres. Não há como estar do lado do movimento negro e achar que esse aspecto não foi relevante.

No século XIX, as insurreições populares estavam pipocando pelo país (Balaiada, Cabanagem, Quilombos, etc.) e internacionalmente, como, por exemplo, a Revolução do Haiti em 1804, país pioneiro em extinguir a escravidão e alcançar a independência na América latina. Essas revoltas populares aterrorizavam as classes dominantes que faziam de tudo para impedir que as chamas revolucionárias invadissem seus domínios. Porém, os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, oriundos da Revolução Francesa de 1789, já percorriam o mundo e não podiam mais ser calados. No Brasil, a burguesia portuguesa fez um esforço imenso para manter a escravidão, até o momento em que não havia mais como conter a luta por liberdade.

Sendo assim, entendemos que a abolição da escravatura foi uma vitória das classes oprimidas, que enfrentaram, de diversas maneiras, o chicote do feitor e toda sua opressão e exploração, com uma importante participação de setores da nascente classe operária. Por isso, afirmamos que a abolição não foi um presente da “princesa boazinha” e nem uma imposição da Inglaterra. A liberdade foi tomada das mãos dos dominadores por aqueles que não aceitavam mais as humilhações e as ordens dos “senhores”, foi fruto da organização de todos que não aceitavam mais essa condição de subserviência, e queriam enfrentá-la, negros ou não.

A abolição trouxe a liberdade?

É inegável que a abolição e a continuidade das lutas trouxeram ganhos pra vida dos negros e seus filhos. Se este artigo está sedo escrito é porque um jovem, negro e pobre, teve condições de ser alfabetizado. Logo, essa luta não pode ser apagada ou amortizada.

Agora, quanto ao fato de ainda faltar muito para que nós negros vivamos em uma sociedade onde a liberdade e igualdade plenas sejam uma realidade, isso também é uma verdade inegável. Para nós, isso se dá porque a liberdade alcançada para os escravos foi uma liberdade dentro dos limites do sistema capitalista, ou seja, não se trata de uma liberdade plena, uma vez que a propriedade privada dos grandes meios de produção não foi extinguida.

Dessa forma, o escravo que antes trabalhava na colheita de um grande proprietário de fazendas, após a abolição foi obrigado a continuar vendendo sua força de trabalho em troca de um baixo salário, como uma mão de obra pouco especializada. Como ele não era detentor desses meios de produção (fábricas e fazendas) só lhe restava continuar sujeito à mesma exploração. Ou seja, a liberdade de escolher por qual burguês ele seria explorado. Isso ocorre porque a abolição da escravidão, apesar de constituir uma transformação no modo de produção, não teve como finalidade expropriar as fazendas e posses e tornar seu uso coletivo, planificado, como fim do bem estar de todos os cidadãos, manteve-se a estrutura “hierárquica” do acúmulo do capital.

Como o capital permaneceu na mão das mesmas famílias, não houve qualquer intenção de investir dinheiro em serviços públicos que contemplassem essas camadas oprimidas, ou seja, os negros tinham liberdade, mas não dispunham de terras para plantar, hospitais ou escolas, além de tudo o que ainda eram obrigados a comprar das mãos dos antigos senhores, as mercadorias que eles mesmos produziam. Obviamente, o resultado dessa exclusão foi a perpetuação de sua condição de subalterno como parte da classe trabalhadora.

Aos poucos as senzalas foram sendo trocadas por cortiços nas favelas, o chicote foi sendo trocado por jornadas absurdas de trabalho, as humilhações dos feitores foram sendo substituídas pela necessidade de se submeter às regras do patrão, para poder sobreviver. Portanto, o racismo ganhou uma máscara mais “democrática”, enquanto que na prática o negro segue, até hoje, como a parcela da classe trabalhadora que ocupa os piores cargos, recebe os piores salários, dispõe de serviços públicos mais precários e sente na pele a repressão dos “novos capatazes”; as polícias e forças militares, em especial nos bairros proletários.

A nossa luta hoje

É muito importante resgatar esse histórico de lutas para nos armarmos para os combates que estamos enfrentando hoje. O Movimento Negro Socialista entende que o 13 de Maio é uma dessas datas históricas que devem sempre ser lembradas. Justamente por isso, as classes dominantes tentam apagar ou distorcer os fatos, pois é muito perigoso que a população tenha consciência da força de sua unidade enquanto classe.

Atualmente estamos vivendo uma profunda crise do capitalismo, a burguesia tenta aumentar a exploração e retirar direitos e conquistas, as reformas da previdência, a reforma trabalhista, o congelamento dos gastos em serviços públicos, os  ataque às liberdades democráticas, etc. A burguesia fará a única coisa que ela é capaz de fazer para manter seus privilégios de classe: aumentar as chicotadas em nossas costas para que assim a crise seja paga às custas de nosso suor e sangue, sendo os negros os que mais sentem o peso dessas medidas.

Portanto, hoje, mais do que nunca é preciso lutar pela nossa liberdade, pelos nossos direitos. Contudo, a luta por uma vida menos sofrida só poderá ser alcançada se arrancarmos o poder das mãos dessa minoria de parasitas que há séculos nos oprime. A luta por liberdade, além de ser uma luta em legítima defesa, é uma disputa por poder. O que queremos é que o poder passe para a mão da maioria, para a classe trabalhadora organizada, e não pertença mais a essa casta de aproveitadores, que sempre nos viu apenas como “mula de carga”.

Enfrentar o racismo hoje exige enfrentar, com o mesmo vigor, o capitalismo, pois ambos são duas faces de uma mesma moeda. A liberdade verdadeira, a igualdade de direitos, o respeito às diferenças, só será possível com a superação do capitalismo e a construção do socialismo.